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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/texto-leva-a-conclusao-equivocada-ao-ignorar-ineficiencia-de-medidas-defendidas-por-bolsonaro-na-pandemia/ | COMPROVA | Texto leva a conclusão equivocada ao ignorar ineficiência de medidas defendidas por Bolsonaro na pandemia | null | 2020-08-13 | Publicação diz que o presidente da República não pode ser responsabilizado pelas mortes por covid-19 porque medidas defendidas por ele não foram adotadas, mas não há comprovação científica de que essas ações tenham eficiência contra a pandemia
Conteúdo verificado: Publicação em um perfil no Facebook e replicada por site afirma que ações defendidas pelo presidente Bolsonaro no combate à pandemia não foram implementadas e, logo, não é possível culpar o mandatário pelas mortes e o avanço da doença, que soma mais de 103 mil óbitos.
Um perfil de Facebook que usa o nome Bituca Von Wittgenstein alega que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não pode ser responsabilizado pelas mortes decorrentes da pandemia porque medidas defendidas por ele, como isolamento vertical e tratamento precoce com cloroquina e azitromicina, não foram colocadas em prática. O texto leva a conclusões enganosas já que dois dos três pontos levantados pelo post não têm eficiência comprovada contra a covid-19.
Em conversa com o Comprova, o titular do perfil afirmou: “Que o presidente teve esse posicionamento que eu escrevi no texto, ele teve; se ele é bom ou ruim, são outros 500, não fiz esse juízo de valor. Então, não existe a possibilidade, na minha concepção, de se falar em qualquer tipo de fake news em relação ao posicionamento dele”.
O perfil fez a postagem às 8h45 do dia 10 de agosto. O site Jornal da Cidade Online publicou o material 25 minutos depois como artigo de opinião. O texto viralizou rapidamente.
Como verificamos?
A primeira ação do Comprova para verificar o conteúdo foi tentar descobrir quem era o autor das postagens. Para isso, foram enviadas mensagens ao perfil de Bituca Von Wittgenstein no Facebook. Por meio de informações coletadas na rede social e pesquisa no LinkedIn, foi possível encontrar o responsável..
O Jornal da Cidade Online também foi contatado – o Comprova conversou, com seu editor, José Tolentino, por e-mail.
Também buscamos contato com algum especialista que pudesse elucidar melhor as informações técnicas da postagem. Naomar de Almeida Filho, epidemiologista, professor titular de epidemiologia do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (ISC/UFBA) e vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) trouxe esclarecimentos sobre o isolamento vertical.
Foi utilizado o buscador Google para encontrar reportagens publicadas na imprensa e documentos públicos sobre tratamentos para covid-19, ações do governo federal para barrar a contaminação, a relação do presidente Jair Bolsonaro com prefeitos e governadores em tempos de pandemia e a atuação do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, que é citado num terceiro ponto do texto.
Acionamos, via WhatsApp, o jornalista Milton Cardoso, que na noite do dia 10 de agosto – mesma data da postagem de Bituca Von Wittgenstein, publicada de manhã – fez um comentário com informações similares às do post no programa Band Cidade RS. A fala do comunicador gaúcho, inclusive, foi compartilhada nas redes sociais do presidente Jair Bolsonaro.
Usamos as ferramentas TweetDeck e CrowdTangle para monitorar o desempenho da publicação de Bituca Von Wittgenstein nas redes sociais.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 12 de agosto de 2020.
Verificação
O autor do texto
A página de Bituca Von Wittgenstein no Facebook tem a foto de um cão com a legenda “Bolsonaro tem meu apoio” e o presidente na imagem de capa. É apresentada como “Um cachorro defensor da moral e dos bons costumes. Odeio banho e petista!”. Já o sobrenome é o mesmo de Ludwig Wittgenstein, um dos principais filósofos do século XX.
Bituca publica fotos do cachorro e posts sobre política. Só em agosto, minimizou a gravidade de pandemia, insultou uma jornalista e criticou bolsonaristas que postam conteúdos falsos.
No dia 4 de agosto, o perfil publicou um post sobre a criação de uma página no Facebook em parceria com dois amigos. Ao clicar no link deste outro perfil, há um post do mesmo dia dando boas-vindas. No final, três pessoas assinam a publicação: duas são as mesmas citadas como amigas de Bituca e, a terceira, é “Fernando Vaisman (Bituca)”. Fazendo uma busca pelo nome no Google, aparece uma página no LinkedIn com a foto do mesmo homem que está em posts do perfil de Bituca como o dono do cãozinho. Segundo o LinkedIn, ele é sócio-diretor da empresa e formado em direito.
Em uma busca no Google pelo nome da empresa informada no LinkedIn, foi possível encontrar um número de telefone, que o Comprova confirmou ser o de Vaisman ao falar com ele por WhatsApp.
Lockdown não é eficaz?
O post afirma: “O presidente era contra o lockdown. Defendia o isolamento vertical desde o início. A vontade do presidente foi ignorada por prefeitos, governadores e pelo STF e, assim, cada um faz o que acha melhor, mesmo que as decisões sejam completamente incoerentes e absurdas”.
Mas, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), o lockdown é uma das poucas formas conhecidas de combate ao novo coronavírus. Em 1º de abril, Michael Ryan, diretor-executivo do Programa de Emergências da entidade, afirmou: “Além das medidas de lockdown, precisamos de estratégias abrangentes baseadas em vigilância, em intervenção de saúde pública, detecção de casos, testagem, isolamento, quarentena, e fortalecer nossos sistemas de saúde para absorver o golpe”.
Já em 20 de julho, um tuíte da organização assinado por seu diretor-geral, Tedros Adhanom, informou: “Como dissemos várias vezes, as chamadas medidas de lockdown podem ajudar a reduzir a transmissão da covid-19, mas não podem pará-la por completo” e cita o rastreamento de contatos como essencial para isolar os casos.
Em uma análise do isolamento vertical (que isola apenas os grupos de risco e é defendido por Bolsonaro) publicada no Nexo, em 25 de março, Eduardo Flores, virologista e professor do curso de medicina veterinária da Universidade Federal de Santa Maria, diz que o presidente “está na contramão de milhares de autoridades sanitárias e cientistas de todo mundo”.
O Reino Unido, assim como o Brasil, foi um dos países que minimizaram o perigo do vírus, com seu premiê recomendando, no início de março, que “a grande maioria” dos cidadãos continuassem tocando seus negócios “como sempre”. Mas, em 23 de março Boris Johnson decretou o lockdown. A situação do país estava tão grave que a rainha Elizabeth 2ª defendeu medidas de confinamento social em um pronunciamento. Até o fechamento deste texto, o país, de 66,65 milhões de habitantes, contabilizava 46.791 mortes, segundo a Johns Hopkins University.
A Suécia adotou o isolamento vertical e teve a mais alta taxa de letalidade entre os países nórdicos. Foram 5.774 mortes para 10,2 milhões de habitantes. Por outro lado, Dinamarca e Noruega, que instauraram o lockdown e têm, somados, 11,2 milhões de habitantes, tiveram menos de 900 óbitos.
Entre os países que adotaram o isolamento vertical e obtiveram bons resultados está a Coreia do Sul, que aliou a medida a outras estratégias, como testagens em massa e utilização de tecnologia para rastrear a movimentação dessas pessoas. Foram 305 óbitos em uma população de 51,6 milhões de pessoas.
Já a Nova Zelândia, que, entre outras ações, decretou o lockdown rapidamente após o primeiro caso de contágio, em 28 de fevereiro, é um dos países mais bem-sucedidos no combate à pandemia. Estava há 102 dias sem novos casos de transmissão local até que em 11 de agosto anunciou quatro infecções de origem desconhecida em Auckland. Com isso, a primeira-ministra do país, Jacinda Ardern, impôs um confinamento à cidade. No total, foram 1.579 casos de covid-19 confirmados e 22 mortes no país.
O Comprova questionou Vaisman sobre os bons resultados obtidos na Nova Zelândia com a adoção das políticas rígidas de isolamento. Ele acredita que “há uma série de desinformações” sobre outros países e que “ninguém sabe efetivamente o que aconteceu em cada país”.
Recurso inválido
Segundo o epidemiologista Naomar de Almeida Filho, que publicou em maio um artigo sobre o isolamento vertical na página oficial da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), a medida é um recurso cientificamente inválido. “Em mais de 40 anos como professor e pesquisador em epidemiologia, nunca soube da existência dessa proposta. Com outros epidemiologistas, fiz uma busca cuidadosa na literatura médica e científica e nada encontrei”, afirmou o médico em entrevista ao Comprova.
Almeida Filho complementou que o isolamento vertical não é um conceito no campo da saúde coletiva nem no campo da medicina: “Por isso, eu o chamei de fraude pseudocientífica. Nunca foi proposto seriamente e, portanto, nunca foi usado para controlar epidemias no passado. Foi uma invenção de um consultor de negócios. Influenciado por conselheiros, Donald Trump mencionou essa ideia e, quase imediatamente, Bolsonaro adotou o isolamento vertical como política de governo.”
E continua: “Essa ideia fomenta a livre circulação dos contaminantes, buscando uma criminosa imunidade de rebanho, o que facilita o contágio e impede o bloqueio do processo epidêmico. O próprio Bolsonaro, e muitos seguidores, encorajaram a quebra de medidas de distanciamento”.
De acordo com o epidemiologista, isso trouxe como resultado “uma pandemia fora de qualquer controle. (…) Esperavam um pico, mas temos um platô, com média de mil mortes por dia, sem expectativa de redução da transmissão.”
A relação com prefeitos e governadores
A relação entre os governos federal, estaduais e municipais tem sido conflituosa no combate à pandemia. Em abril, Jair Bolsonaro disse, ao não encontrar consenso com governantes sobre o isolamento vertical, que poderia resolver a situação com uma canetada.
No mesmo mês, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), definiu que governos estaduais e municipais teriam autonomia para determinar o isolamento social. Chegou a circular nas redes sociais a informação falsa de que o Supremo teria afastado Bolsonaro do controle da covid-19. A mensagem foi desmentida em verificações da Agência Lupa e do Estadão Verifica.
Em junho, Bolsonaro usou o Twitter para criticar a adesão ao distanciamento social, afirmando que as medidas de combate à pandemia são determinadas por governadores e prefeitos.
Contudo, em julho, o presidente reconheceu que medidas de governadores e prefeitos “sempre visaram retardar contágio” da covid-19.
Em 8 de agosto, já com a marca de 100 mil mortes por covid-19, Bolsonaro enviou a parlamentares um relatório em que listava governadores e prefeitos dos locais com o maior número de novos óbitos e novos casos da doença. Em uma tentativa de se eximir das críticas pela condução do enfrentamento à doença, o chefe do Planalto atribuiu a responsabilidade pelo crescimento da pandemia aos gestores estaduais e municipais.
A azitromicina e a cloroquina
No segundo item da postagem, o perfil de Bituca assinala que “o presidente defendia desde lá atrás o tratamento precoce com cloroquina e azitromicina. Até agora há gente discutindo isso e criando problemas para o tratamento”. O responsável pela conta, Fernando Vaisman, justifica a declaração argumentando que o uso desses fármacos deve ser decisão do médico e do paciente, e que há diferença de tratamentos na rede pública ou privada. “Tenho casos de familiares que acabaram contraindo e quando foram ao médico, foi receitado azitromicina e hidroxicloroquina. Na rede pública, isso demorou muito para conseguir ser receitado, em especial para o tratamento precoce”, afirmou ao Comprova.
Ele complementou: “Ninguém está falando que tem que tomar hidroxicloroquina a torto e a direito, mas, a partir do momento que você adota isso como protocolo da rede pública, você permite ao médico receitar esse medicamento”.
Em 20 de maio, o Ministério da Saúde, já tendo como ministro interino o general Eduardo Pazuello, passou a orientar o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no “tratamento medicamentoso precoce” de pacientes com o novo coronavírus, mas ressaltou que “ainda não há meta-análises (…) que comprovem o benefício inequívoco dessas medicações para o tratamento da covid-19”.
A azitromicina é um medicamento eficaz para o combate a bactérias e não tem ação documentada contra vírus, como o SARS-CoV-2. A droga é prescrita, de forma experimental e associada à hidroxicloroquina, a pacientes infectados com o novo coronavírus. Além disso, de acordo com a OMS, não há, até o momento, tratamento efetivo ou drogas comprovadas contra o novo coronavírus. Essa posição é ratificada por autoridades sanitárias como Associação de Medicina Intensiva Brasileira, Sociedade Brasileira de Infectologia e Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Questionado sobre o uso dessas medicações, o epidemiologista Naomar de Almeida Filho afirmou: “No caso da cloroquina, inclusive, há efeitos colaterais fatais. Isso é irresponsabilidade.”
As orientações do Ministério da Saúde
No terceiro item, Vaisman afirma: “O ministro da Saúde original (Mandetta) pregava que só se deveria ir ao hospital quando o paciente estivesse com falta de ar, o que só (sic) mostrou extremamente equivocado, já que, nesse caso, já há comprometimento dos pulmões e a chance de cura cai drasticamente. O ministro atual prega o tratamento precoce”.
De fato, durante a gestão de Luiz Henrique Mandetta, que ficou no cargo até 16 de abril, a cartilha divulgada pelo Ministério da Saúde com orientações sobre o novo coronavírus recomendava que só fosse procurado “um hospital de referência se estiver com falta de ar”. No caso de pacientes com apenas sintomas de gripe, a orientação era ficar em casa por 14 dias e seguir os conselhos da pasta para o isolamento domiciliar.
A falta de ar é indicativo de um quadro mais grave, que necessita de cuidados médicos – mas essa não é a maioria dos casos. Segundo um estudo da OMS de fevereiro, cerca de 80% das pessoas com covid-19 manifestam sintomas leves e acabam se curando em casa. Em torno de 14% têm quadros mais severos, que precisam de atendimento ambulatorial. E apenas cerca de 6% têm casos críticos.
Nesse sentido, a justificativa da orientação do Ministério da Saúde era evitar que o sistema de saúde ficasse sobrecarregado. Isso vale especialmente para o sistema de saúde público, responsável por atender três quartos da população brasileira. Além disso, a orientação visava diminuir os riscos de contaminação pelo novo coronavírus dentro dos próprios hospitais e postos de saúde, que poderiam ter aglomerações em filas ou salas de espera.
Essa foi a recomendação da pasta desde o início da pandemia, decretada em março pela OMS. Em julho, já sob a gestão do ministro interino da Saúde Eduardo Pazuello, o governo federal mudou a orientação, sugerindo às pessoas buscar assistência já nos primeiros sinais, como febre e tosse. O principal argumento foi aliviar a ocupação de UTIs.
A mudança coincide com a ampliação do uso da cloroquina para casos leves de covid-19, seguindo a agenda do presidente Jair Bolsonaro. O atendimento preventivo proposto pelo Ministério da Saúde propõe o uso desse medicamento e de seu derivado, hidroxicloroquina. Porém, no início de julho, a OMS retirou a cloroquina de seus testes científicos definitivamente. A entidade afirmou que o medicamento não resultou em “nenhuma redução da mortalidade de pacientes internados com covid-19 quando comparados ao padrão de atendimento”. Essa posição é ratificada por autoridades sanitárias como Associação de Medicina Intensiva Brasileira, Sociedade Brasileira de Infectologia e Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
A viralização
No dia 10 de agosto, à noite, no programa Band Cidade RS, principal telejornal da rede no Rio Grande do Sul, o comentarista Milton Cardoso fez um comentário com informações bastante similares às do post de Bituca Von Wittgenstein, que já tinham sido republicadas pelo Jornal da Cidade pela manhã.
“O presidente Bolsonaro sempre foi contra o famoso lockdown. Defendia o isolamento vertical desde o início. A vontade do presidente foi ignorada por decisão do STF, com apoio da ‘Rede Goebbels’, repassada para prefeitos, governadores, com decisões incoerentes e absurdas. (…) Veja você, telespectador, Jair Bolsonaro defendia desde o início o tratamento precoce com azitromicina, hidroxicloroquina. Com 100 mil mortos agora, grande número de prefeitos e governadores decidiram colocar a medicação à disposição da população. (…) Tem gente que reclama do ministro da Saúde, mas o ministro da Saúde, o marqueteiro Mandetta, lembram? Pregava que o paciente só procurasse o hospital quando estivesse com falta de ar, o que provocou com certeza o comprometimento de pacientes que poderiam ter evitado a hospitalização, UTIs e óbitos. A pergunta que não quer calar, meus amigos Lúcia e Sérgio [âncoras do jornal]: se o que o presidente pregava e prega nunca foi praticado, como é que ele pode ser responsabilizado pelas mortes?”, afirmou Cardoso.
Entramos em contato com Cardoso via WhatsApp para entender se ele havia utilizado como fonte o post de Bituca e ele respondeu: “Nunca tive qualquer contato. Não uso redes sociais. Não conheço Bituca”.
Também perguntamos a Vaisman, responsável pela conta do Facebook, se sabia do comentário no Band Cidade RS e se havia alguma relação com o texto original. “Sinceramente, nem sei quem é esse cidadão. Eu, basicamente, não leio mainstream, não vejo televisão”, afirmou.
No dia seguinte, 11 de agosto, o presidente Jair Bolsonaro compartilhou o vídeo do comentário de Cardoso em suas redes sociais (Twitter, Facebook e YouTube), aumentando ainda mais a viralização do conteúdo. Em 12 de agosto, o site Coletiva.net publicou o texto “Com desinformação, comentário do jornalista Milton Cardoso é compartilhado por Bolsonaro”.
Por que investigamos?
Nesta terceira fase, o Comprova verifica conteúdos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia. Informações desencontradas, sem embasamento ou fora de contexto podem levar a população a agir de forma inadequada no combate ao novo coronavírus. O post de Bituca tinha 676 reações, 96 comentários e 294 compartilhamentos no Facebook até 12 de agosto. O alcance foi ampliado pela republicação no Jornal da Cidade Online, que atingiu 131 mil interações, segundo a ferramenta CrowdTangle – só no perfil do site foram 39 mil likes, 7,5 mil comentários e 21 mil compartilhamentos.
Ao levar o leitor a acreditar que Bolsonaro não pode ser responsabilizado pelos mais de 100 mil óbitos no país porque medidas que ele defendeu não teriam sido implementadas, o texto verificado ignora que duas das três ações não têm eficácia comprovada contra o vírus e não têm o apoio de autoridades sanitárias. Verificações tentando minimizar o impacto da pandemia já foram publicadas pelo Comprova, como a do médico que usou dados enganosos para sugerir conspiração sobre a covid-19, da publicação que dizia que a pandemia estava em declínio e do vídeo que afirmava que vírus da covid-19 existe desde 2003.
Enganosos, para o Comprova, são os conteúdos retirados do contexto original e usados em outro com o propósito de mudar o seu significado; que induzem a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdos que confundem, com ou sem a intenção deliberada de causar dano. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/postagem-com-capsula-vazia-nao-prova-conspiracao-de-prefeitos-contra-cloroquina/ | COMPROVA | Postagem com cápsula vazia não prova “conspiração” de prefeitos contra cloroquina | null | 2020-08-12 | Meme que viralizou nas redes sociais faz uma montagem com imagem de um caso que envolve outro medicamento. A montagem sugere que o conteúdo teria sido postado no perfil de Twitter de Roberto Jefferson. A assessoria do ex-deputado nega a publicação
Conteúdo verificado: Publicação no Facebook que mostra a captura de tela de uma postagem supostamente feita pelo presidente nacional do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Roberto Jefferson, afirmando que cápsulas de cloroquina foram esvaziadas para “provar” que este medicamento não funciona.
É falso o conteúdo de uma publicação feita no Facebook que afirma que cápsulas de cloroquina vazias foram distribuídas por prefeitos para “provar que o medicamento não tem eficácia contra a covid-19”. A informação foi compartilhada milhares de vezes nas redes sociais desde o último dia 7 de agosto junto com a imagem de uma cápsula de remédio aberta.
A imagem viralizada se trata, na verdade, do frame de um vídeo sobre um caso ocorrido no município de Pontes e Lacerda, no Mato Grosso. A gravação em questão foi feita por uma mulher que recebeu ivermectina – não cloroquina – no hospital privado Vale do Guaporé, na cidade mato-grossense.
Essas publicações são, por vezes, acompanhadas de uma captura de tela de celular em que se vê a identificação do perfil @blogdojefferson, sugerindo que a postagem seria de Roberto Jefferson, presidente nacional do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). A única conta encontrada pelo Comprova em redes sociais cujo usuário é “@blogdojefferson” é de um dos perfis de Jefferson no Twitter. Ele, no entanto, está impedido de fazer postagens com esse perfil desde o fim de julho por uma determinação da justiça relacionada ao inquérito das fake news. A assessoria do político afirmou que ele não fez esta publicação e que se trata de uma montagem.
O conteúdo investigado pelo Comprova culpa os prefeitos pela distribuição das cápsulas vazias. No caso da gravação de onde foi tirada a imagem, não há participação da prefeitura. O Hospital Vale do Guaporé fechou uma parceria com empresários locais para a distribuição da ivermectina como forma de profilaxia contra a covid-19, embora ela não tenha eficácia comprovada. Coordenadores da ação ouvidos pelo Comprova disseram que o projeto não recebeu dinheiro público e que não tem cunho político.
Como verificamos?
O Comprova iniciou a verificação fazendo uma busca no Google, que levou a uma matéria publicada em julho deste ano. Ela mencionava um vídeo no qual uma pessoa mostrava uma cápsula vazia de ivermectina entregue por um projeto realizado por empresários da cidade de Pontes e Lacerda, no Hospital Vale do Guaporé, e indicava que a coordenadora da ação, Eliana Matsuda, havia se manifestado.
Por meio de uma pesquisa nas redes sociais pelas palavras “ivermectina + cápsulas + vazias” foi possível, ainda, encontrar três vídeos, um deles publicado em 3 de agosto, nos quais se via o medicamento prescrito e se ouvia a voz de uma mulher que contava como descobriu que a cápsula de ivermectina estava vazia.
Entramos em contato com a Secretaria Municipal de Saúde, com a Prefeitura de Pontes e Lacerda, com o Conselho Municipal de Saúde e com o Hospital Vale do Guaporé.
O Comprova conversou com Eliana Matsuda, a respeito do projeto e do vídeo da cápsula esvaziada, e com a assessoria de imprensa de Roberto Jefferson, sobre a publicação supostamente feita por ele.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 12 de agosto de 2020.
Verificação
Ivermectina, não cloroquina
Uma pesquisa inicial no Google mostrou que uma história semelhante à da suposta cápsula de cloroquina vazia havia ocorrido em uma cidade do Mato Grosso, Pontes e Lacerda, mas com a ivermectina. A partir desta informação, o Comprova buscou por publicações que mencionassem a “ivermectina esvaziada”, chegando a três postagens.
Os vídeos, com uma qualidade superior às das fotos viralizadas nas redes sociais, possibilitaram a identificação do nome do medicamento: ivermectina de 6mg.
No vídeo, uma mulher diz: “Eu fui na Santa Casa pegar uma ivermectina para poder tomar mais a minha filha. […] E hoje era a data certa de tomar a segunda dose, com 15 dias. […] Ela tomou um comprimido e o outro, por curiosidade, eu acredito, ela foi e abriu. Olha o que tinha dentro da cápsula. Nada!”.
A imagem, compartilhada nas redes, de fato, corresponde a um fragmento do vídeo em que a mulher mostra a cápsula de ivermectina vazia.
A partir da informação do local onde isso teria ocorrido e o nome da coordenadora do projeto mencionado, Eliana Matsuda, a equipe do Comprova fez uma busca no Facebook e encontrou uma transmissão ao vivo realizada em 2 de julho de 2020 pela página Lacerda 24 horas com Matsuda em frente ao Hospital Vale do Guaporé (HVG).
Segundo a descrição do vídeo, tratava-se de um grupo de empresários que montou uma campanha para o “bloqueio” da covid-19 em Pontes e Lacerda e que distribuiria 10 mil doses de ivermectina gratuitamente.
Com início em 6 de julho, a campanha, segundo Eliana Matsuda, era uma parceria entre empresas, o Hospital Vale do Guaporé e médicos. O protocolo de medicação, por sua vez, foi feito pela doutora Jaqueline Margonato, do HVG.
A coordenadora do projeto e a doutora Jaqueline ressaltaram que, embora existam médicos que defendem o uso do medicamento, não há comprovação científica da sua eficácia na profilaxia da covid-19.
O Comprova conversou com Eliana Matsuda. Ela disse que a iniciativa foi firmada entre empresários e o hospital sem “cunho político nem dinheiro público”.
Também falamos por telefone com Claudenice Luiza Lima, administradora do hospital. Ela reiterou que a mulher que gravou o vídeo não entrou em contato com a instituição e que o laboratório onde os medicamentos foram comprados disse “não haver possibilidade de a cápsula ter ficado vazia porque o processo é automatizado”. Por fim, relatou que a equipe “abriu outras caixas de medicamento e não encontrou cápsulas com defeito”.
Por telefone, a prefeitura de Pontes e Lacerda afirmou que não tinha qualquer ingerência sobre o tema, assim como a Secretaria de Saúde do município, acrescentando que o Hospital Vale do Guaporé é privado.
A equipe do Comprova também falou com um responsável pelo Conselho Municipal de Saúde de Pontes e Lacerda por WhatsApp, que assinalou que soube do ocorrido pelas mídias sociais e, por se tratar de um caso isolado e sem notificação formal, não deliberou sobre o tema.
A ivermectina industrializada é produzida em forma de comprimido, mas é possível encontrar o medicamento em cápsulas em farmácias de manipulação. Em nota, o Hospital Vale do Guaporé informou que recorreu a um laboratório de manipulação local porque “não havia na indústria, nos distribuidores e no comércio a ivermectina industrializada”.
Roberto Jefferson
A postagem que gerou a verificação tem como base uma suposta publicação do ex-deputado Roberto Jefferson, atual presidente nacional do PTB. Nas redes sociais dele, porém, não há nenhum registro de tal post.
O ex-deputado e outros aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) são alvos de um inquérito que investiga disseminação de notícias falsas e ataques a ministros da corte.
Na imagem em questão, é possível ver que o nome do usuário é “blogdojefferson”, o mesmo que Roberto Jefferson usava para publicar tuítes. Contudo, a conta dele na rede social está suspensa desde 24 de julho. A decisão foi de Alexandre de Moraes, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal).
Desde que sua conta foi bloqueada, Roberto Jefferson passou a usar o Twitter pelo usuário “@bobjeffhd”, como se pode confirmar em sua página verificada no Facebook, e no qual não consta nenhuma publicação sobre cápsulas esvaziadas de cloroquina. Também não há registros nas contas dele no Facebook e no Instagram. Na rede social Parler, por sua vez, não encontramos um perfil de usuário @blogdojefferson.
Em mensagem ao Comprova, a assessoria de Roberto Jefferson negou que ele tenha feito a postagem.
Por que investigamos?
O Comprova verifica conteúdos que tenham grande viralização e repercussão nas redes sociais. Um dos posts analisados teve mais de 4,9 mil interações no Facebook. Outro, na mesma rede social, atingiu 1,5 mil compartilhamentos. Este conteúdo também circulou amplamente no Instagram e no Twitter.
A cloroquina é um medicamento em evidência no Brasil, mesmo sem eficácia comprovada contra a covid-19. Ao compartilhar uma informação falsa de que cápsulas da droga estão sendo esvaziadas, o post gera uma preocupação em parte da população que tem buscado se informar sobre o remédio.
A cloroquina só pode ser vendida em receitas de duas vias. Em algumas cidades, Itagi (BA) e Porto Feliz (SP), foi incluída em um kit de prevenção contra a covid-19. A Organização Mundial da Saúde suspendeu seus estudos com a droga por não haver eficácia comprovada no combate ao novo coronavírus.
O Comprova tem publicado outros conteúdos falsos relacionados à pandemia, como da médica que disse que a Austrália controlou a covid-19 com ivermectina, o influenciador que negou a eficiência das máscaras e uma imagem falsa que dizia que a cloroquina estava sendo vendida em trem no Rio de Janeiro.
Falso, para o Comprova, é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/imagem-que-circula-nas-redes-sociais-nao-comprova-venda-de-cloroquina-em-trem-no-rio-de-janeiro/ | COMPROVA | Imagem que circula nas redes sociais não comprova venda de cloroquina em trem no Rio de Janeiro | null | 2020-08-07 | Não há embalagem de medicamentos à base de cloroquina ou hidroxicloroquina na imagem que viralizou no Twitter, Reddit e Facebook
Conteúdo verificado: Em postagens no Facebook e no Twitter, perfis compartilham foto de duas pessoas em um vagão, uma delas coberta por dezenas de saquinhos com diversos remédios que parecem estar à venda. O texto que acompanha as postagens afirma que “O Rio não é pra qualquer um… Cloroquina 3 por 10 no no trem em Japeri – RJ”.
Os textos que acompanham uma foto que circula pelas redes sociais e que sugerem que pacotes de cloroquina e hidroxicloroquina estariam sendo vendidos em trens da malha urbana estadual do Rio de Janeiro são falsos.
Apesar de o Comprova não ter encontrado o autor da imagem, nem registro da circunstância e local onde ela foi feita, a partir análise detalhada da foto e de informações obtidas com o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), é possível afirmar que não há embalagem de medicamentos à base de cloroquina ou hidroxicloroquina na imagem que viralizou.
Como verificamos?
Inicialmente, o Comprova contatou a Supervia, companhia que opera o transporte ferroviário no Rio de Janeiro e é responsável pela linha que leva a Japeri, onde teria sido clicada a foto, segundo algumas das postagens. Também entrou em contato com a Polícia Militar, órgão acionado quando há alguma ocorrência nos trens e estações.
A equipe também fez uma busca reversa de imagem no Google, e na ferramenta TinEye, para tentar achar a fotografia original, No entanto, os primeiros posts encontrados, do dia 4 de agosto, já são repostagens. O Comprova questionou internautas que publicaram a foto se conheciam o autor da imagem, mas nenhum respondeu de maneira afirmativa até o fechamento deste texto. Essas pessoas sempre alegavam que receberam a foto já com o contexto falso.
Sem ter a confirmação, o Comprova utilizou a ferramenta InVid, que possibilita a ampliação de imagens, para observar detalhes da foto. Com o ampliação da imagem, a reportagem entrou em contato com o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos para checar quais laboratórios comercializam medicamentos à base de cloroquina e hidroxicloroquina e, assim, identificar se as embalagens desses remédios apareciam na foto verificada. A equipe também procurou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem.
Verificação
O que dizem a PM e a Supervia
A Supervia informou que não pode confirmar a veracidade da foto porque não “teve registro do fato citado”. A empresa afirmou ainda que investe em campanhas para alertar sobre o comércio ilegal de camelôs “e os riscos do consumo de produtos de procedência não conhecida e, por vezes, fora do prazo de validade” e que, quando sabe de algum tipo de ocorrência, aciona a Polícia Militar por meio do Grupamento de Policiamento Ferroviário (GPFer) – os agentes da companhia não têm poder de polícia.
A Polícia Militar do Rio de Janeiro afirmou não ter sido acionada para nenhuma ocorrência relacionada à venda de cloroquina nos vagões das linhas fluminenses. E completou que “é importante que as pessoas denunciem este tipo de conduta e não contribuam comprando produtos de origem desconhecida”.
Embalagens
Observando a imagem detalhadamente com a ferramenta InVID, é possível identificar alguns remédios, como o Dipimed, à base de dipirona, utilizado no tratamento da dor e febre, e o Narix, descongestionante nasal. Para descobrirmos se há embalagem de cloroquina ou hidroxicloroquina na foto, também pesquisamos os laboratórios que comercializam as drogas no Brasil. Contatado pelo Comprova, o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma) informou que as empresas que vendem atualmente as duas drogas em farmácias do país, segundo dados da consultoria IQVIAsão: Apsen, E.M.S e Sanofi.
Um quarto laboratório, Cristália, produz cloroquina, mas vende apenas para o Sistema Único de Saúde (SUS) e hospitais particulares, em embalagens de 200 comprimidos, conforme informou ao Comprova. “O Quinacris (nome do remédio) não é comercializado em farmácias e drogarias e o foco do produto não é o paciente final”, afirmou a empresa.
Comparando as embalagens dos três produtos comercializados em drogarias brasileiras, é possível verificar que não há nenhum deles na imagem que viralizou nas redes sociais.
A foto verificada pelo Comprova não mostra, portanto, nenhum remédio à base de cloroquina ou hidroxicloroquina.
Nenhuma das duas substâncias tem eficiência comprovada contra o novo coronavírus e medicamentos à base delas devem ser prescritos “em receita especial de duas vias”, informa um comunicado publicado em março pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Por que investigamos?
O Comprova verifica conteúdos que tenham grande viralização e repercussão nas redes sociais. É o caso do post em questão, que teve 3.825 interações no Twitter até 7 de agosto, segundo a ferramenta CrowdTangle.
No Facebook, foram ao menos 7.700 compartilhamentos e mais de 10 mil interações. A maioria das páginas com viralização tratam de notícias locais do Rio de Janeiro, mas o caso também foi divulgado por alguns sites, o mais expressivo da rádio Tupi FM.
Embora o comércio ilegal seja comum em muitas cidades brasileiras, o post chama a atenção por supostamente mostrar a venda de uma droga que está em evidência no país. Apesar de não ter eficácia comprovada contra a covid-19, o medicamento vem sendo apresentado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como uma possível cura para a doença – ele, inclusive, afirmou ter tomado ao ser infectado pelo novo coronavírus.
Muitos brasileiros acreditam que a substância seja realmente uma cura, e o post coloca a saúde da população em risco ao afirmar que a droga pode ser encontrada em trens do Rio de Janeiro. Como informado anteriormente, a droga só pode ser vendida em receita de duas vias.
O Comprova tem publicado outros conteúdos falsos relacionados à pandemia, como da médica que disse que a Austrália controlou a covid-19 com ivermectina e do influenciador que negou a eficiência das máscaras.
Falso, para o Comprova, é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/osmar-terra-usa-dados-de-um-unico-hospital-para-dizer-que-covid-19-esta-reduzindo-no-rs/ | COMPROVA | Osmar Terra usa dados de um único hospital para dizer que covid-19 está reduzindo no RS | null | 2020-08-07 | Deputado usa dados verdadeiros sobre uma queda no número de internações no Grupo Hospitalar Conceição — referência no tratamento da covid-19 em Porto Alegre. Mas os dados não podem ser extrapolados para as outras 298 instituições de saúde que também atendem pacientes com covid-19 em todo o estado
Conteúdo verificado: Publicação no Twitter do deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) em que ele usa dados de internações por covid-19 no Grupo Hospitalar Conceição (GHC), na capital gaúcha, para afirmar que a epidemia está reduzindo no Rio Grande do Sul.
O deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) erra ao afirmar em uma publicação no Twitter que “a epidemia começa a reduzir no RS”. Na postagem, Terra usa dados verdadeiros sobre uma queda no número de internações no Grupo Hospitalar Conceição — referência no tratamento da covid-19 em Porto Alegre — para anunciar uma melhora no quadro em todo o Rio Grande do Sul.
O post é do dia 4 de agosto, data em que o estado chegou a um recorde de mortes registradas em um único dia: 83. O novo coronavírus custou a vida de 2.231 gaúchos até o dia 6 de agosto, aponta o painel on-line do Governo do Rio Grande do Sul. O indicador mostra ainda que a capital gaúcha lidera o ranking de casos confirmados e de mortes no estado: 9.532 e 318, respectivamente. Porto Alegre também superou a própria marca máxima de internações em UTIs na quinta-feira (6), contabilizando 331 pacientes. Nos três dias que se seguiram desde o tuíte de Osmar Terra, foram 215 novos óbitos por Covid-19: 83 na terça-feira , 64 na quarta e 68 na quinta.
A equipe do Comprova tentou contato com o deputado Osmar Terra por telefone, WhatsApp e Instagram, mas não teve resposta até a data desta verificação.
Como verificamos?
O Comprova começou a verificação buscando os dados no site do Grupo Hospitalar Conceição (GHC), que atualiza as informações diariamente. Os gráficos publicados por Osmar Terra não estavam na página e procuramos a assessoria de imprensa do GHC, que nos colocou em contato com o diretor-técnico do hospital, Francisco Zancan Paz. O médico confirmou que os dados são do Conceição e disse que se tratam de estudos internos, mas que estariam disponíveis havendo solicitação. Os retornos sobre os registros foram por mensagens de WhatsApp e telefone.
Também solicitamos informações à Secretaria Estadual da Saúde (SES-RS), que respondeu por e-mail.
Usamos as ferramentas TweetDeck e CrowdTangle para monitorar o desempenho da publicação de Osmar Terra nas redes sociais e o buscador Google para encontrar reportagens publicadas na imprensa sobre a situação da pandemia no Rio Grande do Sul.
Por fim, tentamos falar com o deputado federal por telefone, mensagem de WhatsApp e de Instagram. Ele não atendeu a reportagem.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 7 de agosto de 2020.
Verificação
Em tuíte publicado na última terça-feira (4), o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) usa gráficos do Grupo Hospitalar Conceição (GHC) para afirmar que a epidemia de covid-19 está diminuindo em todo o Rio Grande do Sul. E critica o sistema de bandeiras adotado pelo governo para estabelecer as regras de distanciamento em cada uma das regiões do estado. “Epidemia começa reduzir no RS. Nada a ver com bandeirinhas! Tendência de número de casos de internação em UTI e em enfermaria pela Covid 19, é de queda! Veja no maior hospital do Sul do país: GHC em Porto Alegre! Cai na semana 31, como acontece em todo inverno!”, escreveu o deputado.
É incorreto afirmar que a epidemia está reduzindo no Rio Grande do Sul. O estado registrou o primeiro caso da covid-19 em março e, de lá para cá, a situação piorou. Até 6 de agosto, 78.837 pessoas foram infectadas pelo novo coronavírus e 2.231 morreram vítimas da doença. As taxa de ocupação de leitos nas UTIs dos hospitais gaúchos é de 75%.
A região metropolitana de Porto Alegre é uma das mais atingidas. Na capital gaúcha, a ocupação de leitos de UTI chegou a 90% na segunda-feira (3) e a cidade atingiu um pico no número de casos e de óbitos em 4 de agosto.
Os gráficos que Osmar Terra divulgou na publicação são de um dos hospitais de referência para o tratamento da covid-19 na cidade, o Grupo Hospitalar Conceição (GHC). Embora seja um dos maiores hospitais da capital gaúcha, os índices servem apenas para analisar a situação no GHC, e não podem ser extrapolados para os outros 298 que também atendem pacientes com covid-19 em todo o estado. “São dados dos nossos hospitais. Não temos como avaliar os restantes”, disse o diretor-técnico do hospital, Francisco Zancan Paz.
Em entrevista ao Comprova, Zancan apresentou gráficos que mostram uma tendência à queda de casos de covid-19 nas emergências e enfermarias, mas não nas UTIs. “Na última semana, a demanda das nossas emergências, da nossa UPA e da nossa internação em enfermarias têm decrescido. Isso ainda não repercute na ocupação da UTI, que está sendo mantido em quase toda sua totalidade”, disse. E reforça que só é possível bater o martelo sobre uma diminuição — ou mesmo estabilização — no número de casos se essa tendência se mantiver ao longo de pelo menos 15 dias.
O GHC é composto pelos hospitais Conceição, Criança Conceição, Cristo Redentor e Fêmina, além da UPA Moacyr Scliar, de 12 postos de saúde do Serviço de Saúde Comunitária, de três Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e da Escola GHC. Porém, o hospital Conceição é a referência no tratamento da doença.
Questionamos a Secretaria Estadual da Saúde (SES-RS) para saber se os dados poderiam indicar uma tendência mais ampla no Rio Grande do Sul. Por e-mail, a assessoria de imprensa lembrou que a ocupação das UTIs do GHC segue alta, em torno de 95% até a data do contato, “a curva de óbitos e casos relacionados à covid-19 está em crescimento no Estado. (…) A SES-RS monitora a doença, toma as medidas que julgar necessárias, mas não faz previsões”.
As semanas
No tuíte, Osmar Terra fala em uma queda de internações na 31ª semana epidemiológica, “como acontece todo inverno”. As semanas epidemiológicas são divididas pelo Ministério da Saúde para facilitar o registro e controle de doenças. Contadas de domingo a sábado, a primeira semana é a que tem o maior número de dias de janeiro e a última é a que tem o maior número de dias de dezembro. Em 2020, a semana 31 foi de 26 de julho a 1º de agosto.
A Secretaria Estadual da Saúde não confirmou que tenha havido queda no número de internações na semana 31, mas disse que “nos últimos quatro anos, o pico das internações no Rio Grande do Sul tem ocorrido entre as semanas 18 e 27”.
O período coincide com os meses mais frios do ano no estado. “No inverno tem sido este comportamento. Ano passado foi muito similar”, confirmou o diretor-técnico do GHC. Em 2019, foram notificados 1.296 casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) — condição provocada por doenças respiratórias, como a gripe e a covid-19 — e 75 óbitos no hospital. Em 2020, são 1.967 casos de SRAG e 344 óbitos. Destes, 157 óbitos foram por covid-19.
Insistência
No dia seguinte, 5 de agosto, Osmar Terra voltou ao assunto em sua rede social. Com novo gráfico do GHC, falou em queda na demanda de doentes naquele hospital e na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre. “Como prevíamos vírus está fazendo seu ciclo natural e em poucas semanas termina o surto epidêmico no RS. Quarentena e lockdown inúteis”. No mesmo dia, Porto Alegre bateu recorde de pacientes com coronavírus nas UTIs: 324 pessoas com diagnóstico positivo para covid-19 necessitando cuidados intensivos.
Quem é Osmar Terra
Osmar Terra exerce o sexto mandato na Câmara dos Deputados, representando o Rio Grande do Sul. Em 2016, foi Ministro do Desenvolvimento Social no governo de Michel Temer (MDB) e ocupou a pasta da Cidadania já na gestão de Jair Bolsonaro, em 2019.
O deputado federal é formado em medicina e foi presidente do Grupo Hospitalar Conceição entre 1986 e 1989. Também ocupou o cargo de secretário da Saúde do Rio Grande do Sul de 2003 a 2010, nas gestões de Germano Rigotto (MDB) e Yeda Crusius (PSDB).
Terra é um apoiador de Jair Bolsonaro e, seguindo o discurso do presidente, já negou a gravidade da pandemia em diversas ocasiões — inclusive no post verificado aqui, em que usa o termo “epidemia” e não pandemia. Chegou a afirmar que o distanciamento social não tinha eficácia comprovada, que as mortes pelo novo coronavírus não Brasil não passariam o número de óbitos por H1N1 e declarou que a pandemia terminaria em junho.Já em agosto, compartilhou imagens antigas para criticar o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PHS).
Em março, o Comprova verificou um vídeo em que Terra defende o isolamento vertical, afirmando que apenas idosos e pessoas de grupos de risco deveriam ficar isoladas. As imagens circularam como se fossem do cardiologista Adib Jatene, falecido em 2014.
Por que investigamos?
Nesta terceira fase, o Comprova verifica conteúdos relacionados às políticas públicas do governo federal e à pandemia. Em um ano de eleitoral em que as disputas políticas estão acirradas, a covid-19 virou tema de debates em todos os campos ideológicos. A desinformação circula livremente em redes sociais e pode custar vidas. O post de Osmar Terra no Twitter teve mais de 4,1 mil interações — entre curtidas, comentários e compartilhamentos — e pode enganar os leitores, ao sugerir uma melhora que não se comprova na realidade.
O Comprova já checou outros conteúdos distorciam fatos para minimizar a pandemia: uma corrente que dizia que a etapa máxima das infecções aconteceria em abril, declarações de dois médicos que diziam que o novo coronavírus estava perdendo a força em junho e um texto que garantia que a pandemia já estaria em declínio em julho.
Enganoso, para o Comprova, é todo o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado. É o caso da publicação de Osmar Terra, que usa números reais para chegar a uma conclusão que não é verdadeira. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/evidencias-atestam-a-eficiencia-das-mascaras-no-controle-da-pandemia-ao-contrario-do-que-afirma-site/ | COMPROVA | Evidências atestam a eficiência das máscaras no controle da pandemia, ao contrário do que afirma site | null | 2020-08-07 | As alegações de que o uso de máscaras pode causar intoxicação e aumentar o risco de contaminação pelo novo coronavírus e ou por outros vírus e bactérias não têm comprovação
Conteúdo verificado: Um texto no site do Instituto Rothbard traz informações falsas sobre o uso de máscaras e qualifica como “tirania” as medidas de controle da pandemia.
São falsas as alegações feitas em um texto, publicado pelo site do Instituto Rothbard, que chama o incentivo ao uso da máscara de “tirania”. O conteúdo ainda afirma que não existem evidências capazes de provar a eficiência da proteção facial e que seu uso pode causar intoxicação e aumentar o risco de contaminação pelo novo coronavírus e outros vírus e bactérias.
As afirmações vão na contramão do que dizem as autoridades sanitárias de diversos países e das recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), cujo trabalho se baseia em evidências científicas. A conclusão dessas autoridades é a de que o uso correto das máscaras reduz a quantidade de partículas virais expelidas e, portanto, ajuda a conter o avanço da pandemia.
O Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos (CDC), por exemplo, indica em seu site 19 artigos publicados em diferentes revistas científicas que atestam a efetividade do uso de máscaras como parte da estratégia para controlar a pandemia. A OMS, por sua vez, conta com uma Divisão Científica que subsidia a elaboração das normas da organização e que produz inúmeras pesquisas na área da saúde pública.
Em resposta ao Comprova, a equipe do site do Instituto Rothbard afirmou que o texto não contraria as recomendações dos órgãos de saúde porque comunicados contrários ao uso de máscaras já foram emitidos pelas entidades. O site, no entanto, não leva em conta o contexto em que tais comunicados foram feitos e ignora as mudanças de posicionamento das autoridades.
No início da emergência sanitária causada pela pandemia do novo coronavírus, a OMS recomendou que pessoas sem sintomas da doença evitassem usar máscaras cirúrgicas para que não houvesse falta para os profissionais da linha de frente e para os pacientes sintomáticos. Naquele momento faltavam equipamentos de proteção em vários países do mundo. Em junho, com o avanço do números de casos e óbitos causados pela covid-19, a OMS passou a recomendar o uso de máscaras para o público geral, afirmando que a mudança em seu posicionamento fora baseada na conclusão de novos estudos científicos.
Segundo a equipe do instituto, as organizações e entidades sanitárias são “órgãos burocráticos que se contrariam a si próprios[sic], o tempo todo. E, de modo algum, eles são nossa referência e deviam ser a referência de qualquer pessoa”.
Como verificamos?
Para verificar o texto do Instituto Rothbard entrevistamos, por áudios no Whatsapp, as professoras Giliane Trindade e Viviane Alves do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que desenvolveram uma pesquisa experimental para avaliar a eficácia das máscaras na prevenção da covid-19. Falamos, ainda, com o médico pneumologista do Hospital Felício Rocho, em Belo Horizonte, Leonardo Meira de Faria.
Além disso, consultamos os dados e indicações para frear a disseminação do vírus da Organização Mundial da Saúde (OMS) e dos órgãos sanitários do Brasil e dos Estados Unidos, já que encontramos conteúdos similares ao do Instituto Rothbard em sites norte-americanos.
Por fim, entramos em contato com a equipe do site do instituto por e-mail.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 07 de agosto de 2020.
Verificação
O que é o Instituto Rothbard?
Em seu site, o Instituto Rothbard define-se como “o epicentro de disseminação da Escola Austríaca de economia e do libertarianismo”. Segundo a página, a Escola Austríaca defende “a proliferação irrestrita de territórios livres e independentes, até que o alcance da jurisdição do estado se esvaeça”. No site, são encontrados diversos textos que criticam a atuação dos governos e de organizações supranacionais, como a OMS.
O portal reúne uma série de conteúdos sobre a pandemia que relativizam a gravidade da emergência sanitária e criticam as medidas adotadas para frear seu avanço. Em um dos textos, o portal destaca a manifestação convocada por grupos neonazistas contra o isolamento social, que ocorreu em Berlim no dia1º de agosto, para afirmar que os “europeus estão acordando para a tirania da covid”.
Em outro, o site defende o desembargador que humilhou guardas metropolitanos após levar uma multa por estar sem máscara na cidade de Santos, no litoral paulista. Segundo o portal, que define aqueles que usam máscaras como “paranoicos”, caberia unicamente ao desembargador a decisão de usar ou não a proteção facial.
Além disso, o portal traz inúmeras referências aos conteúdos produzidos pela “The Healthy American”, uma associação anti máscaras norte-americana. A associação também se refere às medidas para frear o espraiamento da pandemia como “ tirania” e mantém uma campanha para que lojas abram em horários distintos para atender aqueles clientes que não desejem usar máscaras.
O que dizem as autoridades e os especialistas?
A OMS e as autoridades sanitárias do Brasil, dos Estados Unidos e de diversos outros países recomendam o uso de máscaras como uma parte da estratégia para frear o espraiamento do novo coronavírus. As autoridades destacam que para que a prevenção da doença seja efetiva, além de usar máscaras, a população deve higienizar constantemente as mãos e manter uma distância de pelo menos um metro e meio entre as pessoas.
Ao contrário do que afirma o conteúdo verificado, existem evidências científicas consistentes indicando que o uso de máscaras reduz a quantidades de partículas virais que pessoas infectadas com a covid-19 expelem ao falar, espirrar ou tossir. O Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos (CDC), por exemplo, indica em seu site 19 artigos que foram publicados em diferentes revistas científicas e atestam a efetividade dasmáscaras como parte da estratégia para controlar a pandemia.
A OMS passou a recomendar o uso de máscaras pelo público geral em 5 de junho. Na entrevista coletiva em que foi feito o anúncio da mudança na recomendação, o órgão explicou que a decisão partiu da conclusão de novos estudos que apontavam a eficiência das máscaras como parte da estratégia para o controle do espraiamento da doença. Nessa data, a OMS publicou documento que reúne essas conclusões e indica como usar corretamente a proteção facial em diferentes ambientes e situações. O documento apresenta 80 referências, que abrangem pesquisas conduzidas pelo próprio órgão e por pesquisadores de centros de pesquisa de diversos países.
Em entrevista ao Comprova, a professora e pesquisadora Giliane Trindade Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), explicou que o uso de máscaras impede que pessoas pré-sintomáticas ou assintomáticas liberem partículas virais ao falar, tossir ou espirrar. “A finalidade do uso da máscara é justamente evitar a pulverização dessas gotículas de saliva, evitando que elas atinjam a superfície do rosto de outras pessoas ou superfícies inanimadas, como por exemplo, corrimão, assento de ônibus, lugares em que as pessoas vão ter mais contato”, esclareceu a pesquisadora.
A explicação da professora e pesquisadora, que realizou uma pesquisa experimental para avaliar a eficácia das máscaras no combate a disseminação da covid-19, está de acordo com as recomendações do Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos. O órgão produziu a ilustração abaixo para conscientizar as pessoas sobre a importância do uso de máscaras.
As tentativas de descredibilizar o uso de máscaras durante a proliferação de doenças virais não é uma novidade. Viviane Alves, que também é professora do Departamento de Microbiologia da UFMG e participou da pesquisa experimental realizada na universidade mineira, acredita que essa onda de desinformação se trata de um negacionismo. “No século XX durante a gripe espanhola também havia a existência da ‘liga anti máscara’ que pregava que elas não eram necessárias e faziam mal. A mesma coisa tem ocorrido agora, várias pessoas tentando prejudicar a saúde da população. Usar máscara, manter o distanciamento social e higienizar as mãos são medidas eficazes provadas cientificamente para prevenir a transmissão, diminuir o número de casos e também diminuir a sobrecarga do sistema de saúde”.
O Comprova já verificou outros conteúdos falsos e enganosos sobre o uso de máscaras desde o início da pandemia. Na verificação mais recente, listou o posicionamento das principais autoridades de saúde brasileiras sobre o tema.
Há possibilidade de intoxicação?
Ao contrário do que afirma o texto do Instituto Rothbard, para a microbiologista Giliane Trindade, a informação sobre intoxicação por dióxido de carbono não procede. O que pode acontecer – no caso de pessoas infectadas – é o vírus ficar contido dentro do material preventivo evitando que seja espalhado e atinja outras pessoas.
“Se a gente pressupõe que o indivíduo tem uma noção correta da forma de descartar a máscara ou de como higienizar, ela não vai funcionar como um vetor de transmissão de vírus. O indivíduo consciente, que está com medo de morrer por covid-19, segue todas as autoridades de saúde e presta atenção naquilo que está sendo divulgado pelas autoridades sanitárias”, concluiu a microbiologista.
O médico pneumologista Leonardo Meira de Faria também não considera que as máscaras causem baixos níveis de oxigênio e hipóxia. Segundo o médico, os poros das máscaras não impedem que a troca de gases que ocorre na respiração seja prejudicada. “Na verdade a máscara é um dispositivo seguro, então a reinalação do gás carbônico não acontece. Não se atinge níveis tóxicos a ponto de considerar que ela possui um risco individual nesse sentido, em hipótese nenhuma”.
Máscara baixa a imunidade?
No texto verificado, há três tipos de máscaras citados – cirúrgica, N95 e de pano – e são apontados como facilitadores da entrada de germes no organismo, supostamente reduzindo a imunidade. Especialistas consultados pelo Comprova alegam que não existem dados sobre as máscaras – fabricadas de forma correta – permitirem esse contato com germes.
“Germes presos nas máscaras não vão causar nenhum tipo de infecção, eles são microrganismos que já moram no corpo. Germes do ambiente que estiverem pelo lado de fora da máscara não vão conseguir penetrar o material. Obviamente, se o tecido estiver contaminado depois de um certo tempo de uso e você colocar a mão e logo em seguida colocar no olho, você também será infectado. Por isso é importante higienizar as mãos e evitar o toque direto nas máscaras e no rosto”.
Há de se destacar que as autoridades recomendam máscaras diferentes para situações diferentes, que variam conforme o ambiente o risco de exposição ao vírus que ele oferece. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) possui uma página que reúne informações sobre máscaras faciais de proteção e que indica qual o tipo mais adequado para os diferentes contextos. A agência, por exemplo, não recomenda o uso de uma máscara tipo N95 para uma ida ao supermercado — ao contrário do que sugere o texto do instituto.
O Comprova já mostrou ser falso um vídeo que dizia que as máscaras reduziam a imunidade e potencializavam a proliferação de bactérias.
O que diz o Instituto Rothbard?
Procurado pelo Comprova, o instituto disse, por e-mail, que nenhum dos textos e vídeos publicados em seu portal contrariam as orientações do CDC e da OMS, alegando que os órgãos “se contrariam a si próprios [sic], o tempo todo” e não servem como referência para os materiais produzidos pela equipe.
Além disso, afirmou ter compromisso com a defesa da liberdade. O instituto pontuou que “o próprio título do artigo [objeto desta verificação] já explica a importância de defender a liberdade diante desta tirania opressiva do governo” e que o texto concentra informações de todos os tipos.
Por que investigamos?
Em sua terceira fase, o Projeto Comprova investiga conteúdos de grande viralização nas redes sociais e com potencial de causar desinformação sobre políticas públicas do governo federal, eleições municipais de 2020 e sobre a pandemia do novo coronavírus. Em se tratando de conteúdos sobre a pandemia, a verificação se torna ainda mais importante, pois a desinformação pode colocar a saúde das pessoas em risco. É o caso do texto do Instituto Rothbard, que pode induzir as pessoas a não usarem máscaras — estratégia recomendada pelas autoridades de saúde para diminuir a velocidade de propagação da doença.
Desde o início da pandemia, o Comprova identificou e desmentiu diversos boatos sobre o uso de máscaras, mostrando que elas são eficientes no combate ao novo coronavírus e que não reduzam a imunidade nem potencializam a proliferação de bactérias. Em outras verificações, também mostrou que um vídeo e um áudio enganavam ao acusar que máscaras importadas da Ásia estariam contaminadas.
Segundo dados da ferramenta CrowdTangle, até a data de fechamento deste texto, o conteúdo somava mais de 4,2 mil interações no Facebook. O Comprova também encontrou conteúdos similares ao verificado em sites dos Estados Unidos que possuem um grande número de interações nas redes sociais, como o “The Healthy American”.
Falso, para o Comprova, é um conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/post-engana-ao-sugerir-que-ponte-entre-acre-e-rondonia-e-obra-apenas-do-governo-bolsonaro/ | COMPROVA | Post engana ao sugerir que ponte entre Acre e Rondônia é obra apenas do governo Bolsonaro | null | 2020-08-06 | A obra sobre o rio Madeira, que tem como prazo atual de inauguração o fim de 2020, foi iniciada em 2014, ainda no governo Dilma Rousseff.
Conteúdo verificado: Em post no Twitter, perfil compartilha vídeo de motociclistas em ponte inacabada entre o Acre e Rondônia e insinua que a obra estaria pronta e teria sido realizada apenas pelo governo Bolsonaro
Um post publicado por @humbertovivian no Twitter engana ao insinuar que a construção da ponte sobre o rio Madeira, que ligará o Acre a Rondônia, foi feita apenas na gestão do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). A obra teve início em 2014, ainda no governo de Dilma Rousseff (PT). Em dezembro de 2018, um mês antes de Jair Bolsonaro assumir a presidência, as obras da ponte já estavam 85% concluídas. A publicação ainda dá a entender que o projeto já está finalizado, mas a previsão de entrega é para o fim deste ano.
A postagem vem acompanhada de um vídeo em que um grupo de motociclistas aparece em cima da ponte ainda em construção. Em um trecho, eles insinuam que forçaram a entrada: “Os caras disseram assim: ‘rapaz, se tu não deixar ‘nós’ entrar (sic), nós vamos entrar’”. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), vinculado ao Ministério da Infraestrutura, afirmou que não está autorizada a passagem de veículos e investigará o caso.
O Comprova conseguiu falar com Solano Henriques, responsável pela publicação no YouTube de um conteúdo muito semelhante ao da postagem no Twitter. Por e-mail, ele disse ter recebido o vídeo e as informações por um grupo de WhatsApp. Humberto Ramos não respondeu aos contatos.
Como verificamos?
O Comprova procurou no Twitter outras postagens com o vídeo e conteúdo semelhante. Ao todo, 34 contas publicaram as imagens até 6 de agosto, incluindo o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho de Jair Bolsonaro. Todos os posts foram feitos depois da publicação de @humbertovivian.
O senador Flávio Bolsonaro (PSL) e o secretário-executivo do Ministério da Infraestrutura, Marcelo Sampaio, que também fizeram publicações nas redes sociais com o vídeo, não responderam aos contatos.
Pela ferramenta CrowdTangle, buscamos no Facebook a publicação mais antiga do vídeo dos motociclistas e um conteúdo semelhante. As primeiras postagens foram feitas em 4 de agosto, um dia depois de Humberto Ramos publicar o conteúdo no Twitter, nas contas “Direita Vive Brasil”, “Bolsonaro Presidente Pátria Amada Brasil”, “Tulio Isac” e “Brasil Sem Corrupção”.
Entramos em contato por e-mail com o Ministério da Infraestrutura e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes para colher informações sobre o andamento da obra. Também por e-mail falamos com Solano Henriques, responsável pela postagem do conteúdo no YouTube.
Verificação
O Comprova não conseguiu identificar quem são os motociclistas que aparecem no vídeo do post verificado. Na gravação, um deles é identificado como Giovani e diz que o grupo se chama “01”.
Enviamos uma mensagem pelo Twitter para Humberto Ramos, mas não obtivemos resposta até o fechamento deste texto. Solano Henriques, responsável pela publicação do material no YouTube, afirmou por e-mail que havia recebido o vídeo por WhatsApp e disse que não sabe quem são os motociclistas.
Questionado, o Dnit disse que a ponte ainda não está liberada para veículos. O órgão declarou que a entrada do grupo não foi autorizada e que irá apurar o que aconteceu.
A ponte do Abunã
O projeto da ponte começou ainda no governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), em 2014. Em março daquele ano, ela anunciou o plano de construção durante uma visita ao Acre. O estado sofria os impactos de uma cheia do rio Madeira, que deixou a BR-364 inundada. A rodovia é a única ligação terrestre do estado com Rondônia.
A construção da ponte teve início com os recursos vindos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e tinha entrega prevista para 2017, com investimento inicial de R$ 128 milhões. As datas de conclusão, no entanto, sofreram mais de uma alteração, passando pelas gestões Dilma, Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (sem partido).
Em contato com o Comprova por e-mail, o Dnit afirmou que o novo prazo de entrega será no fim deste ano.
Governo Bolsonaro
Em dezembro de 2018, um mês antes de Jair Bolsonaro assumir a presidência, 85% das obras da ponte sobre o rio Madeira já estava terminada. “Até março será finalizada a parte de concreto. Até agosto de 2019, a gente irá finalizar os encabeçamentos”, disse o então superintendente do Dnit-RO, Cláudio André Neves.
Em reportagem de 5 de junho de 2019, a TV Globo registrou que o Ministério da Infraestrutura havia dado garantias ao Dnit em relação aos recursos para a conclusão da obra. Naquele momento, o prazo de entrega era final de 2019 e os trabalhos estavam 95% concluídos. O anúncio foi feito pelo ministro Tarcísio Gomes em agosto do ano passado.
O prazo foi alterado mais uma vez por problemas no lado de Rondônia. Por ser uma região alagada, seria necessário um aterro maior do que o calculado no início do projeto da ponte.
“No total serão cravadas 145 estruturas metálicas que servirão de base para suportar as demais estruturas que serão construídas, principalmente, a fundação do elevado em concreto da ponte. Com aproximadamente 460 metros, esse prolongamento da estrutura, além de um aterro de 1.400 metros, com até 10 metros de altura, foi a solução encontrada pelos técnicos da Autarquia para solucionar o problema do trecho de solo mole encontrado e que exige uma complexa solução de engenharia”, disse o Dnit, por e-mail.
Apesar dos problemas, o órgão afirmou que o cronograma segue com previsão de entrega no final de 2020 e “sem risco de paralisação”.
Sonho de 50 anos?
O post investigado diz que “50 anos depois, o governo Bolsonaro realiza o sonho dos acreanos”. Em dezembro do ano passado, Assuero Veronez, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Acre (FAEAC), também disse que o projeto era um sonho de 50 anos. O Comprova não encontrou registros de alguma promessa de obra feita nos anos 1970 que pudesse justificar a afirmação.
Em contato com o Comprova, Solano Henriques, responsável pela publicação do vídeo no YouTube e que também usou a expressão “sonho de 50 anos” na descrição, disse que a informação veio de um grupo de WhatsApp de ex-militares do Exército: “A mensagem veio junto com o vídeo e não tive motivos para duvidar”.
O próprio governador Gladson Cameli (Progressistas) afirmou, no ano passado, que a construção da ponte representava “um sonho antigo dos acreanos”. “Se é a maior realização para o povo acreano, logo, é a minha também, pois trará as melhores perspectivas de desenvolvimento que tanto sonhamos”.
O texto da agência de notícias do governo do Acre afirma que a construção da ponte foi uma promessa de campanha de Cameli, quando se elegeu senador em 2015, “e a luta por sua construção iniciou quando ele ainda era deputado federal”.
Por e-mail, a equipe do governador disse que a obra ajudará as negociações do Acre com outros estados e países. “Muitos políticos e a sociedade sonham com a ligação direta entre os estados do Acre e Rondônia há décadas, o que de fato favorece em muito os negócios para o estado do Acre, que tem uma logística estratégica com o Peru por meio da Rodovia Interoceânica (Estrada do Pacífico). Até hoje, o uso de balsas como transporte entre as duas cabeceiras faz com que se perca, em média, uma hora para carros de passeio, ônibus e caminhões com os mais variados insumos”. [Atualização: este parágrafo foi incluído em 7 de agosto para incorporar mensagem recebida do governo do Acre]
Durante o evento que marcou o início das obras da ponte, o então governador Tião Viana (PT) afirmou que o projeto era uma luta sua desde 1999, quando, segundo ele, liberou emendas para a construção, mas não teve apoio do governo de Rondônia, na época sob a gestão de José Bianco, então filiado ao PFL.
Por que investigamos?
O Comprova checa informações sobre políticas públicas do governo federal e sobre a pandemia de covid-19 que tenham viralização nas redes sociais. O post de Humberto Ramos teve 8,5 mil visualizações no Twitter até 6 de agosto. No YouTube, a publicação de Solano Henriques, com conteúdo semelhante, atingiu pouco mais de 1,1 mil visualizações.
O mesmo vídeo foi publicado pelo senador Flavio Bolsonaro (PSL) e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos). As postagens deles, no entanto, diferem dos outros dois ao deixar claro que a conclusão da obra está prevista para o fim de 2020. Ainda assim, dão a entender que a obra foi feita apenas na gestão Bolsonaro. A publicação de Carlos teve 69 mil visualizações e a de Flávio, 134 mil.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado de forma a induzir a uma interpretação diferente, que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar danos. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/medico-usa-dados-enganosos-ao-sugerir-conspiracao-sobre-covid-19/ | COMPROVA | Médico usa dados enganosos ao sugerir conspiração sobre covid-19 | null | 2020-08-05 | Verificamos as principais alegações de um post que faz referência a um vídeo de um grupo de médicos espanhóis que negam a existência da pandemia
Conteúdo verificado: Em post no Instagram, médico lê texto sobre encontro realizado na Espanha, de uma organização chamada Médicos por la Verdad. Segundo os participantes e o médico, a pandemia é uma farsa “criada com fins políticos”.
O vídeo publicado no perfil do Instagram do médico Djalma Marques, conhecido como Dr. Kefir, traz conteúdo enganoso ao afirmar que “a cada dia vão caindo as máscaras da grande farsa da pandemia!”. Ele contraria autoridades sanitárias do mundo todo que estão tentando combater a pandemia. A covid-19 já provocou a morte de mais de 700 mil pessoas, segundo a Universidade Johns Hopkins. Só no Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, foram mais de 95 mil vítimas até a publicação deste texto.
Logo no início da gravação, Marques afirma ter uma “notícia fantástica”, sobre uma conferência de médicos na Espanha realizada para a imprensa por um grupo chamado de Médicos por la Verdad. Entre os pontos que ele lê no vídeo, destaca-se o trecho: “Os médicos concordam com os seguintes pontos: as vítimas do coronavírus não superam em número as que morreram devido à gripe sazonal no ano passado na grande maioria dos países. Dois: os protocolos médicos em diferentes países foram alterados para exagerar nos resultados. Três: o confinamento de pessoas sadias e o uso forçado de máscaras não têm qualquer base científica”.
Nenhuma dos três pontos é verdadeiro. A taxa de letalidade do novo coronavírus, de acordo com estimativa da OMS, atualmente é de 0,6%– o índice vem sendo reavaliado conforme a evolução da doença e estudos sobre ela. Já a da gripe sazonal é de 0,1%. Também não há nenhuma comprovação de que algum país tenha alterado informações sobre a doença e o confinamento e o uso de máscaras são algumas das poucas medidas eficientes já conhecidas contra a covid-19.
Além de defender uma suposta conspiração com fins políticos, Marques receita remédios como a hidroxicloroquina, sem eficácia comprovada. Questionado pelo Comprova sobre a posição da OMS em pedir o cancelamento dos estudos com a droga, ele disse que a organização faz uso “mais que político” da doença. “Meu respeito pela OMS é zero.”
Como verificamos?
O Comprova buscou informações sobre Djalma Marques na plataforma de currículos acadêmicos Lattes, mantida pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), no Conselho Federal de Medicina e na rede social Linkedin.
Também encontramos no Facebook e no Instagram páginas relacionadas à BioLogicus, empresa da qual Marques é sócio-fundador. Foi por ela que conseguimos o contato do médico e realizamos uma entrevista por telefone.
Procurando no Google, encontramos um vídeo no YouTube com a gravação completa da conferência e conseguimos o contato da associação alemã (Außerparlamentarischer Corona Untersuchungsausschuss, ou Comissão de Inquérito Extra-parlamentar do Corona, segundo tradução livre) que deu origem ao movimento dos médicos negacionistas na Europa. Enviamos dois e-mails pedindo informações, mas não recebemos resposta até a publicação deste texto.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 5 de agosto de 2020.
Verificação
Quem é Djalma Marques?
Ele é médico e possui registro no Conselho Regional de Medicina do Estado da Paraíba (CRMPB). Em seu perfil no Linkedin, ele se descreve como “sócio-presidente, idealizador e fundador” da BioLogicus, uma empresa de biotecnologia. O texto de descrição do site diz que a companhia foi fundada em 2004 por Djalma Marques e pela engenheira química Fátima Fonseca.
Marques tem duas contas no Instagram. Uma delas, no entanto, não é atualizada desde o fim de 2019. Na outra, ainda ativa e com postagens quase diárias, ele se intitula “Doutor Kefir”, nome de um complemento alimentar. A BioLogicus anuncia em suas redes sociais diversos produtos à base da substância.
Em contato por telefone com o Comprova, Marques disse ter se formado em medicina em 1978 e exercido a profissão desde então. Ele diz ter atuado na área de homeopatia e, atualmente, trabalha como médico generalista. Seu registro no Conselho Federal de Medicina não especifica a área de atuação dele.
Máscaras e lockdown
Marques tem se dedicado nas redes sociais a postar conteúdos relacionados à covid-19 desde o começo da pandemia. Inicialmente, defendia o uso de máscara e pedia para que as pessoas permanecessem em casa. No fim de julho, porém, se referiu ao objeto como “focinheira”.
Questionado pelo Comprova, afirmou: “Fui um dos primeiros a dizer para as pessoas ficarem em casa e usarem máscara, porque a gente não conhecia nada do vírus. Depois que começamos a conhecer, a gente começou a mudar”. Ele disse ainda que “não existem trabalhos científicos mostrando que o uso de máscara previne ou evita a disseminação do vírus. Agora, existe o contrário, mostrando que não previne”.
Segundo o Comprova mostrou, no início de junho, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), reforça que as máscaras “reduzem a incidência de infecções” e recomenda seu uso em locais públicos, como supermercados e farmácias.
Ainda no vídeo verificado, Marques critica o lockdown. Questionado pelo Comprova, chamou a medida de “prisão domiciliar forçada”. “Vamos tirar esse nome lockdown do vocabulário porque somos brasileiros. Então, qual é o nome? Não tem nome ainda na ciência colocar todo mundo sadio, suspeito, doente, dentro de casa. A ciência tem nome para quarentena, que é pegar pessoas doentes, separá-las das pessoas sadias até que passem os sintomas ou sejam tratadas. Isso se chama quarentena.” E continuou: “Substituir o nome por lockdown é para deixar o povo na ignorância. Ou você tem uma prisão domiciliar forçada, ou você tem uma quarentena”.
As medidas de restrição e isolamento foram vistas pela OMS, desde o começo da pandemia, como algumas das mais eficazes para a contenção do vírus e o retardamento do pico de contágio da doença. “Além das medidas de lockdown, precisamos de estratégias abrangentes baseadas em vigilância, em intervenção de saúde pública, testes, quarentena, e fortalecer os sistemas de saúde para absorver o golpe”, disse Michael Ryan, diretor-executivo de emergências sanitárias da OMS, em 1 de abril.
Uso da hidroxicloroquina
Na parte final do vídeo, o médico afirma que a hidroxicloroquina se mostrou eficaz no tratamento da covid-19 “em diversos países”. O tratamento com a substância, porém, não tem comprovação científica. A Organização Mundial da Saúde e o National Health Service (Serviço Nacional de Saúde) do Reino Unido cancelaram estudos com a cloroquina e a hidroxicloroquina.
Nos Estados Unidos, um dos países citados por Marques, a Food and Drugs Administration (FDA), órgão equivalente à Anvisa, revogou a autorização para o uso emergencial da hidroxicloroquina para o tratamento da covid-19 no país.
No caso do Brasil, o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina é amplamente defendido pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Ele ordenou que o Laboratório do Exército produzisse os medicamentos e a pressão pela adoção das substâncias custou o cargo de dois ministros da Saúde (Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich). Em maio, o Ministério da Saúde, já sob a gestão de Eduardo Pazuello, ampliou a possibilidade do uso da hidroxicloroquina e da cloroquina para pacientes com sintomas leves da covid-19 – até então, elas eram previstas apenas em casos graves e com monitoramento em hospitais.
Em julho, a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) publicou um informe dizendo ser “urgente e necessário que a hidroxicloroquina seja abandonada no tratamento de qualquer fase da covid-19” diante das novas evidências científicas.
Em contato com o Comprova, Marques diz receitar hidroxicloroquina e ivermectina – outra droga sem comprovação contra a doença – aos seus pacientes. “Eu uso a hidroxicloroquina porque ela é segura. Tratei pacientes obesos, hipertensos, diabéticos, grávidas e não tive um caso de insucesso. Quem diz que não pode tem que explicar o porquê. Acho que é um tema mais político do que médico.” E continuou: “A OMS é liderada por um ex-guerrilheiro do partido comunista, que não é médico. Meu respeito por ela é zero”.
Tedros Adhanom, diretor-geral da organização, nunca atuou como guerrilheiro de um partido comunista. Entre 2005 e 2012, foi ministro da Saúde na Etiópia no governo do presidente Girma Wolde-Giorgis, filiado à Frente Democrática Revolucionária do Povo Etíope. A organização política, de esquerda, teve papel fundamental no fim do regime socialista de Mengistu Haile Mariam (de 1974 a 1991).
Vacina
No Brasil, está em teste uma vacina criada pelo Instituto Butantan em parceria com a empresa farmacêutica chinesa Sinovac Biotech e anunciada pelo governo do estado de São Paulo. Os testes foram autorizados pela Anvisa no início de julho. Já havia sido definido que o estudo clínico envolveria nove mil pessoas – metade receberá a vacina e outra metade receberá um placebo para que seja possível comparar a resposta imune. Os participantes foram recrutados pelo governo – entre os pré-requisitos para se candidatar era preciso ser profissional de saúde, estar atuando no tratamento de pacientes com o novo coronavírus, ainda não ter sido infectado e não estar grávida.
Os testes estão sendo realizados em 12 centros de pesquisa de seis estados do país. Os voluntários serão acompanhados durante três meses. Se a imunização se provar segura e eficaz, o Butantan produzirá 120 milhões de doses a partir do início de 2021. Segundo o instituto, nessa fase, a vacina será disponibilizada para todo o país pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Além desta, há a vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford e pelo laboratório AstraZeneca em cooperação com o Brasil. Em junho, o Ministério da Saúde brasileiro anunciou ter entrado na parceria para a produção por meio da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Segundo comunicado do órgão, serão 100 milhões de doses à disposição da população brasileira quando demonstrada a eficácia da proteção.
Embora haja testes e estudos para o combate ao novo coronavírus, Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS, afirmou nesta semana que a espera por uma vacina pode ser longa. “Muitas vacinas estão na terceira fase de testes clínicos e todos esperamos que haja várias vacinas eficientes que possam ajudar a prevenir que pessoas sejam infectadas. No entanto, não existe bala de prata no momento — e pode ser que nunca exista”, disse.
Médicos por la Verdad?
A associação que foi chamada de Médicos por la Verdad na Espanha surgiu a partir de um movimento criado na Alemanha que tem o médico Heiko Schöning como um dos líderes. Ela reúne pessoas que acreditam, como Marques, que a pandemia não existe. Uma das profissionais à frente do movimento na Espanha é Natalia Prego Cancelo. Em um dos vídeos em seu canal no YouTube, ela aparece à frente de um protesto com menos de 15 pessoas, gritando “Confinamento, nunca mais”.
Na entrevista para o Comprova, Djalma Marques afirmou ter uma relação com os profissionais envolvidos no Medicos por la Verdad. “Como eu estudei em Barcelona, tenho um contato bastante estreito com médicos que fazem parte”, disse. Sobre uma possível presença da associação no Brasil, ele informou que “ainda não é oficial”.
Por que investigamos?
O Comprova checa informações sobre políticas públicas do governo federal e sobre a pandemia de covid-19 que tenham viralização nas redes sociais. O vídeo do médico Djalma Marques teve mais de 38 mil visualizações no Instagram até 5 de agosto. No Facebook, a publicação na página do médico foi compartilhada 689 vezes e teve mais de 13 mil visualizações.
Marques e a associação Médicos por la Verdad colocam a saúde da população em risco ao utilizar informações enganosas para sugerir uma possível conspiração relacionada à covid-19 e ao criticar o uso de máscara e ao “lockdown”. Eles também indicam o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento da doença, o que vai contra as recomendações da Organização Mundial da Saúde.
O Comprova já publicou verificações desmentindo a eficácia da cloroquina e da hidroxicloroquina em diversas ocasiões. Entre as investigações mais recentes estão as da médica que usou informações falsas para falar em cura da doença, a da profissional que citou estudos não conclusivos para sugerir uma conspiração contra a cloroquina e do site que relacionou a baixa mortalidade por covid-19 em Cuba à hidroxicloroquina.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado de forma a induzir a uma interpretação diferente, que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar danos. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-a-australia-tenha-controlado-a-covid-19-com-o-uso-de-ivermectina/ | COMPROVA | É falso que a Austrália tenha controlado a covid-19 com o uso de ivermectina | null | 2020-08-05 | O único tratamento contra a doença aprovado pelo país foi o remdesivir, que só deve ser prescrito para pacientes graves. Antes disso, o país adotou medidas como distanciamento social, higienização das mãos, restrição de viagens e lockdown
Conteúdo verificado: Em vídeo publicado nas redes sociais, a médica Cecília Pimenta diz que a Austrália distribuiu ivermectina “para toda a população” e, após isso, os casos de covid-19 começaram a cair
É falso que o governo da Austrália recomendou a toda população que tomasse a ivermectina como medida preventiva contra a covid-19 e que, depois disso, o número de casos no país caiu. A afirmação foi feita em um vídeo viral pela médica Cecília Pimenta. O único tratamento contra a doença aprovado pela Austrália foi o remdesivir, que só deve ser prescrito para pacientes graves. Antes disso, o país adotou medidas como distanciamento social, higienização das mãos, restrição de viagens e lockdown. A Universidade de Monash, que lidera a pesquisa australiana sobre o uso da ivermectina para tratar o novo coronavírus, afirmou ao Comprova que nem sequer iniciou o teste em humanos. Atualmente, a Austrália enfrenta uma segunda onda de infecções.
No vídeo, Pimenta também afirma, erroneamente, que a eficácia do medicamento foi reconhecida pela agência sanitária dos Estados Unidos, a Food And Drug Administration (FDA) – o órgão orientou os pacientes de covid-19 a não tomar ivermectina. A médica também diz que o uso da ivermectina foi responsável por controlar a pandemia na Etiópia, o que já havia sido desmentido pelo Comprova. Por fim, afirma que o remédio já é considerado uma “vacina” contra o novo coronavírus. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), porém, não reconhece a eficácia da droga no tratamento da doença.
O Comprova conseguiu falar com Cecília Pimenta e a questionou sobre as fontes das informações que cita no vídeo. Por WhatsApp, ela sugeriu que o Comprova pesquisasse na internet artigos sobre o uso da ivermectina no tratamento da covid-19.
Como verificamos?
O Comprova buscou informações sobre Cecília Pimenta no site do Conselho Federal de Medicina (CFM) e no Google, onde encontrou o número da clínica onde ela atende. A secretária nos deu o contato direto da médica. Também buscamos informações em verificações anteriores do Comprova sobre o uso da ivermectina na Austrália e na Etiópia.
Enviamos e-mail para a médica australiana Kylie Wagstaff, que coordena a pesquisa com ivermectina para combater o novo coronavírus na Universidade de Monash, na Austrália, e para o doutor Thomas Borody, diretor do Centro para Doenças Digestivas, que defendeu o uso da droga pelo governo australiano. Também tentamos contato com o Departamento de Saúde da Austrália, mas não tivemos retorno.
Por fim, procuramos a assessoria de imprensa da Anvisa e os sites das autoridades sanitárias dos Estados Unidos, FDA, e da Austrália, Therapeutic Goods Administration (TGA), em busca de informações sobre o uso da ivermectina nos três países.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 5 de agosto de 2020.
Verificação
Quem é Cecília Pimenta?
Cecília Maria Pimenta é registrada no Conselho Federal de Medicina (CFM) com atuação em Minas Gerais desde 1989. Atualmente, trabalha na cidade de Uberlândia. Em seus vídeos, se apresenta como ginecologista e médica da longevidade, embora não tenha nenhuma especialidade registrada junto ao CFM. Criou um canal no YouTube em novembro de 2019, quando publicou uma palestra feita em uma igreja com o tema “A razão da superação à luz da ciência e da Bíblia”. Todos os outros três vídeos do canal foram postados a partir do dia 22 de junho deste ano e falam sobre o uso da ivermectina para tratar pacientes com covid-19. Em um deles, cita como fonte a médica Lucy Kerr, cujo conteúdo sobre a ivermectina já foi apontado como enganoso pelo Comprova.
No vídeo que viralizou, um homem pediu, nos comentários, que ela indicasse os estudos que comprovam a eficácia da droga. A médica respondeu afirmando que, se ele pesquisasse, encontraria estudos contrários e favoráveis ao uso. “A ivermectina é extremamente segura e tem demonstrado resultados excepcionais em todo o mundo. Trabalhos científicos levam tempo para ser concluídos, não temos tempo”, afirmou.
Questionada sobre as fontes das informações que cita no vídeo, Pimenta afirmou, por WhatsApp, que estudos e pesquisas estão facilmente disponíveis em sites como Google Acadêmico, Scielo e BVS. “Basta você só pesquisar por ‘Ivermectin and COVID 19’ que terá acesso às informações que procura”, disse. Quando o Comprova perguntou se ela poderia indicar os links desses estudos, voltou a sugerir que a reportagem fizesse uma busca no Google. “Tem tudo o que você precisa”, disse.
A ivermectina na Austrália
A pesquisa sobre o possível uso da ivermectina como tratamento do novo coronavírus teve início na Universidade de Monash, na Austrália. Os pesquisadores constataram a eficácia do medicamento em laboratório, mas com uma dosagem superior à recomendada para o uso humano. Em junho, a universidade disse ao Comprova que pacientes com covid-19 não deviam usar a ivermectina como tratamento até que testes clínicos em humanos conseguissem comprovar a eficácia e a dose segura para ingestão.
O Comprova voltou a procurar a instituição em agosto para essa verificação. A doutora Kylie Wagstaff, que coordena a pesquisa com ivermectina na universidade, afirmou por e-mail, que, embora os testes pré-clínicos tenham se mostrado promissores, eles ainda não usaram a ivermectina em humanos. Isso porque a Austrália não tinha muitos pacientes para serem testados até recentemente, quando o país começou a passar por uma segunda onda de infecções. Ela também disse desconhecer a adoção da droga pelo governo do país para enfrentar a pandemia.
Segundo o site da Therapeutic Goods Administration (TGA), autoridade sanitária australiana, até o momento não há remédios ou vacinas comprovados para tratar ou prevenir a covid-19. Em 10 de julho, a TGA aprovou o primeiro tratamento específico para a doença no país, o remdesivir. Mesmo assim, só deve ser aplicado em pacientes hospitalizados com sintomas graves. Em 4 de agosto, o médico australiano Thomas Borody, diretor do Centro para Doenças Digestivas (Centre for Digestive Disease), defendeu que o governo adote a ivermectina como parte de um coquetel para tratar o novo coronavírus. O Comprova enviou e-mail para o doutor Borody para saber se ele receitou a medicação para seus pacientes, mas não teve retorno até o fechamento dessa verificação.
Pandemia na Austrália
A Austrália identificou o primeiro caso de covid-19 em 25 de janeiro, um homem vindo da província de Wuhan, na China. Seis dias depois, o governo determinou que todos os estrangeiros vindos da China passassem por um período de quarentena em outro país antes de serem autorizados a entrar em território nacional. Em fevereiro, as restrições foram ampliadas para a entrada de estrangeiros vindo de outras nações.
No início de março, os australianos registraram a primeira morte pela doença e os primeiros casos de transmissão comunitária do novo coronavírus. A partir daí, medidas mais enérgicas foram adotadas. A Austrália fechou suas fronteiras, impôs medidas de distanciamento social e fechou serviços não essenciais. O país também injetou 17,6 bilhões de dólares australianos (R$ 67 bilhões) em um pacote econômico e investiu outros 2,4 bilhões (R$ 9,1 bilhões) em saúde.
O afrouxamento gradual dessas medidas teve início em maio. Mas, em junho, os australianos passaram a lidar com uma segunda onda de infecções e o governo teve que adotar o lockdown em Melbourne, onde o comércio voltará a ser fechado a partir desta sexta-feira, 6 de agosto. O retorno das sessões presenciais do Parlamento federal, que ocorreria agora em agosto, também foi adiado.
Atualmente, o governo federal australiano mantém restrições de viagem, obrigação de quarentena para pessoas que chegam ao país e orienta os cidadãos a manter medidas de higiene e isolamento em casos de sintomas. Governos locais podem impor barreiras sanitárias. A Austrália também restringiu a venda de hidroxicloroquina e de medicamentos essenciais, como analgésicos, anticoagulantes e antidepressivos, para garantir o suprimento para pessoas que precisam dessas substâncias. Até esta quarta-feira (5), a Austrália tinha registrado 19.445 casos de covid-19 e 257 mortes pela doença, segundo dados da Johns Hopkins University.
O que diz a FDA?
Cecília Pimenta disse que a Food and Drug Administration (FDA), órgão sanitário dos Estados Unidos, reconheceu que a ivermectina funcionou em laboratório para combater o novo coronavírus. O site da FDA, porém, informa que as pessoas não devem tomar a medicação para prevenir ou tratar a covid-19 e cita a pesquisa da Universidade de Monash, mas lembra que “esse tipo de estudo laboratorial é comumente usado nos estágios iniciais do desenvolvimento de remédios” e que “testes adicionais são necessários para determinar se a ivermectina pode ser apropriada para prevenir ou tratar a covid-19”.
A FDA também negou haver uma autorização emergencial para que a droga seja usada por pacientes do novo coronavírus e orientou as pessoas a não consumirem medicamentos de ivermectina feitos para tratar animais.
O que diz a Anvisa?
Em email enviado ao Comprova, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) afirmou que não existem medicamentos aprovados para prevenção ou tratamento da covid-19 no Brasil. Sobre a ivermectina, a Anvisa disse que “não existem estudos conclusivos que comprovem o uso desse medicamento para o tratamento da covid-19, bem como não existem estudos que refutem esse uso”. A agência também lembrou que o uso do medicamento para indicações não previstas na bula é de escolha e responsabilidade do médico que o prescreve.
No dia 22 de julho, a Anvisa determinou que as farmácias devem reter a receita das pessoas que compram ivermectina; o que garante um controle maior à venda da droga no Brasil.
Etiópia
Em julho, o Comprova mostrou ser falso que os países da África tenham controlado a pandemia de covid-19 com a ivermectina. No caso da Etiópia, logo após a confirmação do primeiro caso, em 13 de março, o governo fechou escolas, proibiu aglomerações e pediu à população que adotasse o isolamento social. Em 20 de março, a Etiópia adotou novas medidas, como o fechamento de bares e restaurantes, o cancelamento de voos para dezenas de países e a obrigatoriedade de quarentena para todos os que desembarcassem no país. Em 8 de abril, o governo decretou estado de emergência nacional por causa da pandemia.
A ivermectina não é indicada pelas autoridades sanitárias da Etiópia para a prevenção ou tratamento da covid-19. Segundo o governo, não há medicamento eficaz para os pacientes e a prevenção é o melhor método para controlar o contágio da doença. O país recomenda que os cidadãos lavem as mãos com frequência, evitem tocar o nariz e a boca, usem máscara e mantenham distância das outras pessoas.
Por que investigamos?
Em sua terceira fase, o Comprova verifica informações sobre as políticas públicas do governo federal e a pandemia de covid-19 que tenham viralizado nas redes sociais. É o caso da vídeo da médica Cecília Pimenta, que teve 11,3 mil visualizações no YouTube e 10,4 mil compartilhamentos no Facebook. A verificação se torna ainda mais importante quando se trata de medicações e tratamentos para o novo coronavírus, porque esses conteúdos podem induzir as pessoas a automedicação e expô-las a riscos de contaminação, por acreditarem que há uma cura comprovada e barata para a doença.
A ivermectina tem sido tema recorrente de desinformação. Além das verificações citadas acima, o Comprova também mostrou que as declarações de médicos têm sido distorcidas para alegar a eficácia da droga no combate à covid-19. Além disso, o Comprova já verificou conteúdos sobre as vacinas testadas no Brasil, o uso de máscaras, e que a cloroquina cura a doença. Também mostrou ser enganoso o uso via retal de ozônio como tratamento.
Falso para o Comprova é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edição para modificar o seu significado original e divulgado de maneira deliberada para espalhar uma mentira. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/ozonioterapia-nao-tem-eficacia-comprovada-contra-a-covid-19/ | COMPROVA | Ozonioterapia não tem eficácia comprovada contra a covid-19 | null | 2020-08-05 | Aplicação de ozônio, homeopatia e tratamento com ivermectina anunciados em uma live pelo prefeito da cidade catarinense de Itajaí não tem eficácia comprovada para tratar a covid-19
Conteúdo verificado: Prefeito de Itajaí (SC) faz live para anunciar que disponibilizará ozonioterapia à população como forma de tratamento da covid-19. Prefeito também fala da eficácia de homeopatia e ivermectina no combate ao novo coronavírus.
Não há comprovação científica de eficácia dos tratamentos para a covid-19 propostos pelo prefeito de Itajaí (SC), Volnei Morastoni (MDB). No dia 3 de agosto, em uma live no Facebook, ele anunciou que o município vai passar a oferecer um “ambulatório de ozônio”, onde os pacientes confirmados com a doença poderão realizar a chamada ozonioterapia.
A técnica, que administra uma mistura de oxigênio e ozônio no corpo por diversas vias, porém, não é um consenso na comunidade médica e só tem autorização do Conselho Federal de Medicina para ser aplicada de forma experimental. Por isso, a cidade vai participar de um estudo da Associação Brasileira de Ozonioterapia que vai avaliar a efetividade do tratamento. O ensaio, segundo a prefeitura, também é realizado em outras partes do país e não tem limite de participantes – na prática, portanto, estará disponível a todos os moradores da cidade que estiverem interessados.
O prefeito também mencionou a distribuição de comprimidos de ivermectina e de cânfora — nenhuma das duas substâncias tem comprovação de eficácia contra o novo coronavírus.
Como verificamos?
O Comprova entrou em contato com a Prefeitura de Itajaí para saber os detalhes da medida. Também consultamos Conselho Federal de Medicina (CFM), Sociedade Brasileira de Ozonioterapia Médica (SOBOM) e Associação Médica Homeopática Brasileira (AMHB) para entender a utilização das terapias e medicamentos citados no vídeo. Ainda falamos com especialistas da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e do Instituto Questão de Ciência. Por fim, consultamos os dados da doença junto às secretarias de saúde estadual e municipal.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 4 de agosto de 2020.
Verificação
No vídeo transmitido no dia 3 de agosto, Morastoni disse que a Secretaria Municipal de Saúde estava finalizando os trâmites, junto ao Conselho Nacional de Pesquisa e Ética (Conep), para que a cidade seja incluída em um “protocolo nacional de pesquisa”. “Com isso, nós vamos ser autorizados a usar, a ter um ambulatório de ozônio”, afirmou.
A terapia foi a principal novidade anunciada pelo político, que ainda detalhou o tratamento: “Para esses casos [de diagnóstico positivo da covid-19, com sintomas], além da ivermectina, além da azitromicina, além de tudo mais, além da cânfora, nós também vamos oferecer o ozônio. É uma aplicação simples, rápida, de dois a três minutinhos por dia. Provavelmente vai ser uma aplicação via retal, que é uma aplicação tranquilíssima, rapidíssima, de dois minutos, num cateter fininho, e isso dá um resultado excelente. Nós vamos, em breve, estar implantando isso também. E, aí, a pessoa tem que fazer durante 10 dias seguidos — são 10 sessões de ozônio […] e isso ajuda muitíssimo nos casos, provavelmente, nos casos de coronavírus positivos.”
Ozonioterapia
Em 20 de abril de 2018, o Conselho Federal de Medicina tornou a ozonioterapia “procedimento experimental”. Com isso, determinou que ela só pode ser realizada “em instituições devidamente credenciadas” e sob o escopo de estudos. Sua aplicação deve seguir critérios definidos pela Conep. Uma das regras é que a aplicação da ozonioterapia não pode ser cobrada.
O CFM define a ozonioterapia como técnica de aplicação de uma mistura dos gases oxigênio e ozônio, por diversas vias de administração, com finalidade terapêutica. As principais são: endovenosa, retal, intra-articular, local, intervertebral, intraforaminal, intradiscal, epidural, intramuscular e intravesical.
O estudo em Itajaí será coordenado pela Associação Brasileira de Ozonioterapia (ABOZ), que faz lobby pela regularização da terapia junto ao Conselho Federal de Medicina . O CFM analisou 26 mil trabalhos sobre o tema e classificou-os como “incipientes”. Entendeu que “seriam necessários mais estudos com metodologia adequada e comparação da ozonioterapia a procedimentos placebos, assim como estudos comprovando as diversas doses e meios de aplicação de ozônio”.
O Conselho Regional de Medicina de Santa Catarina (CRM-SC) emitiu nota nesta terça-feira, 4, na qual reforça que todo tratamento — não só para covid-19 — deve ser validado pelo CFM e que este já emitiu parecer restringindo a prática da ozonioterapia a estudos experimentais. “A norma federal também deixa claro que o seu uso benéfico em tratamentos clínicos ainda está longe de ser uma unanimidade positiva, já que o volume de estudos e trabalhos científicos adequados sobre a prática ainda é incipiente e não oferece as certezas necessárias. Esse assunto exige mais pesquisa em busca de conhecimento sobre o tema.”
Ozonioterapia e a covid-19
Desde abril, a possibilidade de uso da ozonioterapia como tratamento complementar de pacientes com covid-19 vem sendo discutida no Brasil, por meio do Projeto de Lei 1383/20, da deputada Paula Belmonte (Cidadania-DF). A proposta da parlamentar é que o tratamento seja uma possibilidade, aplicada conforme indicação médica em cada caso e de forma complementar. O texto foi alvo de discussão em uma comissão externa da Câmara dos Deputados no começo de julho. Na ocasião, defensores da terapia alegaram que seria capaz de reduzir a gravidade e o tempo de duração da infecção pelo SARS-CoV-2, com possibilidade de diminuição dos custos do tratamento em até 80%. Representantes do CFM que participaram do debate, porém, afirmam que as evidências clínicas defendidas não são consideradas pela entidade e que não há reconhecimento da ozonioterapia como especialidade médica.
Procurado pelo Comprova, o Ministério da Saúde também reafirmou que “de acordo com nota técnica publicada em abril deste ano, o efeito da ozonioterapia em humanos infectados por coronavírus (Sars-Cov-2) ainda é desconhecido e não deve ser recomendado como prática clínica ou fora do contexto de estudos clínicos”.
O Comprova entrou em contato com a presidente da Sociedade Brasileira de Ozonioterapia Médica (Sobom), Maria Emília Gadelha Serra. A médica enviou um ofício, encaminhado em 3 de agosto ao Ministério da Saúde, solicitando a inclusão de dois hospitais de Porto Alegre em um estudo clínico sobre o uso da ozonioterapia em pacientes com covid-19. O estudo já foi aprovado pela Comissão Brasileira de Ética em Pesquisa e tem registro da participação de 10 centros de pesquisa no país, inclusive a Fundação Oswaldo Cruz, mas ainda não foi iniciado. O ensaio vai recrutar 150 participantes.
Sobre as evidências científicas dos benefícios da ozonioterapia, Gadelha disse que há vários artigos publicados na literatura internacional dos últimos 70 anos. Perguntada sobre os resultados obtidos em outros estudos que coordena e para os quais recebeu aprovação do Conep, a pesquisadora disse apenas que foram protocolados recentemente.
Segundo o prefeito de Itajaí, o município vai fazer parte de uma pesquisa para que tenha autorização para montar um “ambulatório de ozônio”. Ao contrário do que sugere um protocolo de pesquisa, porém, o chefe do executivo municipal disse que a terapia vai estar disponível para todos os habitantes da cidade que testarem positivo para a covid-19: “ivermectina, cânfora, ozônio e tudo mais que nós formos descobrindo e sabendo que pode ajudar, nós vamos colocar à disposição da nossa população”, afirmou, na transmissão ao vivo.
Em uma nota publicada no site da prefeitura e enviada ao Comprova, a prefeitura diz que o estudo está sendo realizado em outros hospitais e ambulatórios do país, com os mesmos protocolos que ainda não tem data para ser implementados na cidade. “Os pacientes poderão participar da pesquisa de forma voluntária, desde que preencham os requisitos do estudo e assinem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido da Pesquisa. Todas as informações serão fornecidas pela equipe da pesquisa. O estudo recomenda que o protocolo seja aplicado em, no mínimo, 142 pacientes”, diz, ainda, o texto divulgado pela prefeitura.
O Comprova contatou a Associação Brasileira de Ozonioterapia, responsável pelo estudo que será realizado na cidade, mas não recebeu retorno até o fechamento desta verificação.
Perguntamos à presidente da SOBOM sobre a possibilidade de utilização da terapia de forma ampla, como anunciada pelo prefeito, ao invés de definir um grupo claro de estudo. Segundo ela, seria um caso de utilização “off-label”, que necessita de autorização do paciente em um “termo de consentimento livre e esclarecido para uso não estabelecido em bula de medicamentos”.
Para Luiz Gustavo de Almeida, microbiologista formado pelo Instituto de Ciências Biomédicas USP e coordenador dos Projetos Educacionais do Instituto Questão de Ciência, a terapia é uma repetição de outros tratamentos propostos durante o curso da pandemia do novo coronavírus. “É a mesma história de todos os outros remédios. A gente testa em laboratório, ele funciona na cultura de células. E as pessoas dão um salto para aplicar isso para pessoas. O ozônio mata vírus e bactérias, tanto que é usado para higienizar laboratórios. Agora, você assume que dentro do corpo da pessoa ele vai ter o mesmo funcionamento. Ele, inclusive, pode fazer mal para as nossas células, dependendo da forma como reage dentro do corpo”, afirmou em entrevista ao Comprova. E completou: “Antes que se faça os testes necessários para saber se esse tratamento funciona em humanos, você já está dando para as pessoas”.
Em abril, o Instituto já alertava para a ineficácia do tratamento com ozônio nos casos de covid-19. Na ocasião, uma clínica nos Estados Unidos foi proibida de oferecer a terapia. Por lá, a Food and Drug Administration (FDA, órgão equivalente à Anvisa no Brasil) considera o ozônio um “gás tóxico e sem aplicações médicas conhecidas em terapias específicas, complementares ou preventivas”.
No dia seguinte à live, 4 de agosto, o Ministério Público enviou uma recomendação à prefeitura de Itajaí para que não seja fornecido o tratamento à base de ozônio. Pelo site oficial, porém, o Executivo informou que “esta ação não se trata da distribuição de ozônio como forma de tratamento, mas sim da participação em um estudo multicêntrico da Associação Brasileira de Ozonioterapia, aprovado pelo Conselho Nacional de Ética em Pesquisa do Ministério da Saúde, que irá avaliar cientificamente o impacto do uso desta técnica no tratamento de pacientes com COVID-19”
Ivermectina
Outro elemento do protocolo adotado em Itajaí no combate à covid-19 e mencionado na live é o uso da ivermectina. A prefeitura iniciou a distribuição massiva da ivermectina para a população em 7 de julho. O prefeito publicou um vídeo em sua página no Facebook no qual diz que a intenção é “ajudar na prevenção ao contágio e na diminuição dos sintomas no tratamento de pacientes com covid-19”. Em 31 de julho, a prefeitura anunciou que 126 mil pessoas já haviam aderido ao programa municipal e que haviam sido distribuídos 1.584.455 comprimidos do medicamento. Neste intervalo, os casos cresceram 75,2% e os óbitos, 113,3%, segundo dados da Secretaria Estadual da Saúde.
A ivermectina é um remédio utilizado há muito tempo na cura de doenças parasitárias como piolho e sarna. Há alguns anos, cientistas descobriram que ela tem efeito inibidor in vitro em alguns vírus, como o da dengue, da gripe e o HIV. Por isso, um grupo de cientistas australianos da Universidade Monash testou seu efeito no SARS-CoV-2 e descobriu que o medicamento possui o mesmo efeito: eliminou todo o coronavírus presente em uma cultura de células em até 48h.
Isso não quer dizer que a ivermectina tenha eficácia comprovada no tratamento da covid-19. Muitas drogas têm efeito positivo em laboratório, mas o resultado não é replicado quando se passa para seres vivos (chamado in vivo), explica Lucile Maria Floeter Winter, diretora da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Segundo ela, os testes in vitro são apenas o primeiro passo, pois nem sempre é possível atingir a dosagem ideal in vivo — isso é, quando a fisiologia do organismo infectado está ativa. “O organismo íntegro pode, por exemplo, metabolizar a substância, fazendo que a dose ideal não atinja o alvo, ou mesmo que esse alvo não seja acessível ao composto por alguma outra razão biológica.”
A própria Universidade de Monash explica que “a ivermectina não pode ser usada em humanos para o tratamento da covid-19 até que sejam feitos testes clínicos que comprovem a sua eficácia em dosagens seguras”.
Na live, o prefeito citou a médica Lucy Kerr, defensora do uso da ivermectina no tratamento de pacientes com a covid-19. O Comprova verificou um vídeo em que ela defendia o uso do medicamento em maio e concluiu que as informações são enganosas.
Tratamento homeopático
Outra substância mencionada pelo prefeito na live foi a cânfora (Camphora officinalis), usada na cidade de forma preventiva e no tratamento dos pacientes com diagnóstico confirmado do novo coronavírus. A Prefeitura de Itajaí anunciou a distribuição do remédio homeopático para a população no final de abril. Até meados de julho, mais de 93 mil frascos de cânfora foram distribuídos no município. Em 17 de julho, a prefeitura divulgou os resultados de uma enquete feita com 1.171 pessoas. Os dados, segundo o município, sugerem uma “redução da gravidade” da doença e um índice de mortalidade menor. A comparação, porém, não leva em conta que apenas 3,7% dos que responderam ao questionário testaram positivo para o novo coronavírus.
Segundo o protocolo desenvolvido pela Associação Médica Homeopática Brasileira (AMHB), a homeopatia deve ser vista como “uma terapia complementar, que além de auxiliar a melhora física, atua na vitalidade emocional dos pacientes” e que “o tratamento homeopático deve ser aliado ao alopático”, ou seja, à medicina tradicional. Para o doutor Luiz Darcy Siqueira, presidente da entidade, a homeopatia não cura a covid-19. Ela trata o paciente, ajudando no seu restabelecimento e na resposta à doença.
Um estudo preliminar feito pela AMHB listou cinco medicamentos homeopáticos para serem usados em pacientes de covid-19: Arsenicum album, Bryonia alba, China officinalis, Chininum arsenicosum e Phosphorus; sem menção à Camphora officinalis. A entidade, porém, diz que o levantamento da Prefeitura de Itajaí é parte de um estudo da Associação Médica Homeopática de Santa Catarina, com acompanhamento da AMHB. Segundo Siqueira, os compostos podem ajudar na prevenção, mas pacientes com casos graves devem ser encaminhados aos hospitais. A AMHB aguarda autorização do poder público para dar início a um estudo clínico no Hospital Regional de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul.
De acordo com o microbiologista Luiz Gustavo de Almeida, é preciso lembrar que não há comprovação de que a homeopatia funciona no tratamento da covid-19 e de outras enfermidades. “É preciso ter muito cuidado com esse tipo de tratamento. Você pode dar falsas esperanças para as pessoas ao oferecer um medicamento que não tem eficácia comprovada. As pessoas podem se sentir mais seguras por estarem fazendo um tratamento profilático, saírem de casa e se contaminar”, adverte. Ele lembra que, em Itajaí, há um número elevado de pessoas contaminadas com o novo coronavírus. “As pessoas acreditam nessa voz de autoridade do prefeito, que é médico, e relaxam justamente as ações que a gente sabe que funcionam, como o distanciamento social, para apostar nessas medidas. Não é nem só uma questão de perda de tempo. Você pode estar fazendo um mal para a população”, alerta.
O prefeito de Itajaí
Volnei José Morastoni (MDB) é médico desde 1979, com especialização em pediatria, pela Universidade Federal do Paraná. Teve registros no Conselho Regional de Medicina do Paraná e depois em Santa Catarina, conforme o portal do Conselho Federal de Medicina. Está em situação regular para exercer a medicina, segundo o órgão.
É prefeito pela segunda vez de Itajaí (2005-2008 e 2017-2020), cidade de 219,5 mil habitantes localizada no Litoral Norte de Santa Catarina. Foi também deputado estadual e presidiu a Assembleia Legislativa de Santa Catarina entre 2003 e 2004. Morastoni é simpatizante do cardiologista e nutrólogo Lair Ribeiro, que prega práticas alternativas na medicina, com quem já fez uma especialização.
No discurso de posse para o atual mandato, em 2 de janeiro de 2017, apontou como prioridade resgatar um antigo projeto da prefeitura, chamado de Centro de Práticas Integrativas e Complementares, dedicado a oferecer modalidades alternativas de tratamento aos pacientes, que incluem homeopatia, acupuntura, relaxamento e métodos terapêuticos orientais. Esse centro havia sido criado em 2008, quando ele foi prefeito pela primeira vez, ainda pelo PT, e, segundo a prefeitura, nasceu amparado na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares, do SUS, aprovada dois anos antes.
Não é a primeira polêmica em que Morastoni se envolve ao defender o uso de homeopatia na rede pública. Em 2017, ele lançou um projeto pioneiro para tratar dependentes de cocaína e crack utilizando composto feito a partir da folha da coca. Embora esse projeto tenha contado com apoio da Universidade do Vale do Itajaí e do Conselho Federal de Medicina, além de ter recebido recursos do Ministério da Saúde, foi criticado por especialistas do setor, como do Instituto Questão de Ciência.
A pandemia na cidade
Conforme a Prefeitura de Itajaí, até a noite do dia 03 de agosto havia 3.648 casos confirmados de covid-19 na cidade e 105 mortes. Dados do governo de Santa Catarina, no entanto, mostravam 3.823 diagnosticados com a doença até a mesma data
As medidas envolvendo homeopatia e ivermectina não geraram efeitos sobre a ampliação do contágio e número de mortes na cidade.
A distribuição de homeopatia, começou em 29 de abril. Nessa época, Itajaí tinha 86 casos confirmados para covid-19 e 3 mortes, segundo a prefeitura e o estado. A ivermectina começou a ser distribuída em 7 de julho, quando a cidade já registrava pouco mais de 2,1 mil casos de covid-19 e 45 mortes. Portanto, havia 25 vezes mais pacientes diagnosticados do que em 29 de abril e 15 vezes mais óbitos.
Desde que a ivermectina começou a ser distribuída até 03 de agosto, quando o prefeito anunciou o tratamento com ozônio, houve um aumento de 80% nos casos diagnosticados e 124% no total de óbitos na cidade, segundo a Secretaria de Estado da Saúde.
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Os dados foram extraídos dos boletins diários da prefeitura e dos boletins do governo do Estado
Itajaí é referência em atendimento médico aos municípios da região de saúde do SUS conhecida como Foz do Rio Itajaí, que concentra 11 cidades com população estimada em 2019 de 715 mil habitantes, segundo o IBGE. No entanto, de acordo com relatórios produzidos pelo governo de Santa Catarina para orientar os prefeitos a tomarem medidas contra o avanço do novo coronavírus, essa região é a mais crítica do estado em número de casos de covid-19, lotação de leitos e medidas de isolamento ou distanciamento social.
Desde 30 de maio, a ocupação dos leitos de terapia intensiva na região tem preocupado a população. E desde 23 de junho apresenta o quadro mais crítico entre as 16 regiões de saúde de Santa Catarina, devido à baixa taxa de isolamento social, lotação dos leitos do SUS (que ultrapassou 90%) e testagem insuficiente da população, segundo critérios definidos pelo governo do Estado. É a região com mais mortes em Santa Catarina: 267, conforme o governo estadual. Até a última segunda-feira, 4, concentrava um em cada cinco óbitos registrados no estado.
Por que investigamos?
O Comprova checa informações sobre políticas públicas do governo federal ou sobre a pandemia de covid-19 que tenham alta viralização nas redes sociais. A possibilidade de aplicação da ozonioterapia como tratamento da covid-19 se tornou um dos assuntos mais comentados do dia.
No momento em que o Brasil se aproxima de 100 mil mortos pela doença, aumenta a expectativa por uma cura. Com isso, o protocolo medicamentoso específico de algumas cidades ou até países chama a atenção. Tanto Cuba quanto Senegal já foram alvo de desinformação em textos que relacionavam a prescrição da cloroquina e da hidroxicloroquina com o sucesso dos países no combate ao novo coronavírus.
A Organização Mundial da Saúde afirma que até o momento não há tratamento que cure a doença. Os medicamentos atualmente prescritos servem para aliviar os sintomas.
Até o fechamento deste texto, o vídeo original da live, no Facebook da Prefeitura de Itajaí, acumulava mais de 16 mil visualizações e centenas de comentários. No Twitter, trechos do vídeo que falam do tratamento — muitas vezes, de modo irônico — também viralizaram. Uma única postagem tinha mais de 9 mil curtidas. A utilização da ozonioterapia foi alvo de matérias do UOL, Estadão, Folha, G1 e até dos veículos britânico The Guardian e do português tvi24.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que confunde com ou sem a intenção de causar dano. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/bolsonaro-nao-bateu-recorde-de-despesas-com-cartao-mas-gasto-e-o-maior-desde-2014/ | COMPROVA | Bolsonaro não “bateu recorde” de despesas com cartão, mas gasto é o maior desde 2014 | null | 2019-10-31 | Os dados do Portal da Transparência e do Suprim mostram que Bolsonaro não é, até este ponto de seu mandato, o recordista de gastos com cartão corporativo nos primeiros nove meses de governo, mas teve a maior despesa deste tipo desde 2014.
Não é verdade que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) “bateu recorde” de despesas com cartão corporativo, ou que consumiu R$ “8,2 milhões” do dinheiro público no cartão, como dizem postagens que viralizaram no Twitter desde domingo (26).
Segundo dados do Portal da Transparência, a Secretaria de Administração da Presidência da República gastou cerca de R$ 4,6 milhões de fevereiro a setembro deste ano. O montante não é um “recorde”, visto que em 2014, sob gestão de Dilma Rousseff (PT), o órgão gastou R$ 7,9 milhões. Os valores foram corrigidos pela inflação.
No entanto, o valor total gasto pela Secretaria de Administração neste ano é o maior registrado desde 2014. A Secretaria é o órgão do governo federal por meio do qual são feitas, entre outras, as despesas do gabinete pessoal do presidente.
O Comprova verificou postagens feitas no Twitter pelos perfis do youtuber Felipe Neto, de @EricoDietrich e @charlesnisz.
Para o Comprova, enganoso é o conteúdo que confunde ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos
A verificação começou com uma busca dos gastos da Secretaria de Administração da Presidência da República no Portal da Transparência, que permite a qualquer pessoa uma consulta aos gastos do governo federal.
No entanto, o portal só mostra os gastos com cartões corporativos a partir de 2013. Para conseguir informações sobre anos anteriores, solicitamos estes dados à Secretaria-Geral da Presidência da República.
Todos os valores foram corrigidos pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), índice oficial que mede a inflação do período.
Quanto Bolsonaro gastou com o cartão?
Os gastos do cartão corporativo do Governo Federal são realizados por servidores dos diferentes órgãos e ministérios. Como gastos do presidente Bolsonaro, foram consideradas as despesas da Secretaria de Administração da Presidência da República, o que não significa que o próprio presidente tenha realizado a despesa.
O Comprova obteve informações sobre gastos com cartão corporativo de duas bases de dados do governo federal: o Portal da Transparência, que tem dados sobre cartões a partir de 2013, e o Sistema de Suprimento de Fundos (Suprim), que possui dados desde 2003. Estas fontes usam critérios diferentes para registrar as despesas.
As despesas com cartão corporativo que aparecem no Portal da Transparência foram feitas no mês anterior em que foram registradas. Ou seja: um gasto que aparece no portal como sendo de setembro foi feito, na verdade, em agosto. É semelhante ao que acontece em faturas de cartão de crédito comum, por exemplo.
Assim, para sabermos quanto foi gasto no atual governo, não foram incluídas as despesas com cartão corporativo que aparecem no Portal da Transparência como sendo de janeiro de 2019 — já que correspondem a gastos de dezembro de 2018, quando Bolsonaro ainda não tinha tomado posse.
Com isso, levantamos as despesas da Secretaria de Administração da Presidência entre fevereiro e setembro (último mês disponível para consulta). Neste período, com a correção pelo IPCA, o órgão gastou R$ 4.649.787,28 com o Cartão de Pagamento do Governo Federal (CPGF), conhecido popularmente como cartão corporativo.
Os dados do Suprim mostram que a Secretaria de Administração da Presidência teve, de janeiro a agosto deste ano, gastos com cartão corporativo um pouco maiores: R$ 5.041.609,76. Isso ocorre porque o sistema também contabiliza as devoluções de saque e eventuais restituições de crédito.
E, diferentemente do Portal da Transparência, o Suprim registra os gastos no mês em que eles ocorreram.
Além disso, os dados do Suprim enviados ao Comprova se referem apenas aos gastos sigilosos, enquanto as informações do Portal da Transparência consideram todos os gastos efetuados.
Os valores totais da gestão pública são abertos, mas há sigilo sobre despesas consideradas de segurança nacional, como a alimentação e o transporte do presidente e do vice-presidente.
Como comparação, dos valores do Portal da Transparência de 2019, dos R$ 4,6 milhões gastos pela Secretaria de Administração da Presidência, R$ 4,5 milhões foram sigilosos.
Além dos gastos do gabinete pessoal do presidente, a Secretaria de Administração é responsável por executar parte das despesas de outros órgãos, como a Secretaria-Geral da Presidência, Casa Civil e Secretaria de Governo.
Quanto outros presidentes gastaram?
Os dados do Portal da Transparência e do Suprim mostram que Bolsonaro não é, até este ponto de seu mandato, o recordista de gastos com cartão corporativo nos primeiros nove meses de governo, mas teve a maior despesa deste tipo desde 2014.
Segundo o Portal da Transparência, entre fevereiro e setembro de 2014, no governo Dilma, a Secretaria de Administração da Presidência gastou, em valores corrigidos pelo IPCA, R$ 7,9 milhões com cartão corporativo.
Veja no gráfico abaixo as despesas desde 2013, todas corrigidas pelo IPCA.
Gastos com cartão corporativo – Presidência
Infogram
Já de acordo com o Suprim, de janeiro a agosto de 2014, a Secretaria de Administração da Presidência teve R$ 8,3 milhões de gastos sigilosos com cartão corporativo.
Como mostra o gráfico abaixo, elaborado com base nas informações do Suprim, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) gastou mais em 2009.
Gastos com cartão corporativo – Presidência – Suprim
Infogram
Antes de 2008, os gastos com cartão corporativo alcançaram valores mais altos que os atuais. Os maiores gastos foram em 2003, R$ 8,3 milhões; em 2004, R$ 10,1 milhões; e em 2006, R$ 8,4 milhões.
No entanto, o decreto 6.370 de 2008 impôs restrições ao uso dos cartões para despesas relativas a viagens (compra de passagens por meio de agências, diárias, hospedagem e transporte) e saques, o que pode ter contribuído para a redução dos gastos nos anos seguintes.
Outra mudança, segundo a CGU (Controladoria-Geral da União), foi um decreto de 2009, que definiu os valores das diárias para ministros de estado em viagem dentro do país e fez com que, nessa circunstância, o cartão não mais pudesse ser utilizado para pagamentos de hospedagem e alimentação.
E, em 2018, foram alterados os limites de gastos com cartão de pagamento, em decorrência do decreto que aumentou os limites dos valores de cada modalidade de licitação.
Para despesas de pagamento imediato relativas a compras e serviços, o valor máximo passou de R$ 800 para R$ 1.760. Já para despesas com obras e serviços, o valor passou de R$ 1.500 para R$ 3.300.
Quando o valor, ainda que pago com cartão de pagamento, passa pelo processo de empenho, os valores máximos são maiores: chegando a R$ 17.600 para compras e serviços e R$ 33.000 para obras e serviços de engenharia.
Os gastos incluem o vice-presidente?
Nos gastos com cartão corporativo da Secretaria de Administração da Presidência, segundo informação da Secretaria Geral da Presidência, estão incluídos gastos realizados pelo vice-presidente apenas quando este está no exercício do cargo de presidente da República.
Fora dos períodos em que o vice-presidente exerce a função de presidente, os gastos são contabilizados pelo Gabinete da Vice-Presidência da República, que de fevereiro a setembro de 2019 teve gastos no total de R$ 469,5 mil.
Em 20 de outubro, o presidente Jair Bolsonaro questionou um texto do Antagonista, segundo o qual a Presidência aumentou 24% os gastos com cartões. Em tuíte, o presidente afirmou que “os gastos com cartões incluem as despesas do Presidente e do Vice”.
No Orçamento, os gastos do Gabinete da Vice-Presidência fazem parte do órgão superior chamado “Presidência”.
No entanto, os valores divulgados pela reportagem do Globo não se referem aos gastos do órgão superior da Presidência, mas sim da Secretaria Especial de Administração da Presidência.
Para que serve o cartão corporativo?
O cartão corporativo foi criado em 2002, no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), por meio de uma portaria.
No início do primeiro mandato do governo Lula, portanto, era o segundo ano de vigência do uso dos cartões.
A função do cartão é facilitar o pagamento de despesas pontuais e ou de gastos que devam ser pagos no ato da compra, como os realizados durante viagens.
Antes da existência dos cartões, esses gastos já existiam. Com os cartões, a principal mudança foi a forma como esse pagamento ocorre, não no gasto em si.
De acordo com Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas, “se não tivesse o cartão corporativo, teria que continuar fazendo o gasto”. Ele dá como exemplo uma operação da Polícia Federal em que surja uma viagem urgente para outro estado. “Tem que comprar passagem de avião, como seria feito? Não teria como fazer nota de empenho e depois pagamento”, afirma ele.
No processo normal de compras por órgãos públicos, antes de realizar um gasto, é preciso fazer um empenho. O empenho funciona como uma reserva do valor, dentro do orçamento, para garantir que não serão feitos gastos que posteriormente o governo não possa pagar.
Além disso, para a maior parte das compras e contratações feitas pelo setor público, a lei determina realizar uma licitação, que pode levar meses até ser concluída. Nesse processo, diferentes empresas podem fazer ofertas e uma delas é escolhida.
No entanto, para gastos pontuais ou de caráter urgente, nem sempre é possível fazer o empenho antes da compra, ou vantajoso realizar uma licitação. Ainda assim, em qualquer caso, é preciso que seja observado o interesse público do gasto.
Cartão corporativo x Bolsa Família
Além das postagens sobre os supostos recordes de gastos de Bolsonaro, um outro tuíte que viralizou buscava ligar as despesas com cartão corporativo ao Bolsa Família. Segundo a postagem, o valor gasto pelo presidente com o cartão corporativo “poderia pagar o benefício para 2.430 famílias ou 7.293 pessoas por mês”. Essa conta não é explicada pelo tuíte.
O cálculo parte da premissa de que Bolsonaro gastou, em média, R$ 460 mil com cartão corporativo por mês. Esse número então é dividido pelo valor médio do benefício do Bolsa Família em setembro, que foi de R$ 189,21. Essa divisão dá 2.431, número próximo ao citado na postagem, de 2.430 famílias.
Para chegar ao número de “7.293 pessoas”, o autor levou em conta que cada família do programa social tem três pessoas — mas o autor do post não explica como chegou a essa conclusão.
Após escândalos, normas ficaram mais rígidas
Desde que passaram a ser usados em 2002, os cartões corporativos foram motivo de diversos escândalos envolvendo integrantes do governo.
Em fevereiro de 2008, após ameaça da então oposição ao governo Lula de instalar uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para investigar gastos irregulares com o cartão, o governo publicou um novo decreto com o objetivo de limitar o uso do cartão e evitar abusos.
Ainda assim, a CPI foi instalada e durou três meses. Como resultado de uma de suas recomendações, em outubro de 2008, a CGU (Controladoria-Geral da União) lançou um manual com orientações para os funcionários e detentores de cargos públicos sobre o uso adequado dos cartões corporativos.
Um dos pontos mais questionados em relação aos gastos, no entanto, continua sem alteração: os detalhes da maior parte dos gastos realizados pelos gabinetes da Presidência e Vice-Presidência são mantidos sigilosos durante o mandato, sob a alegação de “questões de segurança”.
À época, uma regra baixada em dezembro de 2003 pelo Gabinete de Segurança Institucional da Presidência impediu o acesso aos detalhes dos gastos.
Em 8 de agosto deste ano, após criticar a cobertura da imprensa, o presidente Jair Bolsonaro prometeu divulgar seus gastos pessoais com o cartão corporativo, o que ainda não aconteceu.
“Eu vou abrir o sigilo do meu cartão para vocês tomarem conhecimento quanto gastei de janeiro até o final de julho. Ok, imprensa? Vamos fazer uma matéria legal?”, afirmou ele na ocasião.
Segundo ele, o objetivo é desmentir acusações de que teria gasto cerca de R$ 1 milhão por mês. Na transição de governo, a equipe do presidente chegou a cogitar a extinção do cartão, mas desistiu.
Repercussão nas redes
O tuíte dizendo que Bolsonaro bateu “recorde de gasto em cartão corporativo” foi publicado pelo youtuber Felipe Neto no domingo (27). Até quarta (30), a postagem tinha mais de 62 mil interações.
A mesma afirmação aparece no título de um texto do site Esquerda Diário publicado no sábado (26). Segundo a ferramenta Crowdtangle, que acompanha o comportamento de um link nas redes sociais, o texto teve mais de 31,3 mil interações no Facebook até quarta-feira (30).
Já a publicação dizendo que Bolsonaro gastou “8,2 milhões” — enquanto Lula e Dilma teriam gasto, respectivamente, 300 mil e 350 mil — no cartão corporativo em nove meses de mandato foi feita pela conta @EricoDietrich no sábado (26). O post tinha mais de 24 mil interações até terça-feira.
Conteúdo semelhante foi compartilhado pela conta @charlesnisz, no dia 28, e alcançou mais de 22,5 mil interações até o dia 30. Em resposta ao Comprova, o usuário informou que usou o perfil de Erico Dietrich como fonte.
O tuíte que relacionava o gasto com cartão corporativo ao Bolsa Família foi publicado no dia 21 pela conta @antifa1982. Até terça, teve cerca de 4,6 mil interações.
O Comprova enviou mensagens aos autores dos tuítes ao longo dos últimos dias, mas só teve resposta de @charlesnisz até a publicação deste texto. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/hospedagem-de-bolsonaro-em-hotel-de-luxo-de-abu-dhabi-nao-foi-paga-com-dinheiro-publico-brasileiro/ | COMPROVA | Hospedagem de Bolsonaro em hotel de luxo de Abu Dhabi não foi paga com dinheiro público brasileiro | null | 2019-10-30 | O presidente ficou em um dos hotéis mais luxuosos do mundo, mas a hospedagem foi paga pelo governo dos Emirados Árabes Unidos
É falsa a alegação feita no título de uma publicação do site Desmascarando, segundo a qual o presidente Jair Bolsonaro (PSL) “foi ao hotel mais luxuoso do mundo com dinheiro público”. O próprio texto, copiado do site jornalístico Metrópoles, informa que a estadia de Bolsonaro não foi paga com impostos.
Ao Comprova, o Palácio do Planalto informou que, como é a praxe diplomática em toda viagem internacional, “a hospedagem do chefe de Estado foi custeada pelo país anfitrião”.
A Presidência da República não respondeu, no entanto, se a comitiva se hospedou no mesmo hotel de Bolsonaro nem quantas pessoas ficaram com ele.
No Facebook, a miniatura gerada pelo link do texto engana o leitor, uma vez que mostra apenas o título do post, que é falso. Quando o Facebook incorpora algum link para que os usuários compartilhem o conteúdo, a íntegra do texto não aparece. Assim, o leitor teria de clicar na publicação para ter acesso à informação de que não é o contribuinte que está pagando pela hospedagem de Bolsonaro.
Para o Comprova, é falso um conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira, que tenha dolo.
Como verificamos
Para fazer esta verificação, o Comprova entrou em contato com a assessoria de imprensa do Palácio do Planalto para questionar quem fez o pagamento da hospedagem de Bolsonaro. Além disso, consultou os preços das suítes no site do hotel Emirates Palace, onde Bolsonaro ficou hospedado, e o itinerário da viagem presidencial em matérias de veículos de imprensa.
O Comprova entrou em contato por mensagem no Facebook com a página Desmascarando, mas não obteve resposta.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.
Bolsonaro se hospedou em hotel de luxo
É verdade que Bolsonaro ficou hospedado no hotel retratado no texto. O Emirates Palace fica em Abu Dhabi, capital dos Emirados Árabes Unidos.
Segundo reportagem do jornal Folha de S. Paulo, o hotel foi escolhido em 2019 como “o mais luxuoso do Oriente Médio” pelo World Travel Awards e já levou duas vezes a categoria de “mais luxuoso” resort do mundo.
O Comprova simulou no site oficial do hotel o preço de uma diária nesta 3ª feira (29.out.2019): de R$ 2.324,86 a R$ 6.524,53. A conversão foi feita no site do Banco Central. Há ainda a suíte Palace, com três quartos, que chega a R$ 35 mil.
O Palácio do Planalto não informou em que tipos de quartos a comitiva de Bolsonaro se hospedou.
O Emirates Palace foi construído em 2005, pelo governo dos Emirados Árabes Unidos, com um investimento de US$ 3 bilhões. Atualmente, o hotel é administrado pelo grupo privado Kempinski.
Outros custos da viagem de Bolsonaro
Apesar de a hospedagem de Bolsonaro no hotel de luxo ter sido custeada pelo governo dos Emirados Árabes, viagens internacionais do presidente envolvem outros gastos para a administração pública, como o pagamento de diárias e de transporte para comitiva e assessores.
De acordo com o Sistema de Concessão de Diárias e Passagens (SCDP), o valor das diárias varia por cargo e destino da viagem. Para os Emirados Árabes, por exemplo, o decreto 71.733/1973 prevê diárias de US$ 300 a US$ 350.
O Comprova consultou o Painel de Viagem, plataforma do governo federal que mostra os valores de despesas com viagens de funcionários da União. O gasto total em outubro para os países de destino da viagem presidencial, nas datas em que Bolsonaro estava na Ásia e no Oriente Médio, foi inicialmente de R$ 1,37 milhão, mas não é possível determinar se todos os custos estão ligados à comitiva. O maior gasto foi de R$ 82 mil para a viagem de um militar do Departamento de Segurança Presidencial ir do Brasil para a Arábia Saudita no dia 20 de outubro.
Viagem de Bolsonaro
Bolsonaro está na Ásia e no Oriente Médio desde 19 de outubro e encerra a viagem nesta quarta-feira, 30. Passou pelo Japão, China e foi a países árabes (Qatar, Arábia Saudita e Emirados).
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
A publicação foi feita no site Desmascarando e compartilhada na página no Facebook no dia 28 de outubro. No dia 29, a postagem foi apagada da rede social e mantida apenas no site, ainda com o título falso. Antes de ser deletada, teve mais de 2 mil interações na página. Segundo a ferramenta CrowdTangle, o total de interações foi de 5,8 mil.PAGE_BREAK: PageBreak | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/embalagens-de-empresa-francesa-em-praia-de-pernambuco-sao-de-fabricante-de-luvas-e-nao-indicam-responsabilidade-por-vazamento/ | COMPROVA | Embalagens de empresa francesa em praia de Pernambuco são de fabricante de luvas e não indicam responsabilidade por vazamento | null | 2019-10-25 | Os pacotes encontrados continham luvas que foram distribuídas aos voluntários e foram reaproveitados para armazenar parte do óleo recolhido
Publicações que circulam em redes sociais sugerem que o vazamento de óleo em praias nordestinas tenha envolvimento de uma empresa francesa. As imagens são verdadeiras, mas foram usadas fora de contexto e levam a uma interpretação errada. As embalagens que aparecem nas fotos são da empresa Mapa, uma multinacional francesa que produz luvas de látex, e não óleo.
O texto verificado pelo Comprova inicia com a pergunta “E agora Lacron…????”, em uma referência ao presidente da França, Emmanuel Macron, crítico ao presidente Jair Bolsonaro (PSL). Na sequência, o boato afirma que “a possibilidade de ecoterrorismo vem se confirmando” no Nordeste brasileiro. As imagens mostram duas embalagens plásticas que continham óleo, encontradas nas areias do Cabo de Santo Agostinho, cidade do Grande Recife, em Pernambuco.
A Marinha, que investiga os responsáveis pelo desastre ambiental, esclareceu na segunda-feira (21) que a Mapa não faz parte das investigações porque os sacos plásticos na verdade foram reutilizados pelos voluntários para guardar o óleo encontrado nas praias. “O material citado era uma embalagem de luvas de proteção que foi reutilizado para colocar os resíduos”, disse a Marinha, em nota.
Em outra manifestação, o comandante de Operações Navais da Marinha, almirante Leonardo Puntel, afirmou que os voluntários receberam luvas para se protegerem na limpeza das praias e que uma pessoa usou a embalagem vazia para colocar óleo dentro.
Contatada pelo Comprova, a assessoria de imprensa da Marinha destacou que o óleo ao redor das embalagens pode grudá-las, o que dá a impressão de que os sacos estavam lacrados.
A Mapa diz que os sacos são de “luvas de proteção química, indicadas para trabalhos em contato com produtos químicos”. A assessoria da empresa informou que o modelo do produto deixou de ser vendido no Brasil, mas que “algum de nossos distribuidores poderia ter em estoque”.
O produto foi fornecido pela Prefeitura do Cabo de Santo Agostinho para voluntários que atuavam na limpeza da praia. A informação foi confirmada ao Comprova pela gestão municipal.
O Comprova também entrou em contato com Danilo Andrade, um morador do Cabo de Santo Agostinho que trabalhou voluntariamente no mutirão de limpeza. Ele confirmou ter visto a retirada dos sacos da praia pela Marinha e disse que a embalagem é a mesma de outros equipamentos entregues pela prefeitura no mesmo dia, também entre as praias do Paiva e Itapuama.
Esta verificação do Comprova analisou publicação do perfil @DomdasThreads no Twitter e vídeo da página República de Curitiba no Facebook.
O Comprova entrou em contato com @DomdadThreads, que informou que a fonte do tuíte era uma reportagem do SBT. De fato, o apresentador Cardinot, da TV Jornal, afiliada do SBT em Pernambuco, compartilhou em seu programa, na segunda-feira (21), um vídeo com imagens das embalagens da Mapa e mencionou a possibilidade de terrorismo ecológico.
No dia seguinte, Cardinot veiculou coletiva de imprensa com o almirante da Marinha, Leonardo Puntel, esclarecendo que as embalagens não têm relação com o vazamento. Um trecho do comentário de Cardinot na segunda-feira está sendo veiculado para endossar a narrativa de culpa da empresa francesa. O perfil @DomdasThreads foi informado pelo Comprova do comunicado da Marinha que desmente o boato.
Para o Comprova, falso é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
O Comprova entrou em contato com a Marinha, a empresa Mapa, a prefeitura de Cabo de Santo Agostinho e um voluntário que atua no mutirão de limpeza. Também consultamos reportagens publicadas pela imprensa sobre o desastre ambiental.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.
Havia óleo nos sacos da empresa francesa?
Sim, ele foi colocado nos sacos pelos próprios voluntários. Em, nota, a Marinha explicou que os sacos plásticos foram reutilizados por voluntários para guardar o óleo encontrado nas praias.
Ou seja: voluntários usaram luvas da Mapa para proteger as mãos enquanto limpavam as águas e aproveitaram para guardar o óleo recolhido nos sacos onde antes estavam as luvas.
Como os sacos chegaram em Pernambuco?
A Prefeitura de Cabo de Santo Agostinho informou ao Comprova que distribuiu, desde domingo (20), mais de 8 mil kits de equipamentos de proteção individual, de várias marcas diferentes, a serem usados pelos voluntários. É aqui que entra a francesa Mapa, uma empresa de luvas de látex embaladas em sacolas plásticas e que estava dentre as marcas distribuídas pela prefeitura.
Nas fotografias e vídeos compartilhados, é possível ver que o produto foi produzido na Malásia. Sacolas com o logo da empresa foram encontradas próximo à praia do Paiva, no Cabo de Santo Agostinho, na segunda-feira (21).
Após terem sido encontradas por voluntárias que faziam a limpeza do óleo, as embalagens foram recolhidas por militares que estavam na praia. O material foi levado para a Capitania dos Portos, no Recife, para análise, como noticiou o G1.
Em coletiva de imprensa no dia seguinte, o Comandante de Operações Navais da Marinha, almirante Leonardo Puntel, informou que as luvas foram distribuídas aos voluntários e uma pessoa utilizou um saco plástico vazio para colocar o óleo recolhido no mar.
“Uma embalagem de cerca de 30 centímetros era de EPIs (equipamentos de proteção individual) que foram distribuídos para os voluntários. Esses sacos continham luvas dentro”, afirmou. “Essas luvas foram retiradas do saco, distribuídas para os voluntários, que estavam usando essas luvas, e alguém pegou o óleo que estava no local e encheu esse saco que estava vazio”.
O Comprova contatou um dos voluntários que faz parte do mutirão de limpeza. De acordo com Danilo Andrade, a embalagem é a mesma de equipamentos distribuídos pela prefeitura no dia 21. “Quando fui pegar EPIs, notei que a embalagem era a mesma que estava [em meio ao] petróleo”, disse ao Comprova. O voluntário enviou ao Comprova fotos que corroboram seu relato.
A voluntária que encontrou as embalagens (uma vazia e uma com óleo) preferiu não comentar o assunto. Em entrevistas no dia em que os sacos plásticos foram encontrados, ela afirmou que, quando foi retirar o petróleo da praia, viu as embalagens sujas e usou óleo vegetal para limpá-las. Assim, viu as etiquetas que identificavam a marca francesa. Ela tirou fotos e entregou o material a representantes da Marinha que estavam na praia.
O que é a Mapa? O que ela diz sobre o assunto?
Criada em 1957, a Mapa é uma multinacional francesa que produz luvas de látex – não é, portanto, uma empresa que produza ou transporte petróleo. Em nota enviada ao Comprova, a empresa afirma que as luvas retratadas nas imagens são vendidas para proteção contra produtos químicos. A assessoria de imprensa acrescentou que o modelo que aparece na embalagem – Technic 401 – era vendido no Brasil e saiu da linha, mas algumas lojas e distribuidoras poderiam ainda tê-lo em estoque. As luvas podem ser encontradas no Mercado Livre.
A Mapa acrescenta que doará luvas de proteção para serem usadas na remoção de óleo nas praias do Grande Recife. A Prefeitura de Cabo de Santo Agostinho informou nesta quinta-feira (24) já ter recebido donativos da multinacional francesa.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
O texto verificado foi publicado no perfil @DomdasThreads no Twitter e em vídeo na página República de Curitiba no Facebook. O tuíte foi feito no dia 22 de outubro e, no dia 24, tinha 2,7 mil retuítes e 6,8 mil curtidas. O vídeo no Facebook tinha 2,2 mil compartilhamentos e 39 mil visualizações, mas aparentemente foi apagado da plataforma.
Fato ou Fake e Aos Fatos também checaram esse boato. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/uso-de-trem-de-dois-andares-no-brasil-nao-tem-relacao-com-o-governo-bolsonaro/ | COMPROVA | Uso de trem de “dois andares” no Brasil não tem relação com o governo Bolsonaro | null | 2019-10-24 | Post que viralizou no Facebook usa vídeo real para estabelecer relação enganosa entre um investimento feito por empresa privada com ações do governo federal
Um post compartilhado nas redes sociais associa de forma enganosa um vídeo de um trem double-stack (que transporta dois andares de vagões) com o governo de Jair Bolsonaro (PSL). As imagens são reais e de fato mostram a circulação de um trem desse tipo na ferrovia que liga Sumaré (SP) a Rondonópolis (MT), mas o investimento é privado e não ocorreu no atual governo.
O Comprova apurou que não é possível estabelecer nenhuma relação entre o double-stack e o governo Bolsonaro, visto que o investimento do projeto foi 100% privado, divulgado e iniciado em março de 2018, antes mesmo da confirmação da candidatura de Jair Bolsonaro à Presidência, o que só aconteceu em julho do mesmo ano.
Trens double-stack da Brado Logística começaram a operar neste ano entre os dois municípios pelas linhas férreas Ferronorte e Malha Paulista, concedidas à Rumo Logística, que tem a Brado como subsidiária. A viagem inaugural entre Sumaré e Rondonópolis foi feita no dia 19 de junho, mas não se trata da primeira operação de locomotivas como essa no Brasil. A primeira ocorreu em 2013.
Esse tipo de locomotiva consegue transportar cargas em dois níveis e tem capacidade para empilhar até três contêineres.
A publicação diz: “Bolsonaro entrou o Brasil andou”. O vídeo, que na verdade é de autoria do canal “No Trilho”, teve viralização na publicação da página do Facebook “Movimento do Povo Brasileiro” em 17 de outubro. Até a tarde de 22 de outubro, o post acumulava mais de 68 mil visualizações. Ele foi deletado pela página em 23 de outubro.
Para o Comprova, o conteúdo enganoso é aquele que confunde ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos
Para verificar a publicação, o Comprova entrou em contato com a Rumo Logística, concessionária da Ferronorte e da Malha Paulista, e a Brado Logística, subsidiária da Rumo que faz operações de contêineres na linha férrea. As empresas confirmaram que o vídeo apresentado na postagem refere-se à primeira viagem com utilização de vagões double-stack operado por elas.
No vídeo aparece uma marca d’água do canal No Trilho. Contactado pelo Comprova via Instagram, o responsável pelo canal confirmou que o conteúdo foi produzido por eles e publicado no canal oficial do YouTube, e que esse vídeo também chegou a ser fornecido para a afiliada do SBT no Mato Grosso do Sul (SBT MS).
Depois de descobrir que o vídeo era verdadeiro, o Comprova procurou o Ministério da Infraestrutura, a Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF) e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para entender se essa operação também seria a primeira feita em uma ferrovia brasileira. A ANTF e a ANTT explicaram que não, já que a MRS iniciou operações eventuais com vagões double-stack em 2013 entre as duas margens do Porto de Santos, mas desde então elas foram descontinuadas.
Para uma visão mais aprofundada sobre ferrovias no Brasil, ainda entramos em contato com o professor Bernardo Carvalhaes, especialista em Engenharia Ferroviária do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes). Ele explicou que o uso dessa tecnologia de contêineres de dois andares é de fato mais produtiva, já que o modelo permitiria uma operação mais sustentável e econômica, mas isso demanda adequações nas linhas ferroviárias.
Isso geraria um alto custo, seja para o governo federal, seja para iniciativa privada, uma vez que o custo-benefício do transporte de grãos ou outras cargas, exceto o minério de ferro – que é altamente rentável – não corresponde ao investimento necessário para construção e adequação das ferrovias brasileiras.
O Comprova ainda entrou em contato com o “Movimento do Povo Brasileiro” responsável pela publicação duvidosa. O objetivo foi questioná-los sobre a veracidade do vídeo e a associação do post ao governo Bolsonaro.
Por telefone, um dos integrantes da página, Marcos, explicou que eles postaram o vídeo para mostrar a primeira viagem de trens double-stack, no trecho que compreende Rondonópolis e Sumaré.
Ao Comprova, eles também disseram que não tiveram a intenção de dizer que a operação dos trens ocorre graças a ações ou investimentos do governo Bolsonaro, mas que foi apenas um jeito de dizer que, com a entrada dele, o Brasil passou a ir para a frente.
O “Movimento do Povo Brasileiro” justificou a associação ao governo afirmando que o conteúdo publicado estava na página do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas. Em seguida, o grupo encaminhou ao Comprova o link da página oficial do ministro.
O vídeo publicado por Freitas não corresponde ao mesmo vídeo da publicação do “Movimento do Povo Brasileiro” checado pelo Comprova. Questionados sobre a diferença dos vídeos, o “Movimento do Povo Brasileiro” não respondeu as mensagens e logo deletou a publicação no Facebook.
Além disso, eles enviaram links de reportagens sobre o contrato de concessão de um novo trecho da Ferrovia Norte-Sul, assinado com a Rumo pelo governo Bolsonaro, com o objetivo de justificar os investimentos do governo no modal ferroviário. Essa nova concessão da Rumo, porém, é de outra linha férrea (a Norte-Sul), e não a Malha Paulista ou a Ferronorte ou, esta última já administrada pela Rumo (antiga Ferronorte S.A e depois América Latina Logística) desde 1989 e que passou a operar com double-stacks agora.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
Esse de fato foi o primeiro trem de dois andares a operar na ferrovia?
Sim. O trem cargueiro de dois andares iniciou as operações entre Sumaré (SP) e Rondonópolis (MT), em 19 de junho, segundo informou a Brado/Rumo, transportando 68 vagões double-stack, totalizando 136 contêineres. O trecho tem 1.400 quilômetros.
O Comprova apurou que a Rumo fez um investimento de cerca de R$ 60 milhões para comprar 148 vagões double-stack e adequar a ferrovia para permitir essa operação. Eles transportam mais de 70 tipos de produtos movimentados por contêineres, de cargas agrícolas e industriais até bens de consumo.
As empresas afirmam que a eficiência do modelo aumentou em 40% a capacidade do trecho e que ele “permite uma operação mais sustentável, com ganhos significativos de produtividade e rentabilidade, transportando mais contêineres num mesmo trem e reduzindo custos operacionais”, conforme o primeiro anúncio do investimento publicado pelo site da empresa.
Acionada pelo Comprova, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) explicou que esse foi, de fato, o primeiro trem de caráter regular (com horário e circulação definidos e autorizados pela ANTT) com essa característica a operar no país, porém ressaltou – bem como a Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF) – que a MRS já havia feito operações não regulares usando double-stack no país. A ATNF explicou que a primeira operação com double-stack no Brasil foi em abril de 2013, pela MRS, de fato com operações intermitentes, em um pequeno trecho ligando as duas margens do Porto de Santos (Santos e Guarujá). Esse serviço funcionou por alguns meses, mas depois foi interrompido pela empresa, que voltou a usar vagões comuns.
Portanto, é possível dizer que a operação de vagões de dois andares da Rumo/Brado é a pioneira em trajetos de longa distância no país e, ainda, a primeira regular, mas não a pioneira no Brasil.
Há ligação disso com o governo Bolsonaro?
Não. A Brado/Rumo viabilizou o projeto e apresentou a aquisição de 74 vagões de dois andares durante a 24ª edição da Intermodal South America, em março de 2018 – quando Bolsonaro ainda nem tinha sido oficializado como candidato a presidente. Essa iniciativa foi custeada pela empresa, sem nenhum investimento do governo federal, à época comandado pelo ex-presidente Michel Temer (MDB)
“O vagão foi desenvolvido de maneira exclusiva e customizada para atender as necessidades dos nossos clientes. O double stack faz parte de uma nova fase no plano de expansão da Brado. Projetando aumentar em 30% os negócios da companhia em 2018”, afirmou o diretor Comercial e de Operações da Brado, Marcelo Saraiva, na ocasião.
O governo federal de fato está conduzindo um amplo pacote de ações para desenvolver o modal ferroviário brasileiro, mas não existe relação com essa operação específica.
Além da concessão já assinada da Norte-Sul, apresentação do Ministério da Infraestrutura obtida pelo Comprova aponta que a intenção do governo é de, até 2020, assinar contratos de concessão das linhas férreas Fiol e Ferrogrão. O Planalto também quer renovar antecipadamente concessões de outras ferrovias (da Rumo, Vale, MRS e VLI), estipulando em alguns casos que as concessionárias façam investimentos na construção de novas estradas de ferro, como a Fico (no Centro-Oeste) e Ferrovia Vitória-Rio (no Sudeste).
Em algumas dessas renovações de concessões, como a da Malha Paulista, da Rumo, a ANTF explicou que ela poderá prever o investimento em trens double-stack como uma solução para dobrar a carga movimentada na estrada de ferro. Os contratos de prorrogação estão no momento sob análise do Tribunal de Contas da União (TCU).
Por que mais ferrovias no país não operam trens de dois andares?
O Ministério da Infraestrutura explicou que nem toda ferrovia pode receber esse tipo de vagão. Isso porque o double-stack requer adequação, entre outras coisas, de túneis.
De acordo com Bernardo Carvalhaes, especialista em Engenharia Ferroviária do Ifes, grande parte da malha ferroviária brasileira não está adequada para receber esse tipo de tecnologia logística. “Esses trens podem atingir alturas superiores a 6 metros, o que demanda compatibilidade de túneis, pontes, entre outras instalações ao longo da ferrovia. Também há a questão da inscrição em curvas: como o comprimento entre truques (conjunto de rodas) do vagão é maior que os vagões tradicionais, os vagões double-stack não inscrevem em curvas com raios pequenos, precisaria de raios de curva iguais ou superiores a 90 metros.”
O professor ressaltou ainda que o modelo de negócio e a demanda de operação de carga no Brasil mudaram de forma considerável durante as décadas. Para ele, o investimento feito no modal ferroviário brasileiro não corresponde à nossa realidade atual. Principalmente, porque hoje no país, o principal meio de transporte de carga é operado por rodovias.
“O problema é que temos no Brasil ferrovias que foram construídas há mais de 100 anos e as demandas de projeto de quando a maioria foi construída – antes da década de 70 – eram outras, pois na época circulavam vagões menores.”
O Comprova produziu um videográfico para explicar a dificuldade dos trens de ‘dois andares’ operarem no país.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
A publicação foi feita pela página “Movimento do Povo Brasileiro” em 17 de outubro. Até o dia 22, tinha mais de 68 mil visualizações, 3,1 mil curtidas e 2,3 mil compartilhamentos na rede social. A publicação foi deletada pelo perfil no dia 23 de outubro pouco após contato da equipe do Comprova pedindo esclarecimentos sobre a origem do vídeo.
O presidente Jair Bolsonaro também publicou no Twitter um trecho do mesmo vídeo no dia 21 de outubro. Já o filho do presidente, o vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro, também publicou o vídeo em seu Twitter no dia 20, mas eles não afirmaram nas publicações que se tratava de ação do governo. Somados, ambos os tuítes tiveram mais de 50 mil curtidas.
| null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/bolsa-familia-tera-13o-mas-nao-aumento-programa-ainda-exige-presenca-na-escola/ | COMPROVA | Bolsa Família terá 13º, mas não aumento; programa ainda exige presença na escola | null | 2019-10-22 | Tuíte mistura informações falsas e verdadeiras a respeito da gestão do programa no governo de Jair Bolsonaro
É enganoso um tuíte que circula com informações sobre o andamento do programa Bolsa Família na administração de Jair Bolsonaro. Não é verdade que o governo manipula dados para dizer que haverá 13º para os beneficiários, nem que o principal objetivo do programa foi interrompido.
De fato, houve um corte de 381 mil beneficiários no programa, como afirma o tuíte, mas o número de pessoas atendidas costuma variar mês a mês. É verdadeiro também que o valor do benefício não terá aumento real neste ano.
Procurado pelo Comprova, o autor do tuíte, Izanildo Sabino, afirmou que “haverá 13º salário, mas nem todos receberão, já que houve cortes de bolsas, e são essas famílias que serão atingidas”. Segundo ele, “manipular” nessa frase seria equivalente a “manejar os recursos, sem prever aumento”.
Para o Comprova, enganoso é o conteúdo que confunde ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos
Para esta checagem, levantamos informações sobre o Bolsa Família junto a bases de dados do governo federal. Também entrevistamos o economista Marcelo Neri, diretor da FGV Social, da Fundação Getúlio Vargas, para entender a relevância do 13º para os beneficiários do programa.
A criação do 13º
Duas afirmações do tuíte em questão são falsas. Segundo a publicação, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) “manipula dados dizendo que terá 13º salário” no Bolsa Família. Isso não é verdade. O fato é que, em 2019, o Bolsa Família terá um 13º pagamento, anunciado oficialmente em 15 de outubro, quando o governo assinou a medida provisória que institui o pagamento extra.
Entretanto, até o momento, o benefício só está garantido para 2019, visto que a medida provisória determina o pagamento somente neste ano. O Congresso precisa aprovar o texto em até 120 dias, mesmo que o prazo ultrapasse a data de pagamento. Segundo o governo, os repasses aos beneficiários serão feitos em dezembro.
Quem recebe ainda precisa manter filhos na escola
Também é falso que o governo interrompeu o objetivo do programa de manter a criança na escola. Até agora, o Bolsa Família não sofreu nenhuma alteração neste sentido.
A lei que cria o Bolsa Família deixa expresso que o recebimento do benefício depende de a mãe realizar pré-natal e da presença dos filhos em 85% das aulas na escola, entre outras condições.
Em setembro deste ano, o Ministério da Educação informou que a frequência escolar de estudantes beneficiados pelo Bolsa Família bateu recorde nos meses de junho e julho, chegando a 91%.
Cortes no Bolsa Família
A mesma publicação dizia também que o governo Bolsonaro “cortou” 381 mil beneficiários do Bolsa Família, o que de fato aconteceu em janeiro. No entanto, todos os meses o número de beneficiários varia, para mais ou para menos– e já houve cortes maiores em governos anteriores.
Entre os motivos para esta variação, estão o desligamento voluntário de famílias que não precisam mais do Bolsa Família; o cancelamento do benefício por irregularidades; e a entrada de novas famílias.
A diminuição do número de beneficiários no primeiro mês do governo Bolsonaro correspondeu à quarta maior redução desde janeiro de 2014.
A Flourish chart
As maiores diminuições mensais (2014 a 2019)
Julho de 2017 — 543,4 mil
Novembro de 2016 — 397,4 mil
Abril de 2018 — 392,1 mil
Janeiro de 2019 — 381,9 mil
Considerando os dados de 2014 a setembro de 2019, a maior variação negativa foi em julho de 2017, quando houve diminuição de 543,4 mil beneficiários em relação ao mês anterior.
A segunda maior variação negativa foi em novembro de 2016, em que houve diminuição de 397,4 mil famílias beneficiadas pelo programa.
No começo de novembro de 2016, o governo de Michel Temer anunciou o cancelamento dos benefícios de 469 mil famílias. Além disso, outras 654 mil famílias tiveram seus benefícios bloqueados até que atualizassem seus dados cadastrais, para provar se ainda se enquadravam nos critérios de participação no programa.
Em nota de 7 de novembro de 2016, o extinto Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, hoje incorporado ao Ministério da Cidadania, afirmou que este foi o “maior pente-fino já realizado em toda a história do Bolsa Família”. A partir do cruzamento de diferentes bases de dados, o órgão identificou famílias cuja renda seria superior à exigida para ingresso e permanência no Bolsa Família.
Ainda segundo o ministério, o benefício foi cancelado nos casos em que a renda per capita da família ultrapassou R$ 440. Já o bloqueio, nos casos em que a renda identificada, estaria entre R$ 170 e R$ 440.
A saída de famílias do Bolsa Família pode se dar tanto por opção do próprio beneficiado – neste caso, é o desligamento voluntário – quanto pelo Estado, se for identificado que a família não cumpre ou não se enquadra mais nos requisitos do programa.
Levando em conta os números anuais desde 2004, início do Bolsa Família, 2018 foi o ano com maior registro de beneficiários ao fim do período. O número mais alto antes disso foi em 2013, em que houve 14,09 milhões de famílias beneficiadas.
O 13º do Bolsa Família representa aumento real?
É verdade que o Bolsa Família não terá um aumento real, como alega o tuíte em questão. Na prática, o 13º deve promover um ganho aos beneficiários apenas em relação a 2019, e não um aumento real do valor recebido mensalmente por cada família, o que protegeria o poder de compra com o benefício.
Só um reajuste serviria para mudar o valor pago todo mês aos beneficiários do Bolsa Família. O último reajuste no programa entrou em vigor em julho do ano passado.
A mais recente previsão da inflação pelo Boletim Focus, do Banco Central, foi publicada nesta segunda (21) e aponta para uma alta de 3,26% em 2019, medida pelo IPCA. Se essa previsão se confirmar, a diferença entre o valor total pago no ano aos beneficiários do Bolsa Família com o 13º e sem o 13º será, na prática, equivalente a um ganho de 4,9% frente à inflação pelo IPCA.
Usando como exemplo uma família que recebe R$ 189,21 por mês de Bolsa Família — este foi o valor do benefício médio pago em setembro deste ano —, o 13º fará com que ela receba, somados todos os pagamentos feitos ao longo do ano, um repasse de R$ 2.459,73. Sem o 13º, o pagamento total do ano seria de R$ 2.270,52.
Segundo Marcelo Neri, da FGV, o 13º “vai numa direção correta”, mas não é suficiente para atender aqueles que precisam do Bolsa Família. Para ele, o ideal seria reajustar os valores do programa, já que isso não só aumentaria os pagamentos, mas elevaria o número de pessoas que podem receber o benefício.
Hoje, têm direito ao Bolsa Família as famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza, caracterizadas pela renda familiar mensal per capita [por pessoa] de até R$ 178 e R$ 89, respectivamente, diz o artigo 18 do decreto que regulamenta a lei que cria o programa.
O 13º do Bolsa Família não muda essas faixas de renda. Assim, a falta de um reajuste acaba diminuindo, na prática, o número de pessoas que têm direito a entrar no programa. Isso porque “a renda das pessoas deve ter acompanhado a inflação”, explica Neri.
“Quando você dá o reajuste no Bolsa Família, você sobe o benefício e também sobe o critério de elegibilidade, inclui mais gente no programa”, diz. “Na verdade, estão diminuindo o número de pessoas elegíveis porque não estão reajustando essa barra, esse critério, e estão baixando o valor dos benefícios, com exceção desse ganho, desse 13º. Então, na verdade, o programa está apertando o número de beneficiados.”
O último reajuste do Bolsa Família foi feito em julho de 2018. Naquele mês, o benefício foi aumentado em 5,67%. Os valores pagos pelo programa não são corrigidos anualmente por índices de inflação, como acontece com o salário mínimo e o BPC (Benefício de Prestação Continuada), por exemplo.
Os reajustes no Bolsa Família são dados por decreto presidencial, sem periodicidade definida, e não seguem um índice específico de inflação. Ao divulgar aumentos no valor do benefício em anos anteriores, o próprio governo comparou os reajustes concedidos com diferentes índices de inflação.
Em abril de 2018, o governo anunciou que o reajuste de 5,67% superava o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). Em junho de 2016, o aumento de 12,5% foi comparado ao IPCA em um informe do governo.
A medida provisória que institui o pagamento do 13º do Bolsa Família vale apenas para este ano. Dois dias depois de assiná-la, no entanto, Bolsonaro afirmou que o 13º “está garantido” para os próximos anos, pois “vai entrar” na parte de orçamento da LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social).
Na proposta orçamentária do governo (que ainda tem que ser aprovada no Congresso), as verbas previstas para o programa em 2020 não tiveram acréscimo em relação ao valor reservado em 2019: R$ 29,5 bilhões.
Em abril, o governo assumiu que não reajustaria os valores do programa para pagar o 13º. “Este ano, o reajuste é o 13º salário”, disse naquele mês o ministro da Cidadania, Osmar Terra (MDB).
Quem criou o Bolsa Família?
O post verificado pelo Comprova também diz que o Bolsa Família foi “criado pelo PT”.
De fato, o Bolsa Família como é hoje foi criado por uma lei sancionada no primeiro governo Lula (PT), em 2004. No entanto, o programa nasceu da união de outros programas de assistência social que já existiam: o Bolsa Escola, o Bolsa Alimentação, o Programa Nacional de Acesso à Alimentação (PNAA) e o Auxílio-Gás.
A lei do Bolsa Família deixa claro em seu artigo 1º que o programa “tem por finalidade a unificação dos procedimentos de gestão e execução das ações de transferência de renda do Governo Federal”.
Com exceção do PNAA, implantado em 2003, todos os outros programas que deram origem ao Bolsa Família foram criados entre 2001 e 2002, no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
A publicação verificada foi postada pelo perfil @izanildosabino no Twitter, no dia 15. Até a tarde do dia 22, o post teve quase 800 interações, entre retweets, curtidas e respostas. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-enganosa-publicacao-que-atribui-a-shell-responsabilidade-por-oleo-encontrado-em-praias-do-nordeste/ | COMPROVA | É enganosa publicação que atribui à Shell responsabilidade por óleo encontrado em praias do Nordeste | null | 2019-10-22 | Postagem responsabiliza a companhia pelo petróleo encontrado em praias do Nordeste e cita laudo da UFS, mas pesquisador não chegou a esta conclusão
É enganosa a publicação compartilhada nas redes sociais que atribui à Shell a responsabilidade pelo óleo encontrado nas últimas semanas em praias do Nordeste. Apesar de a petrolífera estar prestando esclarecimentos ao governo sobre barris descobertos em praias de Sergipe e Rio Grande do Norte, não existe hoje qualquer laudo ou outro documento oficial divulgado até a data de publicação desta verificação que atribua responsabilidade dos vazamentos à empresa.
O texto verificado pelo Comprova foi publicado em um site e compartilhado no Facebook e no Twitter em 14 de outubro. O site embasa a acusação com um laudo da Universidade Federal de Sergipe (UFS) sobre o conteúdo de dois barris encontrados em 26 de setembro no município de Barra dos Coqueiros, no litoral sergipano. Segundo a publicação, o laudo indicaria que o “óleo vazado no Nordeste é da Shell, amiga do ministro Sergio Moro (Justiça e da Segurança Pública) e do presidente Jair Bolsonaro (PSL)”.
Procurado pelo Comprova, no entanto, o técnico responsável pelo laudo negou a informação. Conforme explica [aqui e aqui] o professor Alberto Wisniewski Júnior, do Departamento de Química da UFS, o laudo da instituição foi repassado ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e apenas não descarta a hipótese de os barris, que foram encontrados com o logo da Shell, estarem associados ao evento que levou ao vazamento de óleo.
Wisniewski destaca que há indícios de que os contêineres foram reutilizados, por isso ainda não se pode relacionar o óleo dos vazamentos com a Shell.
Segundo o sócio-fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires, há grande probabilidade de que o material caiu ou foi lançado ao mar no mesmo acontecimento que provocou o vazamento – seja ele um naufrágio ou outra eventualidade.
O único outro laudo oficial divulgado até agora sobre os barris, elaborado pela Marinha do Brasil, também aponta que o “conteúdo desses contêineres difere do encontrado nas demais praias do litoral nordestino”. Diretor-presidente da Administração Estadual do Meio Ambiente de Sergipe (Adema), Gilvan Dias também apontou a não existência de provas que possibilitem responsabilizar a Shell pelos vazamentos.
O Comprova verificou postagens da página Esquerda Diário no Facebook e no Twitter. Os links publicados nas redes sociais direcionavam para um texto publicado no site do Esquerda Diário, que foi retirada do ar na tarde da segunda-feira, 14 de outubro. No mesmo dia, o site republicou o conteúdo, com outro título, mas também afirmando que há vínculo entre parte da poluição e os barris da Shell. As publicações nas redes sociais permaneceram inalteradas até o fechamento desta verificação.
Enganoso para o Comprova é o conteúdo que confunde ou que seja divulgado para confundir.
Como verificamos
Para verificar a publicação, o Comprova utilizou, inicialmente, a ferramenta de busca reversa do Google para localizar a foto que acompanha as postagens. A ideia era verificar a existência de imagens anteriores ou em outro contexto e, então, atestar sua veracidade. A pesquisa levou os verificadores a uma nota oficial do Governo de Sergipe, de 26 de setembro, registrando a descoberta dos barris.
Depois de descobrir o contexto por trás da história, procuramos todos os órgãos envolvidos no caso, como a Universidade Federal de Sergipe (UFS), a Marinha do Brasil e a Administração Estadual do Meio Ambiente de Sergipe (Adema). Dados da UFS foram obtidos por meio de uma conversa em aplicativo de mensagens com o professor Alberto Wisniewski Júnior. Já a nota da Marinha está divulgada em uma página da instituição sobre o caso do óleo no Nordeste.
Também foram enviados questionamentos sobre o caso ao Ibama e ao Ministério do Meio Ambiente (MMA). Nenhum dos e-mails, no entanto, foi respondido. O Comprova buscou ainda a série histórica do preço do petróleo no site Investing.
O óleo dos barris é o mesmo encontrado nas praias?
Não. O link divulgado nas redes sociais direcionava o leitor para uma reportagem publicada no site Esquerda Diário. A publicação foi removida do site em 14 de outubro. No texto, a denúncia contra a Shell era baseada na informação de que o conteúdo dos barris descobertos em Sergipe seria o mesmo que foi encontrado nas praias do Nordeste. Segundo o site, tal afirmação estaria presente no laudo da UFS, em tese que contraria documento da Marinha sobre o caso.
O Comprova enviou o material para o professor Alberto Wisniewski, que negou a tese. “Essa informação, da forma como está, é equivocada. Isso não foi afirmado. São produtos com diferentes aspectos físico-químicos, porém com indícios a nível molecular de que tenham relação de origem”, diz.
A informação de que o conteúdo dos barris seria o mesmo óleo encontrado nas praias nordestinas circula desde 12 de outubro, em publicação do blog de Diogo Schelp no UOL. Na tarde de 18 de outubro, no entanto, o mesmo blog publicou outra matéria retificando a informação.
A informação falsa sobre o conteúdo dos barris chegou a ser repercutida pelo próprio ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente), que em 11 de outubro pediu que o Ibama cobrasse explicações da Shell sobre o caso. Alguns dias depois, em 16 de outubro, Salles voltou atrás da acusação em visita feita ao Departamento de Química da UFS. Na ocasião, ele destacou não haver divergência entre o laudo produzido pela universidade e o documento feito pela Marinha, e destacou que os dois órgãos estão “trabalhando em conjunto”.
Em 17 de outubro, a Shell divulgou nota dizendo que o conteúdo original das embalagens com a marca da empresa encontrados em praias do Sergipe não possui relação com o óleo cru presente no litoral do Nordeste. Segundo a empresa, os barris são embalagens de Argina S3 30, um lubrificante para embarcações, de lote não produzido no Brasil. “A coloração e as características do produto em questão são bem diferentes do óleo cru encontrado nas praias”, diz a empresa.
A Shell também destaca que não transporta óleo cru em rotas transatlânticas e que o adesivo em um dos tambores encontrados em Sergipe traz a data de 17 de fevereiro de 2019, enquanto as manchas de óleo cru começaram a surgir no litoral apenas em setembro deste ano. “Os fatos apontam para uma possível reutilização da embalagem em questão – reutilização esta que não foi feita pela Shell”, afirma a nota.
A mesma tese é reforçada pelo diretor-presidente da Administração Estadual do Meio Ambiente de Sergipe (Adema), Gilvan Dias. “Todo mundo sabe que esses barris são reutilizáveis, isso é comum. A pessoa compra o barril e depois usa para outra coisa e reaproveita uma, duas, várias vezes”, disse, concluindo, portanto, que não se pode responsabilizar a empresa no caso. “O ideal é que se deixe a investigação prosseguir”, diz.
Apesar disso, a Shell ainda presta esclarecimentos ao governo sobre os barris encontrados em praias do Nordeste. Em 17 de outubro, outro tambor com a marca da empresa foi encontrado pela Marinha em Rio Grande do Norte. O barril, que estava fechado e não apresentava sinais de vazamento, já foi encaminhado para análise.
A Shell realmente é “amiga de Moro e Bolsonaro”?
A publicação original do Esquerda Diário acusava ainda a Shell de ser “amiga de Moro e Bolsonaro” e de ter se beneficiado com “o golpe e a Operação Lava Jato” na “entrega a preço de banana do petróleo brasileiro”. A associação parece partir do fato de a Shell ter sido uma das maiores vencedoras nos leilões do pré-sal feitos no governo Michel Temer (MDB), em 2017 e em 2018, após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
A publicação sugere, portanto, uma relação de causa e efeito entre a Lava Jato e o impeachment da petista com a venda dos lotes do pré-sal para exploração de petróleo, embora não apresente provas dessa acusação ou de que o interesse da Shell pelo petróleo brasileiro tenha qualquer relação com o esquema de corrupção revelado na Petrobras.
A vitória da Shell nos leilões também não é surpreendente, visto que a empresa é hoje uma das maiores companhias do ramo no mundo, segundo a Forbes. Além disso, a multinacional obteve vitórias semelhantes em outros leilões recentes, em países como Argentina, México e Egito. Até mesmo o leilão do campo de Libra, realizado 2013 ainda pelo governo Dilma Rousseff, teve a Shell entre os vencedores.
Ao Comprova, a Shell disse por e-mail que “não mantém e nunca teve relação institucional próxima com o ministro Sergio Moro, e jamais teve qualquer relação com a operação Lava Jato”.
O petróleo brasileiro está sendo entregue a “preço de banana”?
Essa afirmação, presente no texto, também parece oriunda da tese de cooperação entre as empresas petrolíferas e os defensores do impeachment de Dilma Rousseff. Mais uma vez, a acusação é feita sem qualquer tipo de evidência que suporte a acusação. O Comprova fez uma verificação sobre os leilões do petróleo brasileiro.
Observando os valores dos últimos leilões realizados pelo governo de lotes do pré-sal, não há muita diferença nos valores obtidos em concessões semelhantes feitas durante os governos petistas.
Já o petróleo em si é uma commodity, ou seja, está entre o grupo de produtos que têm preço definido pelo mercado internacional. O valor de cada barril sofre influência de vários fatores, como, por exemplo, produção de petróleo mundial (quanto tem disponível no mercado e se isso vai ser suficiente para suprir a demanda) e o preço do dólar.
Existem duas cotações para o preço do petróleo: o Brent e o WTI. O Brent é o tipo de petróleo que é mais usado como referência. É negociado na bolsa de Londres e é referente ao petróleo extraído no mar do norte. Já o WTI é negócio na bolsa americana e é referente ao petróleo extraído principalmente no golfo do México.
O site Investing reúne a série histórica do Brent (veja aqui) de novembro de 2017 a outubro 2019. É possível perceber que não houve grande variação nos preços mensais nesse período. O valor médio do barril foi de R$ 68,17.
Os ministros realmente atacaram a Venezuela com relação ao petróleo?
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou no dia 9 de outubro que o óleo visto em praias do Nordeste era, “muito provavelmente”, da Venezuela. Depois disso, o governo venezuelano divulgou uma nota oficial em que chamava Salles de “tendencioso”. Após a declaração de Salles, viralizou uma publicação enganosa cuja legenda dizia que um vídeo mostrava um navio venezuelano despejando petróleo no Nordeste brasileiro, mas o Comprova verificou que se trata de imagens gravadas em Portugal.
Na manhã do dia 10 de outubro, o presidente Jair Bolsonaro chegou a dizer, durante o Fórum de Investimentos Brasil 2019, em São Paulo, que o derramamento de óleo no litoral do Nordeste brasileiro tinha sido criminoso. No mesmo evento, o próprio Bolsonaro afirmou que não tinha bola de cristal para apontar quem era o responsável pelo “ato criminoso”.
No mesmo dia, o ministro da Defesa, Fernando Azevedo, disse que a origem do óleo estava sendo apurada e que o vazamento pode ter sido um “incidente ou acidente”, mas que tinha que ter sido comunicado ao Brasil.
O vice-presidente Hamilton Mourão disse que embarcações “fantasmas” – sem autorização legal para navegar na costa brasileira e que às vezes fazem contrabando de mercadorias – podem estar envolvidas no despejo de óleo no mar. A declaração foi feita no dia 11 de outubro, em Roma.
Ainda não se sabe as causas do derramamento de óleo no litoral do Nordeste.
Análises do Ibama e da UFBA (Universidade Federal da Bahia) indicam que o material seria similar ao extraído na Venezuela. No entanto, ainda não foi comprovado que o vazamento do óleo foi mesmo provocado pelo país vizinho, nem se o vazamento foi intencional.
Quais foram as providências tomadas pela Justiça? Foi estipulada mesmo uma multa?
Em 12 de outubro, a 1ª Vara da Justiça Federal de Sergipe concedeu uma liminar em que determinava que o governo federal e o Ibama tomassem providências em um prazo de 48h para criar uma barreira marítima a fim de proteger os rios de Sergipe – São Francisco, Japaratuba, Sergipe, Vaza-Barris e Real. A multa, em caso de descumprimento da ordem judicial, é de R$ 100 mil ao dia.
Na decisão, o juiz plantonista Fábio Cordeiro de Lima destaca que é “fundamental proteger a cabeceira dos rios para que não haja uma maior contaminação das águas, principalmente dos rios utilizados para o consumo da população” e autoriza que o Poder Executivo remaneje verbas do orçamento e dispense licitações para a aquisição dos equipamentos necessários ao cumprimento da decisão, desde que observado o preço do mercado. Ele não menciona, no entanto, “interesses entreguistas” de ministros, a serviço dos EUA –- como sugere a postagem do Esquerda Diário – como uma motivação para conceder a liminar.
Após os comentários, o juiz acatou em partes o pedido que havia sido feito pelo Ministério Público Federal (MPF) em Sergipe. Na petição original, a Procuradoria solicitava que as medidas fossem tomadas em 24 horas, sob multa diária de R$ 1 milhão em caso de descumprimento. O foco da ação era proteger áreas sensíveis de mangue e da foz do Rio São Francisco.
O governo de Sergipe instalou as barreiras em 11 de outubro, após reunião do gabinete de crise do governo do estado.
Uma decisão semelhante foi tomada pela Justiça Federal em Pernambuco no domingo, 20.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
O texto verificado foi publicado na página “Esquerda Diário” no Facebook, em 14 de outubro, e teve 7,1 mil compartilhamentos e 1,5 mil curtidas até a tarde de 21 de outubro. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/brasileiros-preencheram-todas-as-vagas-antes-ocupadas-por-cubanos-no-mais-medicos-mas-a-desistencia-e-alta/ | COMPROVA | Brasileiros preencheram todas as vagas antes ocupadas por cubanos no Mais Médicos, mas a desistência é alta | null | 2019-10-22 | As 8,5 mil vagas que ficaram em aberto com a saída dos médicos cubanos foram preenchidas após dois editais no ano passado. O alto índice de desistências, porém, fez com que o governo abrisse nova seleção para suprir 2,1 mil postos vagos em maio deste ano
São enganosas as informações de um tuíte publicado no dia 12 de outubro alegando que 80% das vagas deixadas pelos cubanos no Mais Médicos não foram preenchidas por médicos brasileiros. O programa do governo federal, que chegou a ter 18.337 médicos atuantes em mais de 3,6 mil municípios brasileiros, conta atualmente com 15.003 profissionais. Desde a saída de Cuba do programa, em novembro de 2018, foram abertos três editais para suprir o quadro de vagas em municípios eleitos como prioritários.
O fim da parceria com Cuba deixou cerca de 8,5 mil vagas abertas. O Ministério da Saúde abriu uma primeira seleção com 8.517 vagas ainda em novembro, que teve 7.120 postos preenchidos e uma segunda com 1.397 vagas remanescentes em dezembro. De acordo com o governo, após esse segundo edital, todas as vagas deixadas por cubanos foram preenchidas por brasileiros com registro no Conselho Regional de Medicina (CRM) ou graduados no exterior.
No entanto, conforme apurou o Comprova, a alta rotatividade dos profissionais brasileiros dentro do programa fez com que muitas cidades ficassem sem médicos. Em maio de 2019, um novo edital foi aberto, com 2.149 vagas em 1.130 municípios que ficam em áreas consideradas vulneráveis ou de extrema pobreza, diante das desistências e casos como fim de contratos. Ao G1, o Ministério da Saúde informou que 1.325 profissionais com registro profissional brasileiro se desligaram do programa até o final de maio.
Se levarmos em conta essas 2,1 mil vagas abertas em maio após a desistência de profissionais brasileiros, o percentual correto de vagas não ocupadas por médicos locais seria de 25%, ou seja, 75% dos postos iniciais foram preenchidos e não ficaram ‘vagos’, como apontado no tuíte. O Ministério da Saúde, porém, não forneceu dados atuais de desistências e vagas em aberto no Mais Médicos nem se há a previsão de novos editais.
Em agosto, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) editou uma Medida Provisória reformulando o programa para que o Mais Médicos seja substituído pelo Médicos pelo Brasil. Com ele, serão supridas apenas vagas abertas em locais mais distantes e de difícil acesso. As demais serão fechadas.
O Comprova verificou o conteúdo de uma publicação feita em 12 de outubro no perfil @orlandoguerreir no Twitter.
Enganoso para o Comprova é o conteúdo que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos
A equipe do Comprova procurou o Ministério da Saúde por e-mail e solicitou dados atualizados sobre a quantidade de vagas que ficaram em aberto após a saída dos médicos cubanos e quantas já foram preenchidas desde então. A pasta informou as vagas abertas após a saída de Cuba, disponível também no edital, e o número de médicos que atuam no programa atualmente. Os outros dados solicitados, entre eles o número de desistências, não foram enviados.
Também procuramos dados sobre o número de médicos cubanos no país no site do Sistema Integrado de Informação Mais Médicos (SIMM), mantido pela pasta e pela Organização Panamericana de Saúde (OPAS).
O Comprova ouviu, sobre a dificuldade da permanência de médicos em áreas mais afastadas de centros urbanos, Carlos Eduardo Aguilera Campos, professor e pesquisador da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e Luis Eugênio de Souza, professor do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Foi entrevistado ainda o presidente do Conselho de Secretários Municipais de Saúde do Amazonas (Cosems), Januário Neto.
Além disso, entramos em contato com o autor da publicação no Twitter, que enviou links de agências de notícias como possíveis fontes da informação. Nenhum deles, porém, atestava o dado de 80% de vagas desocupadas.
Saída dos médicos cubanos aconteceu após declarações de Bolsonaro
O governo cubano anunciou a saída do programa Mais Médicos em 14 de novembro de 2018, após declarações do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), que criticou os profissionais cubanos diversas vezes durante a campanha eleitoral e afirmou, por exemplo, que iria “usar o Revalida para expulsar os cubanos do Brasil”.
O governo de Cuba considerou “inaceitáveis” as mudanças como a exigência de revalidação de diplomas obtidos em Cuba. Ao anunciar o fim da parceria, o governo cubano criticou Bolsonaro e afirmou que o acordo com a OPAS foi desrespeitado. “Não é aceitável que se questione a dignidade, o profissionalismo e o altruísmo dos colaboradores cubanos que, com o apoio das suas famílias, prestam serviços atualmente em 67 países”, afirmou em nota. A administração da ilha definiu que todos os profissionais deveriam deixar o Brasil entre 25 de novembro e 25 de dezembro de 2018.
Em resposta a Cuba, pelo Twitter, Bolsonaro disse que “além de explorar seus cidadãos ao não pagar integralmente os salários dos profissionais, a ditadura cubana demonstra grande irresponsabilidade”. Pelo acordo firmado entre a OPAS, a União Federal brasileira e o governo cubano, eram pagos aos profissionais cubanos um salário de R$ 11.520 — sendo que desses cerca de R$ 3 mil ficavam de fato com os médicos, valor que chegou a ser mencionado pelo ex-ministro da Saúde do governo Dilma Arthur Chioro. O restante era remetido à OPAS, que ficava com 10% desse total e repassava a maior parcela para o governo de Cuba.
Com a saída desses profissionais, 8.517 vagas ficaram desocupadas e o governo lançou um edital para o preenchimento. Das posições em aberto, 7.120 foram preenchidas no primeiro edital e outras 1.397 remanescentes no segundo, ambos lançados ainda em 2018. Somando as duas seleções, o Ministério da Saúde afirma que as vagas deixadas pelos cubanos foram 100% ocupadas por médicos brasileiros com CRM ou por profissionais brasileiros formados no exterior, que ainda não passaram pelo Revalida (exame necessário para que médicos formados no exterior obtenham o registro para atuar no Brasil).
Devido a desistências de médicos brasileiros e fatores como o fim de contratos, um terceiro edital foi aberto em maio de 2019 com cerca de 2 mil vagas a serem preenchidas. A pasta explicou, por telefone, que estes editais são abertos quando um número “considerável” de médicos deixa o programa ou quando seus contratos são finalizados. Contudo, não especificou a quantidade mínima de vagas que precisam ser abertas para que um novo edital seja convocado.
Reportagem do Estadão na data da saída de Cuba mostrou que havia no programa Mais Médicos 18.240 profissionais — sendo 8.332 cubanos. De acordo com o jornal, os dados foram fornecidos pelo governo brasileiro na época. Ainda nesta matéria, o governo cubano disse que seus médicos atuavam em 4.058 municípios, cobrindo 73% das cidades brasileiras.
Programa enfrenta dificuldade de manter médicos fora das grandes cidades
O Ministério da Saúde não informou quantos dos 2,1 mil postos que ficaram vagos entre dezembro e maio foram preenchidos e o índice de permanência dos médicos até outubro. A pasta enfatizou, no entanto, que a reposição dos profissionais tem sido em municípios com perfis de maior vulnerabilidade e áreas indígenas.
De acordo com o professor Carlos Eduardo Aguilera Campos, da Faculdade de Medicina da UFRJ, é um desafio manter os médicos principalmente em municípios localizados fora dos centros urbanos. “Como o corte de classe dos médicos é da classe média-alta, existem poucos com origem ou identificação com estas realidades nacionais”, afirmou.
Ao Comprova, Campos comentou ainda que os médicos cubanos tinham uma identificação com o programa. “Os cubanos, pela sua história e pela missão que estavam desempenhando, não se importavam se estavam trabalhando no município de São Paulo ou na Ilha de Marajó. Os brasileiros que aderiram ao Mais Médicos são em sua maioria recém-formados e, pela própria natureza do programa, são vinculados por período limitado.”
O professor Luís Eugênio de Souza, da UFBA, concorda que a desigualdade na distribuição de riquezas entre as regiões do país é uma das causas da dificuldade para que os médicos permaneçam nesses municípios. “Os médicos, como todas as pessoas, em geral, buscam viver e trabalhar onde há melhores condições de infraestrutura urbana, incluindo habitação, saneamento, escola, lazer, segurança pública, etc”, disse. “No Brasil, como em muitos países do mundo, as melhores condições de vida se concentram nos centros das grandes cidades”.
O Amazonas tem diversos municípios em áreas consideradas vulneráveis. Ao Comprova, o presidente do Conselho de Secretários Municipais de Saúde do Estado (Cosems), Januário Neto, disse que o último edital do programa preencheu 40 vagas para 23 municípios no Estado. Januário ressaltou que as vagas que ainda precisam ser preenchidas no Amazonas são em territórios indígenas, onde os médicos ainda não se apresentaram. Segundo ele, cerca de 95% das vagas foram ocupadas por médicos brasileiros, a maioria com formação fora do Brasil.
Mais médicos foi criado para enfrentar dificuldade em municípios afastados
O programa Mais Médicos foi criado em 2013, ainda no governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), tendo como um dos objetivos suprir a carência desses profissionais nos municípios do interior e nas periferias das grandes cidades. Além de cubanos, o programa ainda contava, desde o início, com profissionais brasileiros e de outros países que se inscreveram.
De acordo com um levantamento do Sistema Integrado de Informação Mais Médicos (SIMM), mantido pelo Ministério da Saúde e pela Organização Panamericana de Saúde (OPAS), o número de médicos cubanos no Brasil, em dezembro de 2014, chegou a 11.185 profissionais.
Desde dezembro de 2015, a quantidade de médicos vem caindo gradativamente. O último levantamento, compilado em dezembro de 2018, contabilizava 8.222 médicos cubanos no país, que se dividiam em 2.818 municípios e em 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI).
Segundo a OPAS, três eixos compõem o Mais Médicos: o primeiro prevê a melhoria da infraestrutura nos serviços de saúde; o segundo se refere ao provimento emergencial de médicos, tanto brasileiros (formados dentro ou fora do país) quanto estrangeiros (intercambistas individuais ou mobilizados por meio dos acordos com a OPAS); e o terceiro eixo é direcionado à ampliação de vagas nos cursos de medicina e nas residências médicas, com mudança nos currículos de formação para melhorar a qualidade da atenção à saúde.
O salário bruto (pago como uma bolsa, sem descontos) inicialmente era de R$ 11.865,60 e o líquido de R$ 11.244,56. Contudo, no caso dos médicos cubanos, o valor era repassado para a OPAS, que o distribuía: 75% era retido pela OPAS (dessa parte, 10% ficava com a organização e 90% ia para o governo de Cuba), e apenas 25% retornava para os profissionais, o que se repetia em outras missões. O contrato de trabalho tinha duração de 36 meses, com possibilidade de prolongamento.
Participação de estrangeiros no Mais Médicos provoca embates desde o início
O programa, que foi considerado a maior bandeira política para a reeleição de Dilma (PT) em 2014, foi implantado em agosto de 2013, dias depois de o país viver o ápice das manifestações contra o governo que tomaram as ruas entre junho e julho, motivadas inicialmente pelo aumento das passagens de ônibus.
Desde o início da implantação do Mais Médicos, governo e oposição divergiram quanto à forma de registro provisório dos profissionais vindos do exterior para o programa. Na forma como foi aprovado pela Câmara dos Deputados, o texto do projeto (PLV 26/2013) transferia ao Ministério da Saúde a incumbência de fazer o registro dos médicos estrangeiros inscritos. Apenas a fiscalização do trabalho dos participantes continuaria sendo feita pelos CRMs, e os profissionais estrangeiros não poderiam exercer a medicina fora das atividades do Mais Médicos.
Em 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a ausência de revalidação de diplomas no programa é constitucional.
Bolsonaro criou um novo programa, o Médicos pelo Brasil
Em agosto deste ano, o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, anunciaram um novo programa para substituir o Mais Médicos após o fim dos contratos da política atual. Batizado de Médicos pelo Brasil, o projeto traz novo critério para distribuição de vagas entre os municípios e novas regras para seleção dos profissionais. A principal mudança é a contratação de médicos pelo regime de Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Na época do anúncio, o governo disse que o programa teria 18 mil vagas, das quais cerca de 13 mil em cidades com dificuldade de acesso a médicos. A proposta, definida por Medida Provisória e que dependerá de aval do Congresso, prevê a criação de uma carreira e uma agência reguladora, além de salários de até R$ 31 mil no futuro, graças a bonificações.
O projeto, que está em discussão na Comissão Mista da Medida Provisória n° 890, de 2019, precisa ser aprovado pelo Congresso até 28 de novembro — data em que a MP perde a validade — e, posteriormente, sancionado pelo presidente da República.
Sobre a permanência de profissionais estrangeiros do Mais Médicos, o ministro explicou que, neste momento, só trabalharão aqueles que revalidaram diploma.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
O texto verificado foi publicado no Twitter pela conta @orlandoguerreir em 12 de outubro e, até o dia 21, o conteúdo tinha mais de 2 mil interações.
O Comprova identificou ainda outras publicações de menor viralização fazendo a mesma afirmação. Os boatos circulam desde novembro de 2018. Um dos tuítes, da conta @VictorNassif, recebeu mais de 500 interações e foi publicado no dia 4 de maio.
O Estadão Verifica, que faz parte do Comprova, e o Boatos.org também realizaram verificações sobre boatos envolvendo o Mais Médicos. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-governo-de-pernambuco-tenha-copiado-de-bolsonaro-13o-do-bolsa-familia/ | COMPROVA | É falso que Governo de Pernambuco tenha copiado de Bolsonaro 13º do Bolsa Família | null | 2019-10-18 | O governador de Pernambuco, Paulo Câmara, anunciou em agosto de 2018 a criação de um programa para pagar uma parcela extra a beneficiários do Bolsa Família. Ideia do governo Jair Bolsonaro foi divulgada em outubro daquele ano. No Estado, serão pagos os dois benefícios.
É falsa uma publicação do perfil @Bolsoneas no Twitter que acusa o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), de ser “cara de pau” por promover uma campanha publicitária no estado sobre o pagamento de uma décima terceira parcela a beneficiários do Bolsa Família. Na verdade, há dois programas: um estadual, anunciado por Câmara em agosto de 2018, e um federal, proposto pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) dois meses depois. Na prática, os pernambucanos receberão o pagamento extra duas vezes.
O autor do tuíte é apoiador de Bolsonaro, a quem o governador faz oposição. O post usa duas fotos de peças publicitárias usadas entre 21 e 30 de setembro pela gestão do Estado para promover o programa, uma em ônibus e outra em outdoor.
Por e-mail, a Secretaria de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude, responsável pelo 13º do Bolsa Família em Pernambuco, confirmou que é o mesmo material produzido para a campanha. O Comprova não localizou as fotos originais.
O próprio presidente fez uma publicação criticando Paulo Câmara no dia 18 de outubro, em que usa um vídeo gravado por um apoiador pernambucano e acusa o governador de Pernambuco de “desonestidade” e de ser “o espertalhão da vez”. O governador usou o Twitter para responder, enfatizou que apresentou a proposta antes de Bolsonaro e cobrou soluções do presidente em relação às manchas de óleo que se espalham no litoral do Nordeste (o Comprova já fez uma verificação sobre o assunto).
O Comprova verificou uma postagem feita no dia 16 de outubro pelo perfil @Bolsoneas no Twitter.
Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
Para esta verificação, o Comprova entrou em contato com a Secretaria de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude do Governo de Pernambuco para consultar informações sobre o 13º do Bolsa Família no Estado e a campanha publicitária para promover o programa. O Ministério da Cidadania forneceu dados sobre o Bolsa Família.
Para tentar chegar às imagens originais, também procuramos o autor da publicação pelo endereço de e-mail fornecido na página de Facebook, que tem o mesmo nome, foto de perfil e e-mails do Instagram, mas não obtivemos resposta. O Comprova fez tentativas de localizá-las através da ferramenta de busca reversa de imagens do Google e não foram encontrados registros anteriores das fotos usadas no post.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
13º do Bolsa Família em Pernambuco virou lei em 2018
O benefício estadual é anterior ao nacional. O 13º do Bolsa Família para os pernambucanos foi anunciado por Paulo Câmara em 28 de agosto de 2018, durante um debate entre os candidatos ao Governo do Estado promovido pela Rádio Jornal.
Já a proposta da chapa de Bolsonaro foi de 10 de outubro, três dias após o primeiro turno. O presidente afirmou em uma transmissão ao vivo na sua página no Facebook que a proposta foi do hoje vice-presidente da República, Hamilton Mourão (PRTB).
Na prática, como são programas diferentes, os beneficiários de Pernambuco receberão a parcela extra duas vezes. Primeiro, em dezembro deste ano, será pago o do governo federal. Em 2020, o estadual.
Apesar disso, o programa pernambucano foi instituído antes. O projeto de lei para a criação da chamada Nota Fiscal Solidária foi enviado pelo Governo de Pernambuco para a Assembleia Legislativa em 10 de novembro de 2018 e aprovado pelos deputados no dia 26 do mesmo mês.
Inicialmente, a proposta era de condicionar o pagamento da parcela extra do Bolsa Família a compras feitas por beneficiários com nota fiscal, em que eles teriam que registrar o CPF. O abono seria pago por meio de “créditos”: os beneficiários receberiam 2,5% do que consumissem. Com isso, para alcançar o teto de R$ 150, teriam que gastar R$ 6 mil por ano. Após críticas da oposição ao valor exigido e à necessidade de serem compras com nota fiscal, desconsiderando as que são feitas em feiras livres por exemplo, ainda em novembro do ano passado, Paulo Câmara aumentou o percentual para 5%, reduzindo os gastos anuais necessários para R$ 3 mil. Além disso, para financiar o programa, houve um aumento no ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre alguns produtos.
Em março, quando as notas começaram a ser contabilizadas, houve um novo recuo do governo estadual. Com a mudança, o 13º do Bolsa Família em Pernambuco passou a atender a todos os beneficiários do programa. Uma nova alteração no projeto foi aprovada no dia 25 de setembro de 2019.
A campanha publicitária usada no tuíte circulou, de acordo com o governo estadual, entre os dias 21 e 30 de setembro, em diversas plataformas, como rádio, televisão, jornais e mídia exterior.
O telefone para contato que aparece ao lado da marca do Governo de Pernambuco nas imagens (0800.081.4421) é da Ouvidoria da Secretaria de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude, que coordena a execução do 13º do Bolsa Família no Estado. Segundo o site da pasta, este é “um canal direto com a população para reclamações, sugestões, denúncias, elogios e solicitação de informação quanto aos serviços públicos prestados”.
Como funciona o 13º do Bolsa Família em Pernambuco
Pelas regras atuais, em Pernambuco, quem recebe até R$ 150 tem direito de receber o mesmo valor do benefício. Por exemplo: quem tem o chamado benefício básico, no valor de R$ 89, receberá do governo mais R$ 89.
Através do programa estadual, o valor poderá chegar a R$ 150 se o beneficiário juntar, entre 29 de março de 2019 e 31 de janeiro de 2020, notas fiscais das compras de um grupo de produtos estabelecido por lei, como medicamentos, vestuário, calçados, produtos de higiene pessoal e limpeza. Para que sejam contabilizadas, as notas devem incluir o CPF dos beneficiários.
O pagamento será feito de acordo com a data de aniversário, seguindo um calendário já divulgado pelo governo estadual. Receberão em fevereiro de 2020 os que fazem aniversário entre janeiro e abril. Haverá mais duas parcelas em março e abril do próximo ano.
A publicação verificada pelo Comprova acerta o número de beneficiários do programa em Pernambuco. No Estado, são 1.148.715, segundo o Ministério da Cidadania, pasta do governo federal responsável pelo programa. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população pernambucana é de 9.557.071 habitantes. Em setembro de 2019, o benefício médio no Estado era de R$ 184,59.
Pernambuco não foi pioneiro no 13º do Bolsa Família
Na Paraíba, um abono natalino começou a ser pago aos beneficiários do Bolsa Família na gestão do ex-governador Ricardo Coutinho (PSB). No dia 16 de outubro, foi aprovado na Assembleia Legislativa um projeto do sucessor dele, João Azevêdo (PSB), para dobrar o valor do pagamento, que deve passar de R$ 32 para R$ 64.
Em 2017, o ex-senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que é paraibano, apresentou um projeto de lei para conceder o benefício em todo o país. A proposta foi arquivada com o fim da legislatura, no ano passado.
13º do Bolsa Família de Bolsonaro vale em 2019
Em 15 de outubro de 2019, Bolsonaro assinou uma Medida Provisória que garante o pagamento do 13º aos beneficiários do Bolsa Família. A medida, publicada no Diário Oficial de 16 de outubro, prevê que o pagamento, chamado de ‘abono natalino’, deverá acontecer em dezembro e está garantido, em princípio, apenas para este ano. Segundo a publicação no Diário Oficial, o pagamento do mês de dezembro será feito em dobro. O 13º destinará R$ 2,58 bilhões para as 13,5 milhões de famílias beneficiadas atualmente.
O Programa Bolsa Família foi criado como Medida Provisória em 2003 no primeiro mandato do ex-presidente Lula e oficializado como lei em janeiro de 2004. O objetivo do programa era combater a miséria e a pobreza extrema ajudando financeiramente famílias pobres que possuíam renda per capita de até R$ 178 e que tivessem em sua composição gestantes e crianças ou adolescentes entre 0 e 17 anos. Em todo o país, as famílias atendidas pelo programa recebem benefícios que começam em R$ 41, podendo chegar a R$ 205. Em contrapartida, os beneficiários devem manter as crianças e adolescentes entre 6 e 17 anos matriculadas na escola; fazer acompanhamento de saúde das gestantes e manter a vacinação das crianças e das gestantes em dia.
Em setembro, o presidente Jair Bolsonaro anunciou uma redução no orçamento de programas voltados para a camada mais pobre da população, incluindo o Minha Casa, Minha Vida, o FIES e o Bolsa Família. Para 2020, o Bolsa Família terá o mesmo orçamento de de 2019, R$ 30 bilhões. Com isso, não haverá correção nos valores devido à inflação e o valor real dos benefícios será menor. Além disso, o governo considerou que o projeto vai beneficiar 13,2 milhões de famílias no ano que vem, número menor do que as 13,5 milhões de beneficiadas atuais.
Governadores do Nordeste fazem oposição a Bolsonaro
Bolsonaro não foi o candidato mais votado nas eleições presidenciais no Nordeste no primeiro e no segundo turno, e todos os estados da região elegeram governadores de partidos de oposição ao então candidato a presidente. Em julho, Bolsonaro usou o termo “paraíba” para se referir aos nordestinos ao criticar os governadores, que reagiram nas redes sociais.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
A publicação foi feita pelo perfil @Bolsoneas no Twitter no dia 16 de outubro. Até o dia 18, tinha 1,9 mil curtidas e 798 retweets. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/atraso-de-entrada-do-brasil-na-ocde-nao-tem-relacao-com-retrocessos-no-combate-a-corrupcao/ | COMPROVA | Atraso de entrada do Brasil na OCDE não tem relação com “retrocessos no combate à corrupção” | null | 2019-10-15 | Para atacar Toffoli, post relaciona carta em que o governo dos EUA manifesta apoio ao ingresso apenas de Argentina e Romênia na OCDE com a visita de Comissão Antissuborno ao país. A carta, porém, é anterior à decisão sobre o envio da missão.
Uma publicação no Facebook que viralizou afirma que “o real motivo do adiamento da entrada do Brasil na OCDE” seria a decisão da Comissão Antissuborno da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) de enviar uma missão ao Brasil para acompanhar “retrocessos na área de combate à corrupção”.
Na foto da publicação está o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, com a frase “Parabéns, Toffoli! Brasil pode ficar de fora da OCDE por retrocessos no combate à corrupção”.
Os dois fatos, no entanto, não estão relacionados. A carta em que o governo dos Estados Unidos apoia apenas o ingresso de Argentina e Romênia no grupo — que motivou o entendimento de que a entrada no Brasil na OCDE não ocorrerá tão cedo — é do dia 28 agosto (mas veio a público em 10 de outubro).
O encontro do Grupo de Trabalho sobre Suborno em Transações Comerciais Internacionais da OCDE, em que a decisão teria sido tomada, ocorreu entre os dias 8 e 10 de outubro, em Paris. Compete ao grupo monitorar a Convenção Antissuborno, da qual o Brasil é um dos países signatários.
A publicação enganosa utiliza um texto do jornalista Guilherme Amado, da revista Época, publicado na última quinta (10), que divulga decisão da “Comissão Antissuborno da OCDE”. No entanto, ela ignora o trecho em que o jornalista afirma que a medida “não tem relação com a decisão dos Estados Unidos de não apoiarem a entrada do Brasil na OCDE”.
A publicação viralizada utiliza o trecho abaixo, do texto da Época, para imputar a Toffolli o adiamento da entrada do Brasil do grupo.
“Entre os fatores que levaram o Brasil a receber a advertência está o inquérito das fake news do STF, a decisão de Dias Toffoli que, ao beneficiar Flávio Bolsonaro, limitou as atividades do Coaf e da Receita Federal, a Lei de Abuso de Autoridade e a intervenção política no combate à corrupção”, diz o texto.
Textos do jornal Folha de S.Paulo e do site O Antagonista também noticiaram a decisão, que ainda não foi divulgada oficialmente pelo grupo de trabalho da OCDE. Procurado pelo Comprova, o grupo de trabalho não respondeu.
Ainda que se confirme o envio da missão pelo grupo da OCDE, a própria cronologia dos fatos torna impossível que o não endosso dos EUA à adesão do Brasil este ano tivesse sido motivado pela decisão do grupo de trabalho, visto que a carta dos EUA é de agosto e a decisão do grupo de trabalho teria sido tomada em outubro.
O Comprova verificou uma postagem na página Juntos pelo Brasil no Facebook.
Enganoso para o Comprova é o conteúdo que confunde ou que seja divulgado para confundir.
Como verificamos
Para verificar a publicação, o Comprova primeiramente buscou pelas últimas colunas do jornalista Guilherme Amado. Depois de identificar que as informações sobre a Comissão Antissuborno de fato foram noticiadas, o Comprova entrou em contato com o autor do texto, que preferiu não fazer comentários adicionais além do que tinha divulgado.
Também questionamos a Controladoria-Geral da União (CGU) e a OCDE, esta última não respondeu ao email. Já a CGU se restringiu a recomendar que a reportagem entrasse em contato com a OCDE.
O Comprova ainda conferiu as informações sobre a criação e funcionamento do Grupo de Trabalho sobre Suborno de Transações Comerciais Internacionais da OCDE.
O grupo da OCDE sobre Suborno
O Grupo de Trabalho sobre Suborno de Transações Comerciais Internacionais foi criado em 1994 e tem a responsabilidade de monitorar a implementação da Convenção Antissuborno da OCDE.
O texto de Guilherme Amado na Época, que é mencionado pela publicação que viralizou, faz referência ao grupo como “Comissão Antissuborno da OCDE” (OECD Working Group on Bribery, em inglês).
Desde 2000, o Brasil é signatário da Convenção Antissuborno. Além dele, assinam a convenção os 36 países membros da OCDE e outros 7 não membros.
Em julho de 2019, o grupo divulgou nota afirmando que via risco na lei de abuso de autoridade aprovada pelo Senado.
Na programação do encontro, já constava na agenda do dia 10 de outubro o item “Ad-hoc report by Brazil”. A expressão significa relatório para uma finalidade específica, não é informado qual o tema do relatório.
Segundo apuração da Folha, o grupo vai averiguar se o Brasil tem cumprido as regras previstas na Convenção Antissuborno feita pela OCDE. O grupo é composto por representantes dos Estados participantes da convenção e se encontra quatro vezes ao ano em Paris.
Os integrantes analisam como cada país está cumprindo os critérios da Convenção Antissuborno e publicam relatórios sobre os avanços de cada nação no tema. Os relatórios também são divulgados publicamente.
A Controladoria-Geral da União (CGU) é o órgão responsável por coordenar internamente a participação do Brasil no grupo de trabalho sobre Suborno da OCDE. O Comprova questionou o órgão se o Brasil havia sido notificado de alguma decisão da organização, mas não obteve resposta.
O monitoramento de países é feito por fases. O Brasil já passou por três delas, que geraram cinco relatórios. A última fase de avaliação começou em 2014 e se debruçou sobre questões como a lavagem de dinheiro, a extradição e a cooperação internacional.
Durante essa análise, os integrantes do grupo de trabalho visitam o país e se reúnem com representantes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, e do Ministério Público, além de representantes da sociedade civil e de entidades privadas.
O processo para adesão do Brasil à OCDE
A solicitação formal do Brasil para se juntar à OCDE foi feita em maio de 2017, no governo Michel Temer (MDB), representando um esforço para fortalecer os laços com as nações desenvolvidas do Ocidente, depois que governos anteriores priorizaram as relações com países em desenvolvimento.
Após oficializada a candidatura, demora em média de dois a cinco anos para se concretizar a entrada na OCDE. Entre as razões, está a necessidade de acordo entre todos os 36 membros do bloco sobre a entrada de um novo membro. Além disso, o postulante tem que se adequar aos requisitos da organização, o que envolve mudanças legislativas.
Visita de Bolsonaro à Casa Branca
Em março deste ano, durante visita do presidente Jair Bolsonaro (PSL) à Casa Branca, o presidente Trump afirmou publicamente que endossaria a campanha brasileira para o ingresso na OCDE.
O apoio à entrada na OCDE seria o principal trunfo obtido pelo governo Bolsonaro na viagem. Ser membro da organização funciona como uma espécie de selo de qualidade de políticas macroeconômicas, e estimularia investimentos no país.
Apoio de Trump a Argentina e Romênia
A informação de que a entrada do Brasil na OCDE teria sido adiada partiu de uma carta do governo dos Estados Unidos, datada de 28 de agosto à OCDE, e que veio a público em outubro, após ser divulgada pela agência Bloomberg.
Na carta, o país declara apoio, no momento, apenas à entrada de Argentina e Romênia na organização. O Brasil não é mencionado no documento.
Em troca de apoio para entrar na OCDE, o presidente brasileiro disse que abriria mão de benefícios na OMC (Organização Mundial do Comércio) dados a países em desenvolvimento, uma reivindicação dos EUA, que quer reformar a organização.
Por que o apoio de Trump é importante?
Para que um país tenha seu pedido de adesão à OCDE aprovado, é preciso que todos os 36 países membros da organização concordem, por consenso, tanto com o calendário quanto com a ordem dos convites. Só então tem início o processo de adesão à entidade.
O Estados Unidos vêm se opondo à ampliação da OCDE, em contraposição à União Europeia que defende uma ampliação mais acelerada da organização.
Segundo o secretário-geral adjunto da OCDE, Ludger Schuknecht, o Brasil está avançado em 82 dos 253 requisitos exigidos para se juntar à organização.
O que o governo Trump alega?
Integrantes do governo americano afirmaram na última quinta-feira (10) que os EUA se comprometeram a apoiar Argentina e Romênia antes das conversas com o Brasil e que por isso estão seguindo esse cronograma.
Em maio, o diretor-geral da OCDE, Ángel Gurría, já havia sinalizado que Argentina e Romênia iniciariam com o plano de adesão até setembro, antes do Brasil, e os EUA também haviam deixado claro que são contrários à maior ampliação da OCDE.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
O texto verificado foi publicado na página “Juntos pelo Brasil” no Facebook, em 10 de outubro, e teve 2,9 mil compartilhamentos e 2,2 mil curtidas até a tarde de 15 de outubro. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-policia-rodoviaria-tenha-apreendido-dolares-do-instituto-lula-para-a-venezuela/ | COMPROVA | É falso que Polícia Rodoviária tenha apreendido dólares do Instituto Lula para a Venezuela | null | 2019-10-14 | As imagens, na realidade, são de uma apreensão feita pela Polícia Rodoviária Federal em setembro no Paraná. Na operação, foram apreendidos US$ 300 mil em espécie e 326 quilos de cocaína.
É falsa informação que circula nas redes sociais de que uma caminhonete foi apreendida pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) no Paraná levando dólares para a Venezuela em nome do Instituto Lula. Segundo informações da PRF no estado, o veículo seguia para Paranaguá (PR) e não houve qualquer vinculação entre a apreensão e o ex-presidente.
Na publicação verificada pelo Comprova, que já possuía mais de 1,1 milhão de visualizações até a tarde desta segunda-feira, 14, imagens da apreensão são compartilhadas com texto que relaciona o dinheiro à fundação ligada ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “Caminhão interceptado saía do Instituto Lula rumo à Venezuela cheio de dinheiro”, diz texto do boato.
As imagens, na realidade, são de uma apreensão feita pela PRF em 5 de setembro de 2019 em Campina Grande do Sul (PR), município a 26 km de Curitiba. Na operação, foram apreendidos US$ 300 mil em espécie e 326 quilos de cocaína – informação omitida no boato e que tornaria o caso relacionado ao tráfico de drogas –, escondidos sob o assoalho da caminhonete.
O vídeo que acompanha a publicação foi divulgado pela própria PRF no Paraná e não faz qualquer menção à origem do dinheiro. O órgão destaca ainda que não houve qualquer vinculação entre a abordagem e a fundação ligada ao ex-presidente.
Um inquérito sobre o caso foi instaurado na sede da Polícia Federal no Paraná, em Curitiba, que ainda segue em andamento. Procurada pelo Comprova, a corporação disse que não comenta investigações em curso e afirma que qualquer comentário sobre o caso no atual estágio é “temerário” e sujeito a distorções.
O Instituto Lula negou, por meio do responsável pelo setor de imprensa, José Chrispiniano, relação com a apreensão: “Isso é um absurdo, uma loucura, uma mentira com objetivo de difamação política”, disse. Por email, Chrispiniano tratou a publicação como “fake news”.
O Comprova investigou publicação feita em 1º de outubro em um perfil pessoal no Facebook que até a tarde desta segunda-feira, 14, somava mais de 54 mil compartilhamentos.
Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
Para esta verificação, o Comprova procurou a sede da Polícia Rodoviária Federal no Paraná, responsável pela apreensão, a sede da Superintendência da Polícia Federal no Paraná, que instaurou inquérito para apurar o caso, e o Instituto Lula.
As informações sobre as circunstâncias da apreensão também constam em nota oficial divulgada pela PRF. Já as informações do veículo apreendido foram checadas junto ao Sinesp Cidadão, da Secretaria Nacional de Segurança Pública.
O Comprova tentou falar com o perfil que publicou o boato, mas não obteve resposta.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
Como foi a apreensão?
A apreensão ocorreu por volta das 8h15min de 5 de setembro de 2019, em frente ao posto da Polícia Rodoviária Federal no quilômetro 55 da rodovia Régis Bittencourt – como é chamado o trecho da BR-116 no entorno de Curitiba (PR). Além da cocaína, dividida em 298 tabletes, a PRF também localizou dois pacotes com dólares em US$ 300 mil, equivalente a R$ 1,23 milhão.
Segundo a nota da Polícia, o motorista, de 35 anos estava nervoso e passou mal logo no início da abordagem, o que motivou uma busca detalhada no veículo. Ele apresentou a carteira de habilitação do irmão como se fosse dele e conduzia uma caminhonete Iveco/Daily 35S14HDCS prata, ano 2016/2017, com placa GHL-3260, de São Paulo (SP), em situação regular até às 14h13 desta segunda-feira, 14 de outubro.
Na carroceria, os policiais descobriram um compartimento oculto, no formato de uma gaveta, onde foram encontrados o dinheiro e os tabletes de cocaína. Um vídeo postado na conta oficial da PRF no Youtube registra o momento em que os policiais encontraram a droga e o dinheiro. Não há qualquer menção a uma possível origem do material.
Preso em flagrante, o motorista disse que saiu de São Paulo (SP) e que entregaria o veículo em Paranaguá (PR). O município, distante 6.420 quilômetros de Caracas, capital da Venezuela, e onde fica localizado o maior porto da região, é constantemente palco para outras operações de apreensão de drogas, principalmente cocaína.
Nem a PRF nem a PF informaram o nome do motorista que conduzia a caminhonete, nem o do proprietário do veículo. O condutor, que também possuía uma quantidade de maconha na cabine da caminhonete, vai responder por tráfico de drogas, uso de identidade alheia e porte de droga para consumo pessoal.
Contexto
A Venezuela vive uma crise política e econômica, agravada desde maio de 2018, quando o então presidente Nicolás Maduro foi reeleito em pleito permeado por denúncias de fraudes. A eleição é questionada não só pela oposição, mas também pela comunidade internacional, uma vez que o índice de abstenção chegou aos 54%.
Desde a segunda metade do primeiro mandato, iniciado em 2013, Maduro enfrenta uma grave crise econômica, em partes por conta da queda no preço do barril de petróleo, principal item de exportação da Venezuela, como também por sanções econômicas impostas desde 2015 pelos Estados Unidos.
Além dos problemas econômicos, com uma inflação altíssima, quase metade da população do país vive em situação de miséria e os índices de violência são elevados. No final do ano passado, a capital Caracas alcançou o topo do ranking das cidades mais violentas do mundo.
Em 23 de janeiro deste ano, o presidente da Assembleia Nacional da Venezuela e líder da oposição a Maduro, Juan Guaidó, se autoproclamou presidente do país, elevando as tensões na região. Dias após o anúncio, ele recebeu apoios de diversos líderes internacionais, incluindo Jair Bolsonaro.
Já a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann (PR), por outro lado, divulgou nota criticando posição do presidente brasileiro e destacando que Maduro foi eleito em um “processo eleitoral legítimo”. Mesmo gerando questionamentos dentro do próprio PT, a postura de Gleisi, que chegou a comparecer à posse de Maduro em janeiro, acabou impulsionando a associação entre petistas e o governo venezuelano na opinião pública.
Desde o agravamento da polarização política na Venezuela a entrada de políticos do Brasil na polêmica, tem ficado mais comum o surgimento de peças de desinformação envolvendo o país vizinho. Na maioria das vezes, os boatos apontam relações ocultas ou criminosas entre petistas e Maduro, ou entre o governo brasileiro e o opositor Juan Guaidó.
Mesmo sem qualquer evidência baseada em órgãos confiáveis, o boato verificado pelo Comprova segue a linha dessa polarização entre esquerda e direita e sugere um vínculo entre o dinheiro apreendido, o governo venezuelano e a fundação ligada ao ex-presidente Lula. A apreensão de 326 quilos de cocaína também é omitida na publicação.
Eleição argentina
Uma versão semelhante do mesmo boato circula também nas redes sociais da Argentina, atualmente em meio a uma acirrada campanha presidencial. Na “versão argentina” do boato, os dólares apreendidos no vídeo estariam sendo enviados à campanha de Alberto Fernandéz, também de esquerda e que tem como vice a ex-presidente Cristina Kirchner.
O vídeo que circula no país vizinho, no entanto, é o mesmo divulgado pela PRF no Paraná. Segundo verificação realizada pelo jornal argentino Clarín, as mesmas imagens viralizaram nas redes sociais da Argentina com o objetivo de atingir a chapa de esquerda. Atualmente, Fernández e Kirchner lideram a disputa contra o presidente Maurício Macri.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
O texto verificado foi publicado em um perfil pessoal no Facebook em 1º de outubro e teve mais de 1,1 milhão visualizações, mais de 4,3 mil interações e foi compartilhado outras 54 mil vezes até às 14h28 do dia 14 de outubro. O Comprova chegou a procurar a responsável pela publicação para falar sobre o caso, mas não obteve resposta até a tarde desta segunda-feira.
Conteúdo associando a apreensão a ‘comunistas’ também foi compartilhado no Youtube pelo perfil Rede Brasil NO AR, com mais de 2,3 mil visualizações até a noite de 11 de outubro.
O Estadão Verifica, que faz parte do Comprova, e o Aos Fatos também verificaram a publicação. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/navio-portugues-e-usado-em-postagens-como-se-fosse-petroleiro-da-venezuela-despejando-oleo-no-nordeste/ | COMPROVA | Navio português é usado em postagens como se fosse petroleiro da Venezuela despejando óleo no Nordeste | null | 2019-10-14 | O vídeo foi gravado há cinco meses, na praia de Matosinhos, em Portugal. Além disso, o navio não despeja petróleo no mar, mas areia, em uma operação de dragagem no Porto de Leixões.
São enganosas as postagens nas redes sociais que usam um vídeo de um navio próximo a uma praia despejando uma substância escura no mar. As postagens afirmam que se trata de um navio venezuelano que estaria despejando petróleo na costa do nordeste brasileiro.
O vídeo, na verdade, mostra um navio que faz um serviço de dragagem numa praia em Portugal.
As imagens foram feitas em 30 abril, na praia de Matosinhos, em Portugal. O vídeo foi gravado por Humberto Silva, liderança do movimento “Diz Não Ao Paredão”, e publicado na página do grupo no Instagram. Por e-mail, Humberto confirmou a autoria ao Comprova. O movimento é contrário a obras anunciadas para o Porto de Leixões, em Matosinhos.
Na postagem original, a legenda é: “Cenário da Praia de Matosinhos hoje, durante as dragagens de manutenção do @portodeleixoes”. Por e-mail, Humberto Silva enfatizou que o vídeo não se trata de despejo de petróleo e adicionou nota ao vídeo original ressaltando o uso do post por publicações enganosas no Brasil.
O Comprova verificou postagens nas páginas Capitão Bolsonaro e Moro Presidente 2026 no Facebook.
Para o Comprova, enganoso é o conteúdo que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; que confunde ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos
Para esta verificação, o Comprova inicialmente realizou busca reversa de um frame do vídeo, mas não conseguiu identificar resultados. Em seguida, a equipe pesquisou os termos “navio venezuelano” no Facebook. Ao localizar o vídeo, encontrou uma marca d’água que sinalizava que o vídeo havia sido compartilhado do perfil no Instagram do movimento “Diz Não Ao Paredão”.
Com essas informações, o Comprova visitou a página “Diz Não Ao Paredão” e confirmou a origem do vídeo, postado em 30 de abril. O Comprova não conseguiu encontrar nenhum registro anterior dessas imagens na internet ou em redes sociais.
No Instagram, pesquisamos as imagens que haviam sido publicadas com a localização “Praia de Matosinhos”. Há um post do dia 30 de abril do usuário @tiagofazendeiro. Por mensagem na rede social, ele confirmou ter sido o autor da foto e disse ser morador da região e apoiador do movimento.
Além disso, buscamos informações nos sites da Administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo (APDL), que gerencia o Porto de Leixões, em Matosinhos, da Assembleia Municipal do Porto e de veículos de imprensa brasileiros e portugueses.
Também entramos em contato por e-mail com a organização “Diz Não Ao Paredão”, que faz campanhas online e manifestações contra a construção do paredão no porto.
O Comprova também entrou em contato com a pesquisadora Olivia Oliveira, do Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (UFBA), para pedir informações sobre o laudo que, segundo o instituto, confirma que a origem do petróleo cru encontrado no litoral nordestino pode ser da Venezuela. A pesquisadora nos enviou uma resposta via aplicativo de mensagens.
A equipe do Comprova também pediu acesso ao relatório da Petrobras que foi citado pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, sobre a origem das manchas de óleo. Não tivemos acesso ao laudo, mas a empresa nos concedeu uma resposta, via e-mail.
Além disso, acessamos os dados disponibilizados no site oficial do Ibama das localidades afetadas pelas manchas de óleo.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos
Navio não está jogando petróleo no mar
O navio que aparece no vídeo é uma “draga”, um tipo de embarcação específica para limpar resíduos, areias e sedimentos do fundo de vias navegáveis e nas proximidades de portos, que remove parte do fundo do mar ou dos leitos e canais, e os deposita na beira da praia, facilitando a navegação e criando assim um “paredão” de areia.
De acordo com uma postagem também de 30 de abril no perfil do Porto de Leixões no Facebook, a Administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo (APDL) confirma que as operações de dragagem haviam sido realizadas no período para a manutenção na entrada do canal que leva ao porto.
Essas dragagens e o consequente depósito da areia na praia causaram polêmica. A administração do porto afirmou que a operação é regular e defendeu que “Antes de iniciar qualquer operação de dragagem, são recolhidas amostras das areias para análise prévia, de modo a garantir a sua qualidade para uso balnear”.
A organização “Diz Não ao Paredão” é contrária a uma obra para ampliar em 300 metros o quebra-mar do Porto de Leixões, uma estrutura que protege o terminal marítimo. O movimento tem uma petição homônima na internet contrária ao projeto, já fez manifestações e apresentou a reivindicação às autoridades portuguesas.
O grupo alega que o projeto pode prejudicar atividades como o surfe e também a preservação ambiental da região.
Em março, vereadores questionaram o impacto das obras na prática de surfe na região. Em seu site, a APDL admite que pode haver uma redução na altura das ondas.
De acordo com a APDL, o objetivo da obra é que o porto possa receber navios de transporte de carga maiores do que as condições atuais. A meta é de que possam atracar no terminal embarcações com 300 metros de comprimento, 40,2 metros de boca e 13,7 metros de calado e com capacidade para transportar até 5 mil TEU (unidade de medida padrão).
A ampliação do quebra-mar seria, então, para melhorar as condições de segurança e a navegabilidade no acesso desses navios ao Porto de Leixões. O custo total da obra é de 147 milhões de euros.
Em julho, a Assembleia Municipal opinou que o prolongamento do quebra-mar poderia ser de 200 metros, não 300 metros, como prevê o projeto.
Por que seria um navio da Venezuela?
No dia 9 de outubro, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse que o óleo derramado no litoral nordestino é de origem, “muito provavelmente, da Venezuela”, atribuindo a informação a um relatório da Petrobras. As declarações de Salles foram rebatidas no dia 10 pela Petróleos da Venezuela S.A. (PDVSA). Na nota oficial divulgada no site, a estatal contrapõe as declarações do ministro brasileiro e diz que ele foi “tendencioso” ao culpar a Venezuela pelo óleo derramado nas praias do nordeste:
“Não há evidências de derramamentos de óleo nos campos de petróleo da Venezuela que poderiam ter causado danos ao ecossistema marinho do país vizinho”, afirma em nota.
O Comprova entrou em contato com a Petrobras e solicitou acesso ao relatório citado pelo ministro, Ricardo Salles. A empresa não nos forneceu o relatório, por e-mail, a gerência de comunicação e imprensa, enviou uma nota em que diz: “A análise realizada pela Petrobras em amostras de petróleo cru encontrado em praias do nordeste atestou, por meio da observação de moléculas específicas, que a família de compostos orgânicos do material encontrado não é compatível com a dos óleos produzidos e comercializados pela companhia. Os testes foram realizados nos laboratórios do Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes), no Rio de Janeiro.”
A empresa afirmou ainda que, desde o dia 12 de setembro, realizou, por solicitação do Ibama, limpeza nas praias que apresentaram manchas de óleo, nos estados de Alagoas, Sergipe, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Maranhão, Rio Grande do Norte e Bahia.
Um estudo realizado pelo Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (UFBA) também aponta que o petróleo que atinge o litoral do Nordeste é similar aos óleos de origem venezuelana. A informação foi confirmada pelo Comprova com a pesquisadora Olivia Oliveira.
“O IGEO/UFBA por iniciativa própria e independente, coletou e analisou material oleoso de praias de Sergipe e Bahia e constatou que ele tem características químicas (biomarcadores) similares aos óleos produzidos pela Venezuela. Nossa capacidade analítica permite a identificação da bacia petrolífera que esse óleo foi gerado.”
No dia 10, o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, também falou sobre o assunto. “Não é o Brasil, o Brasil não tem aquele tipo de óleo. Num levantamento preliminar estamos levantando as possíveis navios e as possíveis bandeiras que, pelo período, podem ter sido responsáveis pelo vazamento.”
Monitoramento do Ibama
No site oficial do Ibama, o Instituto apresenta um mapa com as localidades atingidas pelas manchas de óleo. A última atualização em 13 de outubro, às 20h30, mostra 9 estados, 72 municípios e 166 localidades afetados pelo óleo cru. Você pode acessar o monitoramento neste link: Áreas com localidades oleadas no Nordeste brasileiro.
As manchas de óleo apareceram no litoral do Nordeste em 2 de setembro. O presidente Jair Bolsonaro (PSL) determinou a abertura de investigações sobre as manchas de óleo mais de um mês depois, no dia 5 de outubro.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
Na página Capitão Bolsonaro o vídeo foi publicado com a legenda enganosa no dia 10 de outubro e, no dia 11, tinha 6,8 mil compartilhamentos, 1,3 mil curtidas e 805 comentários. Na Moro Presidente 2026, a postagem é de 9 de outubro e tinha 217 compartilhamentos, 191 curtidas e 16 comentários no dia 11.
O conteúdo também foi verificado pelo UOL e pela AFP, veículos que fazem parte do Comprova, além de Agência Lupa, Aos Fatos, Fato ou Fake.
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Veja quais praias foram atingidas pelas manchas de óleo no Nordeste (Folha) | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-enganoso-que-bolsonaro-tenha-liberado-r-8-bilhoes-para-a-educacao/ | COMPROVA | É enganoso que Bolsonaro tenha liberado R$ 8 bilhões para a educação | null | 2019-10-11 | O valor corresponde ao dinheiro desbloqueado para todos os ministérios. A parte que cabe ao Ministério da Educação é de R$ 1,99 bilhão
É falsa a informação que circula nas redes sociais de que o governo Jair Bolsonaro (PSL) liberou R$ 8 bilhões para a educação no início de outubro. O texto confunde valores desbloqueados em despesas para todos os ministérios e superestima em mais de 300% a parcela de fato destinada ao Ministério da Educação (MEC), de R$ 1,99 bilhão.
O conteúdo verificado pelo Comprova foi publicado em perfis no Twitter e no Facebook. As publicações acusam críticos do governo e estudantes que protestaram contra cortes na área de “silenciar” diante de um suposto desbloqueio de R$ 8 bilhões para a educação. “Cadê a mídia pra dar uma nota sobre isso? Percebam que só falam coisas ruins?”, questiona um dos textos que viralizaram.
Na realidade, o que ocorreu foi o desbloqueio, segundo o decreto 10.028 de 26 de setembro de 2019, de cerca de R$ 12,46 bilhões sobre todo o Orçamento da União para 2019. Desse total, R$ 8,3 bilhões foram para todas as pastas do Executivo (além de Educação, Defesa, Infraestrutura, etc), com apenas R$ 1,99 bilhão destinado ao MEC.
Como a pasta já somava R$ 6,1 bilhões em congelamentos feitos em março e em julho, o R$ 1,99 bilhão liberado não representou “bônus”, mas apenas um “alívio” diante da situação anterior do MEC, que ainda opera, segundo a própria pasta, R$ 3,8 bilhões abaixo do previsto na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2019 para despesas discricionárias – aquelas não obrigatórias, como custeio e investimento.
Para o Comprova, enganoso é o conteúdo que confunde ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
O Comprova verificou conteúdos publicados pelo perfil @NinaCarmona2 no Twitter e em um perfil pessoal no Facebook.
Como verificamos
Para esta verificação, o Comprova consultou o último Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias, documento do Ministério da Economia que baseia as mudanças no contingenciamento, assim como os decretos de controle do orçamento e notas oficiais tanto do MEC quanto da Empresa Brasil de Comunicação — empresa pública federal.
A reportagem também utilizou dados do contingenciamento na educação enviados pelo próprio MEC.
No relatório original, o trecho que destaca a possibilidade de ampliações em R$ 12,4 bilhões do orçamento da União – o que inclui Executivo e todos os demais poderes – se encontra na página nove. Já os demais números foram, além de confirmados nas notas oficiais destacadas acima, esclarecidos em entrevista com o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, por telefone.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
Bolsonaro liberou 8 bilhões para a educação?
Não. Até o presente momento, o desbloqueio de R$ 1,99 bilhão previsto no decreto 10.028/2019 foi a única ação recente do presidente no sentido de reverter os contingenciamentos no MEC anunciados pelo governo.
Segundo o ministro da Educação, Abraham Weintraub, 58% desse recurso (R$ 1,15 bilhão) será utilizado para cobrir despesas de custeio como água, energia elétrica e materiais de consumo, de universidades e institutos federais. O restante deverá ser distribuído entre programas de aquisição de livros e bolsas de pós-graduação.
No início de setembro, foi anunciado ainda outro R$ 1 bilhão para o MEC destinados para a educação infantil, como parte do dinheiro recuperado por multas da operação Lava Jato junto à Petrobras. O envio do recurso, no entanto, não partiu de uma escolha unilateral do Executivo, mas sim de um acordo firmado pelo Planalto, com a Procuradoria-Geral da República, o Congresso Nacional e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. O texto foi homologado pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e depende ainda de aprovação de um projeto de lei pelo Congresso Nacional.
Vale lembrar que várias das áreas beneficiadas pela liberação do último mês, como universidades, compra de livros didáticos e bolsas de pós-graduação, já tinham sido algumas das mais afetadas pelo contingenciamento inicial na pasta.
Usando dados equivocados, o texto que circula nas redes tenta dar a impressão de que todo o dinheiro liberado em setembro para o Executivo foi destinado ao MEC.
O que é contingenciamento?
Segundo o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, o contingenciamento de recursos do orçamento não ocorre por “opção” da equipe econômica, mas por exigência da Lei Orçamentária Anual (LOA), que fixa receitas e despesas do governo para 2019.
Contingenciamento e remanejamentos no orçamento são parte da rotina orçamentária de qualquer governo, no entanto, a escolha de quais áreas ganham ou perdem recursos depende das prioridades estabelecidas pelo Executivo.
Em entrevista ao Comprova, o economista Wellington Leonardo da Silva, presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), afirmou que o problema está em contingenciar verbas das áreas sociais. “O que falta ao governo é estabelecer prioridade decente. Só penalizam as áreas da educação, da saúde, da infraestrutura brasileira”, afirma.
De acordo com Mansueto, o bloqueio de gastos ocorre a partir do momento em que a expectativa de arrecadação diminui, como uma forma de equilibrar o volume de receitas e despesas. O secretário afirma que, sem isso, a União pode descumprir a meta de resultado primário – a diferença entre receitas e despesas do governo –, hoje fixada em um déficit de R$ 139 bilhões.
Bloqueios poderiam ser feitos em outras áreas?
Mansueto Almeida admite que o governo é livre para escolher de quais áreas deverá cortar mais, podendo poupar, por exemplo, a educação, mas destaca que há “pouca opção” no caso brasileiro. “Hoje, 93% das despesas são obrigatórias, então só 6% ou 7% do orçamento fica livre, então é muito pequena a parcela que pode ser segurada”. Ele destaca que em outras grandes democracias, como nos Estados Unidos, os gastos não obrigatórios chegam a mais de 30% do orçamento. “Dá para ver a diferença”.
Wellington Leonardo da Silva, no entanto, destaca que outras áreas poderiam ser contingenciadas pelo governo, como taxas dos bancos, o orçamento do Congresso ou mesmo do Ministério Público.
Em agosto, por exemplo, Bolsonaro enviou um projeto de remanejamento de R$ 3 billhões do Orçamento, dos quais R$ 926 milhões seriam cortes da Educação e R$ 842 milhões, valores extras para a Defesa.
“Todo ano, seja governo federal, estadual ou municipal, tem que cumprir esse ritual. Perdeu receita, tem que fazer contingenciamento”, afirma Mansueto. “Se não faz esse contingenciamento e entrega um resultado primário abaixo da LDO, pode levar à responsabilização de todo mundo, ministros, técnicos, até o presidente”, diz.
Perda de receita
Mansueto afirma que perdas de receitas previstas, como consequência da queda do preço do petróleo, motivaram inclusive os contingenciamentos feitos no início do ano. “Quando fizeram o orçamento, o barril de petróleo custava 74 dólares. Agora, caiu para 60 dólares.
Então a arrecadação com isso é menor”. Outra perda de receita ocorreu, segundo o secretário, pela desistência de privatizar a Eletrobrás neste ano: “Só nisso aí já perdeu R$ 12 bilhões”.
Em julho e agosto deste ano, no entanto, o movimento ocorreu no sentido contrário, com melhora do resultado primário. Com isso, o governo pode novamente “abrir a torneira” de gastos, no volume total de R$ 12,4 bilhões. Segundo o “Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias”, que baseia a decisão, a melhora no período foi puxada por reduções em R$ 5,7 bilhões em gastos de pessoal e R$ 1 bilhão em subsídios e subvenções.
“Tem estudantes que estão abandonando as universidades públicas porque não têm mais as bolsas de estudos, que não é uma bolsa faraônica, como a dos deputados. É uma bolsa que permitia comer um sanduíche, pagar sua passagem de ônibus na periferia. Por que não corta o orçamento do Congresso, do Ministério Público?”, questiona o economista Wellignton Leonardo da Silva.
De acordo com ele, o resultado dos contingenciamentos é que “as universidades estão quebradas”. “O que está acontecendo na universidade pública brasileira é que há muito tempo se usa terceirizados para as áreas de limpeza. Com a retirada de recursos das universidades públicas, os reitores estão tendo que encerrar o contrato com a terceirizada e contratar uma outra por preço mais baixo ainda. Ou seja, o terceirizado vai ganhar menos ainda do que ganhava antes”, afirma.
Contexto
O governo havia anunciado em março deste ano um bloqueio de R$ 30 bilhões no Orçamento da União. Inicialmente, a ideia era que os ministérios da Educação e da Saúde ficassem de fora dos cortes. As outras pastas sofreriam redução de 21% nos gastos. No entanto, o que ocorreu foi que a Educação foi o maior alvo da tesourada, perdendo R$ 5,8 bilhões de recursos. A Saúde foi mais preservada — com cortes de R$ 599,9 bilhões — pois já tinha orçamento perto do piso constitucional.
No início de abril, assumiu um novo ministro da Educação, o economista Abraham Weintraub. No final daquele mês, ele afirmou em entrevista ao Estadão que a pasta cortaria recursos de universidades que estivessem promovendo “balbúrdia” e que não tivessem desempenho acadêmico esperado. Entre as instituições que se encaixariam nesses critérios, de acordo com Weintraub, estariam a Universidade de Brasília (UnB), a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a Universidade Federal da Bahia (UFBA). A repercussão negativa fez com que o ministro recuasse da fala no mesmo dia em que a entrevista foi publicada.
Em maio, o orçamento da Educação sofreu novo aperto, quando o governo remanejou R$ 3,6 bilhões para atender a demandas de outros ministérios; para isso, foi tirado mais R$ 1,59 bilhão do MEC, aumentando o contingenciamento total para R$ 7,4 bilhões.
O contingenciamento provocou protestos em massa em cerca de 250 cidades nos 26 Estados e no Distrito Federal. As manifestações organizadas por estudantes fizeram com que o governo reduzisse em R$ 1,59 bilhão os cortes orçamentários da Educação, retornando o contingenciamento para cerca de R$ 5,8 bilhões.
Qual a origem da informação enganosa?
O Comprova entrou em contato com o perfil do Twitter @NinaCarmona2. Na resposta à equipe do Comprova, o perfil afirma que não sabia que a informação é enganosa e disse ter recebido o dado de “uma pessoa confiável”. Até o momento da publicação dessa verificação, o post continuava ativo no Twitter. A imagem utilizada pela conta é uma foto da modelo e atriz norte-americana Marisa Berenson, tirada pelo lendário fotógrafo de celebridades Slim Aarons em 1968, durante uma viagem à ilha italiana de Capri. No Twitter, o perfil se dedica a republicar conteúdo em defesa de Jair Bolsonaro.
A mensagem original, no entanto, não parte do perfil analisado. Pesquisando nas redes sociais, publicações semelhantes aparecem no Facebook desde 5 de outubro. Já no Twitter, a primeira mensagem com esse conteúdo, e também sem fontes, foi feita em 7 de outubro, às 11h15min, também por um perfil dedicado a divulgar conteúdo positivo ao governo Jair Bolsonaro. Esse tuíte, porém, não teve viralização.
Outra informação presente no texto, de que a liberação dos recursos para a educação teria sido ignorada pela imprensa, também não é correta. Após o anúncio, diversos dos maiores veículos de imprensa do País, inclusive a Rede Globo, a maior rede de televisão do Brasil, noticiaram o caso.
Repercussão
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
O tuíte do perfil @NinaCarmona2 teve 64 retweets e 154 curtidas até o dia 9 de outubro. No Facebook, um perfil pessoal com o mesmo conteúdo teve mais de 21 mil compartilhamentos desde o dia 5 de outubro.
Os sites Aos Fatos e Agência Lupa também checaram este conteúdo.
Esta verificação foi atualizada na segunda-feira, 14 de outubro, com dados recebidos do MEC. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/nao-e-possivel-determinar-popularidade-de-bolsonaro-ou-de-qualquer-presidente-so-por-alcance-em-redes-sociais/ | COMPROVA | Não é possível determinar popularidade de Bolsonaro ou de qualquer presidente só por alcance em redes sociais | null | 2019-10-10 | Publicação usa números de seguidores em redes sociais para atestar boa popularidade do presidente brasileiro. No entanto, especialistas afirmam que método é pouco efetivo e que popularidade deve ser medida por pesquisas de opinião pública.
É falsa a afirmação de que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) é o “quarto governante mais popular do mundo”, como diz um texto que recebeu mais de 150 mil interações no Facebook desde quinta-feira (3). O conteúdo usa números de seguidores em redes sociais para atestar a popularidade de Bolsonaro. A metodologia é questionada por profissionais de marketing político e de pesquisas de opinião pública ouvidos pelo Comprova.
Segundo os especialistas, não é possível avaliar a popularidade de Bolsonaro usando números de seguidores, já que nem todos os brasileiros têm conta em redes sociais ou mesmo acesso à internet. Eles defendem os métodos usados pelos institutos de pesquisa, que buscam uma amostra de pessoas que seja representativa da população em idade eleitoral, partindo de dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), por exemplo.
Além disso, um levantamento da quantidade de seguidores de Bolsonaro feito pelo Comprova chegou a resultados diferentes dos mencionados no texto que viralizou. As diferenças estão no número de seguidores – sobretudo no Facebook, onde encontramos 1,4 milhão a menos – e na quantidade de seguidores angariados nas primeiras 24 horas após o discurso na Assembleia Geral da ONU – 10 mil a mais.
Para o Comprova, falso é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
O texto sobre a popularidade de Bolsonaro foi publicado no dia 3 de outubro pelo site Crítica Nacional. O link foi compartilhado no Facebook por grupos e páginas como “Bolsonaro Opressor 2.0”, “Por um Brasil Melhor” e “Somos Todos Bolsonaro”.
Como verificamos
Para esta verificação, o Comprova compilou, através do monitor SocialBlade, o número de seguidores de Bolsonaro e de outros chefes de Estado nas principais redes sociais e comparou com os mencionados no texto e creditados a um estudo da empresa Mr. Predictions.
Também buscamos dados sobre acesso da população brasileira à internet e consultamos pesquisas de opinião recentes dos institutos Ibope, Datafolha, MDA e Ipespe que medem a popularidade do presidente e a avaliação do seu governo.
Além disso, ouvimos o especialista em Comunicação e Marketing Político Darlan Campos e o diretor do Datafolha, Mauro Paulino, sobre a assertividade de se mensurar a popularidade através de números de seguidores nas redes sociais e sobre a metodologia das pesquisas de opinião tradicionais.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.
O que dizem os especialistas
O consultor em Comunicação e Marketing Político Darlan Campos afirma que o número de rede social não é o melhor método para medir popularidade: “Ao meu ver, o que foi usado é impreciso porque na verdade, se os números forem corretos, ele é na verdade o quarto com maior alcance na internet. Não necessariamente o mais popular.”
Campos acredita que não se pode descartar que Jair Bolsonaro seja um líder popular, porém essa ótica precisa ser levada em conta dentro do ambiente digital. “Creio que as métricas podem sim ser utilizadas para medir esse processo (de popularidade) diante dessa sociedade cada vez mais globalizada. Então, de fato ele é um dos líderes mundiais com maior alcance [de usuários nas redes sociais]. A questão é que há outros indicadores que deveriam ser olhados, como grau de conhecimento, e um cuidado com a utilização de ferramentas, como os bots, que podem aumentar esse potencial alcance”, diz, se referindo a sistemas automatizados que, na internet, simulam reações de usuários.
O especialista defendeu ainda a metodologia utilizada pelos institutos de pesquisas tradicionais, reforçando que as pesquisas presenciais retratam de forma mais abrangente a população brasileira: “A gente tem que considerar que o ambiente digital compreende apenas uma parcela da população. Hoje, o índice de conectividade dos brasileiros está na casa dos 70%, ou seja mais de ¼ da população não está nesse meio. Então é uma medição que não pega todo mundo. Por isso, qualquer métrica digital não é mais abrangente e precisa que um método científico, estatístico e com grau de compreensão da realidade muito mais profundo, muito mais correto, que são os das pesquisas.”
O diretor-geral do Instituto Datafolha, Mauro Paulino, também defende a tese de que não dá para medir a popularidade de um presidente apenas pelas redes sociais. Para ele, as métricas utilizadas pelas pesquisas de opinião pública são mais assertivas: “a presença em redes sociais reflete apenas uma parcela da população. Nós sabemos hoje que menos da metade dos brasileiros têm acesso frequente a redes sociais. Então, você já está excluindo, com uma amostra feita a partir de redes sociais, uma parcela significativa da sociedade. O nosso método é enviar pesquisadores para as cidades sorteadas em determinada amostra. Esses pesquisadores fazem as entrevistas de acordo com diversos critérios rígidos que nós determinamos, aplicando os questionários pessoalmente. Então, essa seria a forma mais adequada, a forma mais correta de se representar uma população no Brasil”.
Números da pesquisa: os dez chefes de estado com mais seguidores
Os números divulgados pelo Crítica Nacional são atribuídos a uma pesquisa feita pela empresa Mr. Predictions – uma medição de engajamento digital político de chefes de Estado pelo mundo, que ranqueia os dez com maior número de seguidores em redes sociais. Embora a postagem se baseie em coleta de dados que teria sido feita no dia 1º de outubro de 2019, a publicação original mais recente da Mr. Predictions sobre popularidade de chefes de Estado, publicada em seu site, leva em conta dados coletados no dia 7 de agosto.
O texto do Crítica Nacional não informa como a Mr. Predictions coletou seus dados. Na tarde de terça (8), o Comprova tentou contato com a empresa em três telefones diferentes e por e-mail, mas não teve resposta.
No dia 7 de outubro, o Comprova utilizou a plataforma SocialBlade para comparar os números apresentados pelo post que viralizou. O levantamento de número de seguidores em quatro redes sociais (Facebook, Instagram, Twitter e YouTube) levou em consideração os números contabilizados pela plataforma no dia 1º de outubro de 2019. É importante destacar, no entanto, que a soma dos seguidores não significa que estes são seguidores únicos: uma mesma pessoa pode seguir o presidente nas quatro redes sociais.
Segundo o ranking do Mr. Predictions publicado pelo Crítica Nacional, os dez chefes de estado com mais engajamento digital político, considerando o número de seguidores, são:
Primeiro-ministro da Índia, Narenda Modi (127,1 milhões de seguidores)
Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (105,7 milhões)
Papa Francisco (58,8 milhões)
Presidente da Indonésia, Joko Widodo (48,9 milhões)
Rainha consorte da Jordânia, Rania Al Abdullah (33,2 milhões)
Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (33 milhões)
Presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan (29,5 milhões)
Primeiro-ministro do Paquistão, Imran Khan (22,3 milhões)
Primeiro-ministro dos Emirados Árabes, Mohammed Bin Rashid Al Maktoum (18,2 milhões)
Primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau (14,6 milhões).
O levantamento feito pelo Comprova junto à plataforma SocialBlade encontrou números ligeiramente diferentes:
Navendra Modi (127,9 milhões)
Donald Trump (104,5 milhões)
Papa Francisco (55,2 milhões)
Joko Widodo (48,8 milhões)
Rania Al Abdullah (33,2 milhões)
Jair Bolsonaro (31,5 milhões)
Recep Tayyip Erdogan (29,6 milhões)
Imram Khan (22,2 milhões)
Mohammed Bin Rashid Al Maktoum (18,5 milhões)
Justin Trudeau (14,5 milhões).
Sobre os dados levantados junto à SocialBlade, é preciso dizer que, como há contas no Instagram que não foram classificadas como “business” por seus donos, não foi possível verificar o número de seguidores em todas elas no dia 1º de outubro. Onde não havia dados disponíveis, foram considerados os números do dia 7 de outubro.
Report
Infogram
A discrepância maior encontra-se nos números do Papa Francisco e do presidente Jair Bolsonaro. Sobre os números referentes ao líder do Vaticano, destaca-se que a empresa Mr. Predictions inclui 3,5 milhões de seguidores no Facebook, mas o Papa não possui uma conta oficial nesta rede social. Uma página não oficial foi encontrada pelo Comprova com o mesmo número de seguidores. No caso de Bolsonaro, a diferença se dá pelo número de seguidores no Facebook – 1,4 milhões a mais computados pela Mr. Predictions.
Marca de 33 milhões de seguidores
Sobre o número total de seguidores, somadas as quatro redes sociais já citadas, o post do Crítica Nacional aponta o presidente Jair Bolsonaro como o “quarto governante mais popular do mundo”, com 33 milhões de seguidores. A marca teria sido alcançada no dia 29 de setembro, primeiro domingo após o discurso de Bolsonaro na abertura da Assembleia Geral da ONU. Embora este número apareça na tabela atribuída à empresa Mr. Predictions, o Comprova não encontrou esta marca.
Segundo levantamento da SocialBlade, no dia 29 de setembro, Bolsonaro tinha 31,5 milhões de seguidores (5,1 milhões no Twitter; 9,8 milhões no Facebook; 13,9 milhões no Instagram e 2,56 milhões no Youtube).
Para considerar Bolsonaro como o quarto governante mais popular, o site Crítica Nacional utiliza uma lista dos chefes de estado com maior número de seguidores, na qual Bolsonaro figura em sexto lugar. O site desconsidera o Papa Francisco e a rainha consorte da Jordânia, Rania Al Abdullah, que ocupam, respectivamente, 3º e 5º lugares tanto no ranking feito pela Mr. Predictions quanto no levantamento feito pelo Comprova. Embora a rainha Rania não seja chefe de estado, o Papa é.
Impacto do discurso da ONU
O site Crítica Nacional aponta que Bolsonaro ganhou 23 mil seguidores nas 24 horas após o discurso na abertura da Assembleia Geral da ONU, no último dia 24 de setembro. O Comprova também checou o número de seguidores nestes dias e constatou dados diferentes. O levantamento junto ao site SocialBlade mostra que, entre os dias 24 e 25 de setembro, ele ganhou 33.450 seguidores. Se considerados apenas os novos seguidores em 25 de setembro, dia seguinte ao discurso, foram 17.859.
De acordo com levantamento feito junto ao site SocialBlade, Jair Bolsonaro tinha, até o dia 24 de setembro de 2019, 2,56 milhões de seguidores no Youtube. Neste dia, ele ganhou mais 10 mil seguidores. Não houve ganho nos dias seguintes, exceto em 6 de outubro, quando angariou mais 10 mil seguidores. No dia 7 de outubro, o presidente possuía 2,57 milhões de seguidores na rede social, segundo levantamento do SocialBlade.
No Twitter, eram, em 7 de outubro, 5.218.116 seguidores. No dia 24 de setembro, eram 5.151.756. Neste dia, Bolsonaro ganhou mais 5.591 seguidores. No dia seguinte ao discurso, foram mais 7.703 seguidores – totalizando 13.294 nas 24 horas após o discurso.
No Facebook, em 7 de outubro, às 16h20, eram 9.829.073 seguidores. No dia 24 de setembro, segundo levantamento do SocialBlade, Bolsonaro tinha 9.825.276 seguidores e não houve incremento nesta data. No dia seguinte, ele ganhou 2.091 seguidores. Ele continuou ganhando seguidores até o dia 2 de outubro. Entre os 3 e 7 de outubro, perdeu 647 seguidores.
Já no Instagram, rede social em que o presidente possui mais seguidores, eram 14.034.646 no dia 7 de outubro. Em 24 de setembro, eram 13.919.578, mas não houve novos seguidores nesta data. No dia seguinte, ele ganhou 8.065 novos seguidores, segundo dados do SocialBlade.
A soma dos seguidores no dia 7 de outubro de 2019, conforme levantamento feito pelo Comprova, era de 31,6 milhões, considerando, entretanto, que um mesmo seguidor pode estar nas quatro redes sociais.
Sobre a Mr. Predictions
A Mr. Predictions, empresa responsável pelo levantamento dos dados usados no post do site Crítica Nacional, tem sede na cidade de Florianópolis, em Santa Catarina. Na Receita Federal é registrada como Mr Predictions – Serviços de Tecnologia da Informação S.A., cuja atividade econômica principal é a consultoria em tecnologia da informação. O presidente da empresa é Hugo Cesar Hoeschl, que é ex-procurador da Fazenda Nacional pelo Rio Grande do Sul.
Hoeschl foi tema de uma reportagem do The Intercept Brasil no ano passado sobre a suposta “operação antifraude” nas eleições de 2018. A publicação aponta que o ex-procurador, que aparece em diversos vídeos no Youtube, fraudou o próprio currículo. O Comprova chegou a verificar, em 2018, um vídeo em que Hoeschl tenta, de forma enganosa, usar um conceito matemático para apontar que a eleição de 2014 teria sido fraudada.
Ele também é citado em uma reportagem da Folha de S. Paulo de 2009, em que reclama os direitos autorais de um software usado por uma empresa contratada pela Polícia Federal.
Embora sediado no Brasil, o site Mr. Predictions tem todas as suas postagens originais em inglês. Não há na página oficial qualquer menção a informações sobre quem faz parte do grupo, valores, missão ou quadro funcional.
No entanto, uma publicação feita no dia 31 de agosto de 2018 no site do Instituto Mapa sobre seguidores dos presidenciáveis apontava tanto o Instituto quando a Mr. Predictions como “empresas associadas da área de Ciências de Dados e Análise Preditiva, vinculadas ao Grupo NEXXERA”. O Instituto Mapa e o Nexxera também têm sede em Florianópolis.
O Comprova entrou em contato com o Grupo Nexxera no dia 7 de outubro e foi encaminhado para a área de Satisfação do Cliente, que informou, por e-mail, que a empresa Mr. Predictions já fez parte do Nexxera no passado, mas não mais integra o grupo.
Então, procuramos o Instituto Mapa. O presidente, José Nazareno Vieira, o Zeno, disse ainda ter um trabalho conjunto com a Mr. Predictions, mas sem ligação com política. “Nós temos um trabalho conjunto, mas não se trata desse assunto, não tem mais a ver com esse assunto. A gente tem um contrato específico com eles na área de marcas, mas não temos qualquer contrato em vigor no que diz respeito à política, isso tudo é com Hugo Hoeschl”, afirmou Zeno.
O que dizem pesquisas de opinião pública
O Comprova analisou as pesquisas de opinião pública sobre a popularidade do presidente Jair Bolsonaro (PSL) divulgadas desde o início do mandato. Reunimos dados dos institutos Ibope Inteligência, Datafolha, MDA/CNT e Ipespe/XP.
As pesquisas de opinião pública utilizam métricas científicas baseadas em estatísticas e estratégias para criar uma amostragem que representa uma população, por meio de entrevistas presenciais colhidas nas cinco regiões brasileiras.
IBOPE Inteligência
De acordo com o Ibope, a popularidade de Bolsonaro mantém-se praticamente estável desde Abril/19, em comparação a Janeiro/19, Fevereiro/19 e Março/19. Para a pesquisa do período de 12 de abril a 15 de abril, o instituto usou uma amostragem de 2000 entrevistas em 126 municípios brasileiros:
O percentual dos que avaliam o governo do presidente Jair Bolsonaro como ótimo ou bom se mantém praticamente inalterado em relação ao mês de março, conforme mostra o Ibope. Nesse período, o percentual oscila de 34% para 35%, dentro da margem de erro da pesquisa, que é de dois pontos percentuais para cima ou para baixo. Vale lembrar que em janeiro, 49% avaliavam o governo como ótimo ou bom, e em fevereiro, 39%. Por outro lado, o percentual dos que avaliam a gestão de Bolsonaro como ruim ou péssima mantém a tendência de crescimento observada desde janeiro e passa para 27% da população (eram 11% em janeiro, 19% em fevereiro e 24% em março). Em abril, 31% avaliaram o governo como regular, um recuo de 3 pontos percentuais em relação a março. Você pode acessar outros dados da pesquisa neste link: Avaliação Bolsonaro Abril/19.
A última pesquisa divulgada pelo Ibope em setembro, e realizada nos dias 19 a 22, entrevistando 2000 pessoas em 126 municípios, o governo Jair Bolsonaro é avaliado como ruim ou péssimo por 34% da população brasileira, enquanto 32% o consideram regular e 31% ótimo ou bom. A mostra que, na comparação com junho, os percentuais apurados em setembro oscilam dentro da margem de erro de 2 pontos para cima e para baixo. Você pode acessar outros dados da pesquisa neste link: Avaliação Bolsonaro Set/19.
CNT/MDA
A pesquisa do instituto MDA encomendada pela (Confederação Nacional do Transporte) e realizada em 21 a 23 de fev/19 mostra que a popularidade do presidente Jair Bolsonaro apresentou os seguintes índices: positiva (38,9%), negativa (19,0%), regular (29,0%) e 13,1% não souberam opinar. A aprovação do desempenho pessoal do presidente atinge 57,5% contra 28,2% de desaprovação, além de 14,3% que não souberam opinar.
Os resultados mostraram avaliação positiva do presidente Jair Bolsonaro, com 57,5% dos entrevistados aprovando seu desempenho pessoal, maior índice obtido por um presidente desde novembro de 2013. Naquela época, de acordo com a pesquisa, havia uma percepção de que o governo de Bolsonaro era melhor do que de seus antecessores, Michel Temer e Dilma Rousseff. Você pode acessar todos os dados da pesquisa neste link: Avaliação Bolsonaro CNT Fev/19.
O mesmo instituto mostrou, em outro período do ano, de 22 a 25 de Ago/19, que a avaliação do presidente apresentou alta nos índices de desaprovação do governo: positiva (29,4%), negativa (39,5%). Como mostra o gráfico abaixo:
No gráfico é possível observar que os resultados mostram avaliação negativa do governo do presidente Jair Bolsonaro: 53,7% dos entrevistados desaprovam o seu desempenho pessoal, contra 41,0% que o aprovam. Você pode acessar todos os dados da pesquisa neste link: Avaliação Bolsonaro CNT Ago/19.
Datafolha
O instituto Datafolha realizou uma pesquisa no período de 2 e 3 de abril/19, e apontou que dois em cada três (67%) brasileiros avaliaram que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) fez menos do que o esperado mas, mesmo assim, 32% aprovam o governo. Você pode acessar os dados completos da pesquisa neste link: Avaliação Bolsonaro Abril/19 Datafolha.
Ainda para o Datafolha, no período de 29 a 30 de agosto/19, a reprovação ao presidente cresceu de 33% no início de julho para 38%, na última semana de agosto, o índice mais alto desde o início de seu governo. No mesmo período, a aprovação à gestão do militar reformado caiu de 33% para 29%. Você pode acessar os dados completos da pesquisa neste link: Avaliação Bolsonaro Ago/19 Datafolha.
Exame Pesquisa XP/Ipespe
Na reportagem na revista Exame, do dia 2 de setembro, apresentando dados de pesquisa do instituto Ipespe encomendada pela XP Investimentos, também confirma a queda na popularidade do presidente Jair Bolsonaro (PSL): 41% consideram o governo ruim ou péssimo, enquanto 30% o consideram bom ou ótimo e 37% o avaliam como regular.
É o pior resultado para o governo desde que o levantamento começou. Em fevereiro, a aprovação estava invertida, com índices positivos para Bolsonaro, 40% de ótimo/bom e apenas 17% de ruim/péssimo.
A pesquisa foi realizada entre os dias 27 e 29 de agosto, entrevistou 1.000 pessoas de abrangência nacional. A margem de erro é de 3,2 pontos percentuais. Você pode acessar a matéria nesse link: Avaliação Bolsonaro Exame XP/Ipespe.
Contexto
O Crítica Nacional publicou o texto e compartilhou o link em sua página no Facebook no dia 3 de outubro. O texto começou a viralizar no dia 4, quando começou a ser compartilhado por páginas de apoio a Bolsonaro, segundo dados do Crowdtangle, plataforma que mede a repercussão de um link no Facebook.
No mesmo dia 4, o site Jota publicou um texto dizendo que Bolsonaro “tem a pior popularidade entre presidentes no primeiro ano desde 1987”. O levantamento foi feito pelo próprio site, usando uma ferramenta de agregação que levou em conta 400 pesquisas de opinião publicadas no Brasil nos últimos 32 anos.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
O texto verificado foi publicado no site Crítica Nacional em 3 de outubro e compartilhado na página do site no Facebook no mesmo dia, além de ter sido compartilhado também por várias páginas no Facebook como Bolsonaro Opressor 2.0, Alexandre Garcia e Por um Brasil melhor.
Até a tarde do dia 9 de outubro, o conteúdo tinha mais de 158 mil interações, com 122 mil curtidas, 16 mil compartilhamentos e 20 mil comentários no Facebook. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/dos-paises-com-mais-de-200-milhoes-de-habitantes-brasil-e-unico-com-sistema-universal-de-saude/ | COMPROVA | Dos países com mais de 200 milhões de habitantes, Brasil é único com sistema universal de saúde | null | 2019-10-10 | SUS prevê o atendimento a toda a população gratuitamente. Entre os países com sistemas similares, nenhum tem população tão grande. O Comprova analisou individualmente os países com mais de 200 milhões de habitantes.
Postagem publicada no Twitter pede a defesa do Sistema Único de Saúde (SUS) e afirma que o SUS é o único sistema público de saúde que “atende a uma população com mais de 200 milhões de pessoas” e que “fornece remédios de graça” – algo que, segundo a postagem, nem o equivalente britânico, o Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido (NHS, na sigla em inglês), supostamente faria.
De fato, todo e qualquer brasileiro tem o direito de ser atendido gratuitamente pelo SUS, algo definido na Constituição e na lei 8.080, de 1990. Também é verdade que o SUS fornece remédios gratuitamente. Hoje a população brasileira é de 210,5 milhões.
A publicação, no entanto, comete um erro ao dizer que o NHS não fornece medicação “totalmente de graça”. O sistema britânico oferece remédios gratuitos para uma lista de doenças e para alguns grupos, como idosos, jovens de até 16 anos, populações pobres ou com doenças graves.
O Ministério da Saúde, contatado pelo Comprova, destacou que “o Brasil é o único país do mundo com mais de 100 milhões de habitantes que conta com um sistema público (financiado pelo dinheiro dos impostos), universal (para todos) e gratuito para toda a população”.
Há vários sistemas de saúde no mundo. Em alguns países, o sistema é público, mas, diferentemente do Brasil, a gratuidade cobre apenas parte da população e o atendimento a que as pessoas têm direito pode variar.
Dos países reconhecidos por possuírem sistema de saúde público e universal, como Reino Unido, Canadá, Dinamarca, Suécia, Espanha, Portugal e Cuba, nenhum tem população superior a 100 milhões de habitantes. O mais populoso é o Reino Unido, com cerca de 66,4 milhões de pessoas.
O Comprova só analisou individualmente os sistemas de saúde dos países com mais de 200 milhões, número citado pela postagem. De fato, nenhum deles possui um sistema público de saúde universal, como o SUS. Foram pesquisados China, Índia, EUA, Indonésia, Paquistão e Nigéria.
Esta verificação do Comprova analisou uma publicação do perfil @Adrieli_S do Twitter.
Para o Comprova, uma evidência é comprovada quando não restar nenhuma dúvida sobre a sua veracidade.
Como verificamos
Na verificação foram consultados o Ministério da Saúde, o Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido (NHS, na sigla em inglês) e estudos sobre o SUS.
O Comprova também entrevistou Oswaldo Yoshimi Tanaka, diretor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP); Alcides Miranda, médico especialista em saúde comunitária e professor de Saúde Coletiva na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); e Ivo Lima, mestre em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Além disso, por meio de sites dos governos nacionais e relatórios de organizações internacionais, analisamos como funciona o sistema de saúde em cada um dos outros países com mais de 200 milhões de habitantes
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.
Quem tem direito ao SUS?
A Constituição Federal brasileira define que todo brasileiro tem direito a ter acesso à saúde via SUS. A frase “a saúde é direito de todos e dever do Estado” define a ideia. Qualquer pessoa pode ir a uma unidade básica de saúde ou a um hospital e receber atendimento de graça. O SUS não é apenas atendimento médico, mas também vigilância em saúde e fornecimento de medicamentos.
Beneficiários de planos de saúde também têm direito a atendimento pelo SUS – nesse caso, no entanto, as operadoras dos planos privados são obrigadas pela lei a ressarcir os cofres públicos pelos serviços prestados que tenham cobertura do plano.
O que mais o SUS faz?
Há, também, outros serviços que beneficiam a toda população, como atendimento de emergência por acidentes por meio do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu); regulação de hemocentros assim como transplante de órgãos.
Além disso, o SUS financia pesquisas epidemiológicas, importantes para ajudar o governo a avaliar o risco de ocorrência de surtos ou epidemias e também trazer dados para o controle e prevenção de doenças. E, por meio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), fiscaliza a qualidade de alimentos em restaurantes e supermercados.
Vacinas exigidas para bebês também são oferecidas pelo SUS, por meio do Programa Nacional de Imunização, que oferece todas as proteções recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A estratégia é reconhecida mundialmente como um sucesso na vacinação infantil.
O SUS fornece remédios de graça? Quais?
Sim. Entre as doenças cujos medicamentos são fornecidos gratuitamente pelo SUS estão diabetes, pressão alta, asma, HIV e alzheimer. A lista de drogas fornecidas é atualizada anualmente e se chama Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename). O Ministério da Saúde informou ao Comprova que, na última década, o número de remédios incluídos na lista aumentou em 54%: passou de 574 drogas em 2010 para as atuais 885.
Quem precisa de um remédio que está na lista, mas não é oferecido pelo posto de saúde, ou que não está na lista, pode processar o governo (judicializar) para obrigá-lo a pagar o tratamento. Em geral, pacientes ganham a ação se provam à Justiça que correm risco de vida caso fiquem sem o remédio solicitado.
Como era a saúde no Brasil antes do SUS?
Antes de o SUS ser regulamentado em 1990, só eram atendidas as pessoas que tinham carteira assinada, contribuíam para a Previdência e, portanto, faziam parte do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps).
Quem não tinha carteira assinada podia apenas participar de programas específicos do Ministério da Saúde ou das secretarias de Saúde estaduais ou municipais (como vacinação ou combate a alguma doença específica). Caso contrário, era preciso pagar plano privado ou buscar atendimento em instituições filantrópicas, como as Santas Casas de Misericórdia.
A criação do SUS aconteceu no contexto do fim da ditadura militar e diante de denúncias sobre a medicina previdenciária, como os seus custos. O sistema brasileiro foi inspirado no britânico, o NHS (National Health Service), que havia sido implantado 40 anos antes, após o fim da Segunda Guerra.
O NHS é pioneiro no modelo beveridgiano de serviço nacional de saúde, que entende a saúde como uma forma de cidadania. Outros modelos na Europa também se baseiam na ideia do NHS de fornecer cobertura integral para todos os cidadãos, como o de Portugal, criado em 1974, o da Itália, de 1978, e o da Espanha, de 1986.
Uma diferença entre esses sistemas e o SUS é que, no Brasil, apesar de o Estado ser obrigado a dar assistência de saúde gratuita à população, o governo, proporcionalmente, investe menos na área do que outros países.
De acordo com um relatório do Banco Mundial de 2017, mais da metade dos gastos totais com saúde no Brasil são financiados privadamente (individualmente e planos de saúde privados). No país, a despesa pública com saúde representa 48,2% do total, enquanto a média entre os integrantes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de 73,4%. Já entre nações com condições econômicas semelhantes, o Brasil está acima apenas da média entre os países do BRICS (Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul), 46,5%.
Como afirma Alcides Miranda, médico especialista em saúde comunitária e professor de Saúde Coletiva na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), os demais países com sistemas de saúde universais como o SUS investem um valor, em relação ao PIB, bem maior do que o brasileiro. “Temos mais população e financiamento público que chega a um terço de outros países na saúde. Mas, mesmo com essas dificuldades, o SUS tem cumprido uma função de priorizar os mais vulneráveis e os mais expostos a riscos.”
O SUS britânico fornece remédios de graça?
A publicação que verificamos erra ao dizer que o NHS não fornece medicação “totalmente de graça”. O sistema britânico é financiado por impostos e fornece medicamentos de graça para doenças crônicas (como diabetes) e para alguns grupos populacionais, como idosos, menores de 16 anos, grávidas e pessoas beneficiadas por programas assistencialistas.
Para o resto da população, há uma taxa de até 9 libras (cerca de R$ 45) para medicações receitadas por médicos do NHS, pois os remédios são subsidiados pelo governo. Quando está internado, o paciente não paga pelo remédio. Remédios para câncer e infecções sexualmente transmissíveis (IST) não têm impostos.
“O NHS tem regras mais restritas sobre o que é ou não oferecido. O SUS, pela Constituição brasileira, deve oferecer tudo. Está escrito: ‘A saúde é um direito do cidadão e um dever do Estado’. Temos uma relação de medicamentos obrigatoriamente fornecidos, como para diabetes ou pressão alta. Se o remédio não estiver na lista, a pessoa pode judicializar [entrar com processo] e ganhar”, explica Oswaldo Yoshimi Tanaka, diretor da faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).
O atendimento primário (em postos de saúde) é de graça e cobre praticamente toda a população britânica – o SUS, por outro lado, cobria cerca de 40% dos brasileiros até 2012. O NHS ainda oferece ambulâncias de graça, internações e assistência social para doenças mentais e tratamento dentário de graça para alguns grupos. Em alguns casos, oferece desconto, assim como o SUS, para que o indivíduo pague o resto.
Como é em outros países com mais de 200 milhões de habitantes?
Nenhum dos outros países com mais de 200 milhões de habitantes no mundo tem um sistema de saúde com atendimento integral para todos os cidadãos.
De acordo com Ivo Lima, mestre em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), países em desenvolvimento têm adotado como alternativa a adoção de sistemas baseados em seguros para ampliar a cobertura em vez da criação de um sistema universal. “Há a cobertura por um seguro, mas é básico. Há uma desigualdade relevante, porque pessoas mais pobres estão mais submetidas ao risco de adoecer, mas são as que menos têm acesso ao serviço de saúde”, afirmou. “É diferente do seguro nacional alemão (onde a cobertura está ligada ao emprego). Lá, não tem diferenças no acesso ao serviço de saúde”.
Saiba qual é o modelo em cada um dos outros países com mais de 200 milhões de habitantes:
China
Na China, o sistema público de saúde não é gratuito. Existem os seguros de saúde públicos e os privados. O seguro público é financiado em conjunto por empregados, empregadores e pelo governo. A depender se a região é urbana ou rural, mais ou menos desenvolvida, variam também as porcentagens de subsídio pelo Estado. Além de ajudar a financiar o seguro de saúde em si, os pacientes têm que pagar taxas pelos atendimentos e medicações prescritas, e parte desses gastos pode ser reembolsada posteriormente. Estimativas mostram que, em 2011, a parcela da população coberta por seguro de saúde público passava dos 95%. O sistema de saúde chinês era universal e gratuito até a década de 80. A partir daí, ele sofreu diversas reformas.
Índia
O acesso à saúde é um direito constitucional na Índia. Apesar disso, não há um sistema para atendimento universal como o SUS e, segundo a Newsweek, em 2018, 70% dos custos com saúde eram pagos pelos pacientes e essa foi a causa de quase 7% da população estar abaixo da linha da pobreza. Naquele ano, foi implantado o Modicare (em referência ao primeiro-ministro Narendra Modi), um programa que oferece cobertura de até 500 mil rúpias anuais por família (R$ 28,6 mil, na conversão do dia 7 de outubro) para tratamento hospitalar para moradores pobres de áreas rurais e urbanas (neste caso, usando como pré-requisito a ocupação e incluindo empregados domésticos e trabalhadores da área de construção, por exemplo). Quatro anos antes, havia sido criado o National Health Mission, que coordenou iniciativas como o combate à pólio.
Estados Unidos
Não há sistema universal de saúde – é necessário pagar para ter atendimento ou remédios. Em hospitais, o paciente pode não ser atendido se não tiver plano de saúde (é o caso de 10% dos norte-americanos, o equivalente a 30,4 milhões de pessoas). O governo subsidia planos de saúde para alguns grupos específicos, como idosos ou pessoas de baixa renda – no entanto, mesmo para eles o atendimento e os remédios não são de graça. Estudo publicado em março no American Journal of Public Health aponta que, dos pedidos de falência feitos nos EUA entre 2013 e 2016, 66,5% estavam ligados a dívidas de saúde.
Indonésia |
Existe um programa de saúde pública criado em 2014, o JKN, com o objetivo de reduzir as dificuldades de acesso a serviços básicos pela população. O atendimento é feito por meio de seguros oferecidos pelo governo, com cobertura e preço que variam a depender do indivíduo – quem tem emprego formal, por exemplo, pode ter um seguro, parecido com o funcionamento do Inamps no Brasil, antes da criação do SUS. Em alguns casos, o seguro é de graça, como para populações vulneráveis. Vacinas básicas gratuitas são oferecidas para bebês, crianças em idade escolar e para meninas jovens, por exemplo. O atendimento em unidades básicas de saúde tem custo mais acessível, enquanto serviços mais complexos são bastante caros, segundo o Ministério das Relações Exteriores do Brasil.
Paquistão
De acordo com relatório de 2015 do Escritório Europeu de Apoio ao Asilo (Easo) da União Europeia, o sistema de saúde do Paquistão é fortemente privado. O relatório afirma que à época, mais de 65% da população rural não tinha acesso a instalações básicas de saúde ou serviços de qualidade. Segundo texto de 2018 do jornal Dawn, um dos mais prestigiosos do país, cerca de 51% da população paquistanesa não tem acesso a serviços básicos de saúde. O sistema de saúde público é descentralizado, o que significa que ele pode variar entre as diferentes regiões do país. Em 2015, o primeiro-ministro do país lançou um programa nacional de seguro de saúde (PMNHIP) voltado a famílias vivendo abaixo da linha de pobreza, e que atualmente atinge cerca de 4,7 milhões de pessoas, de 77 distritos diferentes (o país tem mais de 150 distritos). O programa consiste em fornecer cupons de saúde de valor fixo, para cobrir serviços emergenciais e de maternidade, por exemplo. Há também um segundo vale com valor maior para sete doenças consideradas de tratamento prioritário, como diabetes, câncer e HIV.
Nigéria
O país tem o National Health Insurance Scheme (NHIS), que é um órgão criado pelo governo federal em 1999. Ele funciona como um plano pré-pago: paga-se um valor regular fixo e os fundos dessa arrecadação devem ser destinados a Organizações de Manutenção em Saúde (HMOs), que administram os hospitais e clínicas da Nigéria. Contudo, o sistema de saúde no país é precário devido à corrupção governamental.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
A publicação foi feita no Twitter no dia 2 de outubro. Em 9 de outubro, tinha 25,7 mil retweets e 65,8 mil curtidas na rede social. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Evidência comprovada'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/publicacao-atribui-a-bolsonaro-sucesso-em-indices-de-seguranca-com-dados-fora-de-contexto/ | COMPROVA | Publicação atribui a Bolsonaro sucesso em índices de segurança com dados fora de contexto | null | 2019-10-09 | O texto tira os dados de contexto e credita à nova gestão efeitos de governos anteriores
É enganosa uma publicação que circula nas redes sociais exaltando o governo Jair Bolsonaro (PSL) por reduzir a criminalidade no Brasil, bater recorde na apreensão de drogas e deflagrar o maior número de operações da Lava Jato até então. O texto tira os dados de contexto e credita à nova gestão efeitos de governos anteriores.
A taxa de mortes violentas intencionais já havia caído 10,8% em 2018, na gestão de Michel Temer (MDB), de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Quanto às drogas, os dados vão até 31 de agosto e indicam que há recorde na apreensão de haxixe e que a apreensão de cocaína é a segunda maior desde 1995. A apreensão de maconha está em menos da metade do recorde de 2017.
Quanto à Lava Jato, em 2019, não foram deflagradas mais operações do que em anos anteriores.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, chegou a repercutir o tuíte com os dados imprecisos com o comentário: “seguimos”.
O Comprova verificou uma publicação do site Crítica Nacional que foi compartilhada em diversos perfis e páginas de redes sociais, como @PorTiMeu_BR no Twitter e Direita RJ no Facebook.
Enganoso para o Comprova é o conteúdo que confunde o leitor ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos
Para esta verificação, o Comprova consultou o Ministério da Justiça, a Polícia Federal, a Procuradoria da República no Rio de Janeiro e os dados de violência do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Também ouvimos o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Daniel Cerqueira, um dos coordenadores da publicação Atlas da Violência, e a professora de Segurança Pública da Universidade Federal Fluminense (UFF) Jacqueline Muniz, que ajudou a criar e implantar o sistema nacional de estatística criminal do Ministério da Justiça.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
Houve redução na criminalidade no Brasil?
Sim. Nos primeiros meses da gestão Bolsonaro houve queda nas mortes por violência, de acordo com dados do Ministério da Justiça. Os pesquisadores ouvidos pelo Comprova destacam, no entanto, que a tendência não é recente e que não é possível atribuir os números ao governo atual.
De acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o número de mortes violentas intencionais em 2018 já havia caído 10,8% no Brasil em comparação a 2017, no governo Michel Temer (MDB). Em pelo menos 13 Estados esse índice já vinha diminuindo desde 2011. A taxa de mortes violentas intencionais inclui homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e as mortes decorrentes de intervenções policiais.
Embora o número de mortes em geral tenha caído de um ano para outro, as mortes decorrentes de intervenções policiais cresceram 19,6% em relação a 2017. Os dados mais recentes disponíveis do Fórum Brasileiro de Segurança Pública são referentes ao ano de 2018. (Para que você veja as taxas de criminalidade por Estado, basta clicar na seta para a direita ou para a esquerda. Também é possível selecionar uma das opções ao clicar na seta que aponta para baixo.)
Taxas de criminalidade
Infogram
O Ministério da Justiça disponibiliza dados sobre criminalidade até maio de 2019 na plataforma Sinesp, que compila boletins de ocorrência enviados pelos Estados ao governo federal.
No entanto, como afirma texto publicado pela Folha, o sistema é visto com desconfiança por pesquisadores, por não obedecer a critérios básicos de padronização e estatística.
Criado há sete anos, o Sinesp só começou a ser alimentado sistematicamente pelos estados no fim de 2018. Além disso, não é exigido um critério técnico dos estados e distritos nem é fiscalizada a origem da coleta de dados.
Segundo a plataforma, nos cinco primeiros meses deste ano, houve queda de 23,7% no número de vítimas no País — estatística que inclui homicídio doloso, lesão corporal seguida de morte e roubo seguido de morte. Essa taxa também já havia diminuído 10,3% no período de janeiro a maio de 2018 em relação a 2017.
Sinesp
Infogram
Ao buscar créditos pela melhora da segurança no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro declarou no Twitter, em maio: “‘especialistas’ dirão que a queda [em homicídios] não tem relação com nossas ações, mas se o número tivesse aumentado, certamente culpariam o governo”.
Pesquisadores ouvidos pelo Comprova afirmam que os efeitos de políticas de segurança pública não podem ser notados a curto ou médio prazo. Além disso, a competência na solução de problemas na área costuma ser dos governos estaduais e municipais (veja a explicação mais abaixo).
“Considerando o pouco tempo de governo e, portanto, de implementação de qualquer política pública, não se pode atribuir uma participação da política atual na queda das taxas de crimes”, disse a professora Jacqueline Muniz, da UFF.
O pesquisador do Ipea Daniel Cerqueira afirma ainda que, além de não ser responsável pela diminuição nos índices de violência, o governo Bolsonaro age de forma “contraproducente” do ponto de vista da segurança pública.
Segundo ele, uma das medidas propostas pelo Executivo, de flexibilizar o acesso a armas de fogo, pode resultar no aumento de mortes nos próximos anos. “Existe uma evidência internacional que quanto mais armas, mais crimes, mais homicídios e mais suicídios”, afirma. O Comprova já fez uma verificação sobre o tema.
Cerqueira critica os principais pontos do pacote anticrime proposto pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. Para ele, o excludente de ilicitude e o endurecimento das penas de crimes são um “contrassenso”.
“O excludente de ilicitude de forma generalizada é uma licença para matar”, aponta. “E o endurecimento na punição é completamente contrário ao diagnóstico da violência no Brasil. O problema do país é a identificação dos homicidas e dos grandes criminosos. Por que isso acontece? Falta investigação e inteligência.”
De acordo com o Atlas da Violência de 2019, a taxa de elucidação de homicídios não é calculada no Brasil e, nos Estados onde esse índice é aferido, a média fica entre 10% e 20%.
Redução nos índices de criminalidade podem ser atribuídos ao governo federal?
Segundo os especialistas em segurança pública ouvidos pelo Comprova, a queda nos índices de criminalidade não pode ser atribuída ao governo federal. Em geral, resultados negativos ou positivos estão ligados a ações estaduais e municipais. Além disso, o efeito gerado por políticas públicas não costuma ser imediato.
De acordo com Jacqueline Muniz, da UFF, o governo federal só pode atuar sobre os assuntos de segurança pública de forma indireta, já que são os poderes estadual e municipal que administram de maneira direta e continuada os territórios e suas populações.
“Ninguém mora, estuda e trabalha na abstração que é a União. A população vive nas cidades e no campo, cuja competência de intervenção direta é do município e do Estado”, explica ela.
Para Muniz, o principal papel do governo federal é o de indução — ou seja, o de estimular os governos estaduais a aplicarem uma determinada política pública. Além disso, a União pode repassar recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública para os Estados e municípios e intervir com o Exército, de maneira pontual e complementar às ações das polícias estaduais.
O pesquisador do Ipea Daniel Cerqueira acrescenta que, além dos papéis de indução e no financiamento, outra atuação esperada do governo federal é participar da capacitação dos operadores e gestores da segurança pública.
Do ponto de vista jurídico, ele diz que não há uma definição clara a respeito de quem tem responsabilidade sobre a segurança pública. Cerqueira explica que, durante a elaboração da Constituição de 1988, a parte que regulamenta a área foi coordenada pelos militares. O artigo que versa sobre o tema, o art.144, não é muito específico.
“Nas outras sete Constituições do Brasil e mesmo no Brasil Colônia, não havia uma discriminação legal sobre qual o papel do governo federal na segurança pública. Isso ainda continua sendo do ponto de vista jurídico e legal um limbo”, afirma.
Os dois acadêmicos concordam que políticas de segurança pública não têm resultado imediato. A professora Jacqueline Muniz explica que a atuação da União tem efeito cumulativo. Segundo ela, para entender a participação do governo federal na redução de índices de criminalidade, é preciso analisar indicadores de quanto o Executivo repassou para os Estados, como esses recursos foram aplicados e quais foram os resultados obtidos a partir do uso do dinheiro federal.
“Considerando o pouco tempo de governo e, portanto, de implementação de qualquer política, não se pode atribuir uma participação da política atual na queda das taxas de crimes”, disse ela.
“Há que ir além e demonstrar o que, de fato, se tem feito em apoio aos programas e ações desenvolvidos pelos estados e municípios. É preciso esclarecer quais são as boas práticas que o governo federal tem participado desde janeiro de 2019 que têm ajudado os estados”.
Há um programa pontual da gestão Bolsonaro, focado em cinco cidades brasileiras, já com resultados iniciais: o Em Frente, Brasil. Os municípios de Ananindeua (PA), Cariacica (ES), Goiânia (GO), Paulista (PE) e São José dos Pinhais (PR) registraram queda de 53% em homicídios em setembro, na comparação com o mesmo mês de 2018.
Por que os índices de violência diminuíram?
Consultada pelo Comprova, a Polícia Federal não se posicionou sobre a redução nos crimes. Segundo o pesquisador do Ipea Daniel Cerqueira, são três os principais motivos para a queda nos índices. Dois aspectos são tendências de longo prazo que ajudaram a impedir um aumento ainda maior dos índices de violência.
O primeiro deles é uma mudança severa no regime demográfico brasileiro, com o envelhecimento da população. Outro ponto de mudança para a segurança pública foi o Estatuto do Desarmamento, de 2003. “Isso freou o aumento dos homicídios em alguns Estados em que as polícias focaram na retirada de armas de fogo na rua”, explica o pesquisador.
Além disso, mais recentemente experiências pontuais em Estados e municípios contribuíram para puxar o índice de violência para baixo. “Estados que fizeram bons programas de segurança pública, como Espírito Santo e Paraíba, têm queda de mais de sete anos nas taxas de homicídios”, diz Cerqueira. “Em termos municipais, vários prefeitos fizeram bons programas, como em Diadema, Canoas, e em municípios do Sul, como Pelotas.”
Um dos coordenadores da publicação Atlas da Violência, Cerqueira explica que a queda no número de mortes do país é uma tendência observada há alguns anos. Como citado anteriormente, em 2018 esse índice já havia caído 10,8% no país em relação ao ano anterior.
“Mesmo nos anos anteriores, em que a taxa global de homicídios no Brasil estava crescendo, havia cada vez mais unidades da federação no Brasil diminuindo esse índice”, diz ele. “A taxa só cresceu em 2017 por conta da guerra contra o narcotráfico no Norte e no Nordeste.”
Segundo Cerqueira, de 2016 para 2017 a taxa de homicídios já havia caído em 15 estados brasileiros. No ano seguinte, esse número aumentou para 21 unidades da federação.
Houve recorde em drogas apreendidas no Brasil?
Há um recorde na gestão Bolsonaro: a apreensão de haxixe. A Polícia Federal apreendeu, de janeiro a 31 de agosto, 5,7 toneladas da droga – mais de 2 toneladas foram em uma única operação, realizada no início do ano na Região Metropolitana de Fortaleza. O recorde anterior, de 1,2 tonelada de haxixe apreendida, foi em 2007.
O volume de apreensão de cocaína é, até agora, o segundo maior desde 1995. Na gestão Bolsonaro, houve apreensão de 69 toneladas da droga. O recorde é de 2018, quando a PF apreendeu mais de 79 toneladas de cocaína.
Não há recorde na apreensão de maconha: até agora, houve apreensão de 150,1 toneladas, mais da metade do que o ano passado, mas bem abaixo do recorde de 2017, quando a PF apreendeu 353,9 toneladas.
Ao analisar o período entre janeiro e junho, a apreensão de maconha no governo Bolsonaro está abaixo do registrado desde 2017.
Em relação às demais drogas, as apreensões de LSD, metanfetamina e ecstasy estão longe de bater recorde.
O gráfico abaixo compila os números de apreensão de drogas em todo o território nacional desde 1995, segundo dados da Polícia Federal.
Apreensão de drogas
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Lava Jato no governo Bolsonaro
A postagem verificada pelo Comprova diz que, em 2019, já foram deflagradas oito fases da operação Lava Jato. O dado, no entanto, está errado. Até a data da publicação, haviam sido deflagradas nove operações somente a partir das investigações realizadas pelo Ministério Público Federal do Paraná – sem levar em conta desdobramentos no Rio de Janeiro e em São Paulo.
Além disso, as fases da operação Lava Jato não têm elo de ligação com o governo. Elas são solicitadas pelo Ministério Público, com autorização judicial, a partir de investigações da Polícia Federal. O MP é um órgão independente, que atua sem interferência do Executivo, Legislativo ou Judiciário. Ou seja, o número de operações Lava Jato não pode ser influenciado pela vontade de um governante.
Por meio do levantamento oficial da operação Lava Jato, disponibilizado pelo site do MPF (Ministério Público Federal), não é possível avaliar ao certo se houve aumento ou diminuição no número de ações deflagradas no decorrer dos anos e afirmar que há um recorde de operações no governo Bolsonaro.
Isso porque o site não exibe as datas em que as fases aconteceram. A página mostra, entretanto, o número total de operações feitas desde 2014 – quando operação começou, em Curitiba – nos três estados (Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná). A linha do tempo – que traz todas as fases da Lava Jato – também está desatualizada.
As operações das três forças-tarefa são autorizadas pela Justiça Federal em Curitiba, São Paulo e no Rio de Janeiro, e cada instituição é responsável por contabilizar as operações de seus respectivos órgãos. Eis a tabela disponibilizada pelo MPF sobre as operações.
A última atualização dos dados da 1ª Instância de São Paulo foi feita em 16 de setembro de 2019. Até então, duas operações haviam sido deflagradas. O site não deixa claro, no entanto, a data em que as ações foram feitas.
O mesmo ocorre com as instâncias de Curitiba e Rio de Janeiro. A última atualização do Rio é de 20 de setembro de 2019, e, até a ocasião, 39 operações foram feitas. Por e-mail, a Procuradoria da República do Rio confirmou que não faz um levantamento ano a ano e que as únicas informações disponíveis estão no site.
Os dados de Curitiba foram atualizados em 26 de setembro. Consta no site que, até então, tinham sido deflagradas 65 operações. O número está, entretanto, desatualizado porque, em 27 de setembro de 2019, foi deflagrada a 66ª fase da Lava Jato a partir do Paraná. A investigação, denominada “Alerta Mínimo”, mirou um suposto esquema de lavagem de dinheiro envolvendo doleiros e funcionários do Banco do Brasil.
No caso de Curitiba, em especial, sabe-se que nove fases foram deflagradas em 2019. O Comprova chegou a este número depois de subtrair o número total de operações feitas até o momento (66 fases) pelo número de operações feitas até o fim de 2018 (57). Veja um gráfico que mostra o número de operações deflagradas pela força-tarefa da Lava Jato do Paraná, ano a ano, desde 2014, quando as investigações começaram:
Lava Jato na 1ª instância em Curitiba
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Total de operações da PF em 2019
As discussões a respeito do futuro da Lava Jato cresceram nos últimos meses diante de medidas tomadas pelo presidente Jair Bolsonaro percebidas como contraproducentes para o andamento das investigações. Entre outras coisas, o presidente foi acusado de interferir na Polícia Federal.
A pedido do Comprova, o Ministério da Justiça disponibilizou um levantamento que mostra todas as operações feitas pela Polícia Federal nos últimos 10 anos. Os dados foram compilados, primeiramente, a pedido do jornal Folha de S. Paulo, que revelou em reportagem que, em 2019, a PF fez o menor número de operações nos últimos 5 anos.
A Polícia Federal é um órgão vinculado à pasta da Justiça e Segurança Pública, que no governo do presidente Jair Bolsonaro está sob o comando do ministro Sergio Moro.
O ano que a PF mais fez operações foi 2018, com 629 ações executadas. Veja os números de todas as operações realizadas entre 2009 e 2019:
Operações PF
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Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
O texto verificado foi publicado no site e no Twitter do Crítica Nacional em 29 de setembro. Até 8 de outubro, havia mais de 4 mil compartilhamentos e 18,6 mil curtidas. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-700-empresas-japonesas-querem-investir-no-brasil-impulsionadas-pelas-reformas-do-governo-bolsonaro/ | COMPROVA | É falso que 700 empresas japonesas querem investir no Brasil impulsionadas pelas reformas do governo Bolsonaro | null | 2019-10-04 | 700 é o número aproximado de empresas japonesas que já estão operando no Brasil. Postagens usam o número para associar suposto interesse das companhias com reformas defendidas pelo governo
É falso que 700 empresas japonesas querem investir no Brasil por causa das reformas prometidas pelo governo de Jair Bolsonaro (PSL), como dizem publicações no Facebook que viralizaram nesta semana. Na verdade, esse é o número correspondente ao total de empresas japonesas que já funcionam em território brasileiro – segundo a Embaixada do Japão no Brasil, o número exato é de 707 empresas, dado compilado pelo Ministério das Relações Exteriores japonês.
As publicações usam um link do site Conexão Política, datado de 12 de setembro, cujo título inicialmente era: “700 empresas japonesas querem investir no Brasil com expectativa ao governo Bolsonaro”. No entanto, o título foi alterado para: “Embaixador japonês diz que diversas empresas do Japão e do mundo querem investir no Brasil”.
Apesar de publicado em setembro, o texto do Conexão Política reproduz uma entrevista do embaixador japonês no Brasil, Akira Yamada, dada à Agência Brasil e publicada em 24 de março. O texto da Agência Brasil traz a informação de que, segundo Yamada, “há cerca de 700 empresas japonesas atuando no Brasil” e que “esse número não cresce há cinco anos”.
Para o Comprova, falso é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
O Comprova entrou em contato com a equipe do Conexão Política via e-mail para questioná-la sobre as informações , mas ainda não obteve resposta.
Como verificamos
Para esta verificação, procuramos a entrevista original do embaixador Akira Yamada à Agência Brasil para fazer a comparação entre o que o diplomata de fato falou e o que estava sendo compartilhado no Facebook.
Também entramos em contato com órgãos diretamente ligados à relação entre Brasil e Japão em busca de dados sobre a presença de empresas japonesas no país. Procuramos a Embaixada do Japão no Brasil, a Câmara do Comércio e Indústria Japonesa no Brasil e a Japan External Trade Organization (Jetro, braço de comércio exterior do governo japonês).
Além disso, procuramos informações sobre empresas japonesas no Brasil junto a órgãos do governo brasileiro, como o Banco Central e o Ministério da Economia.
Para encontrar publicações com o título enganoso, antes da alteração que levou à versão atual, usamos a busca do Facebook.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova acessando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
A entrevista do embaixador
O texto do Conexão Política reproduz trechos da entrevista do embaixador Yamada à Agência Brasil, na qual o diplomata indica interesse de empresas japonesas em investir no Brasil “se a política se estabilizar e a economia caminhar bem”.
No entanto, em nenhum momento Yamada cita número de empresas japonesas interessadas em investir no Brasil. O único valor que o embaixador de fato cita, de acordo com o texto da Agência Brasil, é o de 700 empresas já instaladas no país.
Yamada também afirmou, segundo a notícia da Agência Brasil, que “aumentou o número de executivos japoneses interessados em vir para o país conhecer os projetos brasileiros e investir” e que “os investimentos estão atrelados às reformas da Previdência e tributária em tramitação no Congresso Nacional”.
Ao Comprova, a assessoria de comunicação da Embaixada do Japão no Brasil confirmou o teor das declarações de Yamada à Agência Brasil.
Quantas empresas japonesas existem no Brasil?
Por e-mail, a Embaixada do Japão no Brasil informou nesta sexta-feira (4) que “o número atual das empresas japonesas calculado em 2017 é de 707”.
A Jetro, uma organização de comércio exterior ligada ao governo japonês, forneceu um relatório do Ministério das Relações Exteriores japonês com informações sobre cidadãos do país no exterior, cuja versão mais recente é de 2017 e está em japonês, sem tradução para outro idioma. Ao observar a linha 18, destacada de amarelo, podemos ver que havia 707 empresas japonesas no Brasil até outubro de 2017.
O Comprova também procurou a Câmara de Comércio e Indústria Japonesa no Brasil para confirmar se o número de 700 empresas no país estava correto, mas não teve resposta.
A lista de empresas associadas à Câmara, atualizada em 15 de julho deste ano, traz 356 companhias. Destas, 225 são japonesas.
O interesse japonês em investir no Brasil
Também recorremos a informações do governo brasileiro para entender o tamanho do interesse japonês em investir no Brasil. Após uma queda no investimento depois de 2014, o montante investido por empresas japonesas no Brasil voltou a crescer em 2018.
Segundo um relatório do Banco Central, entre 2014 e 2017 houve queda no investimento japonês no Brasil, indo de US$ 3,8 bilhões para US$ 537 milhões.
Em 2018, o volume de capital investido avançou para US$ 1,1 bilhão. No primeiro semestre deste ano, o Japão investiu US$ 747 milhões no Brasil. Você pode acessar o relatório do Banco Central nesse link.
Outros dados do governo, desta vez da Rede Nacional de Informações sobre o Investimento (Renai), do Ministério da Economia, mostram que nos últimos anos não houve nada parecido com um patamar de centenas de empresas japonesas interessadas em investir no Brasil. O volume prometido de investimento, inclusive, já foi bem maior em anos anteriores.
As informações da Renai mostram quanto se planejou investir no Brasil com capital japonês desde 2004. Esses investimentos anunciados poderiam envolver 100% de dinheiro japonês ou investimento conjunto com capital brasileiro ou de outros países.
A Renai faz a ressalva de que seus relatórios “não representam um levantamento dos investimentos realizados na economia brasileira” e têm como objetivo “apresentar as intenções para execução de projetos futuros”. A planilha com dados desde 2004 pode ser baixada aqui.
Entre janeiro e junho deste ano, o Brasil teve seis anúncios de investimentos envolvendo capital japonês, totalizando US$ 234 milhões, a partir de seis empresas.
gráfico empresas capital japonês
Infogram
No primeiro semestre do ano passado, os anúncios de investimento com capital japonês no Brasil somaram US$ 1,3 bilhão. Na série histórica, o maior valor anunciado é para o primeiro semestre de 2008, com US$ 11,7 bilhões. Os valores são nominais, ou seja, não foram corrigidos pela inflação e correspondem ao que foi anunciado em cada ano.
Desde 2004, o número de empresas que anunciaram investimentos no Brasil com dinheiro japonês nunca chegou perto da ordem das centenas. A quantidade mais alta de companhias que anunciaram investimentos foi de 31, no ano de 2006. No primeiro semestre de 2019, foram seis empresas.
gráfico investimentos japoneses – US$
Infogram
A Embaixada do Japão também deu informações sobre o interesse do país em investimentos no Brasil. Em e-mail enviado ao Comprova nesta sexta-feira (4), a embaixada mencionou o Softbank, que “estabeleceu em março um fundo de investimento de 5 bilhões de dólares” por meio do qual investe em empresas brasileiras, e o anúncio feito pela Toyota no mês passado de que vai investir R$ 1 bilhão para a fabricação de um novo modelo de veículo.
A alteração no título
A verificação também mostrou que o Conexão Política alterou o título do post. O mesmo link foi compartilhado pelo site em dois dias diferentes com títulos distintos, um falso (“700 empresas japonesas querem investir no Brasil com expectativa ao governo Bolsonaro”) e outro que traz o real significado da entrevista do embaixador japonês (“Embaixador japonês diz que diversas empresas do Japão e do mundo querem investir no Brasil”).
Uma busca pelas palavras “conexão política” e “Japão” no Facebook permitiu encontrar a primeira publicação, ainda com o conteúdo falso, feita na página do Conexão Política no dia 12 de setembro, às 13h52 (veja o print da publicação). Até a tarde desta sexta (4), o link teve 1,2 mil compartilhamentos.
A mesma busca também mostra que, às 15h12 do dia 28 de setembro, o Conexão Política fez outro post no Facebook usando o mesmo link, mas já com o título “Embaixador japonês diz que diversas empresas do Japão e do mundo querem investir no Brasil”. O segundo post teve apenas 120 compartilhamentos até a tarde desta sexta (veja o print da publicação).
O link com o título enganoso também foi compartilhado no dia 27 pela página “Eu Sou Direita” e recebeu 10 mil compartilhamentos até esta sexta. Outra publicação, feita no grupo “Equipe de Bolsonaro de Plantão” no dia 25, tinha 2,2 mil compartilhamentos.
Repercussão nas redes
De acordo com dados do Crowdtangle, plataforma que mede a repercussão de links postados no Facebook, os posts com o link do Conexão Política tiveram mais de 1,7 milhão de interações (curtidas, compartilhamentos e comentários) até a tarde desta sexta-feira (4), entre elas 180 mil compartilhamentos. Algumas das páginas e grupos que postaram o link com o título enganoso foram Eu Sou Direita, Lava Jato Brasil, Equipe de Bolsonaro de Plantão e República de Curitiba.
Contexto
As publicações falsas feitas nesta semana vieram em paralelo à confirmação, na segunda-feira (30), da viagem do presidente Jair Bolsonaro ao Japão este mês. Bolsonaro vai comparecer à entronização do novo imperador do Japão, Naruhito, no dia 23.
Em junho, Bolsonaro visitou a cidade japonesa de Osaka por causa da conferência do G20, grupo formado pelas 20 maiores economias do mundo. Em 27 de junho, Bolsonaro não tinha agenda oficial e passeou pelo comércio local de Osaka, onde tirou fotos com transeuntes, de onde veio a imagem do post que o Comprova analisou.
Em julho, o embaixador do Japão no Brasil, Akira Yamada, participou de uma sessão solene no Senado, em Brasília. A sessão foi convocada pela senadora Leila Barros (PSB-DF) em homenagem aos 111 anos da imigração japonesa no Brasil. O país também tem a maior comunidade nipônica do mundo fora do Japão, com cerca de 2 milhões de pessoas, entre descendentes e japoneses natos.
Durante seu discurso, Yamada disse que “está convicto de que, se as reformas avançarem, muitas empresas japonesas voltarão a olhar para o Brasil novamente para se instalar e aumentar os investimentos”. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-leilao-vai-entregar-metade-do-petroleo-brasileiro-para-estrangeiros/ | COMPROVA | É falso que leilão vai entregar metade do petróleo brasileiro para estrangeiros | null | 2019-10-03 | Áreas oferecidas não correspondem à metade das reservas brasileiras, e Petrobras também participa do leilão
É falso um texto viralizado no Facebook que afirma que “quase metade do petróleo brasileiro vai ser entregue em leilão”. A publicação diz que recursos naturais brasileiros estariam sendo vendidos para empresas estrangeiras e responsabiliza o presidente Jair Bolsonaro (PSL) e o ministro da Economia, Paulo Guedes.
De fato, a Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) prevê a realização de um megaleilão no dia 6 de novembro para a exploração de quatro novas áreas do pré-sal na Bacia de Santos. Essas descobertas excedem as áreas concedidas à Petrobras em 2010, acordo que ficou conhecido como cessão onerosa. Ou seja, são áreas ainda inexploradas pela estatal brasileira.
O texto cita, corretamente, que a produção estimada para esses campos seria de 1,2 milhão de barris de óleo por dia. A ANP confirma que o excedente da produção chega a esse montante. A publicação viralizada também acerta que a produção de óleo do Brasil é de cerca de 2,6 milhões de barris diários, produção média, em 2019, até o momento. Considerando apenas o mês de agosto, foram quase 3 milhões de barris por dia.
No entanto, ao contrário do que afirma o título da publicação, as reservas que serão leiloadas não correspondem à metade do petróleo do país, hoje calculadas em 12,7 bilhões de barris.
Se somado esse potencial de produção de 1,2 milhão de barris à produção de agosto, esses novos campos seriam responsáveis por cerca de 28% da extração brasileira, e não por metade da produção.
Segundo o texto, “seria um nível inédito de participação estrangeira na extração de petróleo brasileiro”, mas, como o leilão ainda não foi realizado, não é possível saber quanto das reservas ficará nas mãos de empresas estrangeiras. Vence o leilão o consórcio ou a empresa que se comprometer a partilhar mais óleo com a União.
Foram habilitadas para o leilão 14 empresas de 11 países. Dessas, 13 são petroleiras estrangeiras. Entre elas estão empresas que já operam no país, como a anglo-holandesa Shell e a norueguesa Equinor. Há ainda a participação da Petrobras, única empresa nacional habilitada.
Mesmo que não seja a vencedora da licitação, a Petrobras poderá ficar com 30% da exploração em duas das quatro áreas que serão leiloadas.
Além disso, a participação de empresas estrangeiras em leilões de reservas de petróleo no país não foram implementadas pelo governo Bolsonaro. Desde 1997, no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), com a aprovação da Lei do Petróleo, a Petrobras deixou de ter exclusividade na exploração de petróleo no país.
Já em 2016, no governo de Michel Temer, permitiu-se que empresas estrangeiras operassem os campos do pré-sal sem participação da estatal. Até então, a estatal deveria ter pelo menos 30% de participação em qualquer consórcio de exploração e produção, limitando às estrangeiras o papel de sócios financeiros.
Considerando os quase 3 milhões de barris diários produzidos no país em agosto, 2,8 milhões foram de reservas operadas pela Petrobras, seja como operadora única ou como a operadora principal em consórcio com outras empresas. Em sequência, ficaram os 72 mil barris que foram extraídos sob operação da Equinor e 46 mil sob operação da Shell. As demais operadoras, sejam estrangeiras ou brasileiras, não chegaram a produzir 30 mil barris diários.
Esta verificação do Comprova analisou um texto publicado no site Esquerda Diário.
Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
Para esta verificação, o Comprova analisou os documentos publicados no site da ANP, na área que reúne informações sobre a Rodada de Licitações dos Volumes Excedentes da Cessão Onerosa, como o edital do leilão.
Além disso, entramos em contato com a assessoria de imprensa da ANP e consultamos reportagens publicadas em grandes veículos de imprensa sobre o megaleilão.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.
O que é o megaleilão
A Petrobras recebeu, em 2010, o direito de explorar até cinco bilhões de barris de petróleo na Bacia de Santos, pelo acordo de cessão onerosa, em que ela remunera o governo pela produção. No entanto, a ANP avaliou que essa reserva é ainda maior. O leilão, portanto, é para a extração desse volume excedente de petróleo, que tem reserva estimada entre de 6 a 15 bilhões de barris.
A licitação deverá render até R$ 106,3 bilhões em bônus de assinatura à União, que é o lance pago pelas empresas para obter a concessão. A produção estimada nessas áreas é de 1,2 milhão de barris de petróleo por dia.
Os valores são diferentes para cada uma das áreas e foram previstos na resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) que autorizou o leilão, publicada em abril de 2019. Búzios é o maior campo, com 852,21 quilômetros quadrados, e tem o maior valor: R$ 68,1 bilhões. Em seguida, estão Atapu, de R$ 13,7 bilhões; Sépia, de R$ 22,8 bilhões; e Itapu, de R$ 1,7 bilhão. O pagamento será iniciado no dia 27 de dezembro ainda deste ano.
Do valor total, R$ 33,6 bilhões vão para a Petrobras, que será ressarcida devido à mudança no contrato de cessão onerosa. Com isso, a União fica com R$ 72,8 bilhões. Uma parte deverá ser repassada para Estados e municípios ainda neste ano. A proposta do Senado é de que 15% vão para Estados e 15% para municípios, além de o Rio de Janeiro receber mais 3% do valor que caberá ao governo federal.
As regras para a divisão não foram promulgadas no dia 26 de setembro, com a Emenda Constitucional 102, que trata da cessão onerosa. Por isso, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), sugeriu que o governo edite uma Medida Provisória (MP) estabelecendo como será a distribuição do dinheiro. Para votar a reforma da Previdência em segundo turno, senadores cobram a MP.
Quem vence o leilão
As áreas do pré-sal serão leiloadas pelo regime de partilha, em que além de pagar para operar em um campo e de remunerar o poder público com royalties, as petroleiras precisam repassar para a União uma parte da produção em petróleo. Essa parcela é chamada de “excedente em óleo”.
Esse petróleo é entregue bruto para a estatal Pré-Sal Petróleo S.A (PPSA), que é responsável pela venda do mineral. Esse modelo de partilha é usado em áreas do pré-sal ou naquelas consideradas estratégicas pelo governo.
Vence o leilão a empresa que ofertar o maior percentual de “excedente em óleo” para a União, de acordo com o edital, lançado em setembro. Esse termo se refere ao percentual do petróleo explorado na área, por isso o modelo do negócio recebe o nome de “partilha de produção”.
Os percentuais mínimos previstos pela ANP são de 23,25% na área de Búzios, 25,11% na de Atapu, 27,65% na de Sépia e 19,82% na de Itapu.
Petrobras tem preferência
Assim como em todas as rodadas de leilão que oferecem áreas no regime de partilha, a Petrobras pode exercer no megaleilão o direito de preferência para atuar como operadora de um consórcio. A operadora é empresa efetivamente responsável pelo gerenciamento das atividades na área contratada no leilão.
Para esta licitação, a Petrobras manifestou em maio o interesse em fazer parte dos consórcios para as áreas de Búzios e Itaipu. Assim, mesmo que não seja a vencedora para esses campos, poderá ficar com 30% da exploração neles.
O edital do leilão explica que a estatal deverá reivindicar a participação nos dois blocos durante a sessão pública para a apresentação das ofertas, em 6 de novembro. Isso não se aplica no caso de ser a própria Petrobras a vencedora do leilão, isoladamente ou em consórcio. Caso a Petrobras não seja a ganhadora nem decida participar dos consórcios vencedores, a vencedora assumirá e indicará a operadora.
O edital ainda prevê que mesmo se uma operadora estrangeira ganhar o leilão, parte dos bens e serviços adquiridos para atividades de exploração e produção deve ser nacional. Além disso, deve ser assegurada preferência à contratação de fornecedores brasileiros.
A participação de estrangeiras na exploração do petróleo
Apesar de ter deixado de ter exclusividade na exploração do petróleo em 1997 — com a aprovação da Lei do Petróleo — mais de 20 anos depois, a estatal ainda é responsável pela operação da maior parte dos barris produzidos no país.
Dos quase 3 milhões de barris diários produzidos no Brasil em agosto, 2,8 milhões foram de reservas operadas pela Petrobras. Parte dessas reservas ela administra em conjunto com outras petroleiras mas detém o controle da operação.
A primeira rodada de licitações da ANP foi realizada em junho de 1999. A agência concedeu 12 das 36 áreas leiloadas e 13 empresas estrangeiras participaram da concorrência.
Desde então, foram realizados diversos outros leilões, ano a ano, até 2006, quando foi descoberto o pré-sal. Após a confirmação da descoberta do megacampo, hoje chamado de Búzios, o governo decidiu rever as regras do setor e interrompeu por cinco anos a realização de leilões, o que levou a um processo de desmobilização de empresas estrangeiras no país e queda de investimentos no setor.
Em 2010 foram criados os contratos de partilha. Eles garantiam à Petrobras participação mínima de 30% nos consórcios, além de exclusividade na operação dos projetos, limitando às estrangeiras o papel de sócios financeiros.
No governo Temer, em 2016, as regras mudaram e passou a ser permitido que empresas estrangeiras sejam operadoras de campos do pré-sal. Também deixou de ser obrigatória a participação da estatal com um mínimo de 30% de cada consórcio vencedor.
Consórcios liderados por empresas estrangeiras levaram 6 das 13 áreas do pré-sal licitadas sob Temer, tendo sido responsáveis por 99% dos R$ 6,8 bilhões arrecadados.
No megaleilão previsto para novembro, 14 petroleiras foram habilitadas. Dessas, 13 são petroleiras estrangeiras e a Petrobras é a única empresa nacional habilitada.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
O texto verificado foi publicado no site e no Facebook do Esquerda Diário em 30 de setembro, além de ter sido postado também por várias páginas no Facebook como “Grupo de Apoio ao Jornalista Glenn Greenwald”, “Acorda meu povo” e “Avante! O PT é a Chama da Luta e da Resistência” .
Até a tarde do dia 3 de outubro, o conteúdo tinha mais de 19 mil interações, com 11,4 mil curtidas, 5,8 mil compartilhamentos e 1,9 mil comentários.
Leia também
Entenda o que é e como funciona a cessão onerosa (Folha)
Vinte anos após 1º leilão, Petrobras opera 95% da exploração de petróleo (Folha)
Se Petrobras não tem monopólio, por que mais empresas não fazem gasolina? (Uol) | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/terras-indigenas-em-rondonia-nao-foram-vendidas-a-empresa-irlandesa/ | COMPROVA | Terras indígenas em Rondônia não foram vendidas a empresa irlandesa | null | 2019-10-01 | Contrato foi anulado pela Justiça e era, na verdade, para venda de créditos de carbono
É falso um texto compartilhado no Facebook afirmando que terras indígenas em Rondônia teriam sido vendidas para uma organização irlandesa e que a negociação teria sido anulada pela Justiça.
Na realidade, um contrato para a venda de créditos de carbono, celebrado entre uma empresa irlandesa e uma associação indígena, foi suspenso em 2012 por decisão judicial provisória, a pedido da Advocacia Geral da União (AGU).
O contrato previa que a empresa irlandesa teria os direitos sobre os créditos de carbono gerados pela preservação da floresta pelos indígenas nos trinta anos seguintes. No entendimento da Justiça, os termos do acordo seriam ilegais e abusivos.
Caso fosse um contrato de venda, ele também seria considerado ilegal, pois a Constituição não permite a venda de terras indígenas.
O contrato foi assinado em 2011 pela irlandesa Celestial Green Ventures PL e a Associação Indígena Awo “Xo” Hwara, organização que é apontada no documento como representante das terras indígenas de Igarapé Lage, Rio Negro-Ocaia e Igarapé Ribeirão, localizadas em Guajará-Mirim, em Rondônia. A Celestial Green Ventures já havia feito negociações semelhantes no mesmo período com outros povos indígenas.
O valor total do contrato era de US$ 13 milhões, que seriam pagos à associação indígena em parcelas anuais de US$ 445 mil, ao longo de 30 anos. No entanto, nada chegou a ser pago, porque a venda de créditos de carbono foi anulada pela Justiça Federal em Rondônia em 2012, a pedido da AGU.
Um dos argumentos foi de que a Fundação Nacional do Índio (Funai) não participou da articulação. Segundo a legislação, as terras são de uso exclusivo dos indígenas e o aproveitamento dos recursos só pode ser efetivado se o governo federal concordar.
A anulação do contrato foi confirmada em 2018, decisão a que se refere o texto verificado pelo Comprova. O processo transitou em julgado em junho de 2019, ou seja, não cabe mais recurso.
Esta verificação do Comprova analisou um texto publicado no site Terça Livre, compartilhado em uma página de apoio ao ministro Sergio Moro e pela página República de Curitiba no Facebook.
Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
Para esta verificação, o Comprova consultou o andamento do processo de número 0012239-70.2012.4.01.4100 no site da Justiça Federal em Rondônia [Para visualizar os documentos, você deve acessar a área “inteiro teor”].
Além disso, entramos em contato com as assessorias de imprensa da Funai e da AGU e ouvimos Pedro Soares, gerente de REDD+ (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação) da ONG Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam).
Também foi contatado Raul Silva Telles do Valle, diretor de Justiça Socioambiental da ONG internacional World Wide Fund for Nature, conhecida pela sigla WWF.
O Comprova não conseguiu acesso à íntegra do contrato entre a Celestial Green e a Associação Indígena Awo “Xo” Hwara.
Através de pesquisas pelo CNPJ da empresa no site da Receita Federal, foi possível encontrar dois cadastros de 1997 com o nome da associação, um deles inativo desde 2008 e o outro ativo. Porém, o Comprova não conseguiu contato com a entidade através dos telefones que estão disponíveis.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.
O que é o mercado de créditos de carbono
O mercado de créditos de carbono do Redd (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação) prevê que uma entidade pode pagar outra por ela ter evitado a emissão de gases que provocam o efeito estufa (por meio de ações como a redução do desmatamento). Cada crédito é equivalente ao aquecimento global causado por uma tonelada métrica de dióxido de carbono (CO2).
O Redd é um mecanismo voltado para o pagamento daqueles que preservam florestas, reconhecendo que mantê-las de pé ajuda a conter a emissão de gases estufa. O conceito vem sendo desenvolvido desde 2003 nas Conferências do Clima organizadas pela ONU. Umas das discussões é de que maneira países desenvolvidos podem remunerar países em desenvolvimento que conservam suas florestas.
Por que o contrato foi anulado?
Segundo as decisões dos juízes, há dois argumentos principais para a anulação do contrato: o fato de que a lei prevê consulta às comunidades indígenas nas negociações e que a Funai deveria ter sido contatada. Para isso, usam como base o artigo 8º do Estatuto do Índio e o artigo 231 da Constituição Federal.
Também foi apontado que o uso das terras indígenas é exclusivo dos povos indígenas e que, apesar do direito ao uso, as terras são da União.
A juíza Laís Durval Leite, responsável pela sentença de 2018, avaliou que não pode haver exploração comercial das terras indígenas, pois, ao garantir esse direito, o objetivo é de preservar a cultura e as tradições desses povos. A juiza classificou ainda como “abusiva” a cláusula do contrato “que impede o uso da terra, dos rios e dos lagos pelos seus ocupantes tradicionais”.
Em entrevista ao Comprova, Pedro Soares, gerente de REDD+ do Idesam, afirmou que os projetos de Redd deveriam prever apenas ações para redução de desmatamento ilegal e atividades que não vão contra o plano de gestão dessas terras. “Qualquer coisa fora disso, que vá restringir atividades tradicionais, é errada e não pode ser feita dentro de um contrato do tipo”, disse.
Em entrevista ao Comprova, o diretor de Justiça Socioambiental da WWF, Raul Silva Telles do Valle, afirmou que, em geral, indígenas deveriam ter o direito de comercializar créditos de carbono de suas terras. “Se eles têm o direito de usar a terra, eles podem decidir se pode desmatar ou não. (…) Assim como, se explorar madeira, eles que vão vender. (…) Nessa mesma lógica, o carbono não é algo em si, mas é a ação de abrir mão de desmatar e de isso ser reconhecido por terceiros como um benefício para a humanidade”, afirmou.
Em 2012, antes da primeira decisão que suspendia o contrato, a Funai consultou a Advocacia-Geral da União (AGU) sobre a possibilidade de vender créditos de carbono em terras indígenas. A AGU afirmou que era necessário debater a questão para definir leis e políticas públicas a respeito.
A AGU apontou risco nesse tipo de contrato por questões como a dificuldade de confirmar que essas organizações indígenas representem os povos indígenas envolvidos, além de “violações que têm sido verificadas à autonomia e aos direitos dos povos indígenas”.
Tanto a Constituição Brasileira, quanto a Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), que trata de povos indígenas e tribais, preveem a criação de um protocolo de que defina o que deve ser considerado consulta oficial a um povo indígena. O protocolo das terras indígenas envolvidas no contrato foi publicado na última sexta-feira (27).
O que é a Celestial Green Ventures?
A Celestial Green Ventures era uma empresa que dizia se dedicar a financiar projetos de compensação de carbono, ou seja, iniciativas de reflorestamento ou preservação de florestas com o objetivo de compensar a emissão de gás carbônico por empresas. A informação está em documento enviado pela Celestial Green Ventures para o site de jornalismo investigativo Agência Pública em 2012.
De acordo com reportagem do Estado de S. Paulo de 2012, no mesmo período, a Funai registrava 30 projetos semelhantes. Deles, 16 eram com a empresa irlandesa.
Segundo dados disponíveis no site do Companies Registration Office, órgão do governo irlandês para registro de empresas, a Celestial Green Ventures foi criada em Dublin, capital irlandesa, em 2010, mas foi liquidada em 2016.
Em que contexto foi feito o contrato?
Os contratos entre a Celestial Green e diferentes povos indígenas foram feitos no contexto do avanço do debate sobre o Redd, que seria uma recompensa em dinheiro a governos, pessoas jurídicas ou projetos que tenham reduzido sua emissão de gases estufa, por meio da redução do desmatamento.
Um dos mecanismos do Redd é o mercado voluntário de créditos de carbono – chamado assim porque os créditos obtidos por meio dele não podem ser considerados nas metas de redução de emissões que os países tenham que cumprir. Nele, pessoas jurídicas e projetos podem vender créditos de carbono fiscalizados por entidades independentes da ONU.
O que diferencia o mercado voluntário do mercado obrigatório (ou regulado) é que ele não está atrelado aos acordos internacionais vigentes. Para o Redd, isso muda em 2020, quando entra em vigor o Acordo de Paris, e ele passará a integrar o mercado regulado.
De acordo com Pedro Soares da ONG Idesam, o contrato da Celestial Green era um projeto mal-intencionado e mal feito. “Ela (a empresa) tentou se aproveitar de um mecanismo (Redd) em construção para um benefício próprio. A gente acredita que, se houvesse regulamentação de Redd no Brasil, esse projeto [da Celestial Green] nunca teria chegado no estágio em que chegou”, afirmou Soares.
O que a legislação brasileira diz a respeito do Redd?
Não existe legislação federal no Brasil que defina as regras de Redd, tampouco suas particularidades em relação a povos indígenas. Alguns estados, como Acre, Rondônia, Amazonas e Mato Grosso, criaram leis estaduais sobre o tema.
Em 2015, a portaria nº 365 do Ministério do Meio Ambiente instituiu o Programa de Monitoramento Ambiental dos Biomas Brasileiros e, no ano seguinte, o governo brasileiro lançou sua Estratégia Nacional para REDD+. Apesar disso, não há lei que especifique as regras de como isso deve ocorrer.
Mercado obrigatório de crédito de carbono
O mercado obrigatório de créditos de carbono consiste atualmente no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que entrou em vigor em 2005 e foi previsto pelo Protocolo de Kyoto. O MDL é regulado pela ONU. Por meio dele, países desenvolvidos apoiam projetos de redução de emissões de gases estufa em países em desenvolvimento, como o Brasil, com o objetivo de cumprir suas metas ambientais.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
O texto foi publicado no site Terça Livre no início de setembro, mas só foi compartilhado nas páginas República de Curitiba e Sérgio Moro no dia 26. Até o dia 1 de outubro, tinha 6 mil compartilhamentos e 3,3 mil curtidas na primeira e 2,7 mil compartilhamentos e 4,9 mil curtidas na segunda. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/homem-preso-por-atear-fogo-a-mata-no-amazonas-nao-foi-pago-pelo-mtst/ | COMPROVA | Homem preso por atear fogo à mata no Amazonas não foi pago pelo MTST | null | 2019-08-29 | O homem que foi preso, identificado nas postagens por um nome errado, estava queimando fios elétricos para retirar o cobre e o fogo se alastrou por acidente
É falso que um homem detido por crime ambiental em Iranduba, cidade vizinha a Manaus, no Amazonas, tenha afirmado em depoimento que foi pago pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) para atear fogo em uma área de mata.
O boato foi publicado na internet e em redes sociais acompanhado de fotos que mostram um homem e um incêndio na região da rodovia AM-070, próximo à Ponte Jornalista Phelippe Daou, que liga Manaus a Iranduba. A delegada Sylvia Laureana, da 31ª Delegacia Integrada de Polícia (DIP), onde o suspeito prestou depoimento, confirmou ao Comprova que é ele quem aparece nas imagens.
O homem foi detido pela Polícia Militar no dia 24 de agosto e assinou um (Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO) por crime ambiental. O Comprova teve acesso ao documento, em que ele e o policial militar relatam que o incêndio aconteceu por acidente. Segundo o depoimento, ele estava queimando fios elétricos com o intuito de retirar o cobre para vender, por volta das 10 horas, quando o fogo se espalhou. O policial militar disse ter sido informado por testemunhas que o homem “havia iniciado o incêndio ao tentar se desfazer de uma fiação elétrica”.
Esta verificação do Comprova investigou informações de um texto do site Acontece Agora e de uma publicação do perfil @ajuricabat no Twitter. As postagens foram feitas entre os dias 24 e 26 de agosto.
Falso para o Comprova é o conteúdo divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
Para esta verificação, o Comprova entrou em contato com a delegada Sylvia Laurena, que enviou o termo assinado pelo suspeito, além da Secretaria de Segurança Pública do Amazonas e do MTST.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
Fotos se espalharam pelo WhatsApp
Através de busca reversa de imagens e de pesquisas nas redes sociais, o Comprova não localizou as fotos originais. No entanto, a delegada Sylvia Laureana confirmou que o homem que aparece nas fotos que viralizaram é de fato o mesmo que foi levado para a delegacia. O Comprova teve acesso às fotos tiradas do suspeito na 31ª DIP, no último sábado (24), e pode atestar que se trata da mesma pessoa dos posts.
As fotos em que o suspeito aparece não serão publicadas pelo Comprova para preservar a privacidade dele, mas você pode ver o e-mail enviado pela delegada em que ela atesta que o homem que aparece nas postagens que viralizaram é o mesmo que foi detido.
Há duas fotos do suspeito nas publicações que viralizaram. De acordo com a delegada, uma delas, em que ele aparece perto do fogo, foi feita por uma pessoa que passava pelo local e enviada a um policial. No depoimento, o policial militar que levou o suspeito para a delegacia relatou que pessoas que estavam próximo ao local, ao verem o fogo na área da mata, “registraram o fato e enviaram as fotos via aplicativo WhatsApp”. Sylvia Laureana afirmou que a segunda foto que foi amplamente compartilhada nas redes sociais, em que o homem está dentro de uma viatura, foi feita por um agente.
Por e-mail, o usuário do Twitter @ajuricabat, um dos primeiros a fazer a publicação enganosa, ainda no sábado (24), respondeu ao Comprova que recebeu pelo Facebook as fotos de uma amiga que tem um sítio próximo à AM-070. Segundo ele, “fora ela, outros amazonenses já haviam postado”.
O que diz o Termo Circunstanciado de Ocorrência
Alguns posts em redes sociais e notícias associam as imagens ao nome Valdeir, que nada tem a ver com o caso. O Comprova teve acesso ao Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), em que consta um nome diferente. A pedido da Secretaria de Segurança Pública, o nome verdadeiro foi omitido.
A delegada também confirmou que, em depoimento, o homem não mencionou qualquer ligação com o MTST ou que tenha agido mediante pagamento de terceiros.
O termo assinado pelo suspeito afirma que ele confirmou que provocou o incêndio na AM-070 ao ser questionado sobre o assunto, mas disse não ter tido intenção. O homem, que é auxiliar de produção e tem 33 anos, relatou que estava passando próximo à ponte que liga Manaus a Iranduba e decidiu queimar um pedaço de fio elétrico para tirar o cobre e vender o material. No depoimento, contou que colocou o fio na margem da estrada e ateou fogo, “mas o vento espalhou o fogo, fazendo com que a mata nas proximidades da estrada fosse incendiada”.
No TCO, um dos policiais que atendeu a ocorrência declarou que avistou o incêndio e se dirigiu ao local. Moradores que flagraram o ato enviaram fotos por WhatsApp ao agente, que acionou o Corpo de Bombeiros e saiu em busca do suspeito. O homem foi localizado quando estava a caminho do distrito de Cacau Pirera, a cerca de seis quilômetros da cabeceira da ponte que liga Manaus a Iranduba, segundo o Google Maps. Ele foi levado pelos policiais militares à 31ª DIP, em Iranduba.
O Comprova tentou falar com o suspeito e com o policial militar que o levou para a delegacia, mas as ligações não foram atendidas.
Furtos de fios de cobre
Segundo a delegada, não havia indícios de que os fios que o homem queimou tenham sido furtados.
Segundo a Secretaria de Segurança Pública do Amazonas, de janeiro a abril deste ano foram registradas 80 ocorrências de furtos de fios de cobre. Em 2018, foram 360 casos e, em 2017, 207 crimes. As informações são do Sistema Integrado de Segurança Pública (Sisp).
MTST não tem atuação no Amazonas
O Comprova entrou em contato com o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, que negou qualquer ligação com o suspeito. O MTST frisou que não tem atuação no Amazonas.
Segundo Rud Rafael, coordenador nacional do movimento, o MTST atua em 12 estados do país: na região Norte, Roraima e Tocantins; no Nordeste, Ceará, Pernambuco, Alagoas e Sergipe; no Centro-Oeste, Goiás e Distrito Federal; no Sudeste, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais; e o único estado do Sul é o Rio Grande do Sul.
O coordenador do grupo afirmou que o MTST “jamais teria esse tipo de prática”. De acordo com Rud Rafael, o MTST atua principalmente na defesa do direito à moradia, sempre em ambiente urbano e principalmente nas periferias das cidades.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
A publicação do site Acontece agora foi feita no dia 26 de agosto e, até o dia 28, tinha 9,3 mil interações no Facebook, segundo a ferramenta CrowdTangle. A do perfil @ajuricabat foi postada no dia 24 e, no dia 28, tinha 2 mil retweets e 3,7 mil curtidas.
Agências de checagem também verificaram o conteúdo de postagens que usaram essas fotos, como o Estadão Verifica, que é parceiro do Comprova, o Fato ou Fake (que foi publicada no G1, no O Globo e no Extra) e o Boatos.org. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Verificação'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/chineses-nao-estao-construindo-estrada-de-ferro-para-ligar-mato-grosso-ao-maranhao-video-mostra-obra-na-suecia/ | COMPROVA | Chineses não estão construindo estrada de ferro para ligar Mato Grosso ao Maranhão; vídeo mostra obra na Suécia | null | 2019-08-28 | Não existe nenhuma ferrovia sendo construída, nem projeto, que ligue o estado do Maranhão ao município de Lucas do Rio Verde, no Mato Grosso, passando por Marabá, no Pará
Um vídeo da construção de uma estrada de ferro na Suécia foi tirado de contexto e usado em postagens no Twitter, no Facebook e no Whatsapp associado a uma informação falsa. O post afirma que o vídeo mostra “o maquinário que os chineses estão usando para fazer a estrada de ferro que vai da região de Lucas do Rio Verde”, no Mato Grosso, até o Maranhão, passando por Marabá, no Pará.
Não existe nenhuma ferrovia sendo construída nesse trajeto, como mostra o mapa ferroviário do Ministério da Infraestrutura. Tampouco, na parte do site do Ministério em que são informadas as ferrovias que estão em obras, consta a realização de obras que ligariam os municípios citados nas postagens.
Também não existe planejamento por parte do governo federal de construir uma estrada de ferro que ligue o Maranhão a Lucas do Rio Verde passando por Marabá.
De acordo com nota do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), os municípios de Marabá e Lucas do Rio Verde fazem parte do trajeto de ferrovias diferentes. Marabá integra o percurso da Estrada de Ferro Carajás, já o município de Lucas do Rio Verde está no trajeto previsto da Ferrovia de Integração do Centro Oeste (Fico), ferrovia que ainda não saiu do papel.
O Comprova encontrou o vídeo no perfil @EliOliv98248502 do Twitter. O texto usado na publicação enganosa circula nas redes, com algumas variações, desde pelo menos junho de 2018. Nas postagens mais recentes, publicadas em agosto deste ano, o vídeo que acompanha o texto sequer foi filmado no Brasil. Segundo apuração do Comprova, ele mostra uma obra em uma ferrovia na Suécia.
As demais postagens utilizando versões similares ou idênticas do texto, e encontradas pelo Comprova, foram publicadas em maio de 2019 e junho de 2018. Elas utilizavam vídeo da expansão da Estrada de Ferro Carajás, executada pela Vale, como foi checado pelo Estadão Verifica.
O selo Falso é usado pelo Comprova para conteúdos divulgados de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Já o selo de Contexto errado é utilizado quando o conteúdo é retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado original.
Como verificamos
Para analisar o conteúdo que viralizou, o Comprova buscou informações com a empresa sueca CEAB, nome que aparece numa máquina que é mostrada no vídeo.
Também entrou em contato com o DNIT e buscou dados do governo federal sobre obras de ferrovias no Brasil, tanto no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) quanto no site da Valec (empresa pública vinculada ao Ministério da Infraestrutura).
O Comprova também entrou em contato com fontes ligadas às concessionárias do setor ferroviário no país e com a Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China (CCDIBC).
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
O vídeo que viralizou
O Comprova não conseguiu chegar ao autor do vídeo que aparece no post enganoso. No entanto, como as imagens mostram uma máquina com o logotipo da empresa sueca CEAB, foi possível entrar em contato com a companhia, que deu informações sobre a obra exibida na gravação.
No vídeo viralizado também é possível ler no maquinário o nome da marca Volvo, empresa também sueca e mais conhecida por seus automóveis.
Por e-mail, a CEAB informou que o vídeo em questão foi feito em uma de suas obras no sul da Suécia, entre as cidades de Lund e Arlov. A máquina do vídeo é do modelo Volvo EWR150E Rail. Um vídeo publicado na página da empresa em agosto de 2018 mostra o mesmo maquinário.
De acordo com o representante da empresa Tony Andersson, o vídeo mostra uma nova tecnologia que está sendo desenvolvida pela CEAB em conjunto com um de seus fornecedores, a RF-System, para colocação mais rápida do trilhos.
A empresa afirmou que o vídeo foi feito em agosto deste ano, mas que não é capaz de informar quem teria filmado. “Não acredito que tenha sido um de nossos funcionários ou um passante – visto que é uma área restrita. Poderia ser uma empresa terceirizada ou até nosso cliente”, afirmou Andersson em nota.
Ferrovias e projetos nas cidades citadas
A legenda da postagem falsa cita uma suposta obra ferroviária ligando três estados brasileiros: Maranhão, Pará (Marabá) e Mato Grosso (Lucas do Rio Verde).
No entanto, não existe nem obra nem planejamento pelo governo federal de construir uma ferrovia ligando as localidades citadas pela postagem.
A cidade de Marabá (PA) é ligada ao Maranhão pela Estrada de Ferro Carajás (EFC), que foi inaugurada há mais de 30 anos.
Em relação a Lucas do Rio Verde, há dois projetos que ainda não saíram do papel e que envolvem a cidade. Um deles é a Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico) e o outro, a Ferrogrão (EF-170).
O projeto da Fico prevê ligar Porto Velho, capital de Rondônia, a Mara Rosa, em Goiás. Essa ferrovia ligaria o município de Lucas do Rio Verde ao Maranhão por meio de uma conexão com a Ferrovia Norte-Sul (FNS) na cidade de Mara Rosa.
Com isso, também seria possível a ligação com Marabá (PA), devido à conexão da FNS com a EFC em Açailândia, no Maranhão. Nesse caso, portanto, uma futura ligação entre Lucas do Rio Verde e Marabá só seria possível por meio do uso de três ferrovias distintas.
O projeto da Fico, que ainda está em fase de estudos, passou por mudanças no começo deste ano e deverá entrar em fase de consulta pública.
Já a Ferrogrão poderia ligar o município de Lucas do Rio Verde ao estado do Pará. Seu projeto inicial prevê a ligação de Sinop (MT) ao porto de Miritituba (PA), no rio Tapajós. Segundo o governo, é possível que a ferrovia seja estendida de Sinop até Lucas do Rio Verde.
Por este projeto, a estrada de ferro passaria bem longe de Marabá. O porto de Miritituba fica a mais de 700 km ao leste da cidade, em linha reta.
De acordo com o site do PPI, o edital de licitação da Ferrogrão deve sair no próximo trimestre – mas indígenas, caminhoneiros e políticos do Pará querem barrar o projeto, como noticiou o jornal Folha de S.Paulo no dia 21 deste mês.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
A publicação sobre a suposta obra ferroviária em Marabá foi feita no dia 21 de agosto no Facebook e teve, até o dia 28, mais de 19 mil compartilhamentos e 7,7 mil curtidas. Outra postagem no Twitter teve 2,1 mil retweets e mais de 4 mil curtidas. Leitores também enviaram ao Comprova o vídeo pelo Whatsapp, no número (11) 97795-0022, por meio do qual recebemos denúncias de conteúdo duvidoso.
O mesmo vídeo, acompanhado do mesmo texto, também foi encontrado em dois posts no YouTube publicados em 21 e 23 de agosto. Somados, os dois vídeos não tinham mais de 120 visualizações até o dia 27.
Outros veículos já fizeram checagem envolvendo construção de ferrovias e suposto uso de maquinários chineses: Estadão Verifica, e-farsas e Agência Lupa. O Boatos.org fez duas, uma em 2018 e outra em 2019.
O interesse chinês por ferrovias no Brasil
Questionada se empresas chinesas participam da construção de ferrovias no Brasil, a Câmara de Comércio Brasil China (CCBI) informou apenas que “existem sim empresas chinesas interessadas em construir ferrovias no Brasil”. No entanto, ela não soube confirmar se existe alguma companhia chinesa envolvida em obras do setor.
Já o DNIT não soube informar. O órgão afirmou, em nota, que “não constrói ferrovias” e sugeriu que fossem contatadas a Valec (empresa pública vinculada ao Ministério da Infraestrutura) ou as empresas que operam os trechos.
A Valec informou, em nota, que “não há empresas chinesas executando obras de responsabilidade da Valec”.Textos de veículos da imprensa, como da Folha de S.Paulo em 2017, do Jornal do Commercio em 2019 e da Exame em 2019, noticiaram o interesse do país asiático em entrar no setor ferroviário brasileiro, no entanto, não há notícia de qualquer obra iniciada ou leilão vencido por grupos e empresas chinesas para a construção de ferrovias no país.
Entre as obras ferroviárias citadas na matéria da Folha como de interesse de grupos chineses estão a Ferrogrão e a Fico, que ainda estão em fase de estudos.
Outra obra citada é a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL). Os trechos atualmente em execução, no entanto, estão sendo realizados pela Valec, conforme consta no portal Avançar do governo federal.
A FIOL tem um terceiro trecho cuja execução ainda não começou.
A matéria da Exame, mais recente, também menciona como interesse dos chineses tanto a FIOL quanto a Ferrogrão. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Verificação'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/ongs-da-amazonia-nao-estao-associadas-a-exploracao-de-riquezas-minerais/ | COMPROVA | É enganosa publicação que associa, sem evidências, ONGs da Amazônia à exploração de riquezas minerais | null | 2019-08-26 | Embora o Ipea relacione cerca de 102 mil ONGs que atuam na Amazônia (número que inclui desde associações de moradores e centros comunitários até organizações de defesa de direitos de grupos e minorias, meio ambiente e proteção animal) não é possível atribuir a elas interesse na exploração das riquezas minerais da região
É enganosa uma publicação compartilhada no Facebook e no Twitter que sugere, sem evidências, que mais de 100 mil organizações não governamentais (ONGs) que atuam na região amazônica estariam interessadas não na “floresta”, mas nos minérios presentes na área.
Por lei, ONGs são entidades sem fins lucrativos e não podem obter autorização para exploração mineral.
Há divergências quanto ao total de ONGs na Amazônia. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que existam 102 mil entidades da sociedade civil registradas em municípios da Amazônia Legal. Já o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) calcula um número bem mais baixo: 15,9 mil.
As diferenças entre os dados se dão por causa de metodologias diferentes: enquanto o Ipea usa uma base maior, do Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), o IBGE se vale de um recorte menor, do Cadastro Central de Empresas (Cempre).
Se considerarmos o estudo do Ipea, o post nas redes sociais acerta o número de ONGs com sede na Amazônia. No entanto, a publicação erra ao dizer que a fonte da informação são “levantamentos do Exército Brasileiro e da ABIN”. De acordo com a assessoria do Ministério da Defesa, o “tema não pertence ao escopo da atuação desta pasta”.
De acordo com o Mapa das Organizações da Sociedade Civil do Ipea, o número de ONGs que tem atuação em áreas relacionadas à mineração é muito pequeno: 145 em todo o país, sendo 14 em estados que compõem a Amazônia Legal. É importante destacar que essas entidades não trabalham diretamente na exploração de minérios, e têm papel de representar associações de mineradores.
A publicação também alega que há abundância de mais de 14 tipos de minérios na Amazônia, mas, segundo o chefe do Departamento de Recursos Minerais do Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Marcelo Esteves Almeida, nem todos têm potencial de exploração comprovado. De acordo com Almeida, avaliar o potencial de exploração de certos minerais na região, como paládio e ródio, ainda depende de mais estudos.
O Comprova verificou informações publicadas no perfil @Luis_Roberto04 no Twitter e em um perfil pessoal no Facebook.
Enganoso para o Comprova é o conteúdo que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos
Para analisar o conteúdo que viralizou, o Comprova acessou o Mapa das Organizações da Sociedade Civil, do Ipea, e o estudo As Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos no Brasil (Fasfil), do IBGE. Também consultamos os especialistas Janine Mello, coordenadora do Mapa das Organizações da Sociedade Civil, e Marcelo Esteves Almeida, chefe do Departamento de Recursos Minerais do CPRM. Analisamos ainda legislação sobre autorização de exploração mineral e sobre constituição de organizações da sociedade civil.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
Quantas ONGs existem na Amazônia?
O Ipea calcula que existam 102.080 entidades da sociedade civil com sede em municípios da Amazônia Legal. Esse número representa 12,4% do total de ONGs do país, 820.186. O IBGE, por sua vez, estima que sejam 236.950 fundações privadas e associações sem fins lucrativos, sendo 15.919 (6,7%) em estados que compõem a Amazônia Legal.
A discrepância entre os dados do IBGE e do Ipea está explicada nesta nota técnica. Os dois institutos de pesquisa utilizam bases de dados diferentes; o mapa do Ipea faz um recorte mais amplo. Enquanto o IBGE utiliza o Cadastro Central de Empresas (Cempre), o Ipea parte do Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ), da Secretaria da Receita Federal (SRF), como um todo e de outras 14 fontes de dados auxiliares.
Apesar dos números absolutos divergirem, a proporção de ONGs encontradas nas duas pesquisas em relação ao universo total de empresas é parecido: 4,69% no caso do IBGE e 4,09% no Ipea. Além disso, ambas as pesquisas adotam critérios parecidos para classificar ONGs, baseados na Classification of the Purposes of Non-Profit Institutions Serving Households (COPNI), da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Estes são os cinco elementos para definir uma ONG: são privadas e não estão vinculadas jurídica ou legalmente ao Estado; não possuem finalidades lucrativas; são legalmente constituídas; são autoadministradas e gerenciam suas próprias atividades de modo autônomo; são constituídas de forma voluntária por indivíduos.
Perfil das ONGs na Amazônia
A pedido do Comprova, o Ipea levantou o perfil das organizações de sociedade civil com sede em municípios que compõem a Amazônia Legal (lista completa das cidades aqui).
As entidades não governamentais sediadas na região representam 12,4% das organizações da sociedade civil em atividade no Brasil. A região Norte, onde fica a maior parte da Amazônia Legal, tem 3,8 ONGs a cada mil habitantes, índice abaixo da média nacional (4/mil hab.). O Sul é a região com maior número de ONGs por pessoa (5,4/mil hab.).
Dentre as entidades sediadas na Amazônia Legal, 50.662 (49,6%) atuam na categoria “defesa de direitos e interesses”, nomenclatura mais ampla que inclui associações de moradores, centros comunitários e organizações de defesa de direitos de grupos e minorias, meio ambiente e proteção animal. Essa forma de organização também é majoritária no restante do país (41,3% do total de ONGs).
O segundo tipo de ONG mais frequente na Amazônia é a religiosa, com 19.320 entidades (18,9%). A proporção regional é menor do que a nacional (25,4%). Segundo a pesquisadora do Ipea Janine Mello, é comum no Norte do país que essas organizações também se dediquem a temas relacionados à saúde, especialmente dos povos indígenas.
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ONGs Amazônia 2
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O Ipea também registra os recursos federais recebidos por entidades da sociedade civil. Na Amazônia, esse aporte representou 5,7% do total do valor destinado a ONGs pelo governo entre 2010 e 2018. Apenas 3.626 (0,03% do total da Amazônia) entidades da região obtiveram verba federal, no valor de R$ 6,8 bilhões. Como mostra o gráfico, a destinação de recursos a entidades na Amazônia tem diminuído ao longo dos anos.
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Janine ressalta que o mapeamento mostra apenas entidades registradas em municípios da Amazônia Legal. Ainda não existe um estudo detalhado sobre a atuação de organizações internacionais em território brasileiro. Geralmente, essas entidades estão sediadas no Sudeste, afirma a pesquisadora.
Quais ONGs têm interesse em minérios?
É possível fazer consultas no Mapa das Organizações da Sociedade Civil do Ipea por nome da organização. O Comprova buscou palavras-chaves como “mineração”, “minérios”, “minerais”, “mineradores” e “mineradoras” para estimar quantas entidades não governamentais se dedicam ao assunto. Encontramos apenas 145 organizações que atendiam a essa descrição em todo o país, excluindo clubes de moradores com nomes similares, associações de artesãos de minérios e associações de empresas de água mineral ou suplementos minerais.
Do total, apenas 14 têm sede em estados que compõem a Amazônia Legal. A maioria (36 ONGs) está em Minas Gerais, onde há indústria de extração de minério. As entidades que mapeamos na Amazônia são, principalmente, associações regionais de mineradores e de representação de empresas que trabalham na área de mineração.
Apesar de essas organizações se dedicarem a temas relacionados a minérios, elas não podem obter autorização de exploração mineral, devido à sua natureza jurídica — são entidades sem fins lucrativos, e não empresas. “Organizações sem fins lucrativos não podem ter concessão federal para fazer extração de minério”, explica a pesquisadora Janine Mello.
De acordo com a ouvidoria da Agência Nacional de Mineração (entidade que regula a exploração de minérios no país), para uma pessoa jurídica requerer autorização para uma pesquisa mineral, é preciso ser uma empresa legalmente habilitada, com registro na Junta Comercial. Também é possível que pessoas físicas façam esse requerimento (por exemplo, garimpeiros) — neste caso, é necessário ser pessoa natural do Brasil. Esses requisitos estão no decreto-lei 227.
As ONGs precisam atender a certas exigências para serem registradas no Brasil, entre eles o de “não possuir finalidades lucrativas”, como explica este estudo do Ipea. O Código Civil define o empresário como “quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”.
Para existir, uma ONG precisa ter inscrição no CNPJ, mas, como é proibido buscar lucros, a atividade de extração mineral é incompatível com a sua atuação.
Esta cartilha do Observatório do Terceiro Setor explica melhor o papel das ONGs no território brasileiro. São entidades de livre associação que existem para influenciar agendas públicas e exercer controle social. Embora algumas dessas organizações desenvolvam trabalhos de assistência à população, as ONGs não têm o objetivo de substituir o trabalho do Estado.
Os formatos de pessoas jurídicas privadas em que elas se enquadram no Código Civil são os de associações e fundações, previstos no segundo e no terceiro capítulos da legislação. De acordo com o artigo 53, “constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos”. Conforme uma publicação da Associação Brasileira de Organizações não Governamentais (Abong), elas podem comercializar produtos ou serviços, mas não podem exercer exclusivamente essa atividade ou fazer dela a sua única finalidade.
O artigo 62 estabelece as possibilidades de atuação das organizações: assistência social; cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico; educação; saúde; segurança alimentar e nutricional; defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável; pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias alternativas, modernização de sistemas de gestão, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos; promoção da ética, da cidadania, da democracia e dos direitos humanos; e atividades religiosas.
Recursos minerais na Amazônia
A publicação afirma que o subsolo da Amazônia é rico em “cassiterita, paládio, ródio, tungstênio, zircônio, titânio, linhito, nióbio, tântalo, columbita, cromo, ouro, diamante e urânio, etc.”.
De acordo com o geólogo do CPRM Marcelo Esteves Almeida, há locais na Amazônia onde já é realidade a exploração de recursos minerais como cassiterita (em Pitinga, no Amazonas, e no centro-norte de Rondônia), ouro (no oeste de Roraima, e em Tapajós e Carajás, no Pará), cobre (Carajás), urânio (Pitinga), nióbio-tântalo (Pitinga) e diamante (norte de Roraima).
Um exemplo de destaque é a província mineral de Carajás, no Pará. Segundo este artigo do geólogo Breno Augusto dos Santos — responsável pela descoberta de jazidas de ferro na região em 1967 — as 18 bilhões de toneladas de minério encontradas representam “maior concentração de alto teor já localizada no planeta”. Além do ferro, metais como cobre, zinco, manganês e ouro também são encontrados na região.
No entanto, segundo Marcelo Esteves Almeida, são necessários mais estudos para determinar o potencial de exploração mineral em outras áreas da Amazônia. “As pesquisas estão ainda muito aquém da importância e do tamanho dessa região. Apesar dos esforços recentes, dificuldades logísticas e o custo das expedições científicas têm dificultado bastante o avanço do conhecimento nas últimas décadas”, disse Almeida.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
A publicação foi feita no Facebook no dia 15 de agosto e, no dia 22, tinha 1,8 mil compartilhamentos, 987 curtidas e 81 comentários. No Twitter, havia 1,9 mil retweets e 5,9 mil curtidas. O mesmo texto foi usado em diversas publicações nas redes sociais desde então.
Contexto
O presidente Jair Bolsonaro demonstrou publicamente em mais de uma ocasião desconfiança em relação às organizações da sociedade civil. Mais recentemente, ele acusou — sem provas — ONGs que recebem recursos do exterior de estarem por trás das queimadas na floresta amazônica. Para ele, o objetivo seria fazer uma “campanha” contra o governo.
Em agosto, o presidente criticou o ministro das Relações Exteriores da França, Jean-Yves Le Drian, por ele ter participado de reuniões com ONGs quando visitou o Brasil. “O que ele veio tratar com ONG aqui? Quando fala em ONG, já nasce um sinal de alerta”, disse Bolsonaro.
Quando fez acusações contra o ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) Ricardo Galvão, o presidente também tentou associá-lo a ONGs. “No nosso sentimento, isso (dados sobre desmatamento) não condiz com a realidade. Até parece que ele (Ricardo Galvão) está a serviço de alguma ONG, que é muito comum”, afirmou Bolsonaro em julho.
O presidente também atacou entidades estrangeiras durante um discurso em visita a Bahia, em julho. Na ocasião, ele disse que a baía de Angra “fatura quase zero” em turismo por causa dos “xiitas ambientais”. “Eu não sei por que essa gente tem tanto amor por ONGs estrangeiras. O Estado está aparelhado. Não temos preconceito contra ninguém, mas temos uma profunda repulsa por quem não é brasileiro.”
No início do ano, o então ministro da Secretaria do Governo, Carlos Alberto dos Santos Cruz, disse que a administração federal pretendia fazer um levantamento sobre o número de ONGs em atuação no país para, em um segundo momento, “otimizar” o repasse de verbas públicas a essas entidades.
De acordo com o Ipea, de 2010 e 2018, foram repassados R$ 6,8 bilhões em recursos federais a organizações sediadas na Amazônia Legal. Esse valor equivale a 5,74% do total empenhado do Orçamento Geral da União para OSCs, que foi de R$ 118,5 bilhões no período. Essa verba atendeu a 22.214 organizações nesses oito anos, das quais 3.626 eram na Amazônia Legal. “Em 2010, o valor repassado para a Amazônia Legal foi de R$ 1,4 bilhão. Esse valor cai para R$ 338 milhões em 2018”, enfatizou a pesquisadora Janine Mello. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/projeto-de-lei-nao-pretende-legalizar-o-incesto-mas-ampliar-o-reconhecimento-de-familias-pelo-estado/ | COMPROVA | Projeto de Lei não pretende “legalizar o incesto”, mas ampliar o reconhecimento de famílias pelo Estado | null | 2019-08-22 | Apesar de existirem brechas no projeto, ele não seria suficiente para revogar a proibição do casamento entre pais e filhos prevista no Código Civil.
São enganosas as publicações que atribuem ao Projeto de Lei 3.369, de 2015, a intenção de “legalizar o incesto”. A proposta, de autoria do deputado federal Orlando Silva (PCdoB – SP), tem como objetivo ampliar o reconhecimento de famílias pelo Estado brasileiro, englobando, por exemplo, a adoção por casais homossexuais e os casos em que crianças são educadas por tios e avós.
Para uma especialista em Direito de Família entrevistada pelo Comprova, apesar de existirem brechas no projeto, ele não seria suficiente para revogar a proibição do casamento entre pais e filhos prevista no Código Civil.
As postagens viralizaram depois que a Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados colocou a votação do PL na pauta da quarta-feira, 21 de agosto. Após a repercussão nas redes, a proposta foi retirada da agenda para “aprimoramento do texto”.
Esta verificação do Comprova investigou informações divulgadas pelas páginas Nas Ruas e Só a Verdade, no Facebook, e pelos sites Estudos Nacionais e Jornal da Cidade Online (posteriormente editado).
Como Verificamos
Para esta checagem, o Comprova consultou a íntegra do PL 3.369/2015 e as assessorias de imprensa do autor da proposta, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), e do relator do texto na CDHM, deputado Túlio Gadêlha (PDT-PE).
Também foram entrevistadas a presidente da Comissão de Direito de Família da OAB Pernambuco, Virgínia Baptista, a professora de Direito de Família da Universidade Federal Fluminense (UFF) Fernanda Pimentel, e o deputado Túlio Gadêlha.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
“Casamento entre pais e filhos”
Segundo as publicações viralizadas, o PL em questão regulamentaria o casamento entre “um pai com seu filho, o pai com a filha, mãe com filha, mãe com um filho, ou qualquer combinação entre pais e filhos”. Para justificar tal afirmativa, as postagens mencionam o artigo 2º da proposta, que estabelece:
“São reconhecidas como famílias todas as formas de união entre duas ou mais pessoas que para este fim se constituam e que se baseiem no amor, na socioafetividade, independentemente de consanguinidade, gênero, orientação sexual, nacionalidade, credo ou raça, incluindo seus filhos ou pessoas que assim sejam consideradas”.
O trecho, contudo, não faz qualquer menção a casamentos, mas a núcleos familiares.
O que dizem as especialistas
Orlando Silva e Túlio Gadêlha afirmaram que o objetivo do projeto é de ampliar a concepção de família aceita pelo Estado. Na opinião da professora de Direito de Família da Universidade Federal Fluminense (UFF) Fernanda Pimentel, essa é a interpretação mais provável.
Para a especialista, o projeto tem como objetivo regulamentar casos que já são reconhecidos em tribunais, como “quando um padrasto cria uma enteada, ou um enteado, ou um tio que crie sobrinhos”, disse, em entrevista ao Comprova.
Essa regulamentação tem diversas consequências jurídicas, como o direito à herança, a benefícios previdenciários e à dedução do dependente no Imposto de Renda, afirmou.
A professora destacou, contudo, que o Projeto de Lei traz conceitos muito abertos, o que possibilita múltiplas interpretações, inclusive a mencionada nas postagens viralizadas. “O texto, realmente, quando ele usa essa técnica das cláusulas gerais, ele o faz de maneira muito genérica. Se eu quiser, eu conduzo esse texto para uma interpretação bastante ampla, permitindo essas relações”, disse Pimentel.
Essa opinião é reforçada pela presidente da Comissão de Direito da Família da OAB Pernambuco, Virgínia Baptista. Para a advogada, o ponto do projeto que permitiria interpretações divergentes do objetivo dos autores é o uso da expressão “independentemente de consanguinidade”.
“Abre brecha, sim, para relações incestuosas, eu acho que é bem claro no texto dele. Talvez ele precisasse rever esse trecho da lei. A questão da consanguinidade é uma vedação e isso não vai poder ser superado”, afirmou em entrevista ao Comprova.
Fernanda Pimentel pontuou, contudo, que o Projeto de Lei não seria interpretado de maneira isolada, mas levando em consideração todas as outras normas e costumes da sociedade – tornando improvável a “acolhida da relação incestuosa”.
“Quando o projeto fala que a família é toda forma de união entre duas ou mais pessoas que para este fim se constituam e que se baseiem no amor, na socioafetividade, independentemente de consanguinidade, gênero e orientação, ele está transferindo para o Judiciário a possibilidade de aplicar isso ao caso concreto. Só que, diferentemente desse pânico instalado, essa interpretação não é solta. Ela é feita a partir da Constituição e do sistema jurídico vigente”, disse Pimentel.
Atualmente, o casamento entre pais e filhos e entre irmãos é proibido pelo artigo 1.521 do Código Civil. Para que o PL permitisse este tipo de relacionamento, explica Pimentel, precisaria haver uma revogação tácita do artigo, ou seja, quando se presume que a lei anterior foi revogada.
“Só que revogação tácita tem que ser reconhecida pelos tribunais. E toda orientação jurisprudencial do direito brasileiro é no sentido de valorizar esse interdito na formação da família brasileira, que é a vedação da relação incestuosa. Então, eu não creio que o projeto de lei encaminharia para a acolhida dessa relação incestuosa”, afirmou.
Autor e relator negam intenção de legalizar incesto
Em nota oficial publicada na página Vermelho.org, o deputado Orlando Silva explicou que o projeto tem como objetivo ampliar o reconhecimento de famílias pelo Estado, incluindo núcleos formados por pessoas sem laços sanguíneos.
“Quando o projeto diz ‘independentemente de consanguinidade’, está se referindo às milhares de famílias, sejam de casais héteros ou homoafetivos, formadas a partir do generoso ato da adoção legal de crianças”, disse na nota.
Em posicionamento oficial enviado ao Comprova, o deputado Túlio Gadêlha, que emitiu parecer pela aprovação do PL na Comissão de Direitos Humanos e Minorias, acrescentou que o projeto também quer o reconhecimento de “uma família formada por parentes, como avós e netos ou tios e sobrinhos, por exemplo”.
“Ter um conceito de família amplo é importante para que essas novas concepções possam ter acesso a programas sociais, por exemplo. Esse reconhecimento está em relatórios da ONU, no STF, só não houve no Legislativo”, afirmou Gadêlha em entrevista ao Comprova.
Retirado da pauta
Após a repercussão nas redes sociais, a votação do PL foi retirada da pauta desta quarta-feira pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias.
Em nota de esclarecimento publicada no site da Câmara dos Deputados, o presidente da Comissão, Helder Salomão (PT-ES), afirmou que o projeto tem sido objeto “de interpretações distorcidas” e que por isso, a pedido do relator, retirou o PL da pauta para “aprimoramento de sua redação por meio da elaboração de substitutivo”.
Um substitutivo é um tipo de emenda que altera a proposta, recebendo este nome porque substitui o projeto original.
Em entrevista à Rádio Câmara nesta quarta-feira, 21 de agosto, o deputado Orlando Silva esclareceu que pediu que Túlio Gadêlha redigisse o substitutivo para atender às “pessoas de boa fé que querem esclarecimento” e para que “não pairem dúvidas quanto aos nossos objetivos”.
Em entrevista ao Comprova, Túlio Gadêlha afirmou que pretende “continuar abrangendo todos esses formatos de família, mas excluir esse entendimento deturpado que parte da bancada evangélica tem feito”. “Eu acho importante a gente, que está nesse campo do Legislativo, ter a sensibilidade de compreender o olhar de outros parlamentares”, disse.
O deputado chegou a reconhecer que a redação do PL pode deixar em aberto interpretações divergentes, mencionando o caso da poligamia, que, segundo algumas publicações viralizadas, seria legalizada com o projeto. “De fato, o projeto, lendo-se, pode compreender uma configuração de família, como vem sendo colocado, pela poligamia. São reconhecidas como formas de família união de duas ou mais pessoas.” Apesar disso, ele enfatizou que não concorda com essa avaliação, feita também por outros parlamentares.
Tramitação do projeto
O projeto de lei foi apresentado em 21 de outubro de 2015. No ano seguinte, recebeu um parecer favorável de Jean Wyllys (PSOL-RJ), mas não foi votado.
Com o fim da legislatura passada, o PL foi arquivado, mas voltou a tramitar a pedido de Orlando Silva este ano. No dia 8 de agosto, Túlio Gadêlha apresentou o relatório pela aprovação do projeto e pela rejeição de uma emenda que usava como conceito de família “a união de um homem e de uma mulher, por meio de casamento ou de união estável, e a comunidade formada por qualquer dos pais e seus filhos”.
O projeto ainda deverá ser analisado pelas comissões de Seguridade Social e Família e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Comissão não tem maioria de esquerda
Ao contrário do que diz a publicação do site Estudos Nacionais, a composição da Comissão de Direitos Humanos e Minorias não tem maioria de esquerda entre os titulares. Partidos de tendências mais conservadoras têm nove indicações e os mais progressistas também têm nove nomes.
O PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, tem como representantes os deputados Filipe Barros (PR) e Julian Lemos (PB). Os outros integrantes do bloco são: Abílio Santana (PL-BA), Aroldo Martins (Republicanos-PR), Bia Cavassa (PSDB-MS), Delegado Éder Mauro (PSD-PA), Iracema Portella (PP-PI), Lauriete (PL-ES), Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ).
O PT ocupa uma vaga do MDB e uma do PP, com Erika Kokay (DF) e Padre João (MG), respectivamente). O bloco tem ainda: Camilo Capiberibe (PSB-AP), Carlos Veras (PT-PE) e Helder Salomão (PT-ES, presidente do colegiado). A comissão é formada ainda por Eli Borges (Solidariedade-TO), José Medeiros (Podemos-MT), Márcio Jerry (PCdoB-MA) e Túlio Gadêlha (PDT-PE).
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
A publicação da página Nas Ruas teve 3 mil comentários, 2,8 mil curtidas e 1,7 mil comentários. O post da Só a verdade teve 4,3 mil compartilhamentos, 214 comentários e 275 curtidas. O artigo publicado no site Estudos Nacionais teve 20 mil interações no Facebook, segundo a ferramenta CrowdTangle. As publicações foram feitas entre os dias 19 e 20 de agosto e tinham esses números de interação nas redes sociais no dia 21.
O texto do Jornal da Cidade Online teve 162 mil interações no Facebook entre os dias 20 e 22 de agosto, de acordo com o CrowdTangle. Inicialmente publicado com o título “Zambelli denuncia projeto de Manuela que pretende legalizar casamento entre pais e filhos”, o artigo foi alterado. O site publicou uma errata corrigindo a informação de que a ex-deputada Manuela D’Ávila (PCdoB) seria autora do projeto de lei. Além disso, passou a afirmar que “a redação do projeto é tão confusa que levantou uma polêmica no sentido de que o PL poderia normalizar o incesto”.
O Estadão Verifica e a Agência Lupa já haviam checado esta alegação. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Verificação'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/um-terco-do-que-governo-quer-remanejar-sao-cortes-da-educacao/ | COMPROVA | Um terço do que governo quer remanejar são cortes da Educação | null | 2019-08-22 | É verdade que quase um terço do dinheiro que o governo pretende remanejar vem do Ministério da Educação
É verdade que o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) propôs ao Congresso o remanejamento de R$ 3 bilhões no Orçamento, em meio às negociações para a aprovação da reforma da Previdência na Câmara. Quase um terço desse valor sairia do Ministério da Educação (MEC). As alegações estão em postagens compartilhadas na internet.
Essas mesmas postagens, no entanto, tratam de forma enganosa a destinação dos recursos remanejados. Elas afirmam que o presidente Jair Bolsonaro distribuiu R$ 3 bilhões para “comprar” votos de parlamentares para aprovação da reforma da Previdência.
O Comprova apurou, no entanto, que não é possível dizer que esses recursos foram usados para “comprar” parlamentares. É possível afirmar, por outro lado, que parte do remanejamento irá, sim, beneficiar parlamentares. Mais especificamente, deputados e senadores terão R$ 1,77 bilhão a seu dispor para usar em emendas.
O projeto ainda precisa ser aprovado pelo Congresso.
Esta verificação do Comprova investigou as informações que constam de postagens nas páginas Esquerda Diário e A Casa de Vidro no Facebook. Ambas compartilham um artigo do site Esquerda Diário cujo conteúdo também foi verificado pelo Comprova.
Como verificamos
Para verificar este artigo, o Comprova analisou a íntegra do projeto de lei proposto pelo Governo Federal, onde estão previstos os remanejamentos no Orçamento de 2019.
Analisamos para quais órgãos e programas o PL prevê aumentar os recursos e para quais ele pretende diminuí-los. O Comprova também entrou em contato com o Ministério da Educação e com o Ministério da Economia.
Além disso, analisamos, por meio do portal SIGA Brasil, do Senado, os dados da elaboração da Lei de Orçamento Anual (LOA) de 2019 e vimos como cada um desses programas foi incluído no Orçamento deste ano – se foi iniciativa do Executivo, do Legislativo ou de ambos. Isso porque os dois poderes podem incluir despesas no Orçamento.
Para entender o papel das emendas parlamentares, entrevistamos os cientistas políticos Lara Mesquita e Vitor Oliveira. Sobre as regras orçamentárias, entrevistamos a professora de finanças públicas e orçamento público Ursula Dias Peres, da USP. Sobre o remanejamento e as emendas, contatamos Gil Castello Branco, da ONG Contas Abertas. E sobre a dívida pública, questionamos a Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado e que busca dar transparência às contas do governo.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
O remanejamento do Orçamento
As postagens verificadas remetem a texto do site Esquerda Diário que afirma que “R$ 3 bilhões em emendas parlamentares foram distribuídos na véspera da votação do segundo turno da Reforma da Previdência. Quase 1/3 desse valor saiu dos cortes na educação”.
O artigo do Esquerda Diário se baseia em texto da Folha de S. Paulo que mostra que quase um terço das verbas canceladas provém do Ministério da Educação. Ao todo, o MEC perde o saldo de R$ 926 milhões. Isso porque, conforme o projeto de lei sugerido pelo governo Bolsonaro, o órgão teria tanto cortes em algumas de suas ações no valor de R$ 1,16 bilhão quanto suplementação no valor de R$ 230 milhões.
No entanto, as postagens viralizadas exageram o teor do texto ao afirmar que “R$ 3 bilhões em emendas parlamentares foram distribuídos” pelo governo de Jair Bolsonaro.
A reportagem da Folha não é taxativa em relação ao valor do remanejamento que seria destinado a atender interesses de parlamentares. O texto afirma que, “segundo interlocutores de Palácio do Planalto, R$ 2 bilhões são para atender a pleitos de parlamentares e R$ 1 bilhão se destina a ações do Ministério da Defesa.”
O texto do Esquerda Diário ainda diz que reforma se trata de “cortar gastos públicos para liberar mais recursos aos donos da dívida pública”.
O projeto de lei (PLN 18/2019), que ainda está em tramitação no Congresso, prevê o remanejamento de R$ 3 bilhões do Orçamento de 2019. O projeto foi encaminhado pelo Executivo na terça-feira (6) e publicado no dia seguinte, datas em que a Câmara dos Deputados realizava a votação em segundo turno do texto-base da reforma da Previdência.
Em nota, a assessoria do MEC afirmou que o valor cancelado abrange todas as unidades do Ministério e diversos de seus programas. Sozinha uma ação do MEC relativa ao funcionamento de instituições de ensino superior, por exemplo, perderia quase R$ 175 milhões.
Depois do MEC, o órgão que sofre maior corte é o Ministério da Infraestrutura. Se aprovada a redação do Executivo, ele perderia R$ 757 milhões.
Os órgãos que teriam aumentos mais significativos são, em ordem decrescente, o Ministério da Defesa, o Ministério da Saúde e o Ministério do Desenvolvimento.
Entre as ações do Ministério da Defesa que teriam aumento de verba, se aprovado o remanejamento, estão a construção de submarino de propulsão nuclear (R$ 152 milhões) e aquisição de cargueiro militar (R$ 148 milhões).
Remanejamentos no Orçamento são parte da rotina orçamentária de qualquer governo. No entanto, a escolha de quais áreas ganham ou perdem recursos depende das prioridades do Executivo.
“Há uma escolha do governo, há determinação política dentro da regra técnica [do Orçamento]. A situação financeira está complicada, mas o governo escolheu cortar do MEC e colocar na Defesa”, afirmou a professora de finanças públicas e orçamento público da USP Ursula Dias Peres.
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Emendas 2
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Apesar de ser possível identificar no projeto de lei de onde o governo pretende cortar verbas e para onde pretende destiná-las, não é possível afirmar com certeza quanto desse dinheiro será remanejado devido a acordos com parlamentares.
Anualmente, Planalto e Congresso em conjunto definem a Lei Orçamentária Anual (LOA), espécie de documento que define receitas e despesas para o ano seguinte. O remanejamento é uma das formas previstas em lei para alterar o que está autorizado na LOA.
Deputados e senadores podem modificar o que está definido no projeto do Executivo por meio de emendas parlamentares. Dessa forma, é possível direcionar parcela do Orçamento para cumprir compromissos políticos assumidos pelos parlamentares em seus redutos eleitorais.
O Comprova verificou que tanto as ações que serão cortadas quanto as que receberão verba possuíam emendas parlamentares no Orçamento de 2019 (aprovado em dezembro de 2018).
Do montante que o governo pretende remanejar agora, 58% (R$ 1,77 bilhão) vão para cinco ações que foram incluídas no Orçamento integralmente por emendas.
Das cinco ações mencionadas, duas são do Ministério da Saúde (R$ 700 milhões), duas do Ministério do Desenvolvimento Regional (R$ 670 milhões) e uma do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (R$ 400 milhões).
Elas se referem a custeio de serviços de atenção básica em saúde e assistência hospitalar, além de projetos de desenvolvimento sustentável, de desenvolvimento urbano e de fomento ao setor agropecuário.
Se não fossem pelas emendas parlamentares, essas ações não estariam no Orçamento de 2019, pois não estavam previstas no projeto de lei enviado pelo Executivo para o Congresso.
Já do montante total que será cancelado, 40% corresponde a ações integralmente de emendas. Esses dados foram obtidos a partir do SIGA Brasil, sistema com dados orçamentários disponibilizado pelo Senado.
Questionado se os valores remanejados se destinam ao pagamento de emendas parlamentares, o Ministério da Economia não respondeu. Em nota, a assessoria do órgão afirmou que, no PL, “todas as programações suplementadas e canceladas podem ser consultadas”. No entanto, não consta no documento se os valores de destinam ao pagamento de emendas.
Segundo Gil Castello Branco, economista e secretário-geral da ONG Contas Abertas, o que o governo pode fazer por meio de remanejamentos é destinar verbas para projetos de parlamentares. E, por isso, não há como saber o que é pleito de parlamentar porque não se trata de uma emenda formal, mas de um remanejamento de recursos. “Vamos saber do que se trata nessa dotação [valor autorizado no Orçamento], mas não se é de algum parlamentar. Desta vez não é formal, [o parlamentar] vai ao ministério pedir, mas ninguém sabe quem pediu o quê.”
Além disso, esse dinheiro não é distribuído aos parlamentares, como as postagens fazem crer. Ele é remanejado para aumentar os recursos de parte das ações previstas no Orçamento. E, em contrapartida, outras ações do Orçamento devem ter valor equivalente cancelado.
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Emendas 1
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O texto final do Orçamento de 2019 foi aprovado, em dezembro de 2018, com o total de despesas previstas de R$ 3,4 trilhões e R$ 19,2 bilhões em emendas parlamentares.
Das despesas então aprovadas, 95,4% foram para ações que tiveram suas verbas inteiramente incluídas no Orçamento pelo Executivo. As ações integralmente incluídas por emendas parlamentares, por sua vez, representaram 0,3% do valor total.
Em nota, o MEC afirmou que “a suplementação orçamentária não garante o descontingenciamento de recursos, o qual depende da liberação de limites orçamentários estabelecidos por meio do decreto de programação orçamentária e financeira para 2019”. Apesar dos cortes em seu orçamento, o órgão também teve R$ 230 milhões de suplementação.
Mesmo depois de aprovadas no Orçamento ou com o remanejamento autorizado pelo Congresso, não há garantia de quais ações serão de fato executadas. Para tanto é preciso que o governo libere o gasto desses valores por meio de decreto, só então o órgão correspondente pode executar o gasto.
As emendas parlamentares
A postagem do Esquerda Diário afirma que o governo “abriu de par em par os cofres públicos para comprar parlamentares”, em referência ao uso político das emendas, quando usadas como barganha pelo Executivo. Apesar da conotação negativa que o termo pode sugerir, especialistas ouvidos pelo Comprova apontam que a prática de governos utilizarem emendas parlamentares para viabilizar projetos não é nova, nem ilegal, nem negativa.
As emendas parlamentares são prerrogativas constitucionais de senadores e deputados federais. Foram criadas para que os recursos do país fossem melhor distribuídos, pulverizando parte do dinheiro público da União para fins específicos decididos pelos congressistas e beneficiando entidades, municípios ou mesmo bairros pelo Brasil. Alguns de seus destinos podem ser reparar estradas ou comprar ambulâncias, por exemplo.
Desde 2015, uma emenda constitucional definiu que o Executivo é obrigado a executar as emendas parlamentares individuais, atingindo pelo menos o montante de 1,2% da receita corrente líquida. No geral, esse valor é menor do que o valor total de emendas aprovadas na LOA. Isso implica que o Executivo tem discricionariedade para definir quais emendas vai executar.
A partir de 2020, também as emendas de bancadas passarão a ter um percentual mínimo a ser executado. A mudança foi aprovada em junho de 2019.
“Faz parte da natureza política trocar e negociar, em troca de que se chegue a um consenso”, afirma Vitor Oliveira, cientista político e diretor da consultoria Pulso Público. “As emendas são ferramentas que a Presidência tem para mobilizar os parlamentares e resolver democraticamente problemas de ação coletiva, como a aprovação de uma matéria.”
“As emendas têm uma função importante para o orçamento”, também diz Lara Mesquita, cientista política e pesquisadora na Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ela afirma que parlamentares têm mais conhecimento de realidades locais (em lugares em que o governo central não pode estar), portanto sabem que áreas em quais localidades precisam de mais recursos.
No entanto, pode-se questionar, diz Mesquita, os critérios utilizados pelo governo federal para a execução ou não de determinadas emendas.
Manoel Galdino, diretor da ONG Transparência Brasil, concorda. Para ele, negociações entre governo e Congresso são legítimas, mas o processo de liberação de emendas é feito sem transparência, e nem sempre os recursos liberados após acordos são os mais válidos e efetivos para o interesse público.
“Atualmente, o que decide quais emendas serão liberadas é a negociata política, o mero jogo para aprovar uma lei”, diz. Para ele, antes das liberações deveria haver avaliações técnicas que considerassem as agendas do governo e Congresso, mas também respeitassem “o mínimo de viabilidade, da eficiência e impessoalidade” para o bom uso do dinheiro público.
Por outro lado, Oliveira lembra que, desde 2015, as emendas são mais difíceis de serem usadas como moeda de troca (ou para a “compra” de parlamentares, como diz o Esquerda Diário), pois a partir daquele ano sua execução passou a ser obrigatória.
A dívida pública
Ao criticar acordos recentes de emendas parlamentares com recursos da Educação, o artigo do Esquerda Diário afirma que o suposto repasse do dinheiro do MEC para a aprovação da reforma da Previdência se trata de “cortar todos os gastos públicos [como das escolas e das aposentadorias] para liberar mais recursos aos donos da dívida pública”.
A crítica à dívida pública aparece em outras publicações do site, que defende que o débito, de R$ 3,8 trilhões em 2018, não deve ser pago. Uma postagem de 3 de maio de 2019, também sobre os cortes na Educação e a reforma da Previdência, afirma que a dívida pública é “ilegal, ilegítima e fraudulenta”, que “enche o bolso dos banqueiros” e que só a abolição do pagamento “pode garantir um futuro digno à juventude e à classe trabalhadora”.
Para Josué Pellegrini, consultor no Senado Federal e diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), que atua para ampliar a transparência nas contas públicas, a postagem mais recente do Esquerda Diário traz uma “visão equivocada” da dívida. “Chegar ao ponto em que o país não pudesse pagar a dívida e os credores não quisessem mais financiar o governo seria uma verdadeira tragédia econômica e do ponto de vista social”, diz ele.
“Mesmo excluindo o pagamento de juros, o governo continua com um deficit enorme”, Pellegrini aponta. Em 2018, o aumento da dívida da União chegou a 2,6% do valor do PIB. “Se por acaso os credores não quisessem mais financiar o governo, a União não teria como pagar o deficit [hoje coberto pelos empréstimos]. Haveria um ajuste fiscal gravíssimo.“
A dívida pública da União equivale a todos os empréstimos contraídos pelo governo federal para financiar o deficit orçamentário (que inclui gastos para a oferta de serviços públicos e o refinanciamento da própria dívida), segundo definição do Tesouro Nacional. Por meio dos chamados títulos de dívida, a União capta recursos de terceiros quando suas despesas superam a receita disponível, assumindo o compromisso de devolver o valor com juros.
Atualmente, os três maiores financiadores da dívida pública são os fundos de investimentos (26,8%), fundos de Previdência (23,9%) e instituições financeiras (23,1%), mas o grupo inclui também não residentes, seguradoras e o próprio governo, segundo dados de junho de 2019 do Tesouro Nacional. A não ser pelos bancos, o valor que financia a dívida está dividido em componentes “dos quais estão por trás milhares de investidores”, incluindo pessoas físicas, diz Pellegrini. Não há “donos”, ele afirma, mas “todos somos detentores da dívida pública”.
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Emendas 3
Infogram
Atualmente, a Previdência Social, com as contas deficitárias, está entre os principais responsáveis pelo crescimento acelerado da dívida, afirma Pellegrini. Isso porque o deficit da Previdência está entre os principais responsáveis pelo deficit da União. Como as contribuições previdenciárias não são suficientes para pagar as aposentadorias, o governo acaba recorrendo a outras fontes de recursos, emitindo os títulos públicos.
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Emendas 4
Infogram
Analistas apontam que a reforma da Previdência é essencial para o equilíbrio fiscal, a estabilidade e o crescimento da economia. Pellegrini acrescenta que a União seria menos dependente da dívida pública (porque pagaria menos juros) se não chegasse a deficits primários tão altos, podendo inclusive aplicar recursos em outras áreas do governo.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
A publicação do Esquerda Diário sobre as emendas parlamentares e a reforma da Previdência foi divulgada na página do Facebook do site em 8 de agosto de 2019 e até o dia 21 do mesmo mês contava com mais de 6,4 mil compartilhamentos e 10 mil interações. A postagem foi também republicada pela página A Casa de Vidro, com 1,1 mil compartilhamentos até o dia 21. A ferramenta CrowdTangle, usada para análise de engajamento de posts nas redes sociais, indica que, além dessas, outras 18 páginas no Facebook e no Twitter repassaram o conteúdo e tiveram compartilhamentos.
Saiba mais
Qual o volume de emendas liberadas na aprovação da reforma (Nexo)
Para que servem as emendas e quais os prós e contras de sua existência (Nexo) | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Evidência comprovada'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/imagem-de-matanca-de-baleias-nao-foi-capturada-na-noruega/ | COMPROVA | Imagem de matança de baleias não foi capturada na Noruega | null | 2019-08-20 | A foto foi tirada em Tórshavn, capital das Ilhas Faroé, território dinamarquês. O registro foi feito pelo fotógrafo Jan Egil Kristiansen durante a caçada anual de baleias-piloto, em 2004.
Está fora de contexto a fotografia que circula nas redes sociais sobre suposta matança de baleias promovida pela Noruega. Segundo publicações localizadas pelo Comprova no Instagram e no Twitter, o país nórdico é “hipócrita” por se preocupar com o meio ambiente no Brasil enquanto promove a caça dos animais.
A foto em questão, na verdade, foi tirada em outubro de 2004 em Tórshavn, capital das Ilhas Faroé, território dinamarquês localizado no Atlântico Norte. A imagem foi publicada no Flickr do fotógrafo Jan Egil Kristiansen com o título “Grindadráp” (caçadas, no idioma feroês).
Esta verificação do Comprova investigou a origem e o contexto da foto divulgada nos perfis @direitaopressao, no Instagram, e @elzaaraujoyaho1, no Twitter.
Como verificamos
O Comprova utilizou ferramentas de busca reversa de imagem, como o Google Imagens e o TinEye, e consultou os arquivos do Wayback Machine, ferramenta que registra capturas de tela de sites na internet, e do Flickr.
A equipe também entrou em contato com o fotógrafo Jan Egil Kristiansen, responsável pelo clique da caçada nas Ilhas Faroé, e buscou informações no site oficial do governo do arquipélago e da Dinamarca.
‘Hipocrisia’
As postagens no Instagram e no Twitter destacam uma suposta “hipocrisia” da Noruega em criticar políticas ambientais brasileiras enquanto permite a caça de baleias em seu território. Para isso, utilizam uma fotografia de pescadores matando os animais em uma praia cuja água está manchada de sangue.
Diferentemente do que é informado pelas publicações que viralizaram nas redes sociais, a imagem não foi tirada na Noruega, e sim em um território da Dinamarca, no Atlântico Norte.
Por meio da ferramenta de busca reversa de imagem TinEye, que permite fazer buscas por imagens semelhantes publicadas na internet, o Comprova localizou uma publicação de 2009, atualmente fora do ar, no site BuzzFeed. Com auxílio da ferramenta Wayback Machine, que grava versões antigas de conteúdos publicados na internet, a equipe conseguiu reler o artigo, que também comentava sobre as caçadas de baleia nas Ilhas Faroé. Contudo, não havia menção ao responsável pelo registro.
A partir dessas informações, o Comprova filtrou resultados da busca reversa no Google Imagens para resultados que fizessem menção ao termo “Faroe Islands” e encontrou uma publicação no Flickr de uma mulher chamada Miriam Godet que creditava a imagem ao fotógrafo Jan Egil Kristiansen.
O post também continha um link que redirecionava para o perfil profissional do fotógrafo na rede social, onde a foto foi originalmente publicada. O álbum no qual a foto está inserida se chama “Grindadráp” (caçadas, no idioma feroês) e o clique foi feito no dia 09 de outubro de 2004 em Tórshavn, capital das Ilhas Faroé.
O Comprova, então, entrou em contato com Jan pelas redes sociais. Em mensagem via Facebook, ele reiterou as informações encontradas pela equipe. “Confirmo a data e o lugar nas Ilhas Faroé, que não fazem parte da Noruega desde 1814. Também gostaria de acrescentar que não vejo nada de errado em comer carne de baleia-piloto, e que a maioria dos noruegueses provavelmente concorda com isso”, escreveu. Ele, que atua como freelancer, ainda comentou que “tirou a foto por conta própria” e depois vendeu a diferentes veículos de comunicação.
A equipe também descobriu que a imagem está à venda pela agência GettyImages por valores entre US$175 a US$ 499.
Prática milenar
De acordo com o site do governo das Ilhas Faroé, “as formas locais e tradicionais de agricultura e caça, incluindo a caça costeira de baleias-piloto, permitiram às Ilhas Faroé manter um grau relativamente alto de autossuficiência na produção local de alimentos”. O texto ainda diz que “é considerado bom senso econômico e ambiental aproveitar ao máximo os recursos naturais que estão disponíveis localmente”.
Um hotsite do governo dedicado a esta prática afirma que “a condução, encalhe, matança e distribuição de baleias-piloto são totalmente regulamentadas por leis. As capturas são compartilhadas entre os participantes e a comunidade local”.
Caça a baleias na Noruega
Apesar da imagem compartilhada nas redes sociais não ter sido tirada na Noruega, a prática é comum no país. Conforme afirma o próprio governo, em seção de seu site, a baleação começou a funcionar novamente em 1993, depois de cinco anos parada. “Na Noruega, a caça às baleias sempre foi feita em combinação com a pesca tradicional. A baleeira norueguesa é sustentável e legal. A gestão de recursos da Noruega é baseada no princípio do uso sustentável dos recursos naturais. A colheita de recursos marinhos, incluindo baleias, é baseada em critérios científicos.”
O Comitê Científico da Comissão Internacional Baleeira (IWC), responsável pela conservação de baleias e regulamentação da caça, proibiu a caça comercial em todo o mundo. Noruega e Islândia não aderiram, mas informam o número de animais capturados. Anualmente, são estabelecidas quotas com base nos procedimentos desenvolvidos pelo IWC.
Em sua resposta ao Comprova, Jan ainda explicou a diferença entre a caça na Noruega e no arquipélago onde mora. “A baleação norueguesa ocorre em mar aberto, não nas praias como aqui nas Ilhas Faroé”, escreveu.
Repercussão nas redes
A publicação de @elzaaraujoyaho1 obteve 798 RTs e 1,5 mil curtidas. No Instagram, a publicação de @direitaopressao obteve 9.522 likes até o dia 20 de agosto.
O Estadão Verifica, parceiro do Comprova, e a Agência Lupa também desmentiram conteúdos semelhantes.
Contexto
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou no dia 17 de maio que parte dos projetos do Fundo Amazônia – iniciativa que capta doações não reembolsáveis da Noruega e da Alemanha para ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento – apresentaram irregularidades após análise preliminar. Ele também afirmou que proporia a revisão de critérios de contratações.
A Embaixada da Noruega, que responde por 94% das doações, respondeu, em nota, não ter sido informada pelo governo sobre proposta de mudança no programa. Ainda, garantiu que estava satisfeita com a atual gestão, feita pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e com a seleção de seus projetos em andamento.
Com a divulgação de dados que mostram aumento do desmatamento na Amazônia, a ministra alemã do Meio Ambiente, Svenja Schulze, anunciou em entrevista ao jornal “Tagesspiegel”, em 10 de agosto, que congelaria projetos de proteção florestal na Região Amazônica no valor de R$ 155 milhões de reais.
Um dia depois, Bolsonaro comentou a decisão e disse que a Alemanha “vai deixar de comprar à prestação a Amazônia”. No dia 14, o presidente deu uma sugestão aos europeus. “Eu queria até mandar recado para a senhora querida Angela Merkel, que suspendeu 80 milhões de dólares pra Amazônia. Pega essa grana e refloreste a Alemanha, tá ok? Lá está precisando muito mais do que aqui.”
Antes, em 7 de agosto, o ministro Salles havia afirmado que a Noruega possui passivos ambientais e desqualificou as cobranças que o país tem feito às mudanças no Fundo. “A Noruega é o país que explora petróleo no Ártico, eles caçam baleia. E colocam no Brasil essa carga toda, distorcendo a questão ambiental”, declarou.
Dois dias depois, a nação nórdica emitiu nota para afirmar que “está comprometida a continuar com a gestão responsável, prudente e sustentável dos seus recursos petrolíferos”. A indústria petrolífera norueguesa, declarou, “é líder global em padrões de saúde, segurança e proteção ambiental”. Contudo, no dia 15, o ministro norueguês do Clima e Meio Ambiente, Ola Elvestuen, anunciou que o país suspendeu o repasse de 300 milhões de coroas norueguesas, o equivalente a R$ 133 milhões, para ações contra o desmatamento no Brasil.
De acordo com o jornal norueguês Dagens Næringsliv, Elvestuen considera que o Brasil quebrou o acordo para financiar medidas de desmatamento. Questionado sobre a decisão, Salles disse que as negociações sobre o destino do fundo ainda estão em andamento e que, por isso, vê como “natural” a decisão de reter repasses à iniciativa.
No domingo, 18, o presidente Jair Bolsonaro compartilhou vídeo em seu perfil no Twitter atribuindo à Noruega uma caça de baleias. As imagens, no entanto, foram feitas pela ONG Sea Shepherd UK, que desmentiu o uso incorreto das gravações e esclareceu que elas foram feitas nas Ilhas Faroé. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Verificação'] | [] | 2021-07-06 | ['Contexto errado'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/a-partir-de-imagem-verdadeira-postagem-enganosa-exagera-extensao-de-trecho-em-obras-na-br-381/ | COMPROVA | A partir de imagem verdadeira, postagem enganosa exagera extensão de trecho em obras na BR-381 | null | 2019-08-20 | É enganosa a descrição de um vídeo sobre a BR-381, segundo a qual a filmagem divulgada teria sido feita em um trecho muito maior do que o real
Uma página de apoio ao presidente Jair Bolsonaro no Facebook compartilhou um vídeo com imagens de um trecho recém-asfaltado da BR-381 e o descreve na legenda como se fosse outro, três vezes maior.
O vídeo é verdadeiro e mostra trechos asfaltados e um túnel da BR-381 entre Nova Era e Antônio Dias, em Minas Gerais. A distância entre as duas cidades é de 35 km. Na descrição enganosa, o trecho é apresentado como sendo entre Belo Horizonte e João Monlevade, também ligadas pela BR-381, mas distantes 115 km.
A BR-381 é popularmente conhecida como “Rodovia da Morte” devido ao grande número de acidentes que ocorrem na estrada. O trecho entre Belo Horizonte e João Monlevade, citado na descrição enganosa da postagem no Facebook, tem uma média de um acidente por dia, segundo dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Esta checagem do Comprova investigou os dados de uma publicação da página Bolsonaro Bahia no Facebook.
Como verificamos
Para investigar essa publicação, o Comprova consultou o site do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), do Ministério de Infraestrutura, reportagens publicadas pela imprensa sobre as referidas obras, a página da empresa que realizou a obra dos túneis e o YouTube e tentou contato com o proprietário da página e com o autor do vídeo.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
Vídeo da BR-381
Inicialmente, a legenda da postagem com o vídeo diz que o trecho liberado para o tráfego fica entre Belo Horizonte e João Monlevade. Mas, ao ouvir o vídeo, nota-se que o autor da gravação fala que o trecho filmado corresponde ao caminho entre os municípios de Nova Era e Antônio Dias.
Nesse caso, o autor do vídeo está correto.
O mapa abaixo mostra a localização e a distância das quatro cidades.
Para confirmar o que efetivamente estava sendo filmado, o Comprova fez contato com a página Bolsonaro BAHIA, que postou o conteúdo, e com seu administrador, André Meirelles, a fim de encontrar a fonte primária da gravação, mas não obteve resposta.
Posteriormente, ao acessar o YouTube e colocar as palavras-chave “Nova Era Antônio Dias” chegou-se a um vídeo com a mesma duração e mostrando o mesmo trecho postado pelo usuário Bruno Cesar em 21 de julho de 2019.
No Facebook, o Comprova encontrou o perfil de Bruno ao fazer uma busca por seu nome e fez contato com ele. Além de ter publicado em seu perfil o mesmo vídeo viralizado, em 22 de julho deste ano, ele ainda fez uma advertência na legenda: “Obs = Só quis expressar minha satisfação com o andamento das Obras e a redução dos trechos perigosos NÃO TEM NADA A VER COM POLÍTICA, SÓ ESPERO QUE O TÍTULO DE RODOVIA DA MORTE ACABE”.
O usuário, entretanto, não respondeu.
Um dia antes, em 21 de julho, Bruno havia publicado um vídeo da mesma estrada com a seguinte descrição: “Muito feliz por passar no túnel entre Nova Era e Antônio Dias já mostram um certo progresso na BR-381”.
Reportagens comprovam inauguração de trecho da BR-381
O Comprova encontrou reportagens de veículos da imprensa que registraram a inauguração da obra em 19 de julho deste ano no trecho que compreende Antônio Dias e Nova Era, mencionada pelo autor do vídeo.
Uma matéria publicada no site do Diário do Aço, que cobre a região do Vale do Aço, em Minas Gerais, afirma que o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, inaugurou um trecho da duplicação da rodovia BR-381, na localidade de Antônio Dias. Lá, explica que “o trecho integra o chamado ‘binário pista nova’ […], onde estão localizados também dois túneis no sentido Nova Era”.
O DNIT e o Ministério da Infraestrutura também publicaram notícias sobre a inauguração e liberação para o tráfego em 19 de julho deste ano. Entretanto, como é possível ver na página da própria rodovia, os túneis citados já estavam finalizados desde outubro de 2015.
Contudo, a conclusão do binário pista nova era a condição para a liberação do trânsito “em cerca de 12 km de pista simples”, incluindo a passagem pelos túneis Prainha e Antônio Dias. Isso se dá porque o binário pista nova e os dois túneis são de obras e lotes diferentes: o primeiro faz parte do 3.1 e o segundo, do 3.3.
Essa obra teve início em maio de 2014, durante o governo de Dilma Rousseff, como aponta esta matéria do jornal Estado de Minas.
Comparação de imagens para verificação da localização
Para confirmar que o trecho mencionado pelo autor do vídeo realmente correspondia às imagens mostradas, o Comprova pesquisou outras gravações do trecho publicadas por usuários em dias próximos.
Abaixo, pode-se ver uma reprodução do vídeo viralizado (à esquerda), em que aparece o túnel Antônio Dias, e a captura de tela (à direita) da gravação do usuário Minas Gerais Pelo Mundo do mesmo túnel. Em ambas as imagens veem-se as mesmas marcas na construção.
Em e-mail ao Comprova, o DNIT confirmou a localização da filmagem e declarou que esta foi feita “certamente no trecho de pista nova do Lote 3.1”. Também assinalou que, de acordo com a fala do usuário, as imagens foram feitas “na semana de 21 a 27 de julho deste ano”.
A duplicação à qual o autor do vídeo se refere ainda não foi concluída. Segundo o DNIT, “foram entregues 15 quilômetros do lote 3.1 de pista nova e com piso de concreto. A pista está funcionando como um desvio de obra e nos dois sentidos. Isso ocorre para que seja feita a modernização do trecho já existente. Os desvios são realizados nos quilômetros 303 e 314 e os motoristas têm acesso aos túneis Antônio Dias e Prainha”.
O DNIT também explicou que após a modernização da pista antiga, o trecho já liberado passará a ser de pista dupla, com os veículos trafegando apenas no sentido Governador Valadares – Belo Horizonte, direção oposta à vista na filmagem.
No site oficial da obra da BR-381 é possível ver o outro lado do túnel Antônio Dias, com uma placa indicativa, cujo sentido do tráfego passará a valer após a duplicação mencionada.
A iniciativa Nova 381, movimento do setor empresarial de Minas Gerais com o objetivo de promover o desenvolvimento socioeconômico do estado a partir da BR-381, tem um site em que registra o andamento das obras da estrada, que vai de Governador Valadares até Belo Horizonte, passando por, dentre outras cidades, Antônio Dias e Nova Era.
A BR-381 corta a Região Metropolitana do Vale do Aço (RMVA), popularmente conhecida como Vale do Aço. O local é composto por quatro municípios (Coronel Fabriciano, Ipatinga, Santana do Paraíso e Timóteo), além de mais 24 cidades metropolitanas, dentre elas Antônio Dias. O nome da região advém dos complexos de indústrias siderúrgicas, que precisam da BR-381 para que ocorra o escoamento da produção.
O trecho da BR-381 ao qual se refere a descrição do vídeo, entre Belo Horizonte e João Monlevade, está previsto para ser duplicado pela iniciativa privada em processo de concessão que será realizado em 2020 pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e que está em fase de audiências públicas. A rodovia será concedida em um pacote com a BR-262, no trecho entre Vitória (ES) e João Monlevade.
Repercussão nas Redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
O post com o vídeo que mostra a rodovia BR-381 foi publicado em 5 de agosto de 2019 pela página Bolsonaro Bahia e contou até o dia 19 de agosto com mais de 4,8 mil compartilhamentos e 150 mil visualizações. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Verificação'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-enganoso-video-que-fala-sobre-recado-final-de-militares-ao-stf/ | COMPROVA | É enganoso vídeo que fala sobre “recado final” de militares ao STF | null | 2019-08-16 | Não há comprovação de que o alto comando das Forças Armadas esteja pressionando a corte em nome do ministro da Justiça, Sergio Moro. Tanto o Exército quanto o STF negam o episódio
É enganoso um vídeo publicado no YouTube sobre um suposto clima de suspense no Supremo Tribunal Federal (STF) atribuído a um “duro recado” que o alto comando do Exército teria mandado aos ministros. Segundo o rumor, os militares teriam alertado os integrantes da corte para que não “mexessem” com o atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro.
O vídeo em questão é composto por uma sequência de fotos dos ministros do Supremo, de integrantes do governo, do presidente Jair Bolsonaro (PSL) e de militares fardados. As imagens são acompanhadas por um áudio no qual a narradora mistura fatos verídicos e falsos para construir a tese do “recado”.
O vídeo é favorável a Moro. Diz que ninguém “mexe” com ele por causa de sua “autoridade, respeito, caráter e popularidade” e que, se “mexerem com Moro”, a briga será “grande e feia”.
Esta verificação do Comprova investigou os dados do vídeo publicado no canal BR Notícias no YouTube.
Como verificamos
Para fazer esta apuração o Comprova entrou em contato com as assessorias de organizações e pessoas citadas no vídeo. São elas: o Exército, o STF, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB), e com o canal que divulgou o vídeo no YouTube.
A equipe também conversou com o ex-candidato a governador do Distrito Federal, general Paulo Chagas (PRP), com um advogado criminalista e consultou reportagens feitas sobre as afirmações que constam no vídeo.
Você pode refazer o caminho da verificação usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
O “recado”
A narradora do vídeo afirma que o alto comando do Exército mandou um duro recado para o Supremo e, a partir daí, “um grande clima de suspense pairou no ar”. De acordo com a narração, trata-se de uma notificação de um general para que “ninguém mexesse” com Moro na questão dos vazamentos das conversas entre ele e procuradores da força tarefa da Lava Jato.
Ao Comprova, o coronel Guerra, chefe da assessoria de imprensa do Exército, disse por telefone que o “duro recado” citado no vídeo “não ocorreu e é falso”. Por meio de sua assessoria, o Supremo também negou ter recebido qualquer “recado” de integrantes do Exército.
Mourão
Além do rumor de origem não identificada, o vídeo também especula sobre o “recado” ter sido dado ao Supremo pelo vice-presidente da República, Hamilton Mourão (PRTB). A assessoria de imprensa do general da reserva nega que ele tenha dado qualquer “recado” à corte superior e afirma que os fatos descritos no vídeo são inverídicos.
É enganoso que Mourão tenha mandado qualquer recado aos ministros do STF caso eles interferissem a respeito das conversas atribuídas a Moro. A narrativa do vídeo mescla afirmações feitas pelo vice-presidente, como a defesa da operação Lava Jato, com o discurso falso que o militar teria ameaçado a Suprema Corte. O vice-presidente não deu declarações sobre interferências a serem feitas no STF caso os ministros “mexessem com Moro”, mas defendeu a operação Lava Jato publicamente.
Mourão também disse que Moro é de “ilibada confiança” do presidente Bolsonaro e defendeu a privacidade das comunicações do ministro.
FHC
Outra figura pública citada no vídeo por ter defendido Moro foi o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). A narradora diz que o tucano “saiu em defesa de Moro” e disse que o vazamento não passa de uma “tempestade em copo d’água”.
Ao Comprova, a assessoria do Instituto Fernando Henrique disse que o ex-presidente não saiu em defesa de Moro, o que ele fez foi comentar o caso ao ser questionado por um repórter.
Os processos julgados por Moro
O vídeo afirma que alguns ministros disseram “em off” para a reportagem que nada poderia anular os julgamentos da Lava Jato. A expressão “em off” é utilizada no jornalismo quando o repórter não revela quem foi a fonte que lhe passou a informação – isso é feito para preservar o informante.
De acordo com o vídeo, o pior que poderia acontecer seria Sergio Moro ser convidado à Suprema Corte para dar explicações ao “Conselho Superior de Censura”, já extinto. Para verificar esta afirmação, o Comprova entrevistou João Paulo Boaventura –advogado criminalista, sócio do escritório Boaventura Turbay Advogados.
Boaventura disse que o Conselho foi extinto na Constituição de 1988. “Hoje ele é aquele setor do Ministério da Justiça que faz classificação etária de programas de televisão, filmes, etc.”.
Apesar de Moro não ter de dar explicações ao Supremo, como afirma o vídeo, o ministro foi convidado e compareceu a uma sessão no Senado Federal, em 19 de junho, e a outra na Câmara dos Deputados, em 2 de julho.
Lava Jato
O áudio do vídeo está correto quando afirma que o Ministério Público Federal (MPF) diz que a operação Lava Jato é o maior caso de lavagem de dinheiro já apurado no Brasil.
De acordo com o site do MPF, a investigação é realmente a maior deflagrada até hoje e mira um esquema de corrupção que já dura pelo menos 10 anos e envolveu grandes empresas como a Petrobras e a Odebrecht.
Repercussão nas redes
Até o dia 15 de agosto, o vídeo postado no canal BR Notícias, do YouTube, foi visualizado por mais de 327 mil pessoas. De acordo com o Crowdtangle, uma ferramenta de monitoramento de redes sociais, a gravação obteve mais de 22 mil interações no Facebook até a mesma data.
Contexto
Em 9 de junho de 2019, o portal The Intercept começou a divulgar conversas do aplicativo Telegram atribuídas ao ministro Sergio Moro. Nas mensagens, o ex-juiz teria orientado os membros do Ministério Público sobre como agir com relação à operação. Esse tipo de comunicação é considerada ilegal pela Constituição brasileira e pelo Código de Processo Penal.
Depois do vazamento, houve especulações sobre o que aconteceria com os processos julgados por Moro enquanto era juiz federal da 13ª Vara Federal em Curitiba – antes de assumir o cargo no governo Bolsonaro. O pedido de suspeição contra Moro na condenação do ex-presidente Luiz inácio Lula da Silva (PT), apresentado ao STF em dezembro de 2018, ganhou força após as reportagens. A defesa do petista alega que Moro foi parcial no julgamento de Lula.
O vídeo enganoso foi publicado em 10 de agosto, em meio a uma campanha contra o STF que convoca um ato de protesto para o próximo dia 25, cujos alvos são os ministros da corte. Diversas postagens dessa campanha, detectadas no monitoramento do Comprova, pedem o fechamento do STF.
No fim do vídeo analisado, a narradora pede a “intervenção militar” e a imposição do artigo 142 da Constituição contra o STF.
A redação do artigo 142 é objeto de uma leitura enganosa por parte dos apoiadores de uma “intervenção militar”, segundo os quais as Forças Armadas poderiam fechar o Congresso ou Supremo e, ainda assim, estar dentro da lei. Ocorre, no entanto, que o artigo 142 da Constituição não permite tal ofensiva.
Uma ação desse tipo configuraria um golpe de Estado, pois, de acordo com a Constituição Federal, nenhum representante eleito pode ser destituído a não ser por deliberação da maioria absoluta do Poder Legislativo. Uma ação deste tipo configuraria um golpe de Estado, .
O artigo se restringe às diretrizes sobre o funcionamento das Forças Armadas. Esse artigo serve de base para a Lei Complementar 97, de 1999, e o Decreto 3897, de 2001, que regulam as chamadas missões de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). As GLOs são realizadas exclusivamente por ordem da Presidência da República e ocorrem nos casos em que há o esgotamento das forças tradicionais de segurança pública.
A intervenção federal, por sua vez, é um mecanismo previsto no artigo 34 da Constituição. Ela pode ser decretada pelo governo federal nos estados e no Distrito Federal e depende de autorização do Legislativo, ou seja, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. A medida, no entanto, não prevê o fechamento do Congresso. No caso do Rio de Janeiro, que passou por uma intervenção militar recentemente, a prerrogativa colocou os órgãos de segurança pública do Estado sob o comando de um general do Exército.
Um outro vídeo, publicado em março de 2019, adotou estratégia semelhante à utilizada no vídeo investigado nesta verificação – fala em supostos avisos e ultimatos de militares ao Supremo.
Na ocasião, o “recado” não teria sido dado em defesa de Moro, mas sim para impedir a eventual soltura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O vídeo falava em um “aviso final” que o general da reserva Paulo Chagas, que se candidatou ao governo do Distrito Federal, teria dado ao STF.
Tal aviso envolveria o julgamento de mérito sobre a prisão em segunda instância, que estava marcado para 10 de abril de 2019. Uma mudança na jurisprudência (atualmente a favor do cumprimento da pena após sentença confirmada em segunda instância) poderia beneficiar Lula, até então condenado por Moro e o TRF-4. O ex-presidente só seria condenado em terceira instância no caso triplex em abril.
Ainda em abril, especificamente no dia 4, o ministro Dias Toffoli, presidente do STF, atendeu a pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e tirou o julgamento da prisão em segunda instância da pauta da Corte, sem data fixada para retornar até o momento. O assunto, no entanto, pode voltar a ser examinado em alguma sessão sem pauta definida.
A base do vídeo para a argumentar que os militares tinham ameaçado o STF é um texto publicado em 30 de março de 2019 por Chagas. Ao Comprova, o general disse que o post é uma adaptação de um texto originalmente publicado em 2017. O texto original é muito parecido com o replicado na corrente. No entanto, Chagas diz que a parte do “aviso final” ao STF foi inserida pelo autor do post que viralizou. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Verificação'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/artigo-enganoso-associa-mais-armas-a-menos-violencia-texto-traz-perspectiva-incompleta-de-estatisticas-sobre-o-brasil-e-os-eua/ | COMPROVA | Artigo enganoso associa mais armas a menos violência; texto traz perspectiva incompleta de estatísticas sobre o Brasil e os EUA | null | 2019-08-14 | Pesquisas realizadas por universidades nos Estados Unidos e no Brasil indicam o contrário. O artigo também usa dados incorretos sobre o Brasil.
É enganoso um artigo compartilhado nas redes sociais com a alegação de que mais armas podem reduzir os índices de violência. Pesquisas realizadas por universidades nos Estados Unidos e no Brasil indicam o contrário.
O artigo usa números de armas e homicídios dos Estados Unidos, mas fornece dados incorretos sobre o Brasil.
A publicação original foi feita após dois atentados com armas de fogo nos Estados Unidos que resultaram em 31 mortos. O texto acusa a mídia de hipocrisia e a esquerda de ser oportunista por relacionarem a permissividade com a posse de armas à violência.
O Comprova calculou a correlação entre a força ou fraqueza relativa das legislações estaduais sobre armamentos e a taxa de mortes por armas de fogo nos estados americanos, estatística que também inclui acidentes e suicídios. O resultado encontrado aponta que quanto mais forte a regulamentação antiarmas, menor o índice de mortes por armas de fogo.
Esta verificação do Comprova investigou os dados de um texto publicado no site Jornal da Cidade Online.
Como verificamos
O Comprova verificou as alegações feitas no post com dados de instituições como Small Arms Survey, Organização Mundial da Saúde (OMS), FBI, Giffords Law Center, Departamento de Justiça norte-americano, Suprema Corte dos Estados Unidos, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O Comprova também entrou em contato com o autor da publicação.
Você pode refazer o caminho da verificação usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
Armas e homicídios no Brasil e nos Estados Unidos
É verdadeiro que os Estados Unidos são o país mais armado do mundo, com 393 milhões de armas, mais do que as 300 milhões indicadas no texto do Jornal da Cidade Online. O país também está em primeiro lugar como a nação com mais armas entre seus cidadãos: há 120,5 armas para cada 100 habitantes. Mais de uma por pessoa e duas vezes mais do que o Iêmen, que está em segundo lugar e tem uma taxa de 52,8 armas per capita.
O Brasil é o sétimo do ranking, com 17,5 milhões de armas. Valor bem acima do exposto no texto, de menos de 1 milhão. Considerando o número de armas entre os cidadãos, há 8,3 para cada 100 habitantes.
Os dados são do último relatório da organização Small Arms Survey, de 2017, cujos estudos, envolvendo 178 países, são usados por governos do mundo inteiro para desenvolver políticas públicas. A organização é ligada ao Graduate Institute of International and Development Studies, de Genebra (Suíça).
A taxa de homicídios no Brasil é 4,8 vezes maior do que a dos Estados Unidos. Enganosamente, o texto afirma que é seis vezes maior.
Por aqui, há 31,3 homicídios a cada 100 mil habitantes e por lá, 6,5 a cada 100 mil. Os dados são de relatório de 2017 da Organização Mundial da Saúde (OMS) (expostos na página 55).
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Armas no mundo
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Relação entre armas e violência
A premissa do texto é de que mais armas podem reduzir os índices de violência. No entanto, a maioria das pesquisas sustenta o contrário: que dificultar a compra reduz as mortes por arma de fogo.
Um estudo feito na Universidade de Columbia e publicado em 2016 no periódico Epidemiologic Reviews revisou os resultados de 130 pesquisas feitas em 10 países, de 1950 a 2014. Resultado: políticas que restringem o acesso a armas resultaram em menor violência nos países.
Em 2018, mais pessoas morreram por armas do que por acidentes de carro nos Estados Unidos, mostrou o CDC, equivalente à Anvisa norte-americana.
Há também uma revisão feita no Brasil pelo professor do Insper e pesquisador na área em análise econômica do direito Thomas Conti. Ele analisou 61 pesquisas sobre o assunto – muitas delas, revisões de outros estudos – e descobriu que 90% delas indicam que mais armas não estão associadas a menos crimes. Os critérios de seleção foram estudos publicados nos últimos cinco anos, em revistas científicas de alto padrão. Ele afirma que os estudos que defendem que mais armas combatem a violência têm falhas na metodologia.
Ainda no Brasil, há três grandes estudos que analisam a relação entre armas de fogo e violência: Mapa da Violência, o Atlas da Violência e Anuário Brasileiro da Segurança Pública. Todos apontam que maior circulação de armas está associada a mais violência.
Daniel Cerqueira, coordenador do Atlas da Violência e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), órgão do governo federal, afirmou ao Comprova que as evidências internacionais e brasileiras apontam que as armas estão relacionadas à violência. Ele também destacou que a realidade dos Estados Unidos precisa ser comparada com a de outros países desenvolvidos — neste caso, o país tem índices de violência acima dos registrados em nações europeias.
“As pesquisas internacionais mostram que a arma conspira contra a segurança da própria família, que aumenta as chances de os vizinhos sofrerem violência, aumenta as chances de a arma cair no mercado ilegal e inclusive de o lar da família ser alvo de interesse de criminosos em busca das armas”, aponta o pesquisador, doutor em Economia pela PUC-Rio e um dos maiores especialistas do Brasil na relação entre economia do crime e segurança pública. “Os poucos estudos que apontaram o contrário caíram em descredibilidade por erros técnicos, foram refeitos e chegou-se a resultados contrários”, acrescenta.
O estudo mais recente em andamento e com grande abrangência está sendo tocado por um dos mais respeitados pesquisadores sobre os impactos de armas de fogo no mundo, o professor John J. Donohue, da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. A metodologia de análise inclui aquela usada por autores que defendem que mais armas reduzem a violência. Em junho de 2019, um artigo com os resultados foi publicado. Ao analisar os efeitos da flexibilização do porte de armas em diferentes Estados norte-americanos (lá, cada estado tem autonomia para decidir sobre o tema), os pesquisadores descobriram que facilitar o porte de armas aumentou de 13% a 15% a taxa de crimes violentos após 10 anos de as leis terem sido flexibilizadas.
Nos Estados Unidos, os dados também indicam que armas de fogo em casa são um risco para crianças e adolescentes. Este estudo de 2018 feito por pediatras da Universidade de Stanford, na Califórnia, mostra que ferimentos por arma são a segunda principal causa de morte de jovens nos Estados Unidos – os dados usados são do próprio governo federal. Em estados onde comprar armas é mais fácil, o risco é duas vezes maior do que onde há mais obstáculos para comprá-las. Um dos autores do estudo diz que uma criança norte-americana tem 82 vezes mais chances de morrer com um tiro do que uma criança de qualquer outro país desenvolvido.
Há ainda outro problema nos Estados Unidos: quem tem armas de fogo em casa tem 10,4 vezes mais chances de morrer por suicídio, mostrou estudo publicado no American Journal of Epidemiology em 2004. Historicamente, o maior número de mortes por armas de fogo nos EUA ocorre por suicídio, a 10ª maior causa de morte no país. Os dados do CDC ainda mostram que metade dos norte-americanos que se suicidaram em 2017 usaram justamente uma arma de fogo.
O aumento de armas na população está também associado com o aumento de armas no mercado irregular, aponta o Atlas da Violência, publicado em 2019 no Brasil. O documento cita os resultados da CPI das Armas, realizada na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. O estudo apurou que, entre 2005 e 2015, 17,6 mil armas legais foram desviadas para o mercado paralelo, das quais 86% tinham sido compradas de forma legal para civis e militares.
Legislação sobre armas nos Estados Unidos
O texto do Jornal da Cidade Online faz uma comparação enganosa entre cidades dos Estados Unidos, afirmando que Chicago e Baltimore são as mais violentas e que têm legislações mais restritivas para o acesso a armas.
Baltimore, em Maryland, é a 4ª cidade com índice mais alto de assassinatos nos Estados Unidos (22 por 100 mil habitantes) e Chicago, em Illinois, fica na 20ª posição (9 a cada 100 mil). Os dados são das estatísticas mais recentes compiladas pela agência federal de inteligência americana, o FBI, de janeiro a junho de 2018. A taxa mais alta de homicídio é de St. Louis, no Missouri (26 mortos a cada 100 mil habitantes).
Se considerarmos os índices de crimes violentos (homicídio, estupro, assalto e agressão corporal grave), a cidade mais violenta dos Estados Unidos é Detroit, no Michigan (934 casos por 100 mil habitantes). Baltimore está na 5ª posição do ranking (839 casos a cada 100 mil habitantes) e Chicago só aparece em 30º (479 registros por 100 mil habitantes).
Embora Baltimore e Chicago tenham leis de porte e venda de armas mais restritivas, elas não são as mais rígidas do país. Maryland e Illinois estão, respectivamente, no 4º e 8º lugar do ranking do Giffords Law Center, organização que advoga pelo controle de armas de fogo e classifica a legislação dos estados americanos com notas de A a F (sendo a primeira mais restritiva e a segunda, mais permissiva). A entidade leva em consideração aspectos como verificação de antecedentes e regulamentos de segurança.
A distribuição das cidades com números de criminalidade mais altos não se divide de forma uniforme em relação à rigidez da legislação estadual sobre armas de fogo. Entre as 30 cidades americanas com maior índice de crimes violentos, 12 estão localizadas em estados com nota “F” no ranking Giffords, cinco em estados com notas “D” e “D-”, quatro em estados com notas “C” e “C-”, duas em um estado com nota “B+” e sete em estados com notas “A” e “A-”.
Quando comparamos a taxa de homicídios com a rigidez em relação à legislação de armas, observamos que entre as 30 cidades com índices mais altos de assassinatos, nove estão em estados com nota “F”, ou seja, são mais permissivas; 11 em estados com notas “D” e “D-”, cinco em estados de notas “C+”, “C” e “C-”, uma em um estado com nota “B+” e quatro em estados com notas “A” e “A-”.
O que se pode concluir desses dados é que os exemplos de Baltimore e Chicago são anedóticos, e não são indicadores de tendências nos Estados Unidos em geral. As cidades que estão no topo das mais violentas do país, Detroit e St. Louis, ficam em estados com legislação relativamente mais frouxa em relação a armas: Michigan (nota “C”, 16º lugar no ranking Giffords) e Missouri (nota “F”, 47º lugar).
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No ranking do Giffords Law Center, Maryland tem nota “A-”, o que indica uma legislação relativamente restritiva. Entre as exigências, está a checagem de antecedentes para compra e transferência de pistolas e a proibição de venda de mais de uma arma em um período de 30 dias. Para obter licença para comprar um revólver, é preciso completar um curso de segurança.
As regras mais rígidas para porte de armas de fogo no estado americano foram aprovadas em 2013, com o Firearm Safety Act. No ano passado, foram estabelecidas normas ainda mais duras, de acordo com o Giffords Law Center.
É importante ressaltar que uma parte considerável das armas utilizadas em crimes em Maryland é importada de outros estados. A Divisão de Álcool, Tabaco, Armas de Fogo e Explosivos (ATF, na sigla em inglês) do Departamento de Justiça americano registrou que, em 2017, 53% das armas rastreadas em Maryland foram compradas em outros estados dos EUA, a maior taxa de importação da nação — a média do restante do país é 29%.
Segundo a ATF, os armamentos vieram de unidades da federação como Virginia (nota “D”), Pennsylvania (“C+”), West Virginia (“F”) e Georgia (“F”), que têm legislação mais frouxa que Maryland, segundo o ranking do Giffords Law Center.
Illinois tem nota “B+” e fica na 8ª posição entre os 50 estados americanos no ranking Giffords. Assim como Maryland, é preciso passar por uma checagem de antecedentes antes de adquirir uma licença para portar armas, que dura 10 anos. Há ainda uma lei de proteção a crianças que proíbe deixar armas destrancadas ao alcance de menores de 14 anos. O estado, no entanto, não exige o registro de armas de fogo nem impõe restrições à compra de múltiplos armamentos.
De forma semelhante ao que ocorre em Maryland, Illinois também tem taxa alta de importação de armas de outros estados. Segundo relatório da ATF de 2017, 52% das armas rastreadas utilizadas em crimes vieram de unidades da federação diferentes. Indiana (nota “D-”), Wisconsin (“C-”) e Missouri (“F”) são as fontes mais frequentes de armas, todos estados com legislação mais permissiva, de acordo com avaliação do Gifford Law Center.
O departamento de polícia da cidade de Chicago também produziu um documento sobre a origem das armas empregadas em crimes. O levantamento aponta uma tendência consistente de uma década em que a maioria das armas de fogo ilegais recuperadas em Chicago são rastreadas a estados com menos regulação de armas de fogo. No caso da cidade, quase 60% do armamento usado em crimes vinha de outras unidades da federação.
Usar Chicago como exemplo de cidade em que o controle de armas de fogo não funcionaria já foi uma tática empregada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e pela ex-porta-voz da Casa Branca Sarah Huckabee Sanders. Como ressaltou a rádio americana NPR, esse argumento também ecoa em sites de direita, como o Breitbart. Essa alegação, no entanto, já foi desmentida por agências de fact checking dos Estados Unidos, como Politifact.
De acordo com o Politifact, a reputação de Chicago como uma cidade com alta restrição ao porte e venda de armas vem de 1982, quando foi banida a posse de revólveres nos limites municipais. Essa proibição caiu em 2010, com uma decisão da Suprema Corte americana baseada na Segunda Emenda da Constituição do país. Em 2013, o estado de Illinois afrouxou sua legislação sobre armas, permitindo o porte não ostensivo de armas.
Em geral, o estado americano que tem a legislação considerada mais restritiva em relação ao porte e à posse de armas é a Califórnia. Todas as vendas de armamentos e munições precisam passar por verificação de antecedentes; vendedores e compradores devem ter licenciamento; há registros permanentes de armas de fogo; existe proibição de armamentos de alto calibre; autoridades locais têm liberdade de impor ainda mais restrições sobre o assunto.
O Mississippi fica em último lugar no ranking do Giffords Law Center, o que quer dizer que o estado tem a legislação considerada mais permissiva em relação ao porte e à posse de armas. Donos de armamentos não precisam ter licença ou registrar suas armas; não há limite no número de armas que pode se comprar de uma só vez; não há verificação de antecedentes na transação de armas entre duas partes privadas.
A organização pró-controle de armas observou uma correlação entre os estados com legislação mais permissiva e a taxa de mortes por armas de fogo. O Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos compila essas estatísticas de mortalidade, que incluem acidentes, auto-defesa e suicídio, além de crimes violentos.
Existe correlação entre duas variáveis quando elas caminham juntas. O Comprova calculou a correlação entre a nota do Giffords Law Center e a taxa de mortes por armas de fogo, em uma escala que vai de -1 a 1. Em termos estatísticos, quanto mais próximo o resultado for de 1, maior a correlação — considera-se que ela é “forte” quando fica entre 0,70 e 0,89. A correlação encontrada foi de -0,78, o que quer dizer que quanto mais forte a legislação antiarmas, menor a taxa de mortes por armas de fogo.
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Violência nos Estados Unidos e na Suíça
A publicação do Jornal da Cidade Online faz uma comparação entre os índices de violência de cidades dos Estados Unidos governadas por democratas e republicanos.
De fato, a maioria das cidades mais violentas dos Estados Unidos são governadas por democratas. Segundo estatísticas de crimes mais recente do FBI, de janeiro a junho de 2016, dentre as 20 cidades com maior índice de criminalidade violenta, apenas uma tinha um prefeito republicano — Wichita, no Kansas. Outras três tinham governo apartidário — caso de Springfield, no Missouri, San Bernardino, na Califórnia, e Beaumont, no Texas.
Entre as 20 cidades com menor índice de criminalidade violenta, sete são democratas e seis, republicanas.
O mesmo é observado quando a taxa considerada é a de homicídios. Entre as 20 primeiras, apenas uma tem prefeito republicano: Westminster, no Colorado. Dentre as 32 cidades com taxa de homicídio zero, sete são democratas e cinco, republicanas.
Mas isso quer dizer que ter um prefeito democrata aumenta a violência de uma cidade? Não necessariamente. Ao refletir sobre o assunto, é preciso ter em mente dois conceitos importantes que cientistas usam ao olhar para dados estatísticos: correlação (quando dados de diferentes contextos aumentam ou sobem junto, indicando que um fenômeno está ligado a outro) e causalidade (quando os dados indicam que um fenômeno causa outro).
O site Spurious Correlations (correlações absurdas, em inglês) traz alguns exemplos de ligações que não fazem nenhum sentido. Uma delas é que o número de crianças afogadas em piscina cresce quando é lançado no cinema um filme com o ator Nicholas Cage.
Apenas com os dados apresentados no texto publicado pelo Jornal da Cidade, não podemos afirmar de forma categórica que a correlação entre cidades democratas e taxa de violência seja espúria. Segundo o cientista político Guilherme Jardim, é possível que este seja um caso em que existam “variáveis de confusão”. São fatores terceiros que podem influenciar na correlação entre um elemento e outro.
“Outros fatores podem estar causando, ao mesmo tempo, a eleição de democratas”, afirma Jardim. “Por exemplo, fatores populacionais, raciais, regionais e de pobreza.”
Um artigo na revista National Review explora esse assunto. Um dos elementos a levar em conta é que, em geral, grandes centros urbanos nos EUA são democratas. Das 100 maiores cidades do país, 62% são governadas por este partido. E há exemplos muito diferentes nesse grupo: Baltimore, em Maryland, tem alta taxa de crimes violentos; mas Austin, no Texas, tem índice baixo de violência e também é democrata.
As duas cidades têm características muito diferentes. Por exemplo, enquanto Baltimore tem população majoritariamente negra (61,9%), Austin é composta principalmente por brancos (47,7%) e hispânicos ou latinos (34,2%). Baltimore tem taxa de pobreza de 22,4%, com renda média de US$ 47 mil por ano. Em Austin, esses valores são de 15,4% e US$ 67 mil, respectivamente. Esses elementos podem influenciar, de maneiras distintas, os índices de criminalidade.
A relação entre armas e criminalidade é complexa: pesquisadores do tema afirmam que o crime ocorre por vários fatores, incluindo desigualdade social, acesso a armas, poucos policiais na rua, entre outros.
O texto do Jornal da Cidade Online alega ainda que, retiradas as cidades democratas, a taxa de homicídios dos Estados Unidos seria comparável à da Suíça. Consultado, o autor do artigo não mostrou estatísticas que corroborem essa comparação. O índice de assassinatos suíço é um dos mais baixos da Europa, de 0,5 a cada 100 mil habitantes segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Nos Estados Unidos, essa taxa é de 6,5 por 100 mil habitantes.
Áreas com restrições às armas
A publicação do Jornal da Cidade Online alega ainda que a restrição às armas em algumas áreas contribuiria para um maior número de ataques.
O Washington Post fez em maio de 2018 a checagem de uma declaração do presidente Donald Trump que usava a mesma informação: ele afirmou que 98% dos ataques aconteceram em lugares onde as armas são proibidas.
O jornal apontou que Trump se baseou em um estudo da organização Crime Prevention Research Center (CPRC). A página foi atualizada e no dia 13 de agosto apontava que 94% dos ataques desde 1950 aconteceram em “Gun-Free Zones”. Consultando o site Wayback Machine, no entanto, é possível ver que em maio deste ano o índice apontado era de 97,8%.
Um estudo da Everytown for Gun Safety, citado pelo Washington Post, apontou que 10% dos ataques entre 2009 e 2016 aconteceram em áreas com restrição às armas. As duas pesquisas, no entanto, não podem ser comparadas por terem metodologias diferentes, como o número de vítimas para que seja considerado um ataque, e terem sido realizadas em períodos distintos.
Com exceção das escolas, que estão na legislação nacional, a definição das normas sobre essas localidades cabe a cada um dos estados.
A publicação do Jornal da Cidade Online relaciona a política de restrição de armas a Joe Biden, adversário de Trump nas eleições de 2020. Em 1990, foi aprovada uma legislação que criava as “Gun-Free School Zones”, que proibia a posse de armas em áreas escolares. O presidente era George H. W. Bush, do Partido Republicano, e Biden estava no Congresso.
Em 1994, durante o governo de Bill Clinton, do Partido Democrata, houve uma nova mudança nas leis criminais, que é relacionada politicamente ao nome de Joe Biden nos Estados Unidos. A lei tem um capítulo sobre armas, mas não estabelece outras zonas, além das escolas, onde as armas são proibidas. O trecho sobre as “Gun-Free School Zones”, porém, estabelece que crimes envolvendo drogas e armas são problemas nacionais. Além disso, frisa que a violência em áreas escolares tem como consequência a queda na qualidade da educação, que tem impacto na economia dos Estados Unidos.
Pena de morte
A publicação do Jornal da Cidade Online ainda critica políticas de esquerda e afirma que “terrorista merece a pena de morte”. Esses trechos não foram verificados pelo Comprova por serem opinativos.
Repercussão nas Redes
O artigo foi divulgado pelo site Jornal da Cidade Online em 6 de agosto e desde então obteve 488 compartilhamentos nas contas de Facebook e Twitter da própria publicação, segundo a ferramenta de medição Crowdtangle. Somando ao engajamento em outras contas, esse conteúdo obteve 1,3 mil interações até o dia 14 de agosto. Os principais divulgadores foram páginas de direita e de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro.
Contexto
O texto foi publicado no dia 6 de agosto, após dois ataques nos Estados Unidos, um em El Paso, no Texas, e o outro em Dayton, no estado de Ohio. O primeiro deixou 22 mortos e o segundo terminou com nove mortos.
Em entrevista depois dos atentados, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) afirmou a jornalistas que “não é desarmando o povo que você vai evitar isso aí”.
No Brasil, o porte de armas é proibido desde o Estatuto do Desarmamento, Lei 10.826, de 22 de dezembro de 2003, quando o presidente era Luiz Inácio Lula da Silva (PT). As exceções são integrantes das Forças Armadas, policiais (federais, rodoviários federais, ferroviários federais, civis e militares), bombeiros militares, auditores fiscais e tributários, entre outras categorias. Para a posse, alguns dos requisitos eram a declaração da efetiva necessidade e a apresentação de documentos como comprovação de ocupação lícita, residência certa, capacidade técnica e aptidão psicológica.
Em 2005, um referendo retirou o artigo 35 do estatuto, que previa a proibição da comercialização de armas de fogo e munição. Os outros trechos da lei, no entanto, não foram alterados na consulta popular.
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O Estatuto do Desarmamento revogou a lei 9.437/1997, do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que criava o Sistema Nacional de Armas (Sinarm). Essa lei não proibia o porte de arma, apenas limitava ao “requerente comprovar idoneidade, comportamento social produtivo, efetiva necessidade, capacidade técnica e aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo”.
O Mapa da Violência de 2016 apontou que as taxas de homicídios nos estados são heterogêneas e, enquanto São Paulo e Rio de Janeiro, maiores centros urbanos do país, tiveram trajetória de queda, no Norte e no Nordeste houve um aumento. “Continuando o processo iniciado em meados da década de 1990, agora reforçado pelos controles impostos pelo Estatuto do Desarmamento, se consolida a tendência de queda nos grandes polos da violência tradicionais e seu deslocamento para municípios do interior e/ou novos polos”, aponta a pesquisa. As vítimas são predominantemente homens e jovens. Além disso, enquanto o número de vítimas negras aumentou, o de brancas diminuiu.
Em 2019, Jair Bolsonaro assinou sete decretos flexibilizando a posse e o porte de armas. O primeiro foi o 9.685, de 15 de janeiro de 2019, que mudava as regras para a posse. Esse texto foi revogado pelo decreto 9.785, de 7 de maio de 2019, que, por sua vez, foi alterado pelo decreto 9.797, de 21 de maio de 2019.
No dia 18 de junho, o Senado Federal rejeitou o decreto 9.785. Foi aprovado o Projeto de Decreto Legislativo 233/2019, do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), sustando o texto de Bolsonaro. O presidente criticou a decisão no Twitter.
O decreto de 7 de maio flexibilizava o porte de armas a 20 categorias profissionais, entre elas advogados, políticos com mandato e jornalistas especializados na cobertura policial, e ampliava de 50 para 5 mil o número de munições permitidas. O texto de 21 de maio alterava pontos polêmicos no primeiro, revogando, por exemplo, o artigo que abria a possibilidade de portar armas em aviões.
O texto do PDL, que sustou o decreto, seguiria para análise da Câmara, mas, no dia 25 de junho, Bolsonaro revogou o decreto e publicou os 9.844 (revogado), 9.845, 9.846 e 9.847, de 25 de junho de 2019. Foi apresentado no dia 26 de junho o PL 3723/2019, que tramita em regime de urgência.
O projeto de lei acaba com a proibição do porte de arma e afirma que ele é “pessoal, intransferível e será concedido para” diversas categorias, como caçadores e colecionadores. Além disso, prevê a possibilidade de regulamentar o porte para outras profissões.
Já tramitava na Câmara desde 2012 o PL 3722 (com 132 projetos apensados), do deputado Rogério Peninha Mendonça (MDB-SC), que revoga o Estatuto do Desarmamento. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/montagem-enganosa-atribui-a-bolsonaro-obras-na-br-163-feitas-no-governo-dilma/ | COMPROVA | Montagem enganosa atribui a Bolsonaro obras na BR-163 feitas no governo Dilma | null | 2019-08-13 | Uma montagem de fotos sobre os estágios das obras na BR-163 durante os governos do PT e de Bolsonaro é falsa, pois usa imagens de 2017 e 2015, anteriores à posse do atual presidente
É falsa uma montagem feita com duas fotos para comparar a situação da rodovia BR-163 nos governos petistas e no atual, do presidente Jair Bolsonaro (PSL). No conjunto de imagens, a foto de cima, da estrada em situação precária, é atribuída aos “16 anos de PT”; a de baixo, da estrada em pavimentação, é creditada aos “7 meses de Bolsonaro”. As fotos, porém, não correspondem aos períodos citados.
Esta verificação do Comprova investigou os dados de uma montagem encontrada pelo nosso monitoramento nas páginas “O Mito” e “Bolsonaro Bahia”, do Facebook.
Como verificamos
Para esta verificação, o Comprova submeteu as fotos usadas na montagem ao mecanismo de busca de imagens do Google, funcionalidade que procura na internet outras versões de uma mesma imagem. Consultamos também reportagens sobre a obra e nos sites do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), do Ministério da Infraestrutura e da concessionária que administra um dos trechos da BR-163.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
O Comprova descobriu que as fotografias usadas na montagem com os dizeres “16 anos de PT” e “7 meses de Bolsonaro” não foram capturadas nos momentos alegados. A imagem de cima é de 2017 e a de baixo, de 2015.
As duas fotos usadas na comparação são efetivamente da rodovia BR-163, mas elas também não comparam os mesmos trechos.
A foto de cima foi feita na região do município de Trairão, no estado do Pará, cuja obra de pavimentação é de responsabilidade do DNIT em convênio com o Exército brasileiro e a Polícia Rodoviária Federal (PRF).
A imagem de baixo, por sua vez, foi capturada dois anos antes, na parte da rodovia que fica no Mato Grosso, conforme confirmou ao Comprova a concessionária Rota do Oeste, responsável pelas obras de pavimentação entre os municípios mato-grossenses de Itiquira e Sinop.
BR-163/PA
A fotografia dos caminhões parados em um atoleiro, vista na parte superior da montagem, teve o seu primeiro registro encontrado pela equipe do Comprova em uma matéria publicada pelo site do Jornal Folha do Progresso, de 27 de fevereiro de 2017. Foi recebida pelo veículo por meio do aplicativo de mensagens instantâneas WhatsApp, segundo a sua descrição.
De acordo com a reportagem na qual se encontra a foto, o Exército havia ido para o trecho da BR-163 em Trairão após as fortes chuvas que atingiram a região no mês de fevereiro, como mostra esta matéria do portal G1.
Um dia depois, em 28 de fevereiro de 2017, o Ministério de Infraestrutura publicou uma notícia informando que o Exército e a PRF – em conjunto com o DNIT, responsável pelas obras no trecho em questão da BR-163 – estavam se dirigindo ao local para a manutenção da rodovia.
Em março do mesmo ano, o Ministério de Infraestrutura também informou sobre os níveis operacionais do trecho – entre as comunidades de Santa Luzia e Bela Vista do Caracol – locais igualmente mencionados pelo Jornal Folha do Progresso.
Em 2017 o presidente que estava no poder era Michel Temer, do MDB, que assumiu o cargo após Dilma Rousseff, do PT, ser submetida a um processo de impeachment em 2016.
Em e-mail ao Comprova, o DNIT afirmou que o trecho de Trairão, no Pará, já está asfaltado. “A BR 163/PA, desde a divisa com o Mato Grosso até o Porto de Miritituba, tem a extensão de 706 quilômetros. Atualmente, essa extensão está praticamente toda pavimentada, restando pouco mais de 39 quilômetros a serem pavimentados. São 37 quilômetros do segmento sob a responsabilidade do Exército e 2,5 quilômetros sob responsabilidade de uma empresa contratada. O trecho sob responsabilidade do Exército está dividido em 4 lotes de obras. O cronograma prevê a conclusão dos serviços até o final de 2019, deixando a rodovia trafegável e sem pontos críticos”, disse o DNIT.
BR-163/MT
A fotografia de baixo, que mostra um trecho de estrada sendo pavimentado, foi tirada em junho de 2015, conforme a confirmação da concessionária Rota do Oeste ao Comprova por e-mail.
De acordo com a explicação, a foto da realização da pavimentação consta no banco de dados do setor de Comunicação da empresa, arquivada no sistema em 17 de junho de 2015, às 18h12”.
Segundo a assessoria da concessionária, “a imagem é referente à matéria Rota do Oeste inicia pavimentação da segunda etapa de duplicação, que na época foi divulgada à imprensa para informar sobre o andamento das obras de duplicação da BR-163, na região sul de Mato Grosso.
No site da Rota do Oeste, a matéria explica que o trabalho foi realizado no quilômetro 74 da BR-163 e marcava o aniversário de um ano de obras da concessionária na rodovia.
Em 2015, Dilma Rousseff estava em seu segundo mandato no comando do Brasil, diferentemente do que foi afirmado no meme viralizado.
Repercussão nas Redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
A publicação da montagem com as fotografias da BR-163 foi postada na página do Facebook “O Mito” em 5 de agosto de 2019 e até o dia 12 do mesmo mês já contava com mais de 700 compartilhamentos e quase 1.000 interações. O post não aparece mais na página “Bolsonaro Bahia”. Na captura de tela feita pelo Comprova, no dia 5 de agosto, a publicação já havia sido compartilhada 8,8 mil vezes.
O AFP Checamos, Aos Fatos e a Agência Lupa já haviam feito checagem das fotografias da BR-163 anteriormente. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Verificação'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/contratos-de-empresa-do-presidente-da-oab-com-estatais-nao-foram-obtidos-em-licitacao-mas-sao-regulares/ | COMPROVA | Contratos de empresa do presidente da OAB com estatais não foram obtidos em licitação, mas são regulares | null | 2019-08-09 | Artigo diz que escritório de Felipe Santa Cruz recebeu recursos de estatal sem licitação, mas omite que o tipo de contrato firmado dispensa processos licitatórios
É enganoso um artigo compartilhado nas redes sociais sobre os contratos do escritório do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, com a Petrobras e o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) durante a gestão da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
O texto omite o fato de que os tipos de contratos firmados com as empresas dispensam licitação. Portanto, não houve nesse aspecto irregularidade na contratação.
Um outro post, feito no Twitter e sobre o mesmo tema do artigo, informa sobre os valores do contrato. Eles são verdadeiros. A mensagem também afirma que o governo Bolsonaro prometeu romper com os contratos ainda em vigor. Na última terça-feira, 6 de agosto, Santa Cruz foi informado pela Petrobras da suspensão do contrato vigente com a estatal.
Esta verificação do Comprova investigou os dados de três publicações encontradas pelo nosso monitoramento: um tuíte do perfil @profeborto, um post no site Jornal da Cidade Online e outro no site Caneta.org.
Como verificamos
O Comprova consultou dados dos contratos nos portais da transparência da Controladoria-Geral da União e da Petrobras, conferiu as legislações federais que dispõem sobre as normas para licitações da administração pública, checou o regulamento do procedimento licitatório da Petrobras e fez contato com o escritório de advocacia de Santa Cruz.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais ou visualizar a documentação que reunimos.
Serpro
O contrato com o Serpro, assinado em 2014 e com vigência até 21 de dezembro de 2019, refere-se à defesa da empresa pública perante o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região e o Tribunal Superior do Trabalho nos autos do processo nº 0132000-50.1989.5.01.0016.
Para esse contrato, foram feitos três pagamentos, no total de R$ 1,3 milhão. As parcelas foram de R$ 300 mil em março de 2015, R$ 876.000,27 em 10 de setembro de 2018 e a retenção de impostos no valor de R$ 91.421,34, em 18 de outubro de 2018.
O serviço foi prestado sem licitação visto que a modalidade de contratação do escritório de Santa Cruz é classificada como “inexigível”.
Segundo a lei de licitações (Lei 8666/93), a contratação de serviços técnicos, entre eles a defesa de causas judiciais ou administrativas, não exige a realização de processo licitatório. Isto está previsto no inciso II do Art. 25 da lei e no inciso V do art. 13.
Petrobras
Caso semelhante ao Serpro é identificado nos contratos do escritório de advocacia Stamato, Santa Cruz e Saboya Advogados com a Petrobras (atenção: para fazer a consulta por esse link deve-se utilizar o número do contrato. Eles são informados a seguir). A empresa tem o mesmo CNPJ da Santa Cruz Scaletsky Advogados.
Com a Petrobras, a empresa de Santa Cruz teve dois contratos firmados no valor total de R$ 2,5 milhões. Na terça, 6 de agosto, Santa Cruz informou que a estatal cancelou o contrato.
Segundo o Portal da Transparência, o contrato no valor de R$ 1,5 milhão (número 4600407072) foi assinado em maio de 2013 e tinha vigência até janeiro de 2020. Ele se referia à defesa da empresa em ação movida pelo Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense.
Já o outro contrato (número 4600444383), no valor de R$ 1 milhão, vigorou, também segundo o Portal da Transparência, de junho de 2014 a junho de 2019. Ele se referia à representação da estatal em três ações rescisórias.
De acordo com a OAB, ambos contratos ainda estavam vigentes e seriam encerrados apenas com o fim do processo, apesar de as informações do portal apontarem a data de término em junho de 2019 para um deles. A entidade, porém, disse não poder encaminhar cópia dos contratos, sob a justificativa de que são sigilosos.
A Petrobras disse por telefone que não comentaria. Solicitada a confirmar por email, não respondeu até a publicação deste texto.
Ao todo, os dois contratos com a Petrobras somam R$ 2,5 milhões, e ambos também foram enquadrados como “inexigíveis”. A possibilidade está amparada no Decreto 2.745/1998, assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que estabelece o Regulamento do Procedimento Licitatório Simplificado da Petrobras.
Dispensa de licitação
A legislação permite a dispensa de licitação em casos de “inviabilidade fática ou jurídica de competição”, como casos de defesa de causas judiciais ou administrativas da estatal.
Somados, os contratos da Petrobras (R$ 2,5 milhões) e os pagamentos realizados pelo Serpro (R$1,3 milhão) chegam ao valor aproximado referido no tuíte que viralizou.
Tanto o contrato com o Serpro quanto os contratos com a Petrobras foram feitos com o mesmo CNPJ (11.820.663/0001-79). No entanto, constam no Portal da Transparência três razões sociais diferentes para o referido CNPJ, isso porque a empresa teve seu quadro de sócios e nome alterados no período. Segundo comprovante de CNPJ emitido pela Receita Federal, a razão social atual da empresa é “Felipe Santa Cruz Advogados”.
Nos contratos assinados com a Petrobras, em maio de 2013 e junho de 2014, a razão social que consta no site da estatal é “Stamato, Santa Cruz e Saboya Advogados”. Já no contrato assinado com o Serpro em 2014, consta a razão social “Santa Cruz Scaletsky Advogados”.
Fim dos contratos
Publicações nas redes sociais informam que Bolsonaro prometeu romper com os contratos ainda em vigor de Santa Cruz. O Comprova não localizou reportagens nas quais o presidente prometia rever os acordos específicos do advogado com o Serpro e a Petrobras, mas Santa Cruz anunciou na terça-feira, 6, que a Petrobras suspendeu o contrato com seu escritório.
Santa Cruz classificou a iniciativa como “perseguição política” e disse que irá ajuizar uma ação de reparação de danos contra a estatal.
Procurados pelo Comprova, o Palácio do Planalto e a Petrobras informaram que não iriam comentar o assunto.
Repercussão nas redes
O Comprova verifica conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que tenham grande potencial de viralização.
O post sobre os contratos de Santa Cruz foi publicado no Twitter pelo perfil @profeborto em 31 de julho e teve 167 compartilhamentos até o dia 8 de agosto.
Uma versão anterior desse conteúdo foi publicada no dia 13 de fevereiro deste ano no site Jornal da Cidade Online com autoria de “Otto Dantas”, identificado como articulista e repórter. Uma reportagem da agência Aos Fatos apontou indícios que o perfil é falso e que a foto anteriormente utilizada para apresentar Dantas foi retirada do banco de imagens Shutterstock.
Outra versão do texto que circula nas redes sociais foi publicada em 8 de fevereiro pelo site Caneta.org e acumulava, até o dia 8 de agosto, mais de 130 mil interações no Facebook, segundo a ferramenta Crowdtangle.
O Estadão Verifica já havia feito a checagem dessas informações em 13 de fevereiro de 2019.
Contexto
O presidente da OAB tem sido alvo de boatos e desinformações nas redes sociais desde a sua posse, em janeiro deste ano, por declarações contrárias ao governo e seu histórico de desavenças com Bolsonaro.
Em 2016, quando era presidente da seccional da OAB no Rio de Janeiro, Santa Cruz foi ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedir a cassação do mandato do então deputado federal após a exaltação de Bolsonaro ao coronel Brilhante Ustra durante a votação do impeachment de Dilma Rousseff.
No último dia 29, Bolsonaro disse que poderia explicar a Santa Cruz como o pai dele desapareceu durante a ditadura militar (1964-1985). O presidente da OAB levou o caso ao Supremo e o ministro Luís Roberto Barroso deu prazo de quinze dias para Bolsonaro se explicar, caso queira.
O Comprova verificou que Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira foi vítima do regime e não de guerrilheiros da esquerda, conforme relatório oficial da Comissão Nacional da Verdade (CNV), criada em 2011 para investigar violações aos direitos humanos cometidas pelo Estado.
Outra informação que tem circulado nas redes e que o Comprova verificou é a filiação de Santa Cruz ao PT. Na lista de filiações partidárias disponível no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de fato consta que o advogado foi filiado ao partido no Rio de Janeiro de maio de 2001 a fevereiro de 2009. Além disso, Santa Cruz foi candidato a vereador pelo PT nas eleições de 2004. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Verificação'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/mudancas-no-codigo-de-transito-nao-estao-em-vigor-e-projeto-aguarda-aprovacao/ | COMPROVA | Mudanças no Código de Trânsito não estão em vigor e projeto aguarda aprovação | null | 2019-08-08 | É falso que a validade da CNH passou de 5 para 10 anos, que a pontuação limite para suspensão da carteira dobrou e que os exames necessários para sua emissão podem ser feitos com qualquer médico. Essas medidas fazem parte de um Projeto de Lei proposto pelo governo, mas não estão em vigor.
São falsas as afirmações de que a validade da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) passou de 5 para 10 anos, que a pontuação limite para suspensão do documento dobrou e que os exames necessários para sua emissão podem ser feitos com qualquer médico. Essas medidas, que foram listadas em publicações amplamente compartilhadas nas redes sociais, realmente fazem parte de um Projeto de Lei (PL) proposto pelo Poder Executivo, mas não estão em vigor.
No último dia 4 de junho, o presidente Jair Bolsonaro entregou ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o PL 3267, que propõe diversas alterações no Código de Trânsito Brasileiro.
No entanto, para entrar em vigor, o projeto precisa passar pela análise de uma Comissão Especial da Câmara e pelo Senado Federal. Até o fechamento desta matéria, a Comissão em questão ainda não estava totalmente formada. Ou seja, a implementação imediata das medidas mencionadas na postagem é inviável.
Como verificamos
Para esta verificação, o Comprova consultou a íntegra do PL 3267, a ficha de tramitação do texto e a página oficial de Comissões Temporárias da Câmara dos Deputados. Além disso, entramos em contato com as assessorias de imprensa do Ministério da Infraestrutura, da Presidência da República e da Câmara.
A afirmação falsa de que as medidas propostas no Projeto de Lei do governo já estão em vigor foi encontrada pelo Comprova em ao menos duas publicações virais no Facebook. Até as 15h30 desta 5ª feira (8.ago.2019), uma delas foi compartilhada 7,7 mil vezes. Foi postada originalmente em um perfil que compartilha críticas aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), à esquerda, defende a operação Lava Jato e o presidente Jair Bolsonaro.
A segunda é composta por um vídeo da coletiva de imprensa concedida por Bolsonaro no dia em que entregou o PL ao Congresso. A postagem, feita pela página do blog pessoal de Clarice Borsa Agnes, foi compartilhada mais de 8 mil vezes.
Caminho percorrido pelo PL
Um dia depois de ser apresentado pelo governo, o projeto foi encaminhado às Comissões de Seguridade Social e Família (CSSF); Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços (CDEICS); de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP); de Viação e Transportes (CVT) e de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC).
Como o projeto foi enviado para mais de três Comissões de mérito, foi determinada a criação de uma Comissão Especial de 34 membros para unificar a análise do PL.
No entanto, essa Comissão ainda não está totalmente formada, impedindo a análise da proposta. Em uma página do site da Câmara dos Deputados, é possível verificar que os líderes partidários ainda precisam indicar 5 membros titulares e 12 suplentes para completar a Comissão (consulta em 8.ago.2019).
Procurada pelo Comprova, a assessoria da Câmara dos Deputados informou que o prazo regimental para que sejam feitas estas indicações é de cinco sessões deliberativas –limite há muito ultrapassado. De acordo com a assessoria, o prazo é apenas uma orientação e não há repercussões caso não seja cumprido.
Enquanto isso, contudo, o trâmite do PL não avança.
Contexto
Veja as principais mudanças propostas pelo governo.
Mudanças no Código de Trânsito
Infogram
Principais pontos da proposta
Apesar de não estarem em vigor, as medidas listadas na publicação estão entre os principais pontos da proposta do governo, que altera a lei 9.503, de 1997.
Pela legislação atual, o candidato à CNH precisa realizar exames de aptidão física e mental junto ao Detran de seu Estado. As avaliações, que visam a identificar se o futuro motorista está apto a assumir esta responsabilidade, são pagas e de exclusividade do órgão executivo de trânsito. No Rio de Janeiro, por exemplo, a taxa para realização do exame é de R$ 289,36.
Se o PL em questão for aprovado, esses exames poderão ser realizados com qualquer médico. Procurado pelo Comprova, tanto o Planalto, quanto o Ministério da Infraestrutura informaram que esta mudança permitirá que o candidato faça as avaliações com um médico de seu plano de saúde, ou ainda com um profissional vinculado ao Sistema Único de Saúde (SUS). “A intenção é que com essa mudança, haja uma redução ou mesmo eliminação de custos para o cidadão”, afirmou a pasta em nota.
Ainda de acordo com a lei atual, esses exames precisam ser renovados a cada cinco anos, ou a cada três anos para condutores com mais de 65 anos. O PL altera esses prazos para 10 e cinco anos, respectivamente, ampliando a validade da CNH. As carteiras de habilitação já expedidas também terão o prazo de validade prorrogado.
Exames toxicológicos
O PL também revoga o artigo 148-A da lei 9.503, que estabelece a exigência de exames toxicológicos para emissão e renovação da CNH nas categorias C, D e E (para condução de veículos de carga e de passageiros). O texto que acompanha o Projeto de Lei, assinado pelo ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, justifica a mudança afirmando que estes exames são “caríssimos” e que há, em alguns casos, “dúvidas sobre a exatidão”.
Como mencionam as publicações viralizadas, a proposta do governo também dobra o número de pontos limite para que o motorista tenha a CNH suspensa, passando de 20 pontos no período de um ano para 40 pontos no mesmo espaço de tempo.
Cadeirinha
Além disso, o Projeto de Lei flexibiliza a punição para algumas violações de trânsito, como a não utilização da cadeirinha no transporte de crianças com até sete anos e meio.
Atualmente, motoristas que forem flagrados andando com crianças dentro desta faixa etária sem o dispositivo de segurança respondem por infração gravíssima, perdendo sete pontos na CNH e pagando multa de R$ 293,47, como determinado pela resolução 277 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran). Se o PL for aprovado, a punição passa ser apenas uma advertência por escrito.
Opinião pública
Pesquisa do Datafolha publicada em julho deste ano mostra que a maioria da população rejeita as propostas previstas neste Projeto de Lei. Segundo o levantamento, 56% são contra aumentar de 20 para 40 o número de pontos que o motorista pode acumular na CNH. Já a proposta de acabar com a multa para motoristas que transportarem crianças sem o dispositivo de segurança necessário é rejeitada por 68% dos entrevistados.
No geral, 41% dos brasileiros acreditam que o trânsito se tornará mais violento se as propostas do governo Bolsonaro forem aprovadas, contra 21% que consideram que haverá mais segurança.
Saiba mais
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-conselho-de-politicas-de-drogas-era-aparelhado-atas-comprovam-a-diversidade-de-opinioes/ | COMPROVA | É falso que conselho de políticas de drogas era aparelhado; atas comprovam a diversidade de opiniões | null | 2019-08-06 | As atas das reuniões mostram que os representantes da sociedade civil que faziam parte do Conad possuíam diversidade de posicionamentos em relação às políticas de drogas
Diferentemente do que afirma postagem que viralizou nas redes sociais, o Conselho Nacional de Política sobre Drogas (Conad) não era aparelhado por membros da sociedade civil. A análise das atas e registros das reuniões de 2006 a 2018 mostra que seus integrantes apresentavam opiniões diversas sobre diferentes pontos da política de drogas.
No texto viralizado, consta que “os chamados ‘especialistas’ e grupos da ‘sociedade’, que aparelhavam o Conad (Conselho Nacional de Política sobre Drogas), foram dissolvidos pelo governo Bolsonaro.” Ele ainda afirma que esse aparelhamento contava com “médicos, juristas, psicólogos, cientistas e antropólogos”.
Como verificamos
Para verificar se existia aparelhamento no Conad, o Comprova leu e analisou mais de 30 atas e registros das reuniões realizadas de 2006 a 2018. Também foram consultadas as resoluções do conselho e seu regimento. Além disso, os verificadores solicitaram posicionamentos oficiais dos representantes das categorias profissionais e do terceiro setor e entrevistaram alguns dos ex-conselheiros. [Os links para esses documentos estão no final deste post].
Segundo a postagem, “as políticas dos governos passados apoiavam – e ainda apoiam — a liberação e o consumo das drogas no Brasil”. De fato, as atas mostram que havia membros do Conad que defendiam a descriminalização das drogas, no entanto, a posição não era majoritária nem chegou a ser tema de votação no conselho em todo período analisado.
Desde 2006, após um decreto do governo Lula, o Conad passou a ter 27 cadeiras, das quais 13 foram destinadas a representantes da sociedade civil — oito privativas de determinados grupos e conselhos profissionais e quatro que eram indicadas pelo governo para mandatos de dois anos.
Em 22 de julho de 2019, o atual presidente Jair Bolsonaro assinou o decreto nº 9.926, que reduziu a participação de representantes da sociedade civil no Conad.
Qual era posição da sociedade civil em relação à descriminalização das drogas
Dentre os oito grupos que possuíam cadeiras fixas no Conad, dois (o Conselho Federal de Serviço Social e a União Nacional dos Estudantes) se posicionam abertamente a favor da descriminalização das drogas. Apenas um deles se declarou abertamente contra: o Conselho Federal de Medicina (CFM).
Em resposta ao Comprova, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e o Conselho Federal de Enfermagem (CFE) afirmaram em nota não ter posicionamento consolidado sobre o tema. Pela análise das atas, não foi identificado posicionamento das entidades quanto à descriminalização.
O Conselho Federal de Psicologia (CFP), o Conselho Nacional de Educação (CNE) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) tampouco se posicionaram abertamente quanto ao tema nas reuniões. O Comprova entrou em contato com as três organizações repetidas vezes, no entanto, até a publicação desta reportagem, o CFP não respondeu à pergunta quanto à descriminalização e não houve retorno da CNE e da SBPC.
Apesar de não se manifestarem quanto à descriminalização, em reunião de 2009, o representante da SBPC Elisaldo Luiz de Araújo Carlini defendeu o uso medicinal da cannabis e, em setembro de 2015, o representante do CFP propôs este tema para discussão.
Conforme consta em ata de 15 maio de 2012, a secretária-executiva do Conad à época sugeriu a criação de um grupo de trabalho para discutir o tema. Na ocasião, o então representante da Polícia Federal no Conselho disse que não julgava interessante participar do GT, devido ao posicionamento da PF quanto ao tema. “Acho que fica mais tranquilo a discussão sem a nossa presença, vamos colocar assim. Tudo bem?”
Em resposta, o então representante do Conselho Federal de Medicina afirmou que, independentemente da posição, a participação do órgão era importante. “O trabalho consiste na discussão de vieses e dos cenários possíveis”, disse.
Nessa mesma reunião, o médico ainda questionou o conteúdo de gibis feitos pela Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (Senad). De acordo com a ata, o médico afirmou que existia “anuência para a liberação da maconha e a ‘satanização’ do crack” no encarte. A secretária respondeu que o Senad possuía materiais específicos a respeito da maconha.
Entre os representantes do meio artístico o único que chegou a se pronunciar a respeito do tema foi o ator Marcos Frota, que, em reunião em 28 de agosto de 2012, registrou ser contra a liberação das drogas.
Como os representantes da sociedade civil eram renovados ao longo do tempo, o Comprova entrou em contato apenas com os membros que faziam parte do conselho neste ano e foram excluídos pelo decreto de Bolsonaro.
Quais foram as decisões do Conad desde 2006
Ao todo, o Conad teve três resoluções oficiais desde 2006. A primeira delas, no entanto, não passou pelo crivo dos representantes da sociedade civil.
Apesar de ter sido publicada oficialmente em 2010, a decisão do Conad favorável ao uso da Ayahuasca para fins religiosos foi tema de votação no conselho em 6 de dezembro de 2006. Antes, portanto, da primeira reunião em que a sociedade civil passou a fazer parte da composição do Conad, em 27 de junho de 2007.
Comunidades terapêuticas
A segunda resolução do Conad, publicada em 2015, trata do marco regulatório das comunidades terapêuticas, categoria de organização que trata dependência química e que passou a constar na Política Nacional de Drogas no governo Bolsonaro. A questão foi tema de diversas reuniões do Conad.
Comunidades terapêuticas são entidades privadas sem fins lucrativos. Elas se diferenciam de outros serviços de atendimento a pessoas nessas condições por promoverem terapias que incluem trabalho e práticas religiosas, como rezas. As comunidades terapêuticas têm a meta de fazer com que o usuário problemático de drogas se torne abstêmio e se reintegre socialmente.
Ao mesmo tempo em que o Conad contava com representantes da sociedade civil, como o Conselho Federal de Psicologia (CFP) e o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), que se colocaram repetidamente contra a transferência de recursos públicos para essas instituições, as duas cadeiras reservadas ao terceiro setor foram majoritariamente ocupadas por pessoas ligadas a organizações de comunidades terapêuticas.
Exemplos disso são a Fazenda da Esperança, o Conselho Estadual de Comunidades Terapêuticas, a Federação Brasileira de Comunidades Terapêuticas (Febract) e a Confederação Nacional de Comunidades Terapêuticas (Confenact).
Durante os doze anos de trabalho do Conad, também ocuparam as cadeiras do terceiro setor organizações como o Sesi, o Sindicato dos Psicólogos de SP e a ONG Lua Nova.
Em março de 2014, foi constituído um Grupo de Trabalho (GT) para discutir a regulamentação das comunidades terapêuticas. Após quase um ano de debates e duas audiências públicas, a resolução foi aprovada, com abstenção do representante do Ministério da Saúde. Não consta em ata quem votou a favor e quem votou contra a proposta.
Em 2016, a resolução foi questionada na Justiça pelo Ministério Público Federal (MPF) e revogada pelo próprio Conad. Isso porque, para o MPF, a decisão alterava a política de saúde, algo que não era da competência do conselho. Já no governo Temer, em 2018, após a União recorrer da decisão da justiça e conseguir uma sentença favorável, a resolução voltou a valer.
Política de abstinência
Ao longo dos doze anos de atas analisadas, foram identificadas discussões sobre políticas de abstinência em contraposição à política de redução de danos, que era defendida nos governos Lula e Dilma.
Ao contrário da abstinência, tratamentos que utilizam política de redução de danos não exigem necessariamente que os dependentes abandonem por completo o uso de drogas.
A terceira e última resolução do Conad, aprovada em março de 2018, antecipou parte das mudanças instituídas em 2019 pela nova Política Nacional de Drogas. Esta resolução se baseou no Projeto de Lei 37 apresentado em 2013 por Osmar Terra, na época deputado federal.
Segundo notícia publicada na época, no site do Ministério da Justiça, o texto aprovado consolidou uma guinada na política da abstinência no Brasil. “A orientação central da Política Nacional sobre Drogas deve considerar aspectos legais, culturais e científicos, em especial a posição majoritariamente contrária da população brasileira quanto a iniciativas de legalização de drogas”, diz um trecho da resolução.
De acordo com os registros, as categorias dos psicólogos, assistentes sociais e antropólogos se manifestaram repetidamente como sendo contrárias a políticas de abstinência. Em reunião de agosto de 2012, o representante do Conselho Federal de Psicologia afirmou que “propostas de tratamento para qualquer tipo de droga, voltadas à abstinência como única possibilidade, estão fadadas ao fracasso”.
Ao mesmo tempo, representantes de comunidades terapêuticas, assim como médicos, no geral, se colocavam contra a redução de danos. O então representante do Conselho Federal de Medicina (CFM) afirmou em reunião de setembro de 2010 que alguns aspectos dessa política não atendiam à necessidade de se fazer uma repressão efetiva às drogas. “Muitas vezes a impressão é de que há um consentimento social, uma tolerância para o consumo das substâncias ilícitas”, disse.
Conforme consta em registro de reunião em outubro de 2016, após críticas ao marco regulatório aprovado pelo Conad, o então representante da Confederação Nacional de Comunidades Terapêuticas (Confenact), Egon Schlüter, afirmou: “não consta a palavra abstinência na resolução, nós lutamos pelo direito de a pessoa dependente escolher. O nosso atendimento é voluntário e a qualquer momento ela pode desistir”. Como explicou em entrevista ao Comprova, a Confenact é favorável à política de abstinência como objetivo final do tratamento e, à redução de danos apenas como meio de levar a pessoa ao tratamento.
O texto falso foi publicado pelo site Jornal da Cidade Online e, conforme dados do plugin Crowdtangle do Facebook, teve até a data de 6 agosto mais de 5,9 mil curtidas e 1,8 mil compartilhamentos na rede social. O material foi compartilhado por páginas como Direita São Paulo e Bolsonaro News BR.
Contexto
O decreto que reduziu a participação da sociedade civil no Conad foi publicado um mês depois da aprovação pelo Senado de projeto que promoveu alterações na política nacional de drogas.
Entre as mudanças estão a incorporação das comunidades terapêuticas ao Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad) e a volta da abstinência como objetivo do tratamento da dependência química. O projeto é de 2013 e de autoria do ex-deputado federal e atual ministro da Cidadania, Osmar Terra.
Ao longo dos anos, os representantes do Conad debateram inúmeras vezes sobre a regulamentação das comunidades terapêuticas e também sobre as políticas de redução de danos e de abstinência. Como o Comprova verificou, não havia consenso entre os conselheiros nesses temas.
Em 2016, Osmar Terra passou a representar o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário no Conad e, conforme consta em ata, fez críticas à política de drogas então em vigor: “O problema nosso é que a nossa lei é uma lei mal feita, ela é uma lei de ideias liberais”.
Figura-chave para aprovação da resolução do Conad de 2018, que já definia a política de abstinência como prioridade antes de ela se tornar lei, foi ele quem apresentou o texto da resolução ao Conselho e reiterou, inúmeras vezes, a urgência de deliberação. “Precisamos dar uma resposta à sociedade, não podemos mais adiar essa decisão, temos que avançar, dar um passo adiante”, afirmou, segundo consta em ata.
Em reunião em 1º de fevereiro de 2018, parte dos representantes da sociedade civil se colocou contra a votação da proposta. A representante do CFESS defendeu realização de audiências e consultas públicas para debater o tema com a população. A SBPC e a CNE alertaram para ausência de mecanismos para aprimorar a política de drogas que envolvessem áreas da educação. As organizações criticaram, ainda, a falta de pesquisas para embasar as discussões da proposta. Já a Confenact defendeu que a votação não fosse interrompida, uma vez que o conteúdo da proposta já havia sido divulgado.
Após um pedido coletivo de vista, o Conad adiou a votação, que foi realizada em 1º de março de 2018. A resolução foi aprovada por 16 votos a favor e quatro contra. Desde então, o Conad só se reuniu uma vez, em junho de 2018.
Categorias da sociedade civil que deixaram de fazer parte do Conad
Conselhos com direito a indicar um representante:
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)
Conselho Federal de Medicina (CFM)
Conselho Federal de Psicologia (CFP)
Conselho Federal de Serviço Social (CFESS)
Conselho Federal de Enfermagem (COFEN)
Conselho Nacional de Educação (CNE)
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)
União Nacional dos Estudantes (UNE)
Representantes indicados pelo próprio Governo (mandato de dois anos)
2 representantes do terceiro setor
representante do meio artístico
representante da imprensa
antropólogo
Onde acessar as atas das reuniões:
2006 a 2011 – no site da Controladoria Geral da União (CGU)
2011; 2012; 2017 e 2018 – no site do Ministério da Justiça
2013 a 2016 – disponibilizadas ao Comprova pela assessoria de imprensa do MJ (.zip)
Saiba mais
Bolsonaro reduz participação da sociedade em conselho de políticas sobre drogas
Como as comunidades terapêuticas ganham força no Brasil
Senado aprova projeto que altera política nacional de drogas | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Verificação'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falsa-a-corrente-que-acusa-a-embaixada-do-brasil-nos-eua-de-ser-reduto-do-pt/ | COMPROVA | É falsa a corrente que acusa a Embaixada do Brasil nos EUA de ser “reduto do PT” | null | 2019-08-06 | O Comprova não encontrou nenhuma evidência de que exista na Embaixada uma sala de reuniões batizada com o nome de Marielle Franco, que o local exiba nas paredes a inscrição "Lula Livre", que tenha patrocinado manifestações em favor do ex-presidente Lula ou que sirva de abrigo para integrantes do MST
É falso que a Embaixada do Brasil em Washington, nos Estados Unidos, seja um “reduto do PT'” (Partido dos Trabalhadores), que tenha batizado uma sala de reuniões com o nome de Marielle Franco e que tenha sido usada politicamente para apoiar a esquerda, como afirma uma corrente que circula no WhatsApp e nas redes sociais.
Segundo o texto, o presidente Jair Bolsonaro teria escolhido o filho Eduardo Bolsonaro, deputado federal pelo PSL de São Paulo, para ser o novo embaixador em Washington para que ele ”faxinasse” o órgão. A corrente faz acusações sobre as quais não há evidências em outras fontes de informação.
O texto acusa a Embaixada de batizar uma sala de reuniões com o nome de Marielle Franco, vereadora carioca assassinada em 2018, e de exibir nas paredes a inscrição “Lula Livre”, em referência à prisão do ex-presidente. A peça também acusa a Embaixada de ter patrocinado manifestantes que reivindicam a soltura de Lula e abrigado integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). A fonte dessas informações, segundo a corrente, seria um advogado brasileiro que vive em Washington e “muitas vezes precisa ir à Embaixada” para “resolver assuntos de outros brasileiros”.
Como verificamos
Para fazer esta verificação, o Comprova entrou em contato com a Embaixada em Washington, com o Itamaraty e com o MST. Foram também consultadas jornalistas brasileiras que trabalham na capital americana e três outros brasileiros que residem na cidade e frequentam a Embaixada. Além disso, buscamos informações sobre as despesas da Embaixada no Portal da Transparência do governo federal e levantamos fotos do local nas redes sociais e no Google Maps.
A Embaixada do Brasil em Washington afirmou ao Comprova por e-mail que as informações divulgadas na corrente “são patentemente falsas” e não têm “nenhum fundamento”. Afirmou que é um órgão oficial do governo brasileiro, que não conta com inscrições de cunho político, não recebe ou apoia atos políticos de qualquer sorte nem “oferece espaço para a realização de reuniões que não sejam relacionadas diretamente às suas atividades oficiais”.
A Embaixada também ressalta que não tem setor consular, ou seja, não atende a brasileiros para resolver problemas pessoais (como renovar visto ou pedir segunda via de passaporte), competência que hoje cabe a outro órgão, o Consulado-Geral do Brasil em Washington. A informação contradiz o conteúdo do texto que viralizou, segundo o qual um advogado teria “descoberto” o viés de esquerda do órgão por causa de visitas feitas para resolver contratempos de clientes brasileiros. A Embaixada afirma que trata exclusivamente de assuntos de política externa, com o objetivo de “defender os interesses do Brasil nos EUA”. No local trabalham servidores do chamado Serviço Exterior Brasileiro.
A resposta da Embaixada foi corroborada por outros brasileiros consultados pelo Comprova.
As correspondentes em Washington Beatriz Bulla, do Estadão, e Marina Dias, da Folha
de S. Paulo, afirmam que nunca viram escritos de “Lula Livre” nas paredes nem souberam de salas com o nome de Marielle Franco em nenhum dos prédios da Embaixada. “Posso dizer com segurança que isso é boato”, disse Marina, correspondente desde março.
André Borges, conselheiro da diretoria do Banco Interamericano de Desenvolvimento, disse ao Comprova poder “afirmar categoricamente que nunca viu ou ouviu menção a nenhum dos pontos mencionados no texto” que viralizou, incluindo as acusações relacionadas ao MST. Ele respondeu à reportagem enquanto estava a caminho de uma reunião na Embaixada.
O Comprova fez uma ronda nas principais redes sociais em busca de fotos internas da Embaixada e não encontrou nenhuma imagem ou relato de usuário que corrobore o conteúdo do texto. É possível conferir fotos cuja localização é a Embaixada do Brasil em Washington no Instagram e no Facebook (é preciso clicar nas setas ao lado das fotos para ver as imagens seguintes). O Google Maps também disponibiliza fotos do local.
“Nunca ouvi dizer de [a Embaixada] dar contribuição financeira para protestos, nunca me foi oferecido e nunca chegou a mim notícia de alguém que tenha recebido”, também contou ao Comprova Livia Lopes, professora na George Washington University. Ela diz que tem contato frequente com órgão brasileiro para firmar parcerias em projetos acadêmicos. “Nunca vi membros do MST por lá nem de nenhum movimento social. A Embaixada em geral recebe autoridades e ‘notáveis’ para eventos oficiais, mas que duram poucas horas”, disse.
“Diplomatas e funcionários têm linhas ideológicas e preferências distintas, mas noto que todos são respeitosos com a figura do presidente no poder”, continuou ela, que diz ter começado a frequentar a Embaixada durante o mandato de Dilma Rousseff (PT). “Os diplomatas ali são profissionais com décadas de experiência, dedicados ao aprofundamento da relação entre Brasil e Estados Unidos”, acrescentou Roberta Braga, que é diretora associada no Atlantic Council, think tank que atua com assuntos internacionais.
A Embaixada afirmou ao Comprova que não publica agenda ou calendário de atividades oficiais, mas divulga as principais ações do órgão em um boletim mensal por email. De outubro de 2015 a junho de 2019, mês da edição mais recente do boletim, não foram divulgadas atividades relacionadas ao MST ou a outra organização de esquerda.
Alguns dos eventos em destaque nesse tempo foram a eleição de Bolsonaro, em outubro de 2018, reuniões de grupos multilaterais, visitas de autoridades brasileiras aos EUA, ciclos de palestras sobre temas do país e apresentações culturais, entre outros. No último mês, a Embaixada divulgou chamadas para uma cerimônia sobre as vítimas do comunismo para o 30º aniversário da queda do Muro de Berlim, que marcou o início da derrocada da antiga União Soviética (1917-1991) e da polarização entre comunismo e capitalismo no mundo.
Ao Comprova, Gilmar Mauro, integrante da coordenação nacional do MST, afirmou que insinuar que a Embaixada tenha apoiado o movimento é “um absurdo”. “Nenhum membro do MST ficou hospedado na Embaixada em Washington, e nunca tivemos nenhum financiamento de nenhuma Embaixada de nenhuma parte do mundo”, disse. Ele contou que a organização realizou manifestações nos EUA e que seus integrantes com frequência participam de debates no país, mas por meio de “apoio de amigos”, não de órgãos oficiais.
Ao lado de outros grupos, integrantes do MST, sob o movimento de nome Amigos do Brasil, realizaram um ato em frente à Embaixada em Washington em junho de 2017. Eles protestavam na época contra atos de repressão no Brasil a manifestações que criticavam o governo do ex-presidente Michel Temer (MDB). Apesar de ter acontecido em frente ao órgão, o evento não teve apoio institucional da Embaixada, mas de movimentos sociais.
“Protestos [na Embaixada] em geral vejo organizados pela sociedade civil”, disse Livia Lopes ao Comprova. “Como ocorre com a sociedade americana e as questões que os afetam, também a comunidade brasileira protesta quando não está satisfeita.”
As despesas da Embaixada em Washington, de 2012 até julho de 2019, podem ser consultadas (veja como) no Portal da Transparência do governo federal. Para verificar se o órgão financiou algum protesto no Brasil em favor da liberdade do ex-presidente Lula, preso em abril de 2018, o Comprova consultou dados do portal desde aquele mês até o presente. Não foram encontradas entre as despesas referências a alguma manifestação de esquerda no Brasil, mas a gastos com folha de pagamento, material e eventos no órgão.
Bolsonaro e membros do governo foram à Embaixada
Em março deste ano, Bolsonaro fez uma visita oficial aos EUA acompanhado de uma vasta comitiva: seu filho, Eduardo Bolsonaro, presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara; os ministros Ernesto Araújo (Relações Exteriores), Paulo Guedes (Economia), Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Tereza Cristina (Agricultura), Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia) e Ricardo Salles (Meio Ambiente); e Filipe Martins, assessor especial da Presidência para assuntos internacionais.
O primeiro compromisso da delegação, na noite do dia 17, foi um jantar com o então embaixador do Brasil nos EUA, Sérgio Amaral, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior no governo de Fernando Henrique Cardoso e à frente da Embaixada desde 2016. O evento contou ainda com a presença de Olavo de Carvalho, que mora em Richmond, estado da Virgínia. O presidente postou em suas redes sociais uma foto em que aparece com Filipe Martins, Carvalho, o chanceler Araújo e o filho Eduardo com a legenda “Jantar na embaixada do Brasil nos EUA”. Martins retuitou e comentou: “Grande dia!”.
Eduardo foi menos econômico e escreveu em sua página no Facebook: “Privilégio poder participar deste momento, na minha opinião histórico: encontro de Jair Messias Bolsonaro com Olavo de Carvalho. Foi um jantar agradável, um bate-papo à vontade propiciado pelo embaixador do Brasil nos EUA Sérgio Amaral. Grande noite!”. O chanceler Ernesto Araújo chegou a dar uma entrevista coletiva na Embaixada, além de ter postado foto no Twitter.
Nem Bolsonaro nem Eduardo, Araújo, Olavo de Carvalho ou algum outro ministro relatou ter visto o termo “Lula livre” nas paredes do local ou uma sala com o nome de Marielle Franco. Tampouco relataram ter encontrado na Embaixada um “reduto do PT”.
Por e-mail, o Comprova perguntou ao Itamaraty se o conteúdo da corrente que viralizou é verdadeiro, considerando que o ministro das Relações Exteriores e outros integrantes do órgão frequentaram a Embaixada em Washington. Em resposta, o órgão afirmou que as “informações” do texto enviado pelo Comprova “não procedem”. A assessoria de Eduardo Bolsonaro também foi procurada, mas não enviou resposta até a publicação deste texto.
A corrente que viralizou foi divulgada pela página Notícias Servseg e por perfis pessoais no Facebook e no Twitter. A corrente também transitou em grupos de WhatsApp acompanhados pelo Monitor de WhatsApp da Universidade Federal de Minas Gerais, que mapeia conteúdo viral em grupos públicos do aplicativo. Além do Comprova, o Boatos.org verificou o texto.
Contexto
Deputado federal e presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, Eduardo Bolsonaro virou assunto no dia 11 de julho, quando o pai disse em entrevista a jornalistas que indicaria o “Zero Três” para o cargo de embaixador do Brasil nos Estados Unidos. O cargo está vago desde 10 de abril, quando o chanceler Ernesto Araújo demitiu o diplomata Sérgio Amaral, à frente da Embaixada desde 2016.
Historicamente, o cargo de embaixador é ocupado por diplomatas de carreira do Itamaraty, como mostra esta reportagem do portal Huffpost Brasil. Advogado e escrivão da Polícia Federal, o filho do presidente não tem formação internacional. Ao responder sobre suas qualificações, o deputado disse:
“Já fiz intercâmbio, já fritei hambúrguer lá nos EUA, no frio do Maine, estado que faz divisa com o Canadá. No frio do Colorado, numa montanha lá, aprimorei meu inglês. Vi como é o trato receptivo do norte-americano para com os brasileiros. Então acho que é um trabalho que pode ser desenvolvido. Certamente precisaria contar com a ajuda dos colegas do Itamaraty, dos diplomatas, porque vai ser um desafio grande. Mas tem tudo para dar certo”,
A indicação de Eduardo Bolsonaro para a Embaixada do Brasil em Washington ainda precisa passar pela aprovação do Senado.
A Embaixada do Brasil em Washington
A Embaixada do Brasil em Washington, principal representação diplomática nos EUA, dedica-se a defender os interesses brasileiros no país. É considerada fundamental para a execução da política externa brasileira – atraindo investimentos e promovendo o comércio exterior – e para integrar o Brasil a temas importantes da agenda internacional.
É também considerada uma das Embaixadas mais estratégicas para o Ministério das Relações Exteriores, devido à longa tradição na diplomacia entre Brasil e EUA, ao grande poder econômico e militar norte-americano e à influência do país nas Américas. Os
Estados Unidos também são o país com a maior comunidade brasileira no exterior.
A Embaixada divide-se em dois prédios. A residência do Embaixador, um prédio clássico onde vive o chefe do órgão, nomeado pelo presidente da República, e a Chancelaria, edifício modernista onde fica o corpo de funcionários. Ali trabalham diplomatas e integrantes do chamado Serviço Exterior Brasileiro, corpo de servidores federais que representam o Brasil nos Estados Unidos. Estão também na Embaixada representantes de outros órgãos da administração federal, como o Ministério da Defesa, a Polícia Federal e a Receita Federal.
Saiba mais
Entenda a importância da embaixada brasileira nos EUA (G1)
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O que faz o embaixador nos EUA. E o caso Eduardo Bolsonaro (Nexo)
Além da Casa Branca: a importância da embaixada do Brasil em Washington (Exame) | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Verificação'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-bolsonaro-anunciou-fim-das-cotas-nas-universidades-federais/ | COMPROVA | É falso que Bolsonaro anunciou fim das cotas nas universidades federais | null | 2019-08-01 | A informação do vídeo se refere a um edital de vestibular específico para transexuais e travestis que foi suspenso em uma universidade. A decisão não afeta outros processos seletivos nem a política de cotas de outras instituições de ensino
Um vídeo com o título “BOLSONARO ANUNCIA FIM DAS COTAS NAS UNIVERSIDADES FEDERAIS E REV0LTA ESQUERDISTAS” viralizou no YouTube. Essa alegação é falsa.
A publicação utiliza trechos de gravações de um café da manhã de Bolsonaro com a bancada evangélica e um discurso do deputado federal Otoni de Paula (PSC-RJ), além de citar, sem contexto, uma reportagem do jornal O Globo. O vídeo encerra com a afirmação de que o presidente teria acabado com as cotas nas instituições federais.
O Comprova apurou que a informação do vídeo, na verdade, se refere a um edital de vestibular específico para transexuais e travestis da Universidade da Integração da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), suspenso após questionamentos da Procuradoria Federal ligada à universidade e que faz parte da estrutura da Advocacia-Geral da União (AGU). A decisão não afeta outros processos seletivos nem a política de cotas de outras instituições de ensino.
Como verificamos
O Comprova checou as informações publicadas no vídeo com o Ministério da Educação, editais de vestibulares de universidades federais, incluindo o da própria Unilab, o parecer da Procuradoria-Geral ligada à instituição sobre o processo seletivo e as legislações que preveem a autonomia universitária e o uso de cotas para ingresso no ensino superior. Também foram consultados vídeos gravados pelo Palácio do Planalto e da sessão plenária da Câmara dos Deputados na qual Otoni de Paula fez seu discurso.
As imagens que aparecem no vídeo enganoso são do dia 11 de julho, durante um café da manhã de Bolsonaro com a bancada evangélica (o vídeo não pode ser aberto pelo Google Chrome). Questionado pelo deputado Otoni de Paula sobre o vestibular da Unilab, Bolsonaro responde (2min44seg) que “será analisado” e diz que vai “passar para o ministro Weintraub”. Bolsonaro opina que “coisas absurdas vêm acontecendo dada a autonomia das universidades”.
Outra cena exibida no vídeo é de um discurso de Otoni de Paula na Câmara dos Deputados, no mesmo dia, sobre a decisão da Unilab de abrir um vestibular específico para transexuais e travestis. O vídeo está disponível no site da Casa legislativa e, para assistir, é necessário clicar em “reproduzir” ao lado do nome de Otoni de Paula que aparece às 23h38min.
Em um trecho do vídeo verificado pelo Comprova (aos 3min47seg), aparece a imagem da notícia da suspensão do vestibular publicada em O Globo no dia 16 de julho. No título: “MEC intervém e universidade federal suspende o vestibular para trans, diz Bolsonaro”. O anúncio da suspensão foi feito por Bolsonaro em seu perfil no Twitter.
Procurado pelo Comprova, o Ministério da Educação afirma em nota que apenas “questionou a legalidade do processo seletivo” da Unilab via Procuradoria-Geral da República.
“A motivação se deu pelo fato de que a Lei de Cotas não prevê vagas específicas para o público-alvo do citado vestibular. A universidade não apresentou parecer com base legal para elaboração da política afirmativa de cotas, conforme edital lançado. Por esta razão, a Unilab solicitou o cancelamento do certame”, afirma a pasta.
O edital do vestibular foi divulgado sem que tivesse sido apresentado à Procuradoria-Federal junto à Unilab. O parecer só foi elaborado pelo procurador-chefe, Felipe Grangeiro de Carvalho, em 15 de julho de 2019, na véspera do cancelamento do processo seletivo.
O documento não cita nenhuma intervenção do Ministério da Educação nem do governo federal no edital. O parecer foi elaborado em resposta a um questionamento da reitoria da Unilab e conclui pela suspensão do edital do vestibular específico, decisão que não afeta outros processos seletivos de outras instituições.
Ao Comprova, a Unilab afirma que “oficialmente, portanto, só houve ação da nossa própria procuradoria”. Em nota divulgada após a suspensão do edital, a instituição afirma que o parecer da procuradoria “expressou o entendimento de que o edital vai de encontro à Lei de Cotas e aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e da ampla concorrência em seleções públicas”.
A Unilab foi a primeira universidade a propor um vestibular exclusivo a candidatos transgêneros e intersexuais, mas cotas específicas a esses públicos já foram utilizadas em processos seletivos de outras instituições. É o caso da Universidade Federal do Sul da Bahia, a Universidade Federal do ABC e a Universidade Federal da Bahia.
Outras instituições garantem cotas semelhantes em editais de seleção para programas de mestrado e doutorado.
Vestibular era para vagas que não foram preenchidas pelo Sisu
O vestibular da Unilab seria o primeiro no país exclusivo para pessoas transgêneras e intersexuais. Eram oferecidas 120 vagas para início no segundo semestre deste ano que haviam ficado ociosas, ou seja, que não foram preenchidas através do Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Todas eram para a graduação presencial, em 15 cursos, oferecidos no Ceará (nas cidades de Redenção e Acarape) e na Bahia (em São Francisco do Conde).
A universidade funciona desde 2011 e afirma ter “como missão institucional específica formar recursos humanos para contribuir com a integração entre o Brasil e os demais países membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), especialmente os países africanos”. Ao todo, a instituição oferece 25 cursos de graduação.
Constituição garante autonomia universitária
A autonomia das universidades e instituições de ensino federais é assegurada pela Constituição de 1988, que prevê em seu Art. 207: “As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”. Ou seja, os processos de seleção são definidos pela própria universidade, desde que amparados pela legislação vigente, independentemente do governo.
O uso de cotas, por sua vez, é instituído pela Lei 12.711/12 (“Lei das Cotas”), que determina o mínimo de 50% das vagas em cada processo seletivo a candidatos que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas. De acordo com a legislação, a porcentagem de vagas destinadas a pessoas autodeclaradas pretas, pardas e indígenas e pessoas com deficiência deve seguir, no mínimo, a proporção respectiva de pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição.
A Lei das Cotas, no entanto, não especifica a reserva de uma determinada porcentagem de vagas para pessoas transgêneros e intersexuais. Na verdade, a legislação não faz diferenciação envolvendo a orientação sexual dos candidatos, apenas sua autodeclaração racial e se concluiu o ensino médio em escola pública.
Quem é o autor do vídeo
O vídeo é do canal O Jacaré de Tanga, que tinha 802,3 mil inscritos no Youtube no dia 31 de julho e foi criado em 30 de janeiro de 2017. Feita em 26 de julho, a publicação em que é anunciado enganosamente o fim das cotas teve mais de 179 mil visualizações e 35 mil curtidas até o dia 31 de julho.
O autor do vídeo é Felipe Lintz, apoiador do presidente Jair Bolsonaro. Ele era coordenador nacional do Movimento Brasil Livre (MBL) e deixou o grupo em 2017. Em uma entrevista publicada no Youtube, ele e outro integrante do canal, Felipe Ferreira, são questionados sobre a saída do movimento. A justificativa é de que “se decepcionaram”. Desde 2018, a página vem fazendo publicações com críticas a lideranças do MBL, como o deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP) e o vereador de São Paulo Fernando Holiday (DEM). | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/quem-sacar-os-r-500-do-fgts-nao-perdera-o-direito-ao-saldo-em-caso-de-demissao-entenda-a-proposta-do-governo/ | COMPROVA | Quem sacar os R$ 500 do FGTS não perderá o direito ao saldo em caso de demissão; entenda a proposta do governo | null | 2019-08-01 | Artigo com título falso que viralizou no Facebook confunde duas modalidades de saque do FGTS anunciadas pelo governo no dia 24 de julho
Não é verdade que quem sacar R$ 500 do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) perde o direito ao restante do saldo em caso de demissão. Um artigo com título falso que viralizou no Facebook confunde as duas modalidades de saque do fundo que foram anunciadas pelo governo no dia 24 de julho.
Nesse dia, o presidente Jair Bolsonaro assinou uma Medida Provisória (íntegra da MP) que estabelece que os trabalhadores poderão sacar até R$ 500 por conta de FGTS, ativa ou inativa, entre setembro deste ano e 31 de março de 2020.
O mesmo documento também criou o “saque-aniversário”, uma nova modalidade que possibilita a retirada anual de uma parcela do fundo. Apenas quem optar por esse tipo de saque abre mão do saque-rescisão, a retirada do saldo dos recursos do FGTS em caso de demissão sem justa causa.
Para quem escolher aderir ao saque-aniversário, em caso de rescisão contratual, o dinheiro permanece na conta do fundo, e poderá ser utilizado para compra da casa própria ou em caso de doença, aposentadoria, falecimento e inatividade, por exemplo, como já acontecia na legislação anterior.
Tanto no saque-aniversário quanto no saque-rescisão, o trabalhador receberá a multa de 40% sobre o valor do FGTS em caso de rescisão contratual. Não houve mudanças nesse trecho mesmo com as críticas ao benefício feitas pelo presidente Jair Bolsonaro.
Por ser uma Medida Provisória, a proposta tem validade de 120 dias. Para continuar em vigor, precisa ser analisada e aprovada pelo Congresso Nacional.
Como verificamos
Para esta verificação, o Comprova consultou a Medida Provisória 889 e materiais explicativos do Ministério da Economia e da Caixa Econômica Federal. Também analisamos reportagens publicadas sobre o anúncio do governo das novas modalidades de saque do FGTS.
Como serão os saques
O saque imediato do FGTS foi estabelecido no artigo 5º da MP. O trabalhador pode retirar até R$ 500 de seu fundo, de acordo com o limite disponível de cada conta, seja ativa ou inativa. A retirada do dinheiro poderá ser feita até o dia 31 de março de 2020, seguindo um calendário que será divulgado pela Caixa no dia 5 de agosto de 2019.
Quem tiver conta poupança na Caixa receberá o valor automaticamente — os que não quiserem receber os recursos deverão avisar a instituição financeira. O banco federal vai detalhar outras formas de saque também no dia 5 de agosto.
Já o saque-aniversário consiste na retirada anual de um percentual do valor total disponível nas contas do FGTS. A quantidade de dinheiro irá variar de acordo com o saldo na conta (veja o gráfico abaixo). Por exemplo, se o trabalhador tiver um saldo de R$500 na conta, poderá sacar pelo “saque aniversário” 50% do valor, ou seja, R$250. Já se tiver R$30.000 poderá sacar anualmente R$1.500 (5%), acrescidos de R$2.900. Ou seja, R$4.400. Todas as alíquotas foram listadas pelo Ministério da Economia.
A opção por esta modalidade de saque realmente inviabiliza o acesso ao saldo do FGTS em caso de demissão sem justa causa. No entanto, a migração não é obrigatória. Quem desejar aderir ao saque-aniversário precisará comunicar o interesse à Caixa Econômica Federal a partir de outubro deste ano.
O trabalhador também poderá voltar à modalidade anterior, mas para isso precisará aguardar um período de dois anos após a solicitação.
Procurado, o Ministério da Economia esclareceu que não há qualquer relação entre a retirada imediata de R$500 e a opção pelo saque aniversário. Ou seja, quem efetuar o saque autorizado pelo governo não estará aderindo automaticamente à nova modalidade de saque e, portanto, abrindo mão do benefício em caso de rescisão de contrato.
O artigo com título falso foi publicado em um site chamado Comunicando Fatos e usa um texto copiado integralmente de uma reportagem publicada pela revista Exame. O link para essa publicação foi compartilhado em páginas do Facebook como “Resistência Progressista”, “OneL13”, “Bolsominios Arrependidos” e “mulheres que podem #elenão”. Esse último foi compartilhado por mais de 11 mil pessoas de acordo com medição feita às 17h do dia 31 de julho.
Este conteúdo enganoso também foi checado por Aos Fatos, Fato ou Fake e Boatos.Org.
Contexto
O governo estima que 96 milhões de trabalhadores serão beneficiados com as medidas sobre o FGTS e PIS/Pasep. O cálculo do Ministério da Economia é que a liberação de saques desses dois fundos injete R$ 30 bilhões na economia, R$ 28 bilhões apenas com o FGTS.
Como a mudança no FGTS foi feita por meio de MP, o Congresso ainda precisa aprovar o texto. Alguns parlamentares já falam em alterações na medida — por exemplo, o líder do Podemos, José Nelto (GO), afirmou que vai propor que o limite do saque seja de R$ 1 mil. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que a MP é “correta” no curto prazo, mas que é “preciso discutir que modelos queremos de forma definitiva pro FGTS”.
Antes de definir o valor limite de R$ 500 para saques imediatos, o governo passou por idas e vindas. A ideia inicial era liberar até 35% do valor do fundo. No entanto, o setor de construção civil fez pressão contrária à medida, já que o fundo é usado como fonte para financiamentos a juros mais baixos.
O presidente Jair Bolsonaro afirmou, no anúncio da medida sobre o FGTS, que o saque imediato do fundo é “focado nos mais pobres”. De acordo com dados do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) referentes ao mês de junho, 37,4% dos inadimplentes têm dívidas de até R$ 500.
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/publicacao-usa-imagens-antigas-como-sendo-de-obras-do-governo-bolsonaro/ | COMPROVA | Publicação usa imagens antigas como sendo de obras do governo Bolsonaro | null | 2020-06-30 | Imagens usadas em post que compara os governos petistas ao de Bolsonaro são anteriores à atual gestão. O Comprova também verificou que as imagens comparam locais diferentes
Conteúdo verificado: Meme compartilhado no Facebook com imagens que pretendem comparar a situação de vias nos 14 anos de PT com obras que seriam realizadas em 18 meses do governo de Jair Bolsonaro
É falsa a combinação de imagens amplamente compartilhada em redes sociais para mostrar uma suposta evolução de obras públicas entre os governos dos ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2003 – 2011) e Dilma Rousseff (2011 – 2016), do PT, e os primeiros 18 meses de mandato do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Todas as fotografias atribuídas ao governo atual foram tiradas antes da posse de Bolsonaro.
Duas das imagens que supostamente retratam projetos de infraestrutura concluídos durante a gestão de Bolsonaro foram feitas, na verdade, nos mandatos de Lula e Dilma. Uma terceira foi publicada em um banco de imagens internacional anos antes da eleição de Bolsonaro.
As fotos comparadas nas publicações não mostram, ainda, os mesmos locais.
Como verificamos?
Para esta verificação pesquisamos a origem das seis fotos viralizadas utilizando os motores de busca reversa do Google e do TinEye.
A partir dos resultados encontrados, entramos em contato com os responsáveis pelos registros mais antigos de algumas das imagens para confirmar informações sobre o local e a data em que as fotografias foram feitas.
Também consultamos portais do governo e notícias para confirmar dados sobre as obras retratadas nas imagens.
Verificação
Estradas no Mato Grosso e no Pará
As primeiras duas fotos, que comparam uma estrada com veículos atolados na lama a uma rodovia asfaltada, não foram feitas no mesmo lugar nem mostram uma obra realizada pela gestão de Bolsonaro.
Com o mecanismo de busca reversa de imagens TinEye, encontramos registros da primeira foto em 2008. Fizemos a mesma pesquisa pelo Google, ajustando as configurações para obter resultados anteriores a 2009 — a busca encontrou esta apresentação de slides, publicada em janeiro de 2008.
Entramos em contato com a responsável pelos slides, Gislaine Manteli, por um e-mail listado na apresentação. Moradora da cidade de Nova Monte Verde, no Mato Grosso, ela informou que as fotos reunidas ali representavam a situação da rodovia MT-208 na época. Gislaine conta que os slides foram parte de uma mobilização do município para pressionar o governo estadual pela pavimentação da via.
De acordo com ela, hoje o trecho retratado nas fotos, que liga as cidades de Alta Floresta até Nova Bandeirantes, está quase completamente asfaltado. De fato, imagens de satélite do Google mostram longos segmentos pavimentados, com exceção de trechos perto de riachos.
A segunda imagem utilizada no post foi publicada no site do DNIT em 5 de fevereiro de 2010. A foto ilustra uma matéria sobre a pavimentação de 124 quilômetros da BR-163, entre Rurópolis e Santarém, no Pará. A obra foi realizada por um convênio com o Exército Brasileiro, com investimento de R$ 1,4 bilhão. Na época, o presidente era Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Esta foto já havia sido tirada de contexto em posts nas redes sociais, como mostra esta checagem da Agência Lupa.
Ferrovia fotografada em 2002 e foto de banco de imagens
A segunda comparação de fotos tampouco registra o antes e depois de uma mesma obra durante os “14 anos de PT” e os “18 meses de Bolsonaro”.
Uma busca reversa no Google pela imagem atribuída aos governos petistas, na qual é possível ver dois vagões de trem em uma área aparentemente abandonada, leva a um artigo publicado em 19 de novembro de 2008 no blog Música Sob Trilhos.
O texto, intitulado “Ferrovias no Brasil: Sucateamento completa 150 anos” é ilustrado com a imagem agora viralizada. Ao clicar na fotografia é possível identificar a marca d’água “Latuff 2002” no canto inferior direito.
Carlos Latuff, chargista carioca, manteve até 2017 um blog dedicado a compartilhar imagens de ferrovias no Brasil e no mundo.
Contactado pelo Comprova, Latuff confirmou ter tirado a imagem dos vagões de trem no final de 2002 — ano em que o país era governado por Fernando Henrique Cardoso (PSDB), e não pelo PT, como alegam as publicações viralizadas.
De acordo com o chargista, as imagens foram tiradas na oficina da companhia ferroviária MRS Logística no Horto Florestal, em Belo Horizonte, Minas Gerais. “São sucatas de locomotivas da antiga Rede Ferroviária Federal”, afirmou o fotógrafo.
Ao Comprova, Latuff enviou outras fotos que tirou no mesmo dia.
Já a foto que mostraria o estado desta ferrovia durante o governo Bolsonaro foi tirada do banco de imagens iStock, da empresa norte-americana Getty Images.
Embora o site não informe onde a fotografia foi feita, ela foi publicada no repositório em 13 de agosto de 2015 — anos antes da eleição de Jair Bolsonaro.
Uma busca reversa no Google mostra que a imagem é frequentemente utilizada por empresas de construção em diversos países, como Suíça, Itália e Alemanha, para ilustrar os serviços prestados pelas companhias.
Transposição do Rio São Francisco em 2011 e 2015
A terceira dupla de fotos também não mostra uma comparação entre o governo petista e a gestão de Bolsonaro. As duas imagens foram feitas durante o período em que Dilma Rousseff foi presidente (2011-2016).
O primeiro clique é do fotógrafo Wilson Pedrosa. A imagem foi publicada em matéria do Estadão de 4 de dezembro de 2011, assinada por Pedrosa e Eduardo Bresciani. A reportagem percorreu 100 quilômetros de obras da transposição do Rio São Francisco em Pernambuco — os jornalistas encontraram canais em deterioração e canteiros abandonados pelas empreiteiras responsáveis. A foto em questão mostra um trecho entre os municípios de Betânia e Custódia, em Pernambuco.
A segunda imagem foi publicada pela primeira vez em 13 de agosto de 2015 na conta do Ministério da Integração Nacional no site de compartilhamento de fotos Flickr. A legenda informa se tratar da Estação de Bombeamento 1 do Eixo Norte do Projeto de Integração do Rio São Francisco.
O Planalto anunciou na época que a obra em questão foi inaugurada em 21 de agosto de 2015. A estrutura bombeia água do Velho Chico por 45,9 quilômetros até o reservatório de Terra Nova, em Cabrobó, em Pernambuco.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conteúdos duvidosos sobre políticas públicas do governo federal que apresentam ampla repercussão em redes sociais e aplicativos de mensagens. Este é o caso da comparação de imagens de obras, que obteve, até 30 de junho, mais de 13 mil compartilhamentos no Facebook, Instagram e Twitter.
Também é levada em consideração a relevância do conteúdo frente ao noticiário atual.
Neste caso, a viralização da combinação de fotos acontece alguns dias após o presidente Jair Bolsonaro inaugurar um trecho do Eixo Norte da transposição do Rio São Francisco — projeto de infraestrutura iniciado no primeiro mandato do ex-presidente Lula, que reivindica paternidade da obra. O tópico levou a primeiro plano o tema da evolução de obras públicas.
Falso, para o Comprova, é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Esta combinação de fotos também foi verificada pela Agência Lupa. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/hidroxicloroquina-no-inicio-da-covid-19-nao-descarta-necessidade-de-uti/ | COMPROVA | Hidroxicloroquina no início da covid-19 não descarta necessidade de UTI | null | 2020-06-29 | Ao contrário do que diz médico nas redes sociais, há relatos de óbitos de pacientes que usaram hidroxicloroquina já no início dos sintomas. E não há comprovação de que o medicamento reduz o risco de morte pela covid-19
Conteúdo verificado: Tuíte de um médico que diz não ter visto nenhum paciente medicado com hidroxicloroquina no início dos sintomas que tenha evoluído para a fase crítica na UTI.
Um tuíte do dia 22 de junho, escrito pelo médico Allan Garcês, induz ao erro ao fazer crer que o uso da hidroxicloroquina nos primeiros sintomas de covid-19 impede que a doença siga para uma etapa mais severa. “Ainda não vi nenhum paciente que iniciou o tratamento com hidroxicloroquina no INÍCIO dos sintomas, ou seja, no INÍCIO da sua doença, que tenha evoluído para a fase crítica na UTI. FICA A DICA”, ele escreveu em seu perfil.
Estudos dos programas Solidariedade (da Organização Mundial de Saúde) e Recovery (do governo do Reino Unido) não conseguiram comprovar que a cloroquina e a hidroxicloroquina reduzam o risco de morte de pacientes com covid-19. A autoridade sanitária dos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA), suspendeu a autorização para uso emergencial dessas substâncias como tratamento do novo coronavírus no país.
No Brasil, o Ministério da Saúde permitiu o uso da cloroquina em pacientes graves no dia 23 de março e orientou o uso em casos leves no dia 20 de maio. A Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e a Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac) criticaram a liberação para uso da droga na fase inicial da doença.
Para o médico Edson Carvalho, professor da Uninove e infectologista do Hospital Unimed e do Hospital Estadual de Bauru (SP), referência no tratamento de covid-19, a “suspeita” de Garcês não tem fundamento. Carvalho, que foi procurado pelo Comprova por recomendar a hidroxicloroquina, diz que tratou “vários” pacientes com hidroxicloroquina desde o início dos sintomas e, mesmo assim, viu eles evoluírem para casos mais graves – alguns, inclusive, morreram.
Como verificamos?
O Comprova buscou identificar os primeiros estudos que sugeriram o uso da cloroquina no tratamento de pacientes com covid-19 e as revisões feitas sobre eles. Também tentou saber como estudos clínicos conduzidos pela Organização Mundial de Saúde e pelo governo do Reino Unido vêm sendo interpretados por essas organizações. A equipe procurou o posicionamento sobre o remédio do governo dos Estados Unidos e do Brasil. Por fim, levantou o posicionamento de entidades como a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e a Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac).
Também procuramos testemunhos de pessoas que evoluíram para quadros graves da doença mesmo se tratando com a droga desde o início e, em pesquisas na internet, encontramos uma reportagem do site JCNet, de Bauru, com a história de Marília Buzalaf e seu marido, Cláudio, que, em março, ficou 21 dias no hospital – 11 deles intubado – por conta do novo coronavírus, e havia tomado hidroxicloroquina. No Facebook, descobrimos que ela é professora da Faculdade de Odontologia da USP em Bauru, no interior paulista, e, no site da instituição, conseguimos o e-mail dela. Entramos em contato e marcamos uma entrevista, realizada por telefone.
Após ouvir o relato de Marília, o Comprova pediu a ela o celular de Edson Carvalho, médico que cuidou do caso, para confirmar se o paciente havia sido realmente tratado com a hidroxicloroquina desde o começo dos sintomas.
Também tentamos, sem sucesso, falar com Allan Garcês, autor do tuíte. Ele não respondeu as mensagens diretas no Facebook nem no Instagram – seu Twitter não permite o envio de mensagens.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 29 de junho de 2020.
Verificação
O que dizem os estudos?
A cloroquina chegou a ser considerada como um possível tratamento de infecções por coronavírus nas epidemias de SARS e MERS. Na época, porém, não houve estudos em humanos que pudessem confirmar a eficácia da droga.
Em março deste ano, dias após a OMS classificar a covid-19 como uma pandemia, a medicação voltou ao debate a partir de um estudo conduzido por médicos do Sul da França que sugeriram usar a cloroquina para tratar o SARS-CoV-2. Esse estudo foi alvo de muitas críticas, seus resultados foram questionados e considerados anedóticos — termo da literatura médica que descreve casos isolados, que não representam comprovação científica. Em abril, a International Society of Antimicrobial Chemotherapy e a Elsevier, entidades responsáveis pela revista que publicou o artigo, emitiram um comunicado que reconheceu a existência de dúvidas quanto ao conteúdo do estudo e anunciaram um novo processo de revisão independente.
No dia 19 de março, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, classificou o medicamento como uma “mudança de jogo” no tratamento da covid-19 e anunciou que aprovaria o uso dele no país. Dois dias depois, o presidente Jair Bolsonaro disse que o laboratório do Exército aumentaria a produção de cloroquina no Brasil.
Em 25 de março, o Ministério da Saúde emitiu uma nota técnica autorizando o uso da cloroquina para tratar pacientes com casos graves de covid-19. Depois, em 20 de maio, o governo brasileiro passou a orientar o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no “tratamento medicamentoso precoce” de pacientes com covid-19, incluindo pessoas com sintomas leves da doença. No texto, o próprio Ministério da Saúde escreveu: “ainda não há meta-análises de ensaios clínicos multicêntricos, controlados, cegos e randomizados que comprovem o benefício inequívoco dessas medicações para o tratamento da covid-19”.
Naquela semana, a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) emitiu uma nota em que “não recomenda o uso da Cloroquina e Hidroxicloroquina associadas, ou não, à Azitromicina, enquanto não houver evidências científicas definitivas acerca do seu emprego”. O texto também orienta os médicos a realizarem eletrocardiogramas nos pacientes que optarem pelo tratamento, de modo a monitorar possíveis complicações cardíacas.
A Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac) também lançou uma nota ressaltando a “ausência de evidências que apontem claramente o benefício do uso deste esquema terapêutico”. A entidade recomenda o acompanhamento dos pacientes que usem o medicamento para “prevenir a manifestação de eventos arrítmicos potencialmente fatais que podem ocorrer devido a efeitos adversos de um destes fármacos ou da associação entre eles ou com outros fármacos que também possam predispor a distúrbios elétricos cardíacos”.
No dia 5 de junho, pesquisadores do Recovery, estudo clínico conduzido no Reino Unido para encontrar medicamentos que combatam o novo coronavírus, afirmaram não haver benefício no uso da hidroxicloroquina em pacientes com covid-19. Dez dias depois, a Food and Drug Administration (FDA), autoridade sanitária americana, revogou a autorização de uso emergencial da cloroquina e da hidroxicloroquina para o tratamento da doença nos Estados Unidos. A organização afirmou na ocasião que, após realizar estudos, descobriu ser improvável que os medicamentos sejam efetivos no tratamento da covid-19. “Além disso, à luz de eventos adversos cardíacos graves e contínuos e de outros efeitos colaterais sérios, os benefícios conhecidos e potenciais de cloroquina e hidroxicloroquina não superam mais os riscos conhecidos e potenciais para o uso autorizado”, afirmou ainda.
A Organização Mundial da Saúde chegou a incluir a hidroxicloroquina na lista de medicamentos avaliados pelo estudo clínico Solidariedade, que testou drogas para combater a covid-19 em pacientes de 35 países. A OMS, porém, encerrou os testes com a hidroxicloroquina no dia 17 de junho por não ter sido capaz de identificar redução no número de óbitos entre os pacientes que usaram a droga.
A autoria do tuíte
Médico, Allan Quadros Garcês, conhecido como Allan Garcês, foi diretor do Departamento de Articulação Interfederativa da Secretaria-Executiva do Ministério da Saúde na gestão de Luiz Henrique Mandetta. Deixou o cargo para assumir como secretário estadual da Saúde de Roraima, posição que ocupou por 43 dias, entre janeiro e fevereiro deste ano. O Comprova procurou a Secretaria de Saúde para saber o motivo da exoneração, mas não recebeu resposta até o fechamento desta verificação.
Forte defensor da hidroxicloroquina, como mostra em seus perfis nas redes sociais, Allan se lançou ao cargo de ministro da Saúde após a saída de Nelson Teich, em maio. Na época, afirmou em seu Twitter que não havia sido sondado pelo Planalto, mas sabia que seu nome havia chegado “até lá”. No mesmo post, se diz “alinhado ao governo”, como é possível verificar em seus posts – muitos de apoio ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Em 2018, ele foi candidato a deputado federal pelo PSL, mas não se elegeu. Antes, tentou se candidatar a vereador em São Luís, no Maranhão, pelo PMB em 2016, mas também não se elegeu. Em 2012, ficou como suplente da vaga de vereador pela mesma cidade, pelo PSDB.
Testemunho
Em entrevista ao Comprova, a professora de Odontologia da USP Bauru Marília Buzalaf contou que o seu marido, Cláudio, havia tido febre, dor no corpo e mal-estar por cinco dias quando procurou o Hospital Unimed, em Bauru, em março. “Falta de ar ele não teve”, disse. Ele fez o teste de covid-19 e, por ser cardíaco, acharam melhor interná-lo, mesmo sem o resultado do exame, que só sairia em cinco dias. “Naquele dia (da internação), o médico já tinha quase mandado a gente embora para casa depois de ter feito os exames”, afirmou Marília. Mesmo não considerando o caso grave, a equipe médica passou a tratar o paciente com hidroxicloroquina. O medicamento não fez efeito e, quatro dias depois, Cláudio foi para a UTI. No total, ele ficou 21 dias no hospital, até receber alta.
Casos médicos
O infectologista Edson Carvalho, que trabalha no Hospital Unimed e no Hospital Estadual de Bauru, e leciona na Uninove, disse ao Comprova que Cláudio estava na fase inicial da doença quando foi internado e passou a ser tratado com hidroxicloroquina. Acrescentou que teve vários pacientes que tomaram a droga assim que surgiram os sintomas e também tiveram o quadro agravado – alguns falecendo. O médico afirmou ainda que hoje tem “pelo menos quatro pacientes graves que tomaram o medicamento desde o começo e evoluíram com gravidade, com intubação, e que a hidroxicloroquina não fez a menor diferença no quadro clínico deles”.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais. Quando o material aborda assuntos relacionados à covid-19, a verificação se torna ainda mais importante, pois conteúdos enganosos podem colocar a saúde das pessoas em risco. O tuíte checado pelo Comprova tinha mais de 17 mil curtidas e foi retuitado 3.500 vezes.
Sem apresentar nenhuma prova, Allan Garcês engana ao insinuar que a hidroxicloroquina, se receitada no início dos sintomas de covid-19, evita que os pacientes evoluam para quadros mais graves. Desde os primeiros casos da doença no Brasil, os temas relacionados à pandemia têm sido usados para reforçar narrativas que se alinham ou contrariam o discurso do presidente da República, Jair Bolsonaro. No caso, o tuíte do médico segue a linha do chefe do Executivo, que sempre defendeu a cloroquina e a hidroxicloroquina como possíveis substâncias eficazes contra o novo coronavírus, descartando evidências científicas segundo as quais ainda não há nenhuma droga conhecida que combata com eficácia a doença. A polarização dos discursos em defesa do uso de medicamentos sem eficácia comprovada pode servir de incentivo à automedicação e causar efeitos colaterais danosos.
Desde o início da pandemia, o Comprova já realizou várias checagens sobre a cloroquina. Uma delas enganava ao afirmar que pesquisadores brasileiros usaram doses letais da medicação para matar os pacientes. Outra mentia ao afirmar que o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, proibiu o uso da substância. Recentemente também mostrou que era enganoso um conteúdo que atribuía ao uso da cloroquina a situação da pandemia no Senegal.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor ou que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/video-mostra-queima-controlada-feita-pelo-ibama-nao-incendio-provocado-para-culpar-o-presidente/ | COMPROVA | Vídeo mostra queima controlada feita pelo Ibama, não incêndio provocado para culpar o presidente | null | 2020-06-29 | A ação foi, na verdade, uma queima controlada, um procedimento previsto no Código Florestal para prevenir focos de incêndio de maiores proporções. Procurado pelo Comprova, o autor apagou a postagem
Conteúdo verificado: Post da página “Bolsonarianos Ceará”, com um vídeo e a legenda “Ibama provoca incêndio na mata para depois o presidente ser acusado”.
Um post faz acusações falsas sobre o Ibama ao afirmar que o órgão estaria promovendo um incêndio na mata “para depois o presidente ser acusado”. O autor da publicação usa um vídeo gravado de dentro de um carro em movimento que mostra um outro veículo com funcionários do Ibama queimando a mata da beira da estrada. No áudio da gravação, um homem diz estar entre as cidades de Sítio Novo e Montes Altos, no Maranhão, e insinua que o incêndio estaria sendo provocado pelo órgão para “poder derrubar o governo Bolsonaro”.
Procurado pelo Comprova, o Ibama afirmou que realizou uma ação na região no dia 20 de junho, mas que foi uma queima controlada, feita para combater focos de incêndio e prevista no Código Florestal.
O Comprova não conseguiu encontrar o autor do vídeo.
Como verificamos?
Para saber mais sobre a autoria do vídeo e confirmar o local onde ele foi gravado, o Comprova entrou em contato com a pessoa que assina as postagens na página “Bolsonarianos Ceará”, Jolnê Praxedes, por WhatsApp, pelo número disponibilizado no Facebook.
Também entramos em contato com o Ibama e enviamos o vídeo suspeito, além de consultar a Funai sobre o registro da ação e a presença de indígenas na região. O Google Maps foi utilizado para determinar o local onde o autor diz ter feito as imagens, e usamos ferramentas de busca de imagem para confirmar a aparência da viatura.
Verificação
Autoria do vídeo
A página “Bolsonarianos Ceará”, que publicou o vídeo no dia 21 de junho, é de um homem chamado Jolnê Praxedes. O Comprova entrou em contato com ele pelo WhatsApp, pelo telefone presente na própria página e nas postagens.
Perguntado sobre o vídeo, se conhecia a pessoa responsável pela filmagem ou se tinha confirmação do local onde as imagens foram feitas, Praxedes disse que participa de 80 a 100 grupos de política diferentes no WhatsApp, além de receber conteúdo de listas de transmissão, e que não se lembrava, exatamente, de onde tinha recebido o vídeo, que chegou como uma “denúncia”.
“Antes de publicar, procurei ver se tinha alguma coisa quanto à falsidade do vídeo, e não tinha. Sempre, eu procuro tomar esse cuidado”, afirmou, por mensagem de áudio. O dono da página bolsonarista ainda se dispôs, após o contato do Comprova, a apagar o conteúdo, caso a verificação demonstrasse que as informações eram falsas, e pediu que entrássemos em contato para avisá-lo do resultado da checagem. Pouco tempo depois do contato, porém, antes da publicação desta verificação, o vídeo já havia sido apagado da página do Facebook.
Também por mensagem no WhatsApp, Praxedes disse ao Comprova que a página tem outros administradores, mas ele é a única pessoa que aparece em vários vídeos, criticando pessoas vistas como “rivais” do governo de Jair Bolsonaro, como o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes.
Nos posts mais recentes, as legendas incluem uma hashtag de apoio à pré-candidatura de Praxedes à Câmara Municipal de Fortaleza. Jolnê confirmou que pretende concorrer a um cargo nas próximas eleições, pelo Podemos. Ele já chegou a se registrar como candidato a deputado federal, pelo Partido Trabalhista Cristão (PTC), em 2018, mas acabou não concorrendo.
A página do Facebook, que tem quase 72 mil curtidas, foi criada em novembro de 2017, e publica mensagens de apoio ao presidente Bolsonaro e a outros políticos aliados.
Na publicação com o vídeo sobre as queimadas, Praxedes afirma que havia encaminhado o material ao presidente. Questionado pelo Comprova, disse que não enviou por não ter o contato direto do presidente.
O que diz o Ibama?
O Comprova procurou o Ibama e o órgão afirmou, por e-mail, que a ação mostrada no vídeo realmente ocorreu entre as cidades de Sítio Novo e Montes Altos. Foi realizada no dia 20 de junho, um dia antes da postagem de Praxedes, e era uma queima controlada, “utilizada durante o período chuvoso e no início do período seco (junho e julho) em locais com maior risco de ignição de fogo” para reduzir a “quantidade de combustível na seca, diminuindo drasticamente o risco de grandes incêndios florestais”.
A instituição afirmou que esse tipo de queima está previsto no Código Florestal. O texto descreve as situações nas quais o uso de fogo na vegetação é permitido. Entre as possibilidades está o “emprego da queima controlada em Unidades de Conservação, em conformidade com o respectivo plano de manejo e mediante prévia aprovação do órgão gestor da Unidade de Conservação, visando ao manejo conservacionista da vegetação nativa, cujas características ecológicas estejam associadas evolutivamente à ocorrência do fogo”.
Segundo o Ibama, “boa parte dos incêndios florestais iniciam nas beiras de estradas e a realização das queimas nesses locais, como no caso do vídeo, é prioritária”. O órgão disse ainda que a queima do dia 20 de junho foi informada aos órgãos competentes e teve acompanhamento da Polícia Militar do Maranhão “para garantir a segurança no trânsito da estrada”.
Funai
Antes de receber o relatório sobre a queimada preventiva do Ibama, o Comprova entrou em contato com a Fundação Nacional do Índio (Funai), questionando sobre o registro da ação e a presença de indígenas na região. A instituição não respondeu até o fechamento desta verificação, mas um documento enviado pelo órgão de defesa do meio ambiente confirma que a Funai participou da ação.
A operação
O Ibama enviou para o Comprova, por e-mail, o relatório da operação. No documento, descreve os detalhes da ação, que contou com dois servidores do órgão, um da Funai, dois policiais militares, dois supervisores de brigadas e 11 voluntários da Aldeia São José da TI Krika. O trabalho começou às 9 horas do dia 20 de junho e terminou às 14. O documento informa, “por fim, não ter havido nenhuma intercorrência durante toda a operação”. Parte da equipe atuou observando se havia animais em risco, mas não foi registrado “nenhum dano significavo à fauna e apenas benefício à flora”.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conteúdos suspeitos de ampla repercussão em redes sociais, como a postagem de Praxedes, que tinha 119 mil visualizações no Facebook até o dia 24 de junho – um dia depois, após contato do Comprova, Praxedes apagou seu post.
Os autores do vídeo e da legenda enganam ao acusar o Ibama de incendiar um trecho de mata e levam a postagem para o lado político ao dizer que seria um fogo criminoso usado “para depois o presidente ser acusado”. Postado na página “Bolsonarianos Ceará”, o post servia para reforçar a defesa do presidente Jair Bolsonaro, que, no ano passado, foi criticado quando as queimadas na Amazônia bateram recorde dos últimos sete anos. O chefe do Executivo chegou a dizer, sem provas, que ONGs poderiam ter provocado queimadas na região. Ele também acusou o ator Leonardo DiCaprio de ter dado dinheiro para “tacar fogo na Amazônia”.
Falso, para o Comprova, é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
O G1 e o Boatos.org verificaram o vídeo e classificaram o conteúdo como falso. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/prefeito-de-sao-paulo-nao-proibiu-hidroxicloroquina-e-usou-azitromicina-no-tratamento-da-covid-19/ | COMPROVA | Prefeito de São Paulo não proibiu hidroxicloroquina e usou azitromicina no tratamento da covid-19 | null | 2020-06-26 | Ao contrário do que afirmam publicações nas redes sociais, a prefeitura de São Paulo nunca proibiu o uso de cloroquina, nem de sua forma menos tóxica, a hidroxicloroquina
Conteúdo verificado: Texto compartilhado por Facebook e Twitter acusando o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, de deixar “muita gente morrer a (sic) míngua” ao “proibir a Hidroxicloroquina” e depois “confessar à mídia que fez uso do remédio que negou ao povo…”
Uma publicação com informações falsas sobre o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), viralizou no Twitter e no Facebook esta semana. Um dos perfis é de uma usuária que usa o apelido de “Tubaína Paschoal” e uma foto da deputada estadual Janaína Paschoal (PSL-SP). No post, ela afirma que Covas “deixou muita gente morrer a (sic) míngua ao proibir a hidroxicloroquina”, mas que o prefeito teria usado o medicamento para tratar a covid-19 quando foi infectado. A outra postagem, com o mesmo texto, é de uma conta que usa a foto, o nome e se descreve como uma “homenagem” ao general reformado Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional do Planalto, no Facebook.
Nenhuma das informações é verdadeira. A prefeitura de São Paulo nunca proibiu o uso de cloroquina, nem de sua forma menos tóxica, a hidroxicloroquina. O protocolo de atendimento de covid-19 no município, anunciado em 9 de abril, recomenda que o uso do medicamento seja feito com prescrição médica e consentimento do paciente ou da família. Uma recomendação técnica da Secretaria Municipal da Saúde, publicada em 17 de junho, lembra que ainda não existe um medicamento específico para o tratamento da covid-19. E, como não há evidências científicas que justifiquem o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina contra o novo coronavírus, o uso deve ser evitado em pacientes com sintomas leves.
Bruno Covas, de 40 anos, anunciou que estava com covid-19 no dia 13 de junho. O prefeito, que trata um câncer no sistema digestivo, recebeu o diagnóstico depois de um exame de rotina. Em sua conta oficial no Instagram, afirmou que não teve sintomas como febre, dor ou falta de ar e que passaria dez dias isolado, trabalhando de casa. No dia 15, Covas publicou um vídeo em que esclareceu que, mesmo assintomático, estava tomando o antibiótico azitromicina por recomendação médica. “Remédio não é de esquerda ou de direita. Lamento que alguns queiram politizar a escolha do medicamento”, disse. No dia 24, mais uma vez numa mensagem gravada, Covas anunciou que estava recuperado e voltaria ao trabalho presencialmente na prefeitura.
Como verificamos?
Entramos em contato com a assessoria de imprensa da prefeitura de São Paulo para saber sobre o estado de saúde do Bruno Covas, como tinha sido feito o tratamento contra a covid-19 e se ele tinha tomado hidroxicloroquina. Por telefone, fomos informados que os detalhes do tratamento são de caráter pessoal do prefeito. E recebemos a sugestão de buscar as informações nas redes sociais de Bruno Covas. Ele publicou vídeos com atualizações ao longo dos dez dias de isolamento domiciliar.
Buscamos mais informações e documentos técnicos no site da Secretaria Municipal da Saúde, que segue recomendações da Secretaria Estadual da Saúde e do Ministério da Saúde.
Em seguida, levantamos quais foram os primeiros estudos a sugerir o uso de cloroquina e hidroxicloroquina em pacientes com a covid-19 e que revisões foram feitas sobre eles. Também consultamos documentos da Casa Branca e do Ministério da Saúde para explicar como a droga passou a ser adotada nos Estados Unidos e no Brasil. Buscamos também o posicionamento de entidades médicas sobre o uso do medicamento no país. Procuramos ainda informações sobre os status atuais de estudos sobre uso da droga para tratar a covid-19 conduzidos pela Organização Mundial da Saúde, governo do Reino Unido e pela autoridade sanitária americana.
Por fim, tentamos localizar os autores das publicações no Twitter e no Facebook. Ambos são perfis sem autoria declarada e não verificados. Por isso, não recebem mensagens privadas de desconhecidos. O contato com o perfil Tubaína Paschoal foi tentado por mensagem aberta e não houve resposta de nenhum dos dois até o fechamento desta reportagem. Já a página de homenagem a Augusto Heleno disponibiliza um e-mail e um telefone com prefixo 88, da região de Juazeiro do Norte, no interior do Ceará. Tentamos contato, mas o número estava desligado.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 26 de junho de 2020.
Verificação
O prefeito da capital paulista anunciou que estava com covid-19 no dia 13 de junho. Em um vídeo publicado no Instagram, Bruno Covas disse que depois de quatro testes negativos, dessa vez o resultado foi positivo. “A orientação do meu médico, já que eu não tenho nenhum sintoma, é ficar dentro de casa”, contou. Covas faz tratamento para um câncer no sistema digestivo desde outubro de 2019 e, por isso, faz parte do grupo de risco para novo coronavírus.
Ao longo de dez dias, o prefeito se manteve em isolamento domiciliar, trabalhando a distância. No dia 15, mais uma vez em vídeo, Covas esclareceu que permanecia sem febre, sem dor e sem falta de ar e que, por recomendação médica, estava tomando o antibiótico azitromicina. “Medicação a gente toma aquela prescrita pelo médico. Não se trata de remédio de esquerda nem direita. É lamentável ter que politizar a questão do remédio no país, isso não contribui em nada”, lamentou.
A azitromicina é um medicamento eficaz para o combate a bactérias, e não tem ação documentada contra vírus, como SARS-CoV-2. Associada à hidroxicloroquina, a droga é prescrita, de forma experimental, a pacientes infectados com o novo coronavírus. No caso do prefeito, somente a azitromicina pode servir para evitar infecções bacterianas oportunistas, já que Covas tem o sistema imunológico prejudicado por causa do tratamento contra o câncer. Nesta verificação, publicada pelo Comprova no dia 25 de junho, o médico Erich Vinícius de Paula explica que é difícil ter certeza que junto com o vírus não haja uma infecção bacteriana associada, mas alerta: “É muito importante entender que o antibiótico não é direcionado para tratar do vírus”.
Uso de cloroquina não é proibido
“Até o momento, não há vacina nem medicamento antiviral específico para prevenir ou tratar a covid-19”, explica a Organização Pan-Americana de Saúde, braço da Organização Mundial de Saúde (OMS) para as Américas. Uma das drogas em estudo é a cloroquina, usada para o tratamento de malária e doenças autoimunes como o lúpus (leia mais abaixo).
O texto verificado afirma que o prefeito proibiu a hidroxicloroquina na cidade. Essa informação é falsa. Em 9 de abril, Covas anunciou que a cloroquina passaria a fazer parte do protocolo de atendimento de pacientes diagnosticados com covid-19 no município. “Ainda não é possível ser uma política pública, pois não temos ainda pesquisas concluídas, mas havendo prescrição do médico e a concordância do paciente, a Secretaria Municipal de Saúde passou a integrar esse [a cloroquina] medicamento no protocolo de tratamento da covid-19”, afirmou Covas. Uma recomendação técnica foi publicada em 17 de junho, sugerindo uma “análise criteriosa do quadro clínico, o monitoramento do paciente, da resposta em relação à terapêutica selecionada e as reações adversas”. A prefeitura segue uma orientação da Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo, para que a droga não seja prescrita para pacientes com casos leves. E, assim como sugere o Ministério da Saúde, a indicação deve ser feita por um médico com autorização do pacientes ou da família.
Cloroquina: o que dizem estudos e autoridades?
A cloroquina já havia sido considerada para tratamento de infecções de coronavírus após as epidemias de SARS e MERS. Mas, na época, não foram feitos testes clínicos em humanos para confirmar a eficácia da droga.
Em março deste ano, após a covid-19 ter sido declarada uma pandemia pela OMS, um estudo conduzido por médicos do Sul da França se tornou viral ao sugerir que a cloroquina poderia ser usada como tratamento para o SARS-CoV-2, o novo tipo de coronavírus descoberto no final do ano passado. Esse estudo foi alvo de diversas críticas e seus resultados foram questionados e considerados anedóticos, ou seja, se tratavam de casos isolados, sem comprovação científica. Mais tarde, em um comunicado, a International Society of Antimicrobial Chemotherapy e a Elsevier, responsáveis pela revista que publicou o artigo, reconheceram a existência de questionamentos quanto ao conteúdo e anunciaram um novo processo de revisão independente.
Em 19 de março, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tratou do medicamento como uma “mudança de jogo” no tratamento da covid-19 e disse que aprovaria o uso dele no país. Dois dias depois, o presidente brasileiro Jair Bolsonaro anunciou que o laboratório do Exército aumentaria a produção de cloroquina.
No dia 25 de março, o Ministério da Saúde emitiu uma nota técnica autorizando o uso da cloroquina para tratar pacientes com casos graves de covid-19. Em 20 de maio, o governo brasileiro passou a orientar o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no “tratamento medicamentoso precoce” de pacientes com covid-19, incluindo pessoas com sintomas leves da doença na lista das que podem ser tratadas com a substância. Porém, o próprio Ministério da Saúde afirma no documento que “ainda não há meta-análises de ensaios clínicos multicêntricos, controlados, cegos e randomizados que comprovem o benefício inequívoco dessas medicações para o tratamento da covid-19”.
Dois dias depois, a Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) emitiu uma nota em que “não recomenda o uso da Cloroquina e Hidroxicloroquina associada, ou não, a Azitromicina, enquanto não houver evidências científicas definitivas acerca do seu emprego”. O texto também orienta que, para os pacientes que optarem pelo tratamento, “sejam realizados eletrocardiogramas”, de modo a acompanhar possíveis complicações cardíacas.
A Sociedade Brasileira de Arritmias Cardíacas (Sobrac) também emitiu uma nota ressaltando a “ausência de evidências que apontem claramente o benefício do uso deste esquema terapêutico”. A Sobrac recomenda o monitoramento dos pacientes que façam uso do medicamento para “prevenir a manifestação de eventos arrítmicos potencialmente fatais que podem ocorrer devido a efeitos adversos de um destes fármacos ou da associação entre eles ou com outros fármacos que também possam predispor a distúrbios elétricos cardíacos”.
No dia 5 de junho, pesquisadores do Recovery, estudo clínico conduzido no Reino Unido para encontrar medicamentos para tratar a infecção pelo novo coronavírus, afirmaram não haver benefício no uso da hidroxicloroquina em pessoas com covid-19. Dez dias depois, a Food and Drug Administration (FDA), autoridade sanitária americana, revogou a autorização para um uso emergencial da cloroquina e da hidroxicloroquina para o tratamento da doença nos Estados Unidos. A organização alegou que, após o resultado de estudos, é improvável que os medicamentos sejam efetivos no tratamento da covid-19. “Além disso, à luz de eventos adversos cardíacos graves e contínuos e de outros efeitos colaterais sérios, os benefícios conhecidos e potenciais de cloroquina e hidroxicloroquina não superam mais os riscos conhecidos e potenciais para o uso autorizado”, afirmou ainda.
A Organização Mundial da Saúde também avaliou o uso da hidroxicloroquina como um dos medicamentos para o tratamento da covid-19 através do estudo clínico Solidariedade, que já recrutou pacientes em 35 países. Mas decidiu encerrar os testes com a hidroxicloroquina no dia 17 de junho por não ter sido capaz de identificar redução no número de óbitos entre os pacientes que fizeram uso da droga.
Por que investigamos?
O Projeto Comprova verifica conteúdos sobre a covid-19 que tenham grande alcance em redes sociais e grupos de mensagem. A desinformação é perigosa em uma pandemia, pois pode custar vidas. Nesse caso, o texto que acusa o prefeito de São Paulo de tomar proibir a hidroxicloroquina — causando assim a morte de cidadãos — e depois tomar o medicamento teve 11,7 mil interações (8,1 mil curtidas e 3,7 mil compartilhamentos) até o dia 26 de junho em postagem no Twitter, feita por uma conta que usa a foto da deputada estadual Janaína Paschoal (PSL-SP) e se descreve como uma página de “sátira” e paródia”. Mas o conteúdo postado por ela costuma ser de apoio ao presidente Jair Bolsonaro e a suas políticas de governo. As críticas ficam para políticos de esquerda ou que não fazem parte da base de apoio de Bolsonaro, como o ex-governador Ciro Gomes (PDT), o prefeito de Salvador ACM Neto (DEM) e, como no caso do post verificado, o prefeito Bruno Covas (PSDB). A publicação também engana ao dizer que Covas tomou hidroxicloroquina para tratar covid-19, estimulando o uso de uma droga que não tem eficácia comprovada cientificamente.
O conteúdo falso também repercutiu no Facebook. A postagem com o mesmo texto e a mesma foto de Covas foi publicado por um perfil que usa o nome e a foto do general reformado Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. De acordo com dados da plataforma Crowdtangle, a publicação teve ainda mais alcance, 25 mil visualizações até o dia 26, quando foi marcada como conteúdo falso pelo Facebook e, em seguida, apagada pelo autor. Neste caso a desinformação é ainda mais perigosa, porque atribui a mensagem falsamente a uma autoridade do governo federal.
Falso para o Comprova é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
A agência Aos Fatos também concluiu que o conteúdo dessas postagens é falso. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/texto-engana-ao-dizer-que-trump-indicou-weintraub-ao-banco-mundial/ | COMPROVA | Texto engana ao dizer que Trump indicou Weintraub ao Banco Mundial | null | 2020-06-26 | Publicação também afirma equivocadamente que a instituição monitora o COAF e a Receita Federal e que, a mando do presidente americano, o ex-ministro da Educação brasileiro tenha escolta do FBI
Conteúdo verificado: publicação feita em um perfil pessoal no Facebook e também compartilhada em outras redes com o título “*UM PESADELO CHAMADO WEINTRAUB*”.
É enganosa a informação que circula em redes sociais de que o ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, teria sido nomeado diretor-executivo do Banco Mundial pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. O texto induz a acreditar que a nomeação de Weintraub ao cargo já foi aceita e que o mandatário americano teria participação direta no processo. Ainda, fornece informações equivocadas sobre o papel da instituição, como um suposto monitoramento do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) e da Receita Federal.
Weintraub ainda não recebeu a chancela de outros países membros do Banco Mundial para assumir o cargo, conforme explicado pela própria instituição. O conteúdo viralizado nas redes também diz que o ex-ministro conta com escolta do FBI a mando de Trump, embora o Comprova não tenha encontrado nenhum registro que indique proteção especial ao ex-titular do MEC.
Como verificamos?
O Comprova fez uma busca em redes sociais, por meio das plataformas CrowdTangle e Tweetdeck, para tentar rastrear postagens relacionando indicações de Donald Trump a Abraham Weintraub e o FBI. O post mais antigo encontrado data de 20 de junho, em um grupo público do Facebook, mesmo dia em que o ex-ministro diz ter desembarcado nos EUA. Buscamos contato com o perfil do Facebook que realizou a postagem, mas não obtivemos retorno.
Levantamos, junto à assessoria de imprensa do Banco Mundial, quais as atribuições da entidade e se ela monitora instituições financeiras de outros países, como o COAF e a Receita Federal. Pesquisamos no site do órgão como funciona o processo de indicação a um cargo de diretor-executivo e quais tarefas são atribuídas a este posto.
Também apuramos como foi a entrada de Weintraub nos Estados Unidos por meio de publicações em veículos de imprensa e postagens do ex-ministro e de seu irmão em redes sociais. Buscamos no site do governo americano orientações sobre entrada de estrangeiros em meio à pandemia de covid-19 e procuramos o Departamento de Estado e o Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos, além do Itamaraty, para saber como Weintraub conseguiu chegar até o país. Apenas o Departamento de Estado respondeu aos nossos questionamentos.
Por fim, pesquisamos no site do FBI quais as responsabilidades do órgão de inteligência dentro do país e se isso inclui a escolta de autoridades estrangeiras. O Comprova também questionou a agência americana sobre uma possível proteção concedida a Weintraub, mas não obteve nenhum retorno.
Verificação
Indicado por Trump?
“Se muitos desejavam a saída do ministro da Educação de sua pasta, agora lamentam profundamente. O ex-ministro foi nomeado pelo Presidente Donald Trump como diretor executivo do Banco Mundial”, começam as publicações compartilhadas mais de 36 mil vezes em redes sociais desde o último dia 20 de junho.
Não há qualquer indício, no entanto, de que o presidente dos Estados Unidos tenha influenciado a nomeação de Weintraub ao Banco Mundial — que não é um órgão subordinado ao governo americano, mas uma instituição de desenvolvimento governada por 189 países membros.
Envolvido em polêmicas desde que assumiu o Ministério da Educação em abril de 2019, Weintraub renunciou ao cargo em 18 de junho deste ano, após desgaste político por afirmar que gostaria de ver presos os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), a quem chamou de “vagabundos”.
No vídeo em que anunciou sua saída da pasta, o economista também informou que havia recebido o convite para ser diretor do Banco Mundial, agradecendo ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por ter “referendado” a indicação.
No mesmo dia, o Ministério da Economia confirmou em nota oficial que o governo brasileiro oficializou a indicação de Weintraub para diretor executivo do grupo de países que o Brasil lidera no Banco Mundial. Não havia, no comunicado, qualquer menção ao presidente dos EUA, Donald Trump.
Questionado pelo Comprova se a indicação do ex-ministro brasileiro havia sido feita pelo mandatário norte-americano, o Banco Mundial afirmou, apenas, que “recebeu uma comunicação oficial das autoridades brasileiras” indicando Weintraub para o cargo.
A informação coincide com o processo de nomeação oficial detalhado no site da entidade.
O conselho administrativo do Banco Mundial possui 25 cadeiras. Destas, seis são indicadas diretamente pelos maiores acionistas da instituição, entre eles os Estados Unidos. O restante das cadeiras é ocupado por blocos divididos por critérios geopolíticos, chamados de “constituency”.
O grupo do Brasil é composto por oito outros países: Colômbia, República Dominicana, Equador, Haiti, Panamá, Filipinas, Suriname e Trinidad e Tobago. Estas são as nações que devem aprovar, ou não, a nomeação de Weintraub.
O nome do ex-ministro ainda não foi chancelado por estes países. Embora seja considerada uma formalidade, uma vez que o número de votos do Brasil supera o de todos os outros integrantes do “constituency”, Weintraub não foi oficializado, por enquanto, como diretor executivo do banco, como sugerem as postagens.
No último dia 24 de junho a Associação de Funcionários do Banco Mundial enviou uma carta ao Comitê de Ética da instituição pedindo a suspensão da indicação de Weintraub, até que seja conduzida uma investigação sobre falas preconceituosas do ex-ministro.
“De acordo com várias fontes, Weintraub publicou um tuíte de acusação racial que zomba do sotaque chinês (…) Weintraub deu declarações públicas contra a proteção dos direitos das minorias e a promoção da igualdade racial”, listou a associação, na carta. “Portanto, solicitamos formalmente ao Comitê de Ética que reveja os fatos subjacentes às múltiplas alegações, com vistas a suspender sua indicação até que essas alegações possam ser revisadas”, diz o pedido.
Banco Mundial monitora o COAF e a Receita Federal?
As publicações viralizadas afirmam, ainda, que o Banco Mundial tem acesso a todo o sistema financeiro do mundo e que monitora, inclusive, o COAF e a Receita Federal brasileira.
Por isso, sugerem as postagens, Weintraub teria “a chave dos segredos” e poderia monitorar todos aqueles que “tiveram laranjas” nas suas empresas ou “negociações dúbias”, se aprovado pela instituição: “Lula e seus filhos, juntos aos governadores e prefeitos corruptos”, listam as publicações.
Consultado pelo Comprova, o Banco Mundial classificou as afirmações como “incorretas”. “Ninguém do staff ou de qualquer board do Banco Mundial tem acesso a contas bancárias de terceiros”, acrescentou Juliana Braga, representante de Assuntos Externos da entidade, em Brasília.
O Banco Mundial tem como objetivo fornecer assistência financeira e técnica a países em desenvolvimento. Para isso, oferece empréstimos e créditos a juros baixos, além de bolsas. A instituição também facilita financiamentos e oferece recomendações sobre políticas.
Os diretores desta entidade se reúnem aproximadamente duas vezes por semana para supervisionar os negócios do Banco Mundial, incluindo a aprovação de empréstimos, de novas políticas, do orçamento administrativo e de estratégias de assistência a países, como explica o site da organização.
Proteção do FBI
O texto viralizado assegura, também, que Donald Trump solicitou que Weintraub seja colocado sob escolta do FBI “por tempo indeterminado”.
O FBI é uma agência de inteligência dos EUA que busca manter a segurança nacional por meio da proteção das leis do país. As investigações são focadas em violações da lei e monitoramento de possíveis ameaças. Ao todo, os EUA têm 17 agências de inteligência ligadas a departamentos distintos e com propósitos diferentes.
O Comprova entrou em contato com o FBI, tanto no escritório mantido no Brasil, dentro da embaixada de Brasília, quanto na sede em Washington, mas não obteve retorno até a publicação deste texto.
De acordo com o site do Departamento Nacional de Inteligência, diferentemente do que alega a postagem a respeito de Weintraub, a proteção a presidentes, chefes de estado e outras autoridades cabe ao Serviço Secreto — braço do Departamento de Segurança Interna (DHS) e que, embora possa atuar junto do FBI, funciona de forma separada.
É tarefa do Serviço Secreto, segundo o site oficial, fornecer proteção a “chefes de estado visitantes, ou outras autoridades, e cônjuges, além de outros estrangeiros ilustres que estejam visitando o país”.
Procurado por email, o DHS não respondeu a respeito da entrada de Weintraub nos EUA e se ele recebeu proteção do serviço de inteligência.
A ida de Weintraub aos EUA
Em 20 de junho — dois dias após o anúncio da saída de Weintraub do Ministério da Educação — o irmão do então ministro, Arthur Weintraub (que ocupa cargo de assessor especial da Presidência), publicou no Twitter que Abraham havia deixado o Brasil e desembarcado em Miami. A assessoria do MEC confirmou a informação aos veículos de imprensa no mesmo dia e declarou que ele havia pagado pela própria passagem e viajado em voo comercial.
A exoneração de Weintraub só foi publicada no Diário Oficial da União após a chegada dele aos EUA. O governo admitiu que o pedido de demissão veio depois da viagem. Em 23 de junho, o Diário Oficial publicou uma retificação da data da exoneração do ex-ministro, passando a demissão de 20 para 19 de junho.
Desde 24 de maio é vetada, nos EUA, a entrada de brasileiros ou viajantes que tenham passado pelo Brasil nos últimos 14 dias. Há uma lista de exceções fornecida pelas autoridades americanas, que inclui funcionários de governos estrangeiros, de organizações internacionais ou diplomatas — categoria na qual Weintraub, então ministro, se encaixava.
As demais entradas são permitidas a cidadãos norte-americanos e seus cônjuges, assim como filhos estrangeiros ou adotivos; pais e responsáveis de cidadãos americanos com menos de 21 anos; pessoas com residência permanente e legal nos EUA; irmãos estrangeiros de cidadãos americanos desde que ambos tenham menos de 21 anos; cidadãos estrangeiros que entram no país a convite de autoridades dos EUA para auxiliar no combate ao novo coronavírus; membros de tripulações aéreas ou marítimas (neste caso, são pessoas que já viajam sem visto de imigrante).
Não foi informado como Weintraub entrou nos EUA. Sem ocupar, ainda, cargo na diretoria do Banco Mundial, sua única forma de entrar no país, mesmo vindo do Brasil, seria por meio de um visto de autoridade ou mesmo uso do passaporte diplomático (este último também oferecendo risco de veto). Em ambos os casos, ele só teria a entrada permitida caso ainda fosse ministro.
O Comprova enviou um e-mail para o Departamento de Estado dos EUA, que controla entrada de estrangeiros no país, para saber se Weintraub utilizou um passaporte diplomático ou algum tipo de visto especial. O órgão informou que questões de visto são confidenciais e que não comentaria casos individuais. Ainda, acrescentou que exceções ao veto de entrada nos EUA cabem ao Departamento de Segurança Interna (conhecido pela sigla DHS).
Também procuramos o Itamaraty para saber como ocorreu a entrada de Weintraub nos EUA. Até o fechamento deste texto, não houve retorno.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conteúdos duvidosos ligados a políticas públicas que apresentam ampla repercussão em redes sociais e aplicativos de mensagens. É o caso da postagem envolvendo o ex-ministro Abraham Weintraub. Até 25 de junho, o conteúdo teve 48.251 mil interações e 36.872 compartilhamentos no Facebook, 4,2 mil retuítes e 13,6 mil curtidas no Twitter e 709 visualizações, 33 curtidas e 8 descurtidas no Youtube.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado de seu contexto original e usado de modo a induzir outro significado. É o caso da postagem, que embora cite a indicação de Weintraub ao Banco Mundial, fornece a falsa informação de que ele já seria detentor do cargo e que teria chegado lá por indicação do presidente dos EUA, Donald Trump.
Apesar do alinhamento político e ideológico do presidente da República Jair Bolsonaro com Trump, não há nenhum indício da interferência do mandatário no processo de escolha da diretoria-executiva do Banco Mundial, conforme explicado ao longo desta investigação. Também não houve nenhuma confirmação de que Weintraub teria recebido algum tipo de tratamento especial em sua chegada aos EUA.
O conteúdo já foi considerado falso pelo site Boatos.org.
A desinformação em torno de procedimentos que envolvem organismos internacionais já foi alvo de outras checagens do Comprova. No ano passado, uma publicação creditava o atraso da entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a “retrocessos no combate à corrupção”. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-a-covid-19-seja-uma-trombose-causada-por-bacteria/ | COMPROVA | É falso que a covid-19 seja uma trombose causada por bactéria | null | 2020-06-25 | Ao contrário do que afirmam publicações em aplicativos de mensagens e em redes sociais, a covid-19 é uma doença respiratória causada pelo vírus SARS-CoV-2 e cuja cura ainda não foi encontrada
Conteúdo verificado: Texto compartilhado por WhatsApp e em páginas e perfis no Facebook com o título “*Na Itália, o remédio contra o CORONAVÍRUS FOI FINALMENTE ENCONTRADO*.”
É falsa a informação que circula em aplicativos de mensagens e redes sociais alegando que um remédio para o novo coronavírus foi encontrado na Itália. O conteúdo afirma que o agente infeccioso da covid-19 é uma bactéria, e não um vírus, e que as mortes são provocadas por trombose.
Diferentemente do que alega o texto, ainda não foi encontrada uma cura para a doença e, tampouco, existem registros de que antibióticos, anti-inflamatórios e anticoagulantes sejam as únicas formas de tratamento eficaz. Além disso, o SARS-CoV-2 é um vírus.
A publicação ainda induz o leitor a acreditar que não se trata de uma infecção respiratória ao afirmar que o uso dos respiradores não é necessário em pacientes internados. O texto também insinua que internações em unidades de terapia intensiva são dispensáveis.
Como verificamos?
A verificação deste conteúdo foi realizada em duas etapas. Inicialmente, o Comprova investigou desde quando o conteúdo está circulando nas redes sociais, buscando uma pista das possíveis fontes nele indicadas. Utilizando a ferramenta TweetDeck, apuramos que a primeira menção no Twitter da covid-19 como uma bactéria que provoca trombose data do dia 25 de abril. No Facebook, a ferramenta Crowdtangle indicou que o conteúdo apareceu pela primeira vez no dia 14 de abril. Apesar do contato com os autores dessas postagens, o Comprova não conseguiu levantar de onde teria surgido a possível descoberta científica a que se referem os posts.
Na segunda etapa da verificação, o Comprova apurou se existe algum estudo ou manifestação de órgãos da saúde que associe à covid-19 uma “coagulação intravascular disseminada” (trombose) causada por uma bactéria. Nesta etapa, o Comprova consultou os estudos da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), além de manifestações do Ministério da Saúde da Itália – onde, segundo o contéudo, médicos teriam descoberto o real agente patológico causador e a cura para a covid-19. Além disso, para conferir se medicamentos como antibióticos, anti-inflamatórios e anticoagulantes poderiam, como sugere o conteúdo, se apresentar como a cura para a doença, o Comprova consultou o Ministério da Saúde, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH) .
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 25 de junho de 2020.
Verificação
Busca nas redes
Nas buscas pelo Tweetdeck, a primeira menção ao novo coronavírus como uma bactéria que provoca trombose é do dia 25 de abril no perfil de um rapaz da Argentina. O jovem, de 19 anos, alega ter encontrado a informação em um vídeo. Em contato com o Comprova por mensagem direta na rede social, o rapaz disse não se lembrar onde conseguiu o vídeo, mas afirmou que ou foi pelo Facebook ou pelo WhatsApp, pois assistiu junto de seus pais que, segundo ele, utilizam apenas as duas plataformas. Ele enviou, por e-mail, o arquivo do vídeo em questão.
O conteúdo, de oito minutos, inicia com a imagem de um post do Facebook, de 14 de abril, de um homem identificado como Fernando Héctor Petroni. No texto, ele diz, sem explicar a fonte da informação, que graças a autópsias feitas por italianos, descobriu-se que o vírus não provoca pneumonia e sim trombose e deve ser tratado com antibióticos, antiinflamatórios e anticoagulantes. A postagem é similar à que circula no WhatsApp em português e contém as mesmas informações.
Antes da mensagem, ele escreve: “Espero que se confirme e não seja uma perversa fake news”. No entanto, o vídeo não mostra este trecho da postagem. O Comprova enviou uma mensagem a Fernando pela rede social para descobrir onde ele conseguiu esta informação, mas até a publicação desta checagem não recebeu resposta.
Além de mostrar o conteúdo em redes sociais, o vídeo também apresenta áudios supostamente gravados por “profissionais panamenhos opinando sobre esta nova verdade da covid-19“. Três áudios em espanhol – uma voz masculina e duas femininas – são apresentados, com imagens da bandeira do Panamá ao fundo, acusando que a pandemia éfruto de uma conspiração.
Nenhuma das vozes se identifica, seja por nome ou profissão, ou menciona onde trabalha. Só pelos áudios, não é possível saber se são mesmo panamenhos e em que área atuam. O Comprova não encontrou o vídeo em plataformas ou redes sociais.
Usando o Crowdtangle para tentar rastrear as postagens sobre o assunto no Facebook, a mais antiga achada pelo Comprova foi justamente a de Fernando Héctor, de 14 de abril. Até 25 de junho, data do fechamento deste texto, ele tinha 4.722 amigos na rede social e 2.813 seguidores. O homem se descreve como “copensador, analista político, coaching ontológico, conferências de hipnose, PNL [sigla para Programação Neurolinguística] e filosofia budista”. Não encontramos nenhum perfil dele em outras plataformas.
Nos comentários, algumas pessoas apontam que a notícia é falsa e cobram que ele apague a postagem. Outras questionam onde ele teria encontrado as informações. O dono do perfil não respondeu a nenhum destes questionamentos.
Tanto no Facebook quanto no Twitter, foram encontradas postagens em português, inglês e espanhol com a mesma informação. Os textos apresentavam a mesma estrutura de parágrafos, com poucas alterações de palavras.
As alegações da mensagem: vírus ou bactéria?
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a covid-19 é uma “doença infecciosa causada por um coronavírus recém descoberto” (tradução livre), e não por uma bactéria como sugere a postagem. Endossando o que afirma a OMS, o Ministério da Saúde esclareceu em nota que a covid-19 é uma doença respiratória causada pelo vírus SARS-CoV-2.
O sequenciamento genético do SARS-CoV-2 foi iniciado ainda em março por cientistas brasileiros, em prol da chamada “vigilância genômica viral” no país. Como explicado pelo pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais Renato Santana de Aguiar, que fez parte da força-tarefa responsável pelo sequenciamento, esse tipo de esforço “é extremamente importante em qualquer epidemia viral, porque é por meio dele que identificamos o vírus”. Além disso, segundo o pesquisador, os ácidos nucleicos virais — que compõem o material genético do vírus — depois de identificados, são usados nos principais exames para o diagnóstico da doença.
Os testes RT-PCR, segundo a Sociedade Brasileira de Análises Clínicas, são considerados o “padrão ouro” para o diagnóstico da covid-19, e funcionam, segundo a Anvisa, por meio da detecção da presença de material genético do vírus nas amostras dos pacientes.
Na Itália, onde segundo a postagem médicos teriam descoberto que o SARS-CoV-2 seria uma bactéria, o Ministério da Saúde mantém uma página que reúne e desmente os principais boatos que envolvem a doença no país. No dia 29 de maio, em data posterior à das primeiras postagens nas redes sociais, o órgão afirmou ser falso que o agente causador da covid-19 seria uma bactéria. O que sugere que conteúdo semelhante ao desta verificação também circulou por lá.
O fato de a covid-19 ser causada por um vírus — o SARS-CoV-2 — é um consenso científico, sendo incorretas as afirmações feitas pelo autor da mensagem que viralizou.
A trombose e os sintomas
Em geral, segundo a Fiocruz, os vírus desse tipo costumam causar doenças respiratórias semelhantes a um resfriado.
No caso do novo coronavírus, porém, os sintomas das formas mais graves da doença ainda são objeto de estudo em todo o mundo. A chamada tempestade de citocinas, por exemplo, uma reação hiperinflamatória do organismo, tem sido uma das complicações nos casos mais graves. Recentemente, o corticóide dexametasona foi apontado como um possível redutor das mortes pela doença, nos casos de pacientes que necessitam de suporte respiratório.
Em maio, o Comprova verificou que era enganosa uma postagem que afirmava ser a trombose a principal causa de morte dos pacientes com a covid-19. O texto usava um estudo italiano, baseado em autópsias de vítimas do novo coronavírus realizadas em Bérgamo e Milão. Como demonstrado na verificação, porém, o fato de pacientes terem desenvolvido coágulos e problemas na circulação sanguínea não poderia ser considerado como a principal causa de morte. Segundo o diretor do departamento de anatomia patológica do Hospital Papa Giovanni XXIII, onde eram realizadas as autópsias, Andrea Gianatti, — um dos responsáveis pelo estudo —, a ideia era que anticoagulantes poderiam ser uma terapia adicional importante, já que a trombose “geralmente ocorreu após a fase mais aguda da pneumonia, isto é, depois dos sintomas mais típicos causados pelo coronavírus”.
Ainda sobre essa questão, em entrevista concedida ao Comprova por meio de áudios de WhatsApp, o Dr. Erich Vinícius de Paula, coordenador de hemostasia e trombose da Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH), afirmou que “dizer que a covid-19 é uma trombose é uma simplificação absolutamente incorreta”. Segundo o médico, a covid-19 é “uma doença complexa, infecciosa, que envolve uma resposta do sistema imune que atinge todo o corpo” e as complicações podem incluir tromboses. No entanto, afirma o médico, “tromboses são complicações de quase todas as doenças infecciosas”. Ele ressalta que o que existe, atualmente, é uma discussão no meio científico sobre se a covid-19 poderia ser uma doença infecciosa em que esse tipo de complicação ocorre de forma mais frequente, podendo, então, ser considerada um elemento “mais importante no conjunto de mecanismos que levam aos danos que o vírus causa no corpo”.
Sobre a afirmação de que “os respiradores nunca foram necessários, nem a unidade de terapia intensiva”, o Comprova também já publicou, em maio, a verificação de um vídeo, enganoso, que critica o uso de respiradores pulmonares. Como destacado na checagem, a estimativa é que cerca de 5% dos pacientes com covid-19 acabam precisando de ventiladores mecânicos, quando desenvolvem a síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA). Mesmo que alguns resultados de tratamentos realizados sem a utilização desse tipo de máquina demonstrem que ela pode não ser necessária em todos os casos, em outros, é essencial para salvar vidas. Já a internação de pacientes em unidades de tratamento intensivo tem ocorrido em todos os lugares do mundo onde há pacientes com quadro grave da covid-19, inclusive na Itália. A criação de protocolo para esse tipo de internação, aliás, já foi objeto de estudos científicos, como este, publicado na revista The Lancet.
Autópsias
Outra alegação da mensagem viral que verificamos foi a de que “os médicos italianos descumpriram a lei de saúde global da OMS para não realizar uma autópsia do coronavírus morto [sic]”. É importante ressaltar, primeiramente, que a Organização Mundial da Saúde é um órgão consultivo, vinculado às Nações Unidas, que atua apenas recomendando diretrizes sanitárias e fornecendo informações aos países, como o Comprova já publicou, em outra verificação. Em segundo lugar, não existe qualquer vedação à realização de autópsias de vítimas da covid-19. Ainda em março, poucos dias depois da declaração de que o mundo enfrentava, oficialmente, uma pandemia do novo coronavírus, a OMS publicou um guia para prevenção de infecções no manuseio de cadáveres das vítimas da doença. Um dos pontos tratados é justamente a realização de autópsias, e o documento recomenda a utilização de equipamentos de proteção compatíveis com os utilizados, geralmente, na autópsia de qualquer vítima de doenças respiratórias agudas. Não há, portanto, qualquer proibição a esse tipo de procedimento.
Remédios para a covid-19
A postagem, assim como outros conteúdos verificados pelo Comprova, sugere que um remédio para a covid-19 teria sido, finalmente, encontrado. No entanto, até o momento, não existem evidências contundentes de que exista um remédio eficaz para a doença. Os medicamentos administrados aos pacientes com covid-19 tratam os sintomas da doença até que o organismo possa produzir a resposta imunológica adequada para combate ao vírus.
Para compreender a que servem medicamentos antibióticos, anti-inflamatórios e anticoagulantes no tratamento dos pacientes com sintomas da covid-19, o Comprova consultou alguns órgãos da área da saúde.
Em nota, o Ministério da Saúde esclareceu que, até o momento, não há nenhum medicamento, substância, vitamina, alimento específico ou vacina que possa prevenir a infecção pelo coronavírus ou ser utilizado com 100% de eficácia no tratamento. E que a pasta divulga publicamente orientações sobre o uso de medicamentos no tratamento dos pacientes com a covid-19.
Na entrevista concedida ao Comprova, o médico Erich Vinícius de Paula também esclareceu que os medicamentos antibióticos, anti-inflamatórios e anticoagulantes não podem ser apresentados como a cura para a covid-19, mas como parte do tratamento dos pacientes — ao contrário do que afirma a postagem.
Segundo o médico, “a orientação para os pacientes passa pelo uso de oxigênio nos casos graves e um tratamento que chamamos de suporte”, que envolve um uso combinado desses três tipos de medicamento. Ele ainda esclareceu que “os antibióticos são usados na maioria dos casos graves porque é muito difícil excluir que junto com o vírus não haja uma infecção bacteriana associada, mas é muito importante entender que o antibiótico não é direcionado para tratar do vírus”
Em relação ao uso dos antiinflamatórios, o médico afirmou que é preciso atenção. “Nós não estamos falando [no tratamento da covid-19] daqueles antiinflamatórios comprados na farmácia para dor, que são usuais. Mas de drogas que têm o efeito de bloquear o sistema imunológico porque parte dos problemas da covid não são consequência direta do vírus mas sim da resposta do nosso sistema imunológico ao vírus e, quando ela é muito intensa, pode ao invés de nos proteger, nos causar problema.”
Sobre os anticoagulantes, ressaltou que “assim como em qualquer outra infecção se utilizam anticoagulantes para a prevenção da [ocorrência de] trombose. A maioria dos pacientes que está internado em uma UTI, [com um quadro da covid-19] grave ou qualquer outro problema como um AVC ou um infarto, eles vão usar anticoagulantes para a prevenção da trombose”. O médico ainda citou que existem estudos em andamento, inclusive no Brasil, para avaliar se clinicamente seria benéfico o uso de uma dosagem maior de medicamentos anticoagulantes em pacientes com a covid-19, uma vez que ainda não está claro se a doença induz a uma maior ocorrência de tromboses quando em comparação com outras infecções. Alertou, no entanto, que a recomendação da maioria das sociedades médicas de todo o mundo é que uma dose maior de anticoagulantes só deve ser ministrada aos pacientes no contexto de estudos clínicos. Recomendação essa endossada pela própria ABHH e pela Sociedade Brasileira de Trombose e hemostasia.
O Comprova consultou, ainda, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que informou que a indicação de tratamentos não faz parte de seu escopo.
A situação na Itália
Em abril, a Itália vivia um momento delicado no combate ao novo coronavírus. Na data da primeira postagem encontrada pelo Comprova, de 14 de abril, o país contabilizava 21.067 óbitos e era o segundo com a maior quantidade de mortes pela doença, atrás apenas dos Estados Unidos (então com 25.831 mortes). Os dados são da Universidade Johns Hopkins, referência internacional no levantamento de informações sobre a covid-19.
A situação atual da doença é diferente daquela do mês de abril. Dados do Ministério da Saúde italiano mostram que o pico da pandemia no país ocorreu entre os dias 20 e 25 de março e, desde então, o número diário de registros de casos e de óbitos vem diminuindo. Em 23 de junho, a Itália registrou 122 novos casos da doença, menor crescimento diário desde 26 de fevereiro, e 18 óbitos, menor número desde 2 de março.
Apesar da desaceleração, as autoridades italianas ainda pedem cautela à população — o país chegou a adotar, entre 9 de março e 4 de maio, medidas restritivas de isolamento social.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conteúdos suspeitos de ampla repercussão em redes sociais. No caso desta checagem, as principais publicações no Facebook somaram 469 interações e 449 compartilhamentos até o dia 25 de junho. Como se trata de uma informação publicada em várias línguas e diferentes plataformas — Facebook, WhatsApp e Twitter — é difícil precisar o real alcance da postagem, em especial no aplicativo de mensagens.
No entanto, trata-se de uma informação que está classificada como falsa no próprio Facebook e já foi investigada por Agência Lupa, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), AFP, Aos Fatos e Boatos.org. Fora do país, o conteúdo também foi verificado por veículos como Chequeado (Argentina), Maldito Bulo (Espanha), Reuters (Reino Unido) e Boomlive (Índia).
Para o Comprova, falso é um conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
A postagem é perigosa, pois induz o leitor a informações comprovadamente errôneas, como o fato de existir um remédio específico para o tratamento da covid-19 — a Organização Mundial de Saúde (OMS) alerta que ainda não foi encontrada uma cura para o novo coronavírus e que, embora a doença ainda seja objeto de estudos, já foi comprovado que é provocada por um vírus (SARS-Cov-2) e não uma bactéria.
Desde o início da pandemia, o Comprova já verificou mais de um conteúdo alegando cura ou tratamentos certeiros para a doença. Uma das checagens falsas apontava resultados em supostos estudos sobre tratamento com corticóide, enquanto outra sugeria “tratamento sem internação e sem sofrimento”. Um vídeo também afirmava que a descoberta de um anticorpo, em Israel, seria a solução contra o novo coronavírus.
Informações enganosas ou falsas sobre autópsias que indicam diagnósticos distintos também são recorrentes. O Comprova já investigou um texto que afirmava que a principal causa das mortes na Itália não era a covid-19; o conteúdo fazia menção ao tratamento com uso de anticoagulantes. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-hospitais-recebem-r-18-mil-por-cada-obito-registrado-como-covid-19/ | COMPROVA | É falso que hospitais recebem R$ 18 mil por cada óbito registrado como covid-19 | null | 2020-06-24 | A definição dos valores destinados pelo Ministério da Saúde para ações de enfrentamento à pandemia não toma como base o número de pacientes infectados ou mortos
Conteúdo verificado: Vídeo compartilhado no Facebook por um médico e no qual um homem não identificado afirma que hospitais recebem R$ 18 mil a cada registro de óbito por covid-19.
São falsas as afirmações feitas em um vídeo postado no Facebook pelo médico Édison Carmo, de Minas Gerais, dizendo que hospitais recebem R$ 18 mil para cada registro de óbito pelo novo coronavírus.
No vídeo, um homem não identificado mostra uma declaração de óbito de um morador do interior do Rio Grande do Sul. No documento, consta que ele tinha suspeita de covid-19. O autor do vídeo diz, mais de uma vez, que conversou com “o médico” que assinou a declaração e que ele teria confirmado que a informação foi incluída apenas para que o hospital pudesse receber o valor. Ao fazer a postagem, Carmo insinuou que isso estaria por trás do elevado número de óbitos no país. “Entendem agora o altíssimo número de mortes por covid-19?”, questionou.
As informações não são verdadeiras porque a definição dos valores destinados pelo Ministério da Saúde para ações de enfrentamento à pandemia não toma como base o número de pacientes infectados ou mortos. A vítima em questão sequer foi atendida em um hospital e, sim, em uma Unidade Básica de Saúde (UBS). Além disso, tudo indica que o autor do vídeo não teve qualquer contato com a profissional que assinou a declaração de óbito — uma médica mulher. A inclusão da suspeita no documento atendeu a uma recomendação de órgãos de saúde.
Como verificamos?
A equipe do Comprova usou as informações que aparecem na declaração de óbito mostrada no vídeo para identificar a vítima: Henrique José Pena, de 81 anos. A morte ocorreu na cidade de Ipê, na Serra Gaúcha. Com essas informações, entramos em contato com a prefeitura do município, que enviou uma nota sobre o caso. A assessoria de imprensa também forneceu o contato de um sobrinho da vítima, com quem conversamos por telefone.
Depois tentamos encontrar a médica que assina a declaração, Heloisa Joanette Dossin, identificada pelo número de sua inscrição profissional, que consta do documento. A prefeitura informou que ela trabalha para o município por meio do programa Mais Médicos, do governo federal, mas está em férias no momento. De acordo com o registro do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Sul (CRM-RS), Heloisa é pediatra com endereço na cidade de Caxias do Sul, a 54 quilômetros de Ipê. Tentamos contato pelo telefone que aparece no registro, sem sucesso. A assessoria do município nos forneceu, então, o contato da Vigilância Epidemiológica, que esclareceu as circunstâncias da morte de Pena e as razões pelas quais foi incluída na declaração a suspeita de covid-19. Além disso, conversamos por telefone com um funcionário da Funerária Anziliero, de Ipê, para esclarecer se Pena havia sido enterrado sem velório, o que se confirmou.
Em seguida, buscamos mais informações sobre Édison do Carmo, autor da postagem por meio da qual o vídeo viralizou. Édison é médico cardiologista e mora em Patos de Minas, cidade no interior de Minas Gerais — a 1.500 quilômetros de Ipê. Conseguimos falar com ele por meio de um dos números de telefone que consta na base do Conselho Federal de Medicina.
Também solicitamos esclarecimentos ao Ministério da Saúde sobre como funcionam os repasses federais para ações de enfrentamento à pandemia nos estados e municípios. O órgão se manifestou por nota.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 24 de junho de 2020.
Verificação
No vídeo, um homem, que não aparece na imagem, mostra a declaração de óbito de Henrique José Pena, de 81 anos, e diz que ele “infartou dormindo”. Na sequência, chama a atenção para o bloco em que é indicada a causa mortis, no qual consta, dentre outros, “suspeita de covid-19”. Segundo o autor do vídeo, em função disso, o paciente não pôde ser velado. “Aí a família tinha que ir na casa, colocar o cara no saco e ir direto pro cemitério sem ter velório, sem ter nada”, diz. O homem afirma ter cobrado explicações do médico que assinou a declaração. Segundo ele, o profissional teria informado que os hospitais recebem R$ 18 mil a cada registro de óbito por covid-19.
As afirmações não são verdadeiras. Em nota, o Ministério da Saúde reiterou ao Comprova que os repasses de recursos para o enfrentamento à pandemia não são definidos de acordo com o registro de mortos.
Conforme é possível verificar no próprio vídeo, a declaração de óbito é de um morador de Ipê, no Rio Grande do Sul. Também por meio de nota, a Secretaria de Saúde do município informou que o paciente em questão morreu em casa e, como não houve assistência médica, não foi possível precisar a causa da morte.
Por conta disso, a Secretaria alega ter seguido a uma resolução editada no dia 6 de abril pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (Cremers) em conjunto com a Secretaria Estadual de Saúde, o Conselho das Secretarias Municipais de Saúde (Cosems-RS) e a Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre. Os órgãos recomendam que, em situações de casos suspeitos de covid-19, os médicos registrem “claramente a sequência de diagnósticos”, bem como “as outras condições clínicas significativas que contribuíram para a morte e que não entraram na sequência que determinou a morte.”
A declaração de óbito
Por telefone, a Vigilância Epidemiológica de Ipê, município de 6,6 mil habitantes na região gaúcha de Campos de Cima da Serra, confirmou que a declaração de óbito mostrada no vídeo é verdadeira. Henrique José Pena, de 81 anos, faleceu em sua residência na madrugada do dia 16 de junho. Como em Ipê não há hospital, o óbito foi registrado na Unidade Básica de Saúde (UBS) da localidade. Um sobrinho de Henrique, Mário Pena, também confirmou a veracidade do documento, mas não quis dar entrevista, sob alegação de que o episódio já trouxe muito desgaste à família.
A afirmação feita pelo autor do vídeo de que teria conversado com “o médico” responsável pelo atestado não se sustenta porque a inscrição que consta no documento é de uma médica. Trata-se da pediatra Heloísa Joanette Dossin, que atua na rede municipal de saúde por meio do programa Mais Médicos, do governo federal.
Conforme informações da Vigilância Epidemiológica, Pena morava sozinho e o último contato que teve com outras pessoas foi no fim da tarde do dia anterior à morte — que, conforme a declaração, se deu por parada cardiorrespiratória. Como não havia ninguém que pudesse informar se ele vinha apresentando sintomas respiratórios e em função de suas comorbidades — que incluíam problemas cardíacos, problemas renais e anemia severa —, a equipe decidiu coletar material biológico e encaminhar para exame no Laboratório Central do Estado (Lacen), em Porto Alegre. Embora a suspeita tenha sido incluída na declaração, o teste deu negativo para covid-19.
Apesar disso, em função da suspeita, Pena foi enterrado no mesmo dia da morte sem ser velado, conforme afirmação feita no vídeo. Segundo informou por telefone um funcionário da Funerária Anziliero, Plínio Anziliero, ele foi enterrado no mesmo dia do óbito e o procedimento seguiu a orientação do Ministério da Saúde: o corpo foi colocado dentro de um saco, com caixão lacrado e sem velório.
O Comprova não conseguiu contato direto com a médica Heloísa Dossin, mas tanto a assessoria de imprensa do município quanto a Vigilância Epidemiológica negaram que qualquer informação sobre o caso tenha sido repassada para pessoas de fora da Prefeitura. Alegaram ainda que não sabem quem é o autor do vídeo e desconhecem como ele teve acesso à declaração de óbito.
Quem é Édison Carmo
O responsável por compartilhar o vídeo é o cardiologista Édison Bernardo do Carmo, com inscrição ativa junto ao Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais. Morador do município de Patos de Minas, ele trabalha no Instituto do Coração do Alto Parnaíba e mantém um consultório particular.
Em seu perfil no Facebook, onde costuma publicar conteúdos de apoio ao governo Bolsonaro e críticas ao Supremo Tribunal Federal (STF), indica como um de seus locais de trabalho o Instituto Dante Pazzanese, em São Paulo. Por telefone, porém, ele informou que apenas cursou residência médica no hospital paulista. Atualmente, devido às orientações de distanciamento social e por integrar os grupos de risco (tem 61 anos), Carmo disse que está atendendo somente no consultório, sem frequentar Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs).
Questionado a respeito da publicação, ele alegou desconhecer a origem do vídeo e disse que não sabe quem é o sujeito que fala na gravação. Carmo alegou que compartilhou o vídeo após recebê-lo via WhatsApp de um colega, mas não tem lembrança de quem se trata, e que não imaginava a repercussão. Disse, inclusive, que se arrependeu de postar e que, quando decidiu apagar, a publicação já havia sido retirada pela própria rede social.
Por que investigamos?
O Projeto Comprova apura textos, imagens e vídeos com desinformações sobre a pandemia de covid-19. O post de Facebook do dia 22 de junho em que Édison do Carmo compartilhou o vídeo com informações falsas foi visualizado 21 mil vezes antes de ser apagado pelo Facebook.
Uma busca na plataforma CrowdTangle mostrou que o registro mais antigo do vídeo no Facebook é também do dia 22 de junho, publicado pela página “Olavo Tem Razão” menos de uma hora antes do post de Carmo. O perfil é de seguidores do escritor Olavo de Carvalho, guru do presidente Jair Bolsonaro, e publica mensagens de apoio ao governo. Foram 15 mil visualizações até o dia 24 de junho.
A pandemia de covid-19 está no centro do debate político brasileiro. De um lado estão estados e municípios, que precisam lidar diretamente com problemas causados pela doença, como hospitais lotados e falta de equipamento. Do outros, apoiadores do presidente e grupos de direita minimizam o impacto do novo coronavírus no país, alinhados com o discurso de Bolsonaro, que já chamou a covid-19 de “gripezinha” e afirmou que o Brasil não ia sofrer com os efeitos dela. No dia 24 de junho, o Brasil era o segundo país com mais casos confirmados de covid-19 em todo o mundo: 1.145.906, de acordo com levantamento da Universidade John Hopkins. O país também é o segundo em número de mortes: foram 52.645 óbitos até 24 de junho, ainda segundo a universidade americana.
Com isso, surgem boatos que acusam governos estaduais e municipais de inflar o número de mortes para prejudicar o governo federal ou para desviar verbas. Há menos de uma semana, o Comprova já verificou um outro vídeo com acusações de que os governos recebem pelo número de mortos. Outros conteúdos desmentidos alegavam fraude nos registros de óbitos em cartórios, caixões vazios no Amazonas e redução no número de sepultamentos em São Paulo.
A Serra gaúcha, onde fica o município de Ipê, foi uma das mais atingidas pela covid-19 no Rio Grande do Sul. No dia 13 de junho, três dias antes da morte de Henrique José Pena, a região foi classificada pelo governo do estado como bandeira vermelha. Isso significa que há risco epidemiológico alto e, portanto, restrições mais rígidas para conter o novo coronavírus.
As prefeituras da região, que concentra pólos de turismo e distritos industriais, anunciaram a abertura de 31 novos leitos de UTI distribuídos por quatro cidades. Com isso, a Serra foi reclassificada para a laranja, ou seja, com médio risco epidemiológico.
As agências de checagem Lupa e Boatos.org também verificaram o vídeo com desiformações sobre a morte de Henrique José Pena. A conclusão foi a mesma: a denúncia de pagamento por mortos de covid-19 é falsa.
Falso para o Comprova é todo o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira. Neste caso, o autor do vídeo usou uma declaração de óbito verdadeira para criar uma narrativa falsa. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/uso-correto-de-mascaras-reduz-chances-de-contaminacao-pelo-coronavirus-e-nao-torna-o-sangue-acido/ | COMPROVA | Uso correto de máscaras reduz chances de contaminação pelo coronavírus e não torna o sangue ácido | null | 2020-06-24 | Especialistas negam a veracidade das afirmações feitas por um médico em vídeo que viralizou nas redes sociais. Eles garantem que as máscaras recomendadas pelas autoridades de saúde permitem as trocas de gases com o ambiente, reduzem as chances de infecção pelo novo coronavírus e não causam aumento de gás carbônico no sangue nem tornam o sangue ácido
Conteúdo verificado: Vídeo gravado pelo médico João Vaz e compartilhado por diversos perfis no Facebook e no WhatsApp, com a legenda: “Médico diz para que serve a máscara!! Enfim, lucidez, inteligência e seriedade”.
São enganosas as afirmações feitas em vídeo pelo médico João Vaz, no qual ele diz que o uso prolongado da máscara não tem eficácia para combater a propagação do novo coronavírus. Segundo ele, a proteção “só tem uma serventia, não para nós, mas para o vírus”. Ainda de acordo com Vaz, isso ocorreria porque, ao inspirar o ar expirado na máscara, o corpo absorveria partículas de gás carbônico, o que tornaria o sangue mais ácido e “um meio propício ideal para o vírus”.
Segundo especialistas ouvidos pelo Comprova, Vaz está “completamente errado” e o que diz “é contra qualquer racionalidade”. Leonardo Weissmann, infectologista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia, afirmou que “o uso correto de máscaras, cobrindo nariz e boca, reduz a transmissão do vírus e não causa qualquer mal ao organismo”. Ele explicou que a máscara não causa, em nenhuma situação, o aumento de gás carbônico no sangue. “Os poros das máscaras, mesmo não sendo visíveis, permitem as trocas gasosas. O indivíduo que está protegido com máscara não vai inalar seu próprio gás carbônico.”
Em documento publicado no dia 5 de junho, a Organização Mundial da Saúde (OMS) lista potenciais malefícios decorrentes do uso prolongado da máscara pelo público em geral, mas não cita nenhuma desvantagem sobre a troca de gases comentada por João Vaz. Dificuldades respiratórias, lesões cutâneas e agravamento da acne estão entre os danos. No texto “Orientações Gerais – Máscaras faciais de uso não profissional”, divulgado em 3 de abril, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), agência ligada ao Ministério da Saúde, reforça que os equipamentos “não fornecem total proteção contra infecções, mas reduzem sua incidência” e recomenda o uso em locais públicos, como supermercado e farmácia.
Em entrevista ao Comprova, o médico afirmou: “É a minha opinião [o que ele diz no vídeo]”.. “Tenho 49 anos de profissão, doutorado na Alemanha, não estou para discutir com ninguém. Cada um que aprenda.” Questionado sobre a existência de estudos que comprovem suas afirmações, ele respondeu que tem “evidência pessoal com os 5.200 pacientes” que havia atendido até a data da conversa (23 de junho). Em maio, João Vaz já havia aparecido em uma verificação do Comprova que considerou suas afirmações enganosas. Dentre outras declarações, ele criticava o isolamento social e o uso de respiradores.
Como verificamos?
O passo inicial foi verificar se João Vaz é mesmo o homem que aparece no vídeo e se ele é, de fato, médico. Para isso, o Comprova fez uma busca no portal do Conselho Federal de Medicina (CFM) com o nome do médico e comparou a fotografia do cadastro com o vídeo. Em seguida, procuramos e encontramos as redes sociais do médico e confirmamos que eram a mesma pessoa.
Depois, o Comprova pesquisou sobre as diretrizes das autoridades de saúde sobre o uso de máscaras – se há qualquer contra-indicação relacionada à troca de gases na utilização prolongada. Encontramos, no site da Organização Mundial da Saúde (OMS), um documento sobre o uso de máscaras por profissionais da saúde e pelo público em geral. No site da Anvisa, também encontramos documentos online sobre o uso da proteção.
O Comprova também entrevistou médicos infectologistas para confirmar a veracidade da relação entre o uso da máscara, a inspiração de gás carbônico e a acidificação do sangue. Conversamos com Raquel Muarrek, infectologista da Rede D’Or, Leonardo Weissmann, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia e infectologista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, e Jamal Suleiman, infectologista também do Emílio Ribas.
Tentamos contato com Claudia Vegans, autora da postagem que mais viralizou no Facebook, mas não conseguimos falar com ela. Por último, conseguimos falar com o médico João Vaz pelo número de celular citado por ele no final do vídeo.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 24 de junho de 2020.
Verificação
O que dizem as autoridades?
O Comprova buscou no site da OMS o documento em que o órgão aborda o uso prolongado de máscara por profissionais da área da saúde e pelo público em geral. O texto, publicado no dia 5 de junho, cita as desvantagens da utilização, mas em nenhum momento há referência a troca de gases ou acidificação sanguínea. Como mencionamos, entre os danos citados estão dificuldades respiratórias, lesões cutâneas e agravamento da acne. Há 10 desvantagens listadas pela instituição – os últimos pontos são “dificuldade em comunicar com clareza, potencial desconforto e falsa sensação de segurança, o que pode levar a uma menor adesão a outras medidas preventivas essenciais, como o distanciamento físico e a higiene das mãos”.
No site da Anvisa, encontramos algumas publicações referentes a esta proteção. A postagem sobre o uso de máscaras não profissionais data do dia 3 de abril e afirma que elas “atuam como barreiras físicas, diminuindo a exposição e o risco de infecção para a população em geral”.
O que dizem os especialistas?
Jamal Suleiman, infectologista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, contou por telefone ter recebido o vídeo de alguns de seus pacientes, que perguntavam se as afirmações eram verdadeiras. Para o Comprova, ele escreveu que “a justificativa dele não faz o menor sentido. É contra qualquer racionalidade. A máscara concretamente reduz a chance de infecção”. O infectologista fez um levantamento no banco de arquivos científicos PubMed para ver se havia algum texto sobre o assunto, mas “obviamente, não tinha absolutamente nada falando disso”, conforme ele contou.
Também em entrevista por telefone, Raquel Muarrek, infectologista da Rede D’Or, afirmou, logo após assistir ao vídeo de Vaz, que “é fake”. “Esse negócio do gás carbônico não tem nada a ver, porque a respiração entra e sai [através da máscara]”, disse. De acordo com Muarrek, a proteção não retém as moléculas de gás carbônico nem o vírus. “O que ele falou é completamente errado”, completou.
Terceiro entrevistado nesta verificação, Leonardo Weissmann também é infectologista do Emílio Ribas e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia. Após assistir ao vídeo de João Vaz, ele foi enfático ao escrever: “O conteúdo deste vídeo é uma grande bobagem”. Ele explicou que o uso da máscara não torna o sangue ácido em nenhuma situação. De acordo com ele, a acidificação ocorre em pessoas que têm doenças pulmonares, independentemente da proteção.
Quem é o homem que aparece no vídeo?
O homem que aparece na filmagem, e se identifica como João Vaz, é João Carlos Luiz Vaz Marques Leziria. De acordo com o Conselho Federal de Medicina (CFM), ele é médico e sua inscrição junto ao CRM está em situação regular.
Em entrevista ao Comprova, contou ter nascido em Santos, no litoral paulista, ter 75 anos e ser “fã da hidroxicloroquina”.
Em maio, ele apareceu em outro vídeo classificado como enganoso pelo Comprova. Na gravação, ele defendia a cloroquina e criticava o isolamento social.
Vaz também foi candidato a deputado federal pelo PSDB nas eleições de 2014 e 2018, mas não foi eleito em nenhuma delas. Perguntado se vai se candidatar novamente, ele foi categórico ao dizer que não. “Chega, estou velho”, declarou.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais. Quando o material aborda assuntos relacionados à covid-19, a verificação se torna ainda mais importante, pois coloca a saúde das pessoas em risco. O vídeo checado pelo Comprova tinha mais de 572 mil visualizações no Facebook e mais de 38 mil compartilhamentos até o dia 24 de junho. A postagem no perfil pessoal no Facebook foi identificada e rotulada como informação falsa no dia 23 de junho, após verificação do site Aos Fatos, que afirmou não haver evidências de que o uso prolongado de máscaras torne o sangue ácido.
Ao dizer que a máscara deve ser usada apenas em situações específicas, como quando estamos próximos de alguém, João Vaz vai contra uma das poucas medidas eficientes já conhecidas contra o novo coronavírus, que matou mais de 52.645 pessoas no Brasil até o dia 24 de junho. Embora não haja menção política no vídeo, as afirmações de João sobre a “ineficiência” do uso prolongado da máscara segue o pensamento do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Com frequência, o chefe do executivo aparece sem a proteção em eventos;no dia 23 de junho, a Justiça determinou que ele passe a usar o equipamento, sob condição de ser multado em R$ 2 mil caso descumpra a decisão.
Conteúdos criticando o uso da máscara viralizam rapidamente e o Comprova já investigou outros casos, como o vídeo que afirmava, falsamente, que a proteção reduzia a imunidade.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/homem-no-ceara-foi-preso-por-crime-militar-e-nao-por-criticar-compra-de-ventiladores/ | COMPROVA | Homem no Ceará foi preso por crime militar e não por criticar compra de ventiladores | null | 2020-06-23 | Vídeo nas redes sociais mostra entrega de mandado de prisão preventiva a um cabo da Polícia Militar, em Fortaleza
Conteúdo verificado: Vídeo acompanhado de legenda afirmando que um cidadão de Cascavel, no Ceará, recebeu voz de prisão por criticar o governador do estado, Camilo Santana (PT)
São enganosas as postagens nas redes sociais que alegam que um cidadão do município de Cascavel foi preso por criticar o governador do Ceará, Camilo Santana (PT), sobre a compra de respiradores artificiais para o tratamento de pacientes de covid-19. O conteúdo é acompanhado de um vídeo mostrando a entrega de um mandado de prisão preventiva, sem indicar os envolvidos ou a localidade. Na legenda, aparece uma inscrição irônica: “Governo democrático é outra coisa”.
As publicações enganam ao sugerir que o caso tem relação com a pandemia de covid-19 e que teria ocorrido com um civil, quando na verdade mostram o anúncio de prisão preventiva do policial militar Paulo José Monteiro da Cunha, conhecido como Cabo Monteiro. Ele responde a uma denúncia de crime militar na Justiça do Ceará, com base nos artigos 160 e 166 do Código Penal Militar (CPM) — que tipificam como crime o desrespeito a superior diante de outro militar e críticas públicas a atos de superiores ou a qualquer resolução do governo, respectivamente.
A gravação não foi feita em Cascavel – cidade cearense localizada na Região Metropolitana –, mas na capital, Fortaleza, onde mora o Cabo Monteiro, no dia 17 de junho. Não foi possível identificar a autoria ou a publicação original, mas fica claro que as imagens foram filmadas de dentro da residência. Além disso, a denúncia apresentada pelo Ministério Público Estadual do Ceará faz referência a sete vídeos gravados e publicados pelo Cabo Monteiro entre março e abril deste ano, e nenhum deles aborda compra de respiradores.
A decisão que decretou a prisão preventiva foi expedida em 12 de junho pelo juiz Roberto Soares Bulcão Coutinho, da comarca de Fortaleza da Auditoria Militar do Estado do Ceará. De acordo com o documento, existem “indícios de materialidade e provas da autoria de crimes militares” pelo Cabo Monteiro. Para a Justiça, a alegação de liberdade de expressão não caberia no caso porque “o representado transborda em sua conduta, indo além da garantia constitucional, para, sob seu manto, proferir ofensas e tecer comentários pejorativos, que se revelam, em análise superficial exigida no presente momento, perfeitamente adequadas a tipos penais”.
A medida cautelar é justificada, na decisão, pela postagem recorrente de críticas que constituiria “séria ameaça e grave comprometimento dos primados da hierarquia e disciplina militares”. O juiz decidiu que o cabo deveria ficar em prisão domiciliar com monitoramento eletrônico e não poderia entrar em redes sociais e aplicativos de mensagem para postar conteúdos sobre temas e pessoas ligados ao meio militar e da área de segurança pública. Em caso de descumprimento, o PM poderá ser encaminhado para um estabelecimento carcerário.
Procurado pelo Comprova, o advogado de defesa do Cabo Monteiro, Carlos Bezerra Neto, afirmou que a prisão é “abusiva” e que já entrou com pedido de revogação na Justiça Militar. Para o advogado, não existem elementos suficientes que justifiquem a medida. Argumenta ainda que, mesmo se fosse condenado, dificilmente o PM seria preso, porque a soma das penas máximas equivalem a apenas dois anos de detenção.
Sobre o comentário nas redes sociais de que o vídeo mostraria um atentado à liberdade de expressão, Bezerra Neto afirma que a existência de outros dois casos recentes traz margem para esse tipo de interpretação. Ele fez referência à prisão do soldado da Polícia Militar do Ceará (PMCE) Márcio Wescley Oliveira dos Santos e ao afastamento do delegado da Polícia Civil João Henrique da Silva Neto. “Não é que achamos que seja contrário ao Código Penal Militar, mas a circunstância nos faz (sic) crer que existe algo além, talvez por ser momento eleitoral, alguma intenção de movimentar os processos dessa forma.”
O promotor Sebastião Brasilino de Freitas, da Promotoria de Justiça Militar e Controle Externo da Atividade Policial Militar do Ministério Público Estadual do Ceará, afirmou em entrevista ao Comprova que o pedido de prisão preventiva tem o intuito de “cessar o cometimento de crimes que ele (o policial) vinha fazendo”. O promotor diz ainda: “A gente prevenia e ele cometia. Tivemos que tomar uma medida severa” e acrescenta “ele (policial) como cidadão pode ter o direito, como militar não. Ele reiterava e, sendo avisado, continuava a fazer. Só teve um jeito que foi pedir a prisão e que se abstivesse de fazer movimentações nas redes sociais”.
A opção pela prisão domiciliar, explica o promotor, se deve à crise sanitária do novo coronavírus. Em casa, o soldado estaria mais resguardado de um possível contágio. No entanto, caso as medidas judiciais sejam descumpridas, o promotor explica que o MP pode acionar a Justiça e pedir o cumprimento da decisão no 5º Batalhão da Polícia Militar do Estado do Ceará (BPM), unidade localizada no Centro de Fortaleza que abriga PMs presos preventivamente ou condenados à reclusão.
Como verificamos?
O primeiro passo foi tentar identificar as pessoas que aparecem no vídeo postado por, pelo menos, quatro perfis distintos no Facebook. Um dos comentários em uma das postagens indicava que o homem em questão alvo do mandado de prisão era o “Cabo Monteiro”. A partir dessa identificação, buscamos perfis nas redes sociais com esse nome e encontramos as páginas do cabo Paulo José Monteiro da Cunha no Facebook e no Instagram.
Analisamos as imagens e confirmamos tratar-se da mesma pessoa. Em pelo menos um vídeo, o policial fala “aqui em Fortaleza”, indicando estar na capital cearense. O governo estadual confirmou, posteriormente, que a ação ocorreu em Fortaleza.
Como a postagem em questão também mencionava que o fato havia ocorrido no Ceará, partimos, então, em busca de informações junto à Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) do Ceará, ao Tribunal de Justiça do Ceará (TJ-CE), à Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública (CGD) e ao Ministério Público Estadual do Ceará. As instituições responderam via e-mail. O titular da Promotoria de Justiça Militar e Controle Externo da Atividade Policial Militar do Ministério Público Estadual do Ceará, Sebastião Brasilino de Freitas, foi entrevistado por telefone.
Também procuramos no sistema de busca eletrônico de processos judiciais do TJ-CE o nome completo do policial Paulo José Monteiro da Cunha. Nesse sistema, é possível saber se há processos tramitando incluindo aquela pessoa. Encontramos um processo (0605788-03.2020.8.06.0001) envolvendo o Cabo Monteiro. Ele estava em sigilo até o dia 22 de junho de 2020. Depois, foi aberto pela Justiça e conseguimos acessar as informações.
Outra busca efetivada pela equipe do Comprova foi o nome completo do policial no Diário Oficial do Estado do Ceará para averiguar se havia alguma menção a ele na publicação.
Além disso, entramos em contato com a irmã do Cabo Monteiro, Jéssica Monteiro, que nas redes sociais tem um vídeo, postado no dia 18 de junho, tratando da prisão do policial. Também entrevistamos o advogado do PM, Carlos Bezerra Neto, da Associação dos Profissionais da Segurança (APS).
Outro procedimento adotado foi realizar uma busca simples e genérica no Google como os termos “Cabo Monteiro Ceará”. Detectamos que a alcunha “Cabo Monteiro” também aparece em matérias publicadas por sites de conteúdo local do Ceará como: Diário do Nordeste, O Povo, G1CE e até em um texto na página do Ministério Público Estadual do Ceará. Todas as matérias fazem referência à participação do PM na paralisação de policiais e bombeiros militares em fevereiro de 2020.
Verificação
O Comprova encontrou o vídeo publicado com descrições enganosas em diversos perfis no Facebook e no Twitter desde o dia 17 de junho. Uma das versões afirma que um cidadão de Cascavel foi preso por criticar o governador do Ceará, Camilo Santana (PT). Outra circula com o comentário “Mais um cidadão preso!” e uma figurinha representando uma pessoa calada. As postagens sugerem que as autoridades públicas estariam censurando opositores do governo do estado.
No vídeo, dois policiais aparecem do lado de fora de uma residência conversando com ao menos três pessoas dentro. Um dos policiais afirma que foi decretada prisão preventiva em modalidade domiciliar e que a pessoa deveria se “abster de fazer postagens”. A seguir, um homem dentro da casa, aparentemente filmando a si mesmo, diz: “Infelizmente, estou recebendo voz de prisão, uma decisão de juiz que agora eu estou em prisão domiciliar (…) Eu estou sendo conduzido por causa dos vídeos, se vocês tiveram a oportunidade de ver, acho que foi um vídeo de eu pedindo ao governador que parasse de gastar com plantas enquanto a população cearense está morrendo”.
A partir da análise das imagens e de uma dica contida nos comentários de uma das publicações enganosas, a reportagem identificou o homem como sendo o cabo da Polícia Militar do Ceará (PMCE) Paulo José Monteiro da Cunha. A informação foi confirmada pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Ceará (SSPDS/CE).
Em nota, o órgão declarou que “o vídeo trata do cumprimento do mandado de prisão preventiva contra o cabo PM Monteiro, ocorrido no último dia 17 de junho, na sua residência, localizada no bairro Parangaba, em Fortaleza”. Ainda segundo a secretaria, a Justiça Militar Estadual determinou a prisão domiciliar do policial por crime militar, que nesse caso envolveria “críticas a autoridades militares e à instituição e incitação”. Também foi informado o número do processo.
O Comprova obteve a íntegra da decisão judicial depois que o sigilo de Justiça foi removido na segunda-feira, 22 de junho. A acusação contra o Cabo Monteiro está baseada nos artigos 160 e 166 do Código Penal Militar, criado pelo Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969. O primeiro artigo estabelece como crime “desrespeitar superior diante de outro militar”, enquanto o segundo criminaliza a ação de “publicar o militar ou assemelhado, sem licença, ato ou documento oficial, ou criticar publicamente ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do Governo”.
Denúncia do MP cita sete vídeos
A denúncia foi apresentada pelo Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) em 4 de maio. Nela, a Promotoria de Justiça Militar afirma que o cabo Paulo José Monteiro da Cunha usa o Instagram para publicar “vídeos curtos em que tece críticas aos seus superiores hierárquicos e exorta aos militares que lhe ‘seguem’ uma série de práticas que, facilmente, se apresentam como ímprobas, transgressionais e criminosas”.
O documento cita, então, sete conteúdos publicados entre os dias 22 de março e 28 de abril de 2020. Neles, Monteiro faz críticas ao prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio (PDT), ao governador do estado, Camilo Santana (PT), e ao comandante-geral da Polícia Militar do Ceará, coronel Alexandre Ávila de Vasconcelos, sobre assuntos como a distribuição de materiais de higiene e equipamentos de proteção individual aos policiais, o atendimento médico de emergência a agentes feridos e gastos do poder público durante a pandemia. Não há, porém, citação a conteúdos sobre “compra de respiradores” na denúncia apresentada, ao contrário do que afirma o boato enganoso.
O termo utilizado é uma referência à investigação da Polícia Federal que encontrou indícios de irregularidades na compra de 150 equipamentos pela Prefeitura de Fortaleza e pelo Instituto Doutor José Frota (IJF) — o que faria com que o alvo da declaração fosse o prefeito Roberto Cláudio (PDT), e não Camilo Santana (PT). Em ao menos duas publicações posteriores, não citadas na denúncia, o PM de fato abordou o assunto. Ele postou uma foto do prefeito com a frase “testes rápidos e respiradores superfaturados” e uma imagem própria com a legenda “CPI dos respiradores. #EuApoio”.
Soldado também foi acusado de crime militar
O Comprova verificou que matérias de jornais como Diário do Nordeste, O Povo e o site G1CE também apontam que a Justiça Estadual do Ceará, no dia 2 de junho, decretou a prisão preventiva do soldado da Polícia Militar do Ceará (PMCE) Márcio Wescley Oliveira dos Santos. A decisão imputa ao policial a publicação de mensagens nas redes sociais com conteúdo ofensivo ao governador Camilo Santana, ao secretário da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), André Costa, e ao comandante da Corporação, coronel Alexandre Ávila.
O juiz Roberto Soares Bulcão Coutinho – o mesmo que assina a decisão referente ao Cabo Monteiro – determinou que o policial militar Márcio Wescley Oliveira dos Santos se mantivesse recolhido dentro de casa, em tempo integral, com uso de tornozeleira eletrônica. O magistrado também estabeleceu que o militar estava proibido de publicar mensagens sobre o meio militar ou da área da Segurança Pública. Em caso de descumprimento da decisão, a prisão domiciliar poderia ser revogada e o PM levado ao presídio.
Segundo o promotor Sebastião Brasilino de Freitas, Wescley continuou publicando nas redes sociais e, por isso, teve que cumprir a prisão preventiva no 5º Batalhão da Polícia Militar do Estado do Ceará (BPM).
Processos administrativos apuram conduta de policiais
A Controladoria Geral de Disciplina (CGD) instaurou processos administrativos disciplinares contra o soldado Márcio Wescley e o cabo Paulo José Monteiro. A decisão saiu no Diário Oficial do Estado do Ceará de 11 de junho. Segundo o documento, tanto o soldado Wescley quanto o cabo Monteiro praticaram “ato incompatível com a função pública, na medida em que deixa de dar fiel cumprimento aos deveres a que está subordinado, e, ao mesmo tempo, instiga os integrantes da área de Segurança Pública a se contraporem à atuação do Secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa Social, bem como ao próprio Chefe do Poder Executivo Estadual”. Os militares foram afastados preventivamente das funções por 120 dias.
Procurada pelo Comprova, a CGD repetiu em nota as informações do Diário Oficial do Estado e acrescentou que as ações estão, atualmente, em fase de instrução processual.
PMs atuaram em motim de militares em fevereiro de 2020 no Ceará
Cabo Monteiro e Soldado Wescley, alvos de processos administrativos na CGD e denúncia judicial por crimes militares, participaram em fevereiro de 2020 do motim de policiais e bombeiros militares no Ceará. A paralisação teve início no dia 18 de fevereiro e durou 13 dias. Dentre outros pontos, os policiais exigiam reajuste salarial, auxílio por risco de vida, auxílio de insalubridade e adicional noturno.
Durante o motim, batalhões foram ocupados pelos PMs amotinados em Fortaleza e Sobral. No dia 19 de fevereiro, o senador Cid Gomes (PDT), ex-governador do Ceará e aliado político do governador Camilo Santana, tentou entrar em um batalhão da PM em Sobral usando uma retroescavadeira contra uma multidão de amotinados. Na ação, ele foi baleado.
No dia 1º de março, os policiais votaram pelo encerramento do motim. No dia 2 de março, foi assinado, na sede do MP, em Fortaleza, um Termo de Acordo e Compromisso estabelecendo o fim da paralisação dos servidores militares no Ceará. Dentre os pontos pactuados entre Governo e policiais, constava que: os militares que participaram do motim teriam apoio de instituições que não pertencem ao Governo do Estado, como Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Defensoria Pública, Ministério Público e Exército, bem como teriam direito a um processo legal sem perseguição, com amplo direito a defesa e contraditório, e acompanhamento das instituições mencionadas anteriormente.
Cabo Monteiro, em matérias de jornais do Ceará, à época, é identificado como uma das lideranças do motim. Na notícia no site do MP sobre a assinatura do Termo de Acordo e Compromisso ele é designado, junto com o deputado estadual Soldado Noelio (PROS) e o vereador Sargento Reginauro Sousa (sem partido), como representantes dos militares.
Em entrevista ao programa Roda Viva, em 8 de junho, o governador Camilo Santana afirmou que há um “processo de partidarização de pessoas dentro da polícia”, mas que mantém a autoridade sobre ela. “Para aquelas pessoas que tiveram aquele comportamento no motim, eu não considero policiais, eu não considero pessoas que estão lá, fardados, para proteger a população, os que tomam aquelas atitudes. Portanto, sofrerão todo o rigor da lei aqui no meu estado, serão punidos. Eu não anistiarei nenhum policial militar que cometeu aquele crime aqui no meu estado. Exatamente para servir de exemplo.”
Por que investigamos?
O Comprova analisa somente conteúdos duvidosos sobre o novo coronavírus que obtêm grande alcance nas redes sociais. A versão do boato sobre o “cidadão de Cascavel” teve mais de 585 mil visualizações em uma semana, de acordo com plataforma de fact-checking do Facebook.
A equipe do projeto também decidiu investigar o conteúdo por se tratar de um tema de grande relevância, que é o direito à liberdade de expressão. A acusação de que uma autoridade pública está promovendo censura entre os cidadãos durante a pandemia de covid-19 é grave — assim como boatos enganosos nas redes sobre o assunto.
Por fim, o boato se insere em um cenário de disputa política no Brasil que costuma traçar os caminhos da desinformação nas redes sociais. Depois que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) criticou governadores e prefeitos por não concordar com as medidas de isolamento social, conteúdos falsos atacando lideranças regionais se multiplicaram nas plataformas.
Recentemente, o Comprova mostrou que a parceria para vacina contra a covid-19 não foi firmada no ano passado pelo governador de São Paulo, João Doria e desmentiu boato que afirmava que repasses de verbas aos estados estão relacionados ao número de mortos e infectados pelo novo coronavírus, por exemplo. Perfis nas redes também já afirmaram que uma operação da Polícia Federal no Ceará teria reduzido em 90% o número de mortes por covid-19 no estado, o que não é verdade.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-repasses-de-verbas-aos-estados-estejam-relacionados-ao-numero-de-mortos-e-infectados/ | COMPROVA | É falso que repasses de verbas aos estados estejam relacionados ao número de mortos e infectados | null | 2020-06-22 | Ao contrário do que afirma um vídeo postado por um enfermeiro no YouTube, as verbas distribuídas pela União aos estados e municípios para o combate à covid-19 são para hospitais de campanha e compras de equipamentos de proteção, entre outras ações, e não há relação entre o número de infectados e de mortos com os repasses
Conteúdo verificado: Vídeo postado no YouTube no dia 11 de junho com o título “Denúncia – Corpos de mortos pelo covid 19 são vendidos e rende milhões”
São falsas as afirmações de um enfermeiro do Rio de Janeiro que diz, em vídeo publicado no dia 10 de junho, que corpos de vítimas da covid-19 são vendidos por milhões para governos estaduais e municipais. Ele também afirma, erroneamente, que 60% dos óbitos registrados com a doença foram por outros motivos. Segundo o Projeto Comprova verificou, a União disponibiliza verbas para que estados possam usá-las para o combate ao vírus – hospitais de campanha e compras de equipamentos de proteção, entre outras ações –, mas não há relação entre o número de infectados e de mortos com os repasses.
Procurado, o Ministério Público Federal (MPF) do Rio de Janeiro informou que não há qualquer investigação envolvendo possíveis fraudes em óbitos por covid-19 no estado. A Polícia Federal não divulga informações sobre investigações em andamento, mas não há citação de nenhuma apuração envolvendo este tema. A Polícia Civil do Rio de Janeiro e o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MP-RJ) não se manifestaram.
Em entrevista ao Comprova, o autor do vídeo que viralizou nas redes sociais, Anthony Ferrari Penza, que vive em Cabo Frio, disse que pode confirmar suas “denúncias” com relatos de pessoas que buscaram atendimento médico. “Eu tenho provas disso, eu coloco cem pessoas para falar”, declarou Penza – sem apresentar nenhum documento.
Como verificamos?
O Comprova procurou o Ministério da Saúde e a Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro para saber quanto a União repassou ao estado para o combate à covid-19. Também questionou aos órgãos sobre os critérios usados para definir o valor repassado aos estados.
O Comprova procurou ainda o Ministério Público Federal (MPF), a Polícia Federal (PF), o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) e a Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro para saber se há alguma investigação, concluída ou em andamento, sobre possíveis fraudes no registro de óbitos causados pela covid-19.
Também levantamos informações sobre Anthony Ferrari Penza, autor do vídeo. A partir de dados de sua página no Facebook, o Comprova confirmou por e-mail com a Universidade Veiga de Almeida que ele é formado em Enfermagem. Também por e-mail, o Comprova checou com o Conselho Regional de Enfermagem (Coren) do Rio de Janeiro que ele possui registro profissional. Descobriu ainda com o Coren e com o Conselho Federal de Enfermagem que Anthony tem “diversas denúncias” nas ouvidorias dos dois órgãos e que há um processo administrativo para apurar infrações.
Por fim, o Comprova entrou em contato com o autor do vídeo. Fez uma entrevista de 44 minutos e, no dia seguinte, voltou a conversar com o enfermeiro via WhatsApp.
Verificação
No vídeo, Penza afirma que governos estaduais e municipais estão lucrando a cada registro de óbito por covid-19. Ele também diz que 60% das pessoas mortas pelo novo coronavírus “não morreram de covid; morreram por estarem assustadas, morreram por causa da corrupção, morreram porque muitos falaram ‘fique nas casas'”. De acordo com as afirmações do enfermeiro, “existia e existe ainda venda de mortos pelo (sic) covid-19”.
As afirmações, no entanto, não são verdadeiras. Segundo o Ministério da Saúde, os valores repassados a estados e municípios para o combate à pandemia não são definidos de acordo com o número de mortos.
A Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro foi procurada por e-mail no dia 15 de junho. Depois, foi contactada por telefone nos dias 16, 17, 18 e 19 de junho. Mas não respondeu até o fechamento dessa verificação.
Óbitos
O Rio de Janeiro registrou 8.875 mortes causadas pelo novo coronavírus até o dia 22 de junho. Segundo uma nota técnica divulgada pelo Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (Cremerj) no dia 27 de março, os médicos devem incluir a covid-19 como causa da morte na Declaração de Óbito dos pacientes quando a vítima tiver testado positivo para o vírus SARS-CoV-2. “Se a morte ocorrer antes do resultado de exames confirmatórios para COVID-19, recomenda-se ao (à) Médico (a) registrar COVID-19 (suspeito)”, orienta o documento. Nesses casos, a confirmação ou descarte ficará sob responsabilidade das secretarias municipais e estaduais de Saúde.
Por e-mail, o Ministério Público Federal declarou que não há investigações relacionadas a fraude no registro de óbitos pela covid-19 no Rio de Janeiro. A Polícia Federal informou que não divulga informação sobre investigações. O Ministério Público Estadual e a Polícia Civil não responderam ao Comprova.
Quem é Anthony Ferarri Penza
Nascido no Rio de Janeiro, Anthony Ferarri Penza se formou em Enfermagem em 2014, na Universidade Veiga de Almeida, na mesma localidade. Ele diz trabalhar em hospitais de Cabo Frio, mas, na entrevista feita pelo Comprova por telefone, não disse quais são as instituições em que atua. Antes da graduação em Enfermagem, Anthony foi dono de um jornal, o “Diário Cabofriense”, que diz ter vendido “em 2012 ou 2013”.
Politicamente, Penza diz que não é nem de direita, nem de esquerda, mas, nos vídeos, costuma destacar “políticos de esquerda” e chamá-los de canalhas.
No jaleco que usa nas gravações, há a inscrição “Doutor Anthony Ferreira Enfermeiro”. Nos comentários do vídeo, alguns internautas questionam o uso do título “doutor”, mas a Resolução 256/2001 do Conselho Federal de Enfermagem autoriza tal utilização por enfermeiros.
No início da pandemia, em 17 de março, ele postou um vídeo pedindo que as pessoas ficassem em casa. Ele afirmava: “Pelo amor de Deus, desculpa o meu desespero, mas é importante que eu fale isso porque nós não temos condições de atender os pacientes normais, quanto mais atender essa epidemia, ou melhor, pandemia de coronavírus”. E continuava a gravação dizendo que Cabo Frio poderia vir a ter uma “carnificina de coronavírus”. Ao ser questionado pelo Comprova sobre a mudança de postura em relação ao isolamento, Penza respondeu: “Ali era importante. Não sabemos como vai ser o vírus no Brasil e como o Brasil vai se comportar. Tanto que no Brasil como é que se comportaram estados e municípios? Apenas com corrupção”.
Vídeos
O enfermeiro contou na entrevista ao Comprova que faz o que define como “vídeos de revolta” há quatro anos. Possui um canal no YouTube desde março do ano passado. O primeiro vídeo tem 245 visualizações e o mais recente, de 11 de junho, alcançou 6.040 views. Penza disse que quem criou o canal foi sua mulher e já pediu que ela o cancelasse, por não saber mexer no site. A plataforma que ele mais utiliza para divulgar as gravações é o Facebook.
Denúncias contra o enfermeiro
Entre os comentários nos vídeos postados na página de Penza no Facebook, alguns são de usuários que questionam a veracidade do conteúdo e falam em denunciar o enfermeiro. Procurado, o Conselho Federal de Enfermagem afirmou ao Comprova, por e-mail, ter recebido “diversas denúncias” contra Anthony e que foi instaurado um processo administrativo para apurá-las no Conselho Regional de Enfermagem do Rio de Janeiro.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais. Quando o material aborda assuntos relacionados à covid-19, a verificação se torna ainda mais importante, pois coloca a saúde das pessoas em risco. O vídeo checado pelo Comprova tinha mais de 8.646 visualizações no YouTube até a publicação desta investigação e alcançou mais de 99 mil compartilhamentos no Facebook até o dia 22 de junho, quando foi apagado por Penza.
Temas relacionados ao novo coronavírus têm sido usados politicamente, seja para reforçar narrativas ou desacreditar recomendações de cientistas, entre outras razões. Embora o autor do vídeo se defina como “apolítico, nem de direita, nem de esquerda”, a gravação segue a linha de outros conteúdos que se alinham ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que vê os governos estaduais e municipais como alvo preferencial na crise política e econômica causada pela pandemia do novo coronavírus.
Ao afirmar ainda que pessoas morreram “porque muitos falaram ‘fique nas casas'”, Penza trata a orientação de distanciamento social como um erro que teria causado mortes. Além disso, faz acreditar que não é preciso seguir a recomendação de distanciamento em um país que, até 22 de junho, havia perdido mais de 50 mil vidas para o vírus.
Falso, para o Comprova, é todo o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
O site Aos Fatos fez uma verificação sobre o mesmo vídeo em 19 de junho e também o classificou como falso. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/uso-da-cloroquina-nao-explica-a-situacao-da-pandemia-no-senegal/ | COMPROVA | Uso da cloroquina não explica a situação da pandemia no Senegal | null | 2020-06-19 | Post verificado pelo Comprova selecionou e tirou de contexto trechos de entrevista em que um médico senegalês elogia a cloroquina e omite as partes em que ele fala que o sucesso no combate à pandemia no Senegal se devia a vários pontos, como distanciamento social, uso de máscara e fechamento das fronteiras, e não apenas ao uso da hidroxicloroquina
Conteúdo verificado: Publicação feita pelo site PlenoNews no dia 21 de abril com o título “Senegal usa cloroquina desde 1º caso e tem apenas 5 mortes”. A matéria foi compartilhada pelo pastor e deputado federal Marcos Feliciano no dia 16 de junho
Uma publicação do site PlenoNews circula nas redes sociais afirmando que o Senegal teria usado cloroquina desde o primeiro caso de covid-19 e, por isso, teria apenas cinco óbitos e uma taxa de mortes por milhão menor que a da Coreia do Sul até o dia 21 de abril. O post viralizou após compartilhamento, no dia 16 de junho, pelo pastor e deputado federal Marco Feliciano (Republicanos-SP). O texto cita como fonte uma entrevista do médico senegalês Moussa Seydi para a revista francesa Marianne.
O post é enganoso porque selecionou e tirou de contexto trechos da entrevista em que o médico elogia a cloroquina. Na mesma entrevista, Seydi afirma, no entanto, que a explicação para o, até então, sucesso no combate à pandemia no Senegal se devia a vários pontos, como distanciamento social, uso de máscara e fechamento das fronteiras, e não apenas ao uso do medicamento hidroxicloroquina.
Na mesma entrevista, o médico senegalês defendeu estudos clínicos com a droga que estavam sendo realizados à época. “Se eles [os resultados] forem confirmados a longo prazo, tanto melhor, continuaremos. Caso contrário, vamos parar”, afirmou sobre os testes Solidariedade, da OMS, e o Discovery, da União Europeia. De acordo com a OMS, os dois testes já mostraram que a hidroxicloroquina não apresenta redução na mortalidade.
Além disso, no momento em que a publicação voltou a ganhar destaque com o compartilhamento de Marco Feliciano, em 16 de junho, os números da pandemia no Senegal já não eram os mesmos do texto original, de 21 de abril. Naquela data, o Senegal tinha 377 casos confirmados e um total de cinco óbitos. Já em 16 de junho, o país africano passou para 5.090 casos confirmados e total de 60 mortes. Aumento de aproximadamente 1.250% no número de casos e de 1.100% na quantidade de óbitos.
Como verificamos?
O primeiro passo foi procurar a entrevista original. Com uma busca simples no Google, foi possível encontrar o texto, publicado em 17 de abril de 2020 no site da revista francesa Marianne.
Em seguida, tentamos descobrir se o entrevistado realmente era médico. Para isso, fizemos pesquisas no Google e encontramos diversas reportagens com Seydi publicadas em diversos meios de comunicação, como a France24 e o The Africa Report. Também encontramos uma entrevista concedida pelo médico para o Ministério da Saúde do Senegal.
Ao mesmo tempo, procuramos Moussa Seydi no Facebook e no LinkedIn. Lá concluímos que ele é coordenador no Centre Hospitalier National Universitaire de Fann, nas proximidades da capital do país, Dakar. Entramos em contato com um jornalista senegalês, que nos confirmou que Seydi comanda a resposta à pandemia no país. Esse jornalista nos passou o contato de Seydi e pudemos conversar com ele por WhatsApp.
Após entrar em contato com o médico, confirmamos os dados de contaminações e óbitos nos dois países citados na matéria do site brasileiro: Senegal e Coreia do Sul. Consultamos as bases de dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Universidade Johns Hopkins porque ambas são referência no assunto.
Com base na entrevista de Seydi para a revista Marianne, fomos atrás dos estudos Solidariedade e Discovery, citados pelo médico para saber qual o status e a qual conclusão teriam chegado.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 19 de junho de 2020.
Verificação
A entrevista original, concedida à revista Marianne é verdadeira. Contudo, a publicação brasileira analisada pelo Comprova selecionou apenas trechos desta entrevista nos quais o médico faz elogios à hidroxicloroquina. Assim, a publicação é enganosa porque não incluiu as partes da entrevista em que o médico expõe outras medidas adotadas pelo Senegal para o combate à pandemia, como o isolamento social, e tampouco as partes em que ele fala sobre a necessidade de mais testes clínicos para avaliar a eficácia do medicamento.
Questionado sobre os números baixos de mortos e casos, Seydi disse: “A explicação pode conter vários pontos. Primeiro, houve fortes medidas desde o início para fechar as fronteiras, o que impediu a proliferação de casos importados de covid-19. A proibição de grandes reuniões, como as orações de sexta-feira, também nos permitiu reduzir imediatamente o fluxo de novos casos.”
Ele ainda citou que a população senegalesa é jovem e, por isso, seriam poucos os pacientes em estado grave. “No entanto, temos preocupações com a multiplicação de casos comunitários. Esse é um perigo iminente que deve ser cuidadosamente monitorado”, acrescentou.
Uso da hidroxicloroquina
Na mesma entrevista, o médico defendeu o uso da hidroxicloroquina. “Em 19 de março, implementamos um protocolo de tratamento para os pacientes menos graves com tratamento com hidroxicloroquina. Tratamento em que, no momento, observo bons resultados em relação à redução da carga viral.”
Seydi é defensor da hidroxicloroquina. Segundo ele, o medicamento já era amplamente conhecido no país porque é utilizado para tratar a malária, doença com grande incidência no continente africano. “Tenho um produto em minhas mãos que não considero perigoso para meus pacientes. E eu posso usá-lo para tratar os doentes em caso de emergência, então eu uso. Tudo deve ser feito para que a luta contra a epidemia seja bem-sucedida.”
O antimalárico entrou no debate da pandemia após o cientista francês Didier Raoult publicar um estudo no qual afirmava que ele curaria a covid-19. Raoult cresceu em Dakar, capital do Senegal, e atualmente comanda um centro de pesquisas em Marselha, na França. Conhecido por sua heterodoxia, ele é crítico do meio científico e coleciona polêmicas. Entre elas, seu estudo com a hidroxicloroquina. Após ser publicado, outros especialistas franceses o criticaram pelo baixo número de pacientes – 36, dos quais apenas 20 foram tratados com o medicamento.
O estudo de Didier Raoult inicialmente contava com 26 pacientes tratados com a hidroxicloroquina. Os seis restantes foram retirados do relatório final porque interromperam o tratamento: um por sentir náuseas, três por terem ido para a UTI, um morreu e outro deixou de comparecer ao hospital. Dentre os 16 pacientes que não tomaram a droga, 14 testaram positivo para o vírus ao final do período de seis dias – embora o relatório inicial diga que cinco deles não tiveram seus dados coletados.
Além disso, o estudo tinha discrepâncias como a idade dos participantes e pacientes que foram tratados fora do hospital de Didier, onde o protocolo de atendimento pode ter sido diferente. Por fim, um dos pacientes tratado com a combinação hidroxicloroquina + azitromicina foi dado como curado, mas na verdade continuava com a doença.
“Este estudo tem falhas e imperfeições, mas achei seus resultados interessantes”, disse o senegalês Seydi à Marianne. Ele falou que o estudo do francês tem problemas, mas que outros estudos que o contestaram também tinham. Por isso, seria preciso esperar o resultado de outros testes, mais abrangentes, para saber o real benefício da hidroxicloroquina. Seydi cita os estudos Solidarity, da OMS, e o Discovery, da União Europeia. “Estes serão estudos certamente mais bem documentados. Isso nos permitirá questionar nossas atitudes e, assim, julgar se elas são condenáveis a nível científico.”
Estudos não encontraram efeito positivo da hidroxicloroquina
“Se eles [os resultados] forem confirmados a longo prazo, tanto melhor, continuaremos. Caso contrário, vamos parar”, afirmou o médico senegalês em abril. Desde então, o projeto Solidariedade anunciou que os testes com a hidroxicloroquina foram suspensos porque não foram encontradas evidências de eficácia. De acordo com a OMS, os dados do próprio Estudo Solidariedade, do projeto Recovery, do Reino Unido, e também do projeto Discovery — que foi citado por Seydi — mostraram que o tratamento com a hidroxicloroquina não apresentava redução na mortalidade dos pacientes.
Ao ser questionado pelo Comprova em relação aos estudos, Seydi afirmou que nem o Solidariedade, nem o Discovery utilizaram o protocolo proposto pelo médico Didier Raoult. Seydi enviou um link de uma entrevista que ele concedeu ao site senegalês Dakaractu afirmando que o uso da hidroxicloroquina em conjunto com o antibiótico azitromicina poderia diminuir o tempo de internamento de 13 para 10 dias. “Por enquanto, vamos utilizar apenas os nossos estudos. Nós também vamos começar um ensaio clínico randomizado próprio”, disse Seydi.
Números da infecção
A publicação original, feita no dia 21 de abril, afirmava que o Senegal tinha registrado apenas 5 óbitos – o que resultaria em uma mortalidade de 0,3 a cada 1 milhão de habitantes. O texto comparava esse número aos da Coreia do Sul, afirmando que os sul-coreanos teriam cinco mortes a cada 1 milhão de habitantes.
Os dados da Organização Mundial da Saúde mostram que, em 21 de abril, o Senegal realmente tinha registrado apenas cinco óbitos e, considerando a população de 15,8 milhões de habitantes, tinha 0,3 mortes a cada 1 milhão de habitantes. Já a Coreia do Sul, com sua população de 51,6 milhões de habitantes, tinha 237 mortes, uma taxa de 4,6 mortes a cada 1 milhão de habitantes.
Até então, os números da publicação estavam corretos. No entanto, é importante ressaltar, também, que a pandemia do novo coronavírus começou em momentos diferentes nos dois países. A Coreia do Sul registrou o primeiro caso no dia 20 de janeiro, enquanto o Senegal só registrou a primeira infecção 42 dias depois, em 2 de março. Essa diferença ajuda a explicar a diferença entre os números.
Mesmo assim, o texto voltou a ganhar destaque depois que foi compartilhado pelo pastor e deputado federal Marco Feliciano no dia 16 de junho. Nessa data, 25 dias depois da publicação original, o Senegal já tinha registrado um aumento de mais de 1.100% no número de casos e de óbitos pela covid-19 – chegando a 5 mil casos e 60 mortes. Esses valores mostram que o país tinha 32 casos e 3,8 mortes a cada 1 milhão de habitantes.
Já a Coreia do Sul, também até o dia 16 de junho, teve um aumento de apenas 13,7% nos casos e 17% dos óbitos – chegando a 12.155 confirmados e 278 mortes no total. Isso significa que o país tinha 23 casos e 5,3 mortes a cada 1 milhão de habitantes. Entre os dias 21 de abril e 16 de junho, a evolução da doença no país africano foi muito mais expressiva do que no país asiático.
Para obter o número de mortes por milhão de habitantes, basta dividir o número de óbitos pela quantidade de habitantes e, depois, multiplicar o resultado por 1 milhão.
Por que investigamos?
O Comprova verifica conteúdos sugeridos pelos leitores que tenham muita viralização. O texto investigado aqui, que também já foi checado pelo Boatos.org, teve, de acordo com a ferramenta de monitoramento CrowdTangle, quase 700 mil interações no Facebook, número impulsionado pelo compartilhamento feito pelo deputado Marco Feliciano.
No caso da pandemia causada pelo novo coronavírus, os conteúdos falsos e enganosos prejudicam o debate público, atrapalham os esforços de autoridades no assunto e, no limite, podem provocar danos a quem seguir determinadas recomendações.
Enganoso para o Comprova é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado, que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor. Pode ser, também, o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Desde o início da pandemia, esta é a oitava verificação envolvendo a hidroxicloroquina, medicamento cujo uso contra a covid-19 foi politizado após manifestações do presidente Jair Bolsonaro e do presidente dos EUA, Donald Trump, em favor de sua utilização. Trump afirmou, inclusive, que tomou hidroxicloroquina. Até o momento, não existem evidências científicas robustas que comprovem a eficácia no tratamento da covid-19.
Neste contexto, o Comprova verificou, por exemplo, postagens que enganavam a respeito do uso da droga em um hospital do Piauí e outro que confundia ao acusar cientistas brasileiros de deliberadamente usarem doses letais de cloroquina em testes para prejudicar o governo. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/video-engana-ao-afirmar-que-virus-da-covid-19-existe-desde-2003/ | COMPROVA | Vídeo engana ao afirmar que vírus da covid-19 existe desde 2003 | null | 2020-06-19 | Vídeo mostra reportagem da revista "Saúde É Vital" de 2003, que trata do vírus que causou o surto da Síndrome Respiratória Aguda Severa (Sars, na sigla em inglês) há 17 anos – e não do Sars-Cov-2, ou novo coronavírus, que causa a covid-19
Conteúdo verificado: Um vídeo publicado no YouTube com o título “Ainda não dá para respirar aliviado”.
É enganoso o vídeo que circula nas redes sociais com a afirmação de que o vírus que provoca a covid-19 existe desde o início dos anos 2000. O autor da gravação, que viralizou a partir de uma repostagem no YouTube do dia 22 de março, mostra a capa e as páginas de uma reportagem da revista “Saúde É Vital” de 2003. Diferentemente do que a pessoa diz, a matéria, com o título “Ainda não dá para respirar aliviado”, trata do vírus que causou o surto da Síndrome Respiratória Aguda Severa (Sars, na sigla em inglês) há 17 anos – e não do Sars-Cov-2, ou novo coronavírus, que causa a covid-19.
Em março, logo depois que o vídeo viralizou pela primeira vez, o portal “Veja Saúde”, lançado em maio a partir da união das revistas “Saúde É Vital” (que não circula mais) e “Veja”, da editora Abril, publicou um comunicado em que esclarece o erro. A mensagem ainda afirma que o vídeo “pode levar a conclusões erradas”.
O Comprova conversou, por telefone, com Luiz Claudio Rocha de Carvalho, divulgador musical conhecido como Lula Zeppeliano. Foi a partir da repostagem que ele fez do vídeo que o conteúdo viralizou pela segunda vez. À época, Carvalho foi avisado sobre o material enganoso e achou que tivesse retirado o vídeo do ar. Logo após a entrevista com o Comprova, ele retirou o post de sua página no YouTube.
Como verificamos?
O Comprova utilizou a ferramenta CrowdTangle, que avalia desempenho de postagens em redes sociais, para ver quantas vezes o vídeo do canal havia sido replicado no Facebook. O mesmo procedimento foi aplicado ao TweetDeck, que permite buscas mais amplas dentro do Twitter.
Além disso, também pesquisamos nas plataformas se o vídeo havia sido publicado de forma independente, ou seja, em outras páginas sem o link para o canal de Lula Zeppeliano — assim, conseguimos levantar que todas as postagens foram feitas após a divulgação no Youtube.
Uma rápida busca no Google levou o Comprova a encontrar uma publicação da editora Abril esclarecendo sobre a viralização da reportagem “Ainda não dá para respirar aliviado”, da revista “Saúde É Vital”, publicada em 2003 sobre o surto da Sars, doença causada por um vírus da família dos coronavírus.
Assistindo a vídeos do canal de Zeppeliano, reparamos que a voz dele não era compatível com a narração do vídeo que apresenta a reportagem de 17 anos atrás. Assim, percebemos que ele poderia não ser o autor original do conteúdo. Entramos em contato por meio de redes sociais e fizemos uma entrevista por telefone, em 19 de junho, questionando onde obteve o vídeo.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 19 de junho de 2020.
Verificação
O autor da postagem no Youtube apresentava o vídeo apenas no canal, sem divulgação em outras redes sociais como Twitter, Facebook e Instagram — as duas primeiras registraram viralização mais expressiva do conteúdo. Apesar do tom de denúncia das postagens, diversos comentários alertavam para o fato de o nome coronavírus se referir a uma família de agentes virais e não ao específico que causa a covid-19.
Outras mensagens adotaram tom conspiratório. Em uma das postagens que replicou o vídeo, o autor de uma página do Facebook escreveu: “Novo vírus Chines é bem Velho é de 2003 e mídia esconde. Reportagem da Revista Saúde de 2003 prova que a Mídia está manipulando e enganaNdo o mundo. A OMS Organização Mundial de Saúde” [sic].
Nessa publicação, o vídeo original é apresentado com a seguinte legenda: “A mega fraude. ONU, OMS e mídia mentem sobre o ‘novo vírus chinês’. Corona é de 2003”. Nos comentários, um internauta alerta para o fato de a informação ter sido desmentida pela própria revista “Saúde É Vital”.
Revista diz que vídeo leva a conclusões erradas
No site oficial da revista “Saúde É Vital”, da editora Abril, não é possível encontrar edições anteriores a 2015. Contudo, o vídeo postado no Youtube permite leitura parcial do conteúdo. No primeiro parágrafo é possível entender que o coronavírus descrito na matéria intitulada “Ainda não dá para respirar aliviado” é o que provoca a Síndrome Respiratória Aguda Severa, a Sars (sigla em inglês).
Na reportagem, a doença é tratada como “pneumonia asiática”. O texto debate a possibilidade da chegada da Sars no Brasil, o que poderia, segundo especialistas ouvidos, provocar surtos nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro e de São Paulo.
A segunda página da matéria tem um box sobre uma imagem do mapa-mundi e dicas de especialistas para “escapar da doença”. Como é comum no caso de infecções virais, a principal recomendação era manter hábitos de higiene. Também era aconselhado usar máscaras e evitar locais de grande aglomeração.
A editora Abril publicou um texto em março deste ano no qual esclarece que o vídeo em que um homem filma a reportagem de uma edição de 2003, e insinua se tratar da covid-19, “pode levar a conclusões erradas”.
O texto, segundo a revista, discute as ameaças de um tipo específico do coronavírus diferente do que provoca a pandemia em 2020. O veículo reforça que o agente infeccioso debatido no texto é o que causou o surto de Sars, ou Síndrome Respiratória Aguda Severa, há 17 anos. Ou seja, diferente do mais novo tipo de coronavírus, o Sars-Cov-2, que causa a covid-19.
Ao contrário do surto da Sars de 2003, a covid-19, descoberta em dezembro passado, se espalhou por todo o mundo. A publicação ressalta que a família dos coronavírus é conhecida desde meados de 1960, e que os vírus são diferentes entre si.
O post que mais viralizou
Foi a partir da postagem de Luiz Claudio Rocha de Carvalho, conhecido como Lula Zeppeliano, que o vídeo viralizou – só a publicação dele teve mais de 10,5 mil visualizações e foi ela que repercutiu no Twitter e no Facebook.
O Comprova conseguiu o telefone do divulgador cultural ao trocar mensagens diretas com ele por Facebook e Instagram. Na entrevista, contou que havia sido avisado sobre o conteúdo do vídeo ser falso e achou que o tivesse retirado do ar.
Inicialmente, Carvalho afirmou que não se lembrava de quem tinha passado o vídeo para ele e disse não saber quem é o autor. Depois, afirmou que acredita ter recebido o conteúdo de algum apoiador do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) com quem mantinha contato no Facebook. “Não estou lembrando agora, acho que foi até uma pessoa que eu bloqueei”, disse ele, que se define como contrário a governo. “Minha preocupação é sempre desmentir, mas eu dei mole [com o vídeo em questão]. Eu reposto [conteúdos] e tenho cautela, mas, às vezes, né?”.
Após as conversas, Carvalho apagou o vídeo de sua página.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conteúdos suspeitos que apresentam grande alcance nas redes sociais. É o caso deste vídeo. Até 19 de junho, data de publicação dessa verificação, o vídeo do canal teve 10,5 mil visualizações no Youtube — na mesma data, a postagem foi retirada do ar. Segundo o CrowdTangle, o link para o conteúdo original possui 271 interações e 320 compartilhamentos no Facebook, entre posts públicos e privados.
O vídeo também viralizou ao ser publicado diretamente em outras redes — ou seja, sem acesso direto ao Youtube. As postagens no Twitter somaram 3.486 visualizações, 163 compartilhamentos e 248 curtidas. No Facebook, os posts tiveram 3.021 visualizações e 150 interações, entre publicações feitas por perfis, páginas e grupos.
Enganoso para o Comprova é quando um conteúdo é retirado de seu contexto original e utilizado de forma a modificar seu significado, induzindo a uma interpretação equivocada.
O vídeo é perigoso porque infere que o coronavírus citado na revista de 2003 é o mesmo que ocasiona a pandemia atual, sendo compartilhado em outras postagens que acusam órgãos de saúde de mentirem sobre a doença. A própria revista Saúde se manifestou a respeito do caso, que também foi investigado pelo Boatos.org.
Desde a confirmação dos primeiros diagnósticos de covid-19 na China, em dezembro passado, circulam narrativas de que o vírus é fruto de adulteração em laboratório ou mesmo de não causar uma nova doença, minimizando seus riscos.
O Comprova já investigou boato de que o vencedor do Nobel de Medicina teria dito que o novo coronavírus foi desenvolvido em laboratório — afirmação desmentida pelo próprio médico. Também já mostramos que uma reportagem da TV italiana RAI sobre vírus criado em laboratório chinês não tinha correlação com a pandemia de covid-19.
Outro vídeo checado pelo Comprova acusava a Organização Mundial de Saúde de manipulação, mostrando imagens de aglomerações em Genebra, na Suíça, onde fica a sede do órgão; a pandemia, lá, está sob controle após oito semanas de medidas restritivas de isolamento. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/tabela-com-risco-de-transmissao-de-covid-19-nao-foi-divulgada-por-governo-americano/ | COMPROVA | Tabela com risco de transmissão de covid-19 não foi divulgada por governo americano | null | 2020-06-17 | Post associa tabela a um link para o Center for Disease Control and Prevention (CDC), em inglês, mas nenhuma das informações que aparece na tabela está no texto publicado pelo órgão de saúde norte-americano. Pesquisadores alertam que ainda não há estudos suficientes para embasar o tipo de conclusão da postagem
Conteúdo verificado: publicação compartilhada pelo WhatsApp e em páginas de Facebook com o texto “O Center for Disease Control do governo dos EUA oficializou as evidências científicas emergentes sobre a transmissão do coronavírus”.
Um texto que circula nas redes sociais alega que um órgão do governo federal norte-americano, o Center for Disease Control and Prevention (CDC) [Centro para Controle e Prevenção de Doenças em português] , listou circunstâncias e ambientes com uma escala de risco de transmissão do novo coronavírus.
O post é enganoso ao associar a tabela a um link do CDC, em inglês. Nenhuma das informações que aparece na tabela está no texto publicado pelo órgão de saúde norte-americano.
O texto também engana o leitor porque dá a entender que há uma referência categórica na avaliação de risco de determinadas ocasiões sociais, como casamentos. Para isso, o texto usa como referência a medição de “partículas virais” de SARS-CoV-2, o novo coronavírus. Mas pesquisadores alertam que ainda não há estudos suficientes para embasar esse tipo de conclusão.
Como verificamos?
A equipe do Comprova acessou o site oficial do CDC — órgão do governo federal norte-americano responsável por orientações para a população durante a pandemia de covid-19. Buscamos a tabela que viralizou e informações semelhantes. Também consultamos o biólogo Luiz Almeida, do conselho editorial da revista Questão de Ciência — publicação digital de divulgação científica —, para avaliar a razoabilidade das informações.
Usamos sites de busca para encontrar textos com conteúdo similar ao da tabela. A pesquisa foi feita em português e em inglês. Com isso, chegamos a um post no blog do professor de Biologia Erin Bromage, da University of Massachusetts Dartmouth. Nele, Bromage explica os riscos de infecção pelo novo coronavírus em diversos ambientes e a carga viral dispersada ao respirar, falar, espirrar e tossir. Encontramos entrevistas nas quais ele explica que criou o blog para ajudar a esclarecer dúvidas de amigos e parentes e o conteúdo acabou viralizando. Entramos em contato com Bromage por e-mail e por mensagens diretas no Twitter. Ele confirmou que recebeu as perguntas e disse que iria retornar. Mas até o fechamento desta verificação, no final da quarta-feira, 17, a resposta não havia chegado.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 17 de junho de 2020.
Verificação
O CDC afirma que a principal forma de contágio é de um indivíduo para o outro. O site do órgão esclarece que o risco é maior entre pessoas que estão a menos de 1,8 metro de distância, pelas gotículas de saliva dispersadas quando uma pessoa infectada fala, espirra ou tosse. Essas gotas podem atingir uma pessoa saudável e carregar partículas do SARS-CoV-2 para os pulmões. O CDC ainda alerta que pessoas assintomáticas podem transmitir o novo coronavírus. De acordo com o site oficial do órgão de saúde, quanto maior a proximidade e o tempo de contato entre as pessoas, maior o risco. O CDC explica que o contágio por meio de superfícies contaminadas é possível, embora mais raro.
Por isso, a recomendação é: manter distanciamento social, lavar as mãos com água e sabão ou limpá-las com álcool em gel, limpar superfícies e objetos frequentemente tocados e cobrir nariz e boca com tecido (ou seja, máscaras) quando a pessoa estiver em lugares públicos. Mas o CDC não fala em números de partículas virais necessárias para o contágio e nem divulgou uma tabela com essas informações.
O texto do site do CDC possui uma marca de conteúdo revisado no último dia 16. O órgão justifica que editou o material da página para “fornecer mais clareza a todos os tipos de público”. E alega que a mudança desta semana pretendia facilitar a leitura e não era resultado “de nenhuma ciência nova”.
Ao que parece, as informações da lista que viralizou na internet brasileira vieram de um post no blog do professor universitário Erin Bromage. O biólogo é formado, tem mestrado e doutorado pela James Cook University, na Austrália e, atualmente, trabalha como professor associado do Departamento de Biologia da da University of Massachusetts Dartmouth, nos EUA. Ele não é ligado ao CDC. Em uma entrevista para a CNN norte-americana, Bromage contou que criou o blog para “dar conselhos tangíveis para amigos e familiares sobre os riscos [de contágio] com que deviam se preocupar e o que era desperdício de energia mental”.
O post do professor, em inglês, foi publicado em 6 de maio e atualizado no dia 20 do mesmo mês. Até o dia 17 de junho a publicação já tinha sido visualizada por mais de 18 milhões de pessoas em todo o mundo. No texto, Bromage explica que partículas do vírus são dispersadas por pessoas infectadas pela respiração, fala, espirro ou tosse. Ele diz que ainda não há levantamentos sobre quantas partículas são necessárias para provocar o contágio pelo SARS-CoV-2, mas, com base em estudos com outros tipos de coronavírus, estima que cerca de 1.000 partículas virais sejam suficientes para infectar uma pessoa saudável. Não há, porém, consenso sobre essa quantidade. Alguns virologistas acreditam que pode ser até dez vezes menor.
Com isso, Bromage lista quantas partículas se dispersam em diferentes situações. “A emissão de uma partícula viral pela respiração segue essa ordem: falar alto emite menos gotículas [contaminadas] que cantar. Espirro é o que mais emite. quanto mais força para um som deixar a boca, mais partículas são emitidas e maior a distância que elas alcançam”, resume.
O professor alerta que, para a infecção pelo novo coronavírus acontecer, não é preciso inalar mais de 1.000 partículas virais de uma só vez. A exposição continuada também leva ao contágio. Com isso, lista os lugares e situações em que, para ele, há maior risco de infecção, como banheiros públicos e restaurantes. “Depende da concentração de partículas no ar do tempo de exposição. Em lugares amplos com boa ventilação ou ao ar livre, a concentração de vírus é diluída em um volume maior e ar. Quanto menos vírus no ar, mais tempo você pode ficar naquele ambiente antes de se infectar”.
Sobre a transmissão e os estudos conhecidos sobre o tema, a equipe do Comprova conversou por mensagens com o biólogo Luiz Almeida, do conselho editorial da revista “Questão de Ciência”. Ele afirmou que “a transmissão é muito mais efetiva pelo ar; não importa se o ambiente é aberto ou fechado, o que vai importar são as pessoas ao seu lado, se alguma delas tem o seu vírus”. Mas não corroborou os cálculos apresentados na tabela: “Não é verdade que conseguimos concluir neste momento que há um risco maior em ambientes fechados”.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conteúdos que apresentam informações suspeitas sobre a pandemia do novo coronavírus e alcançam um grande número de pessoas nas redes sociais. É o caso do texto investigado aqui, sugerido por leitores que o receberam pelo WhatsApp. Até o dia 17 de junho, o conteúdo teve mais de mil compartilhamentos em ao menos dez publicações no Facebook. A tabela também apareceu em outras plataformas, mas com muito menos alcance. As postagens mais populares tiveram 530 interações no Twitter e apenas 12 curtidas no Instagram até o dia 17.
O Comprova colocou o conteúdo em suspeição porque o post associa a tabela a um link do CDC, em inglês, e nenhuma das informações que aparece na tabela está no texto publicado pelo órgão de saúde norte-americano.
Além disso, como não há ainda vacina e nem medicamento eficiente para combater o novo coronavírus, as medidas de prevenção mais eficientes são não-farmacológicas, como uso de máscaras e o distanciamento social.
Desde abril deste ano vários estados e municípios brasileiros tornaram obrigatório o uso de máscaras de proteção em ambientes públicos, seguindo recomendação do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde (OMS). Em meio à polarização política que envolve todos os temas relacionados à covid-19, o uso da máscara virou quase um posicionamento político. O presidente Jair Bolsonaro já foi flagrado sem o acessório em mais de uma ocasião e, no 15 de junho, o ministro a Educação, Abraham Weintraub, foi multado pelo governo do Distrito Federal por participar de uma manifestação sem máscara. Boatos sobre máscaras contaminadas foram desmentidos pelo Comprova.
Outra fonte de discussão é o distanciamento social. A reabertura do comércio e a retomada das atividades econômicas estão no centro do debate desde que os primeiros casos de covid-19 foram confirmados no Brasil. Enquanto o presidente Jair Bolsonaro insiste em diminuir a gravidade da pandemia, estados e municípios colocaram em vigor medidas de isolamento e, alguns casos, lockdown. Nas últimas semanas, algumas das maiores cidades do Brasil — como São Paulo e Rio de Janeiro — começaram a flexibilização do isolamento social, o que indica maior probabilidade de contato entre pessoas contaminadas e não contaminadas pela covid-19. Isso assusta a população que busca formas de evitar o contágio. Com isso, publicações como a tabela verificada ganham fôlego.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano. O conteúdo investigado é enganoso porque distorce recomendações de autoridades sobre a transmissibilidade da covid-19.
O site Boatos.org também verificou esse conteúdo.
| null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/parceria-para-vacina-contra-a-covid-19-nao-foi-firmada-por-doria-no-ano-passado/ | COMPROVA | Parceria para vacina contra a covid-19 não foi firmada por Doria no ano passado | null | 2020-06-17 | Vídeo distorce declarações do governador de São Paulo em entrevista; acordo entre Instituto Butantan e laboratório chinês Sinovac Biotech foi assinado em 10 de junho de 2020
Conteúdo verificado: Vídeo publicado no YouTube no dia 12 de junho com o título “Dória negociou vacina chinesa antes do vírus chegar ao Brasil”
Vídeo postado no YouTube distorce declarações do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), ao apontar que ele teria negociado a vacina contra o novo coronavírus antes do início da pandemia.
Segundo o vídeo, Doria teria “confessado” que o acordo entre o Instituto Butantan e o laboratório chinês Sinovac Biotech para testes na produção de vacina contra a covid-19, anunciado na semana passada, começou a ser discutido em agosto de 2019, quando ainda não havia registro da doença. Os primeiros casos do novo coronavírus na China foram registrados em dezembro. Um dos letreiros no vídeo diz: “Doria visitou a China em agosto do ano passado. O vírus só chegou ao Brasil no final do mês de janeiro de 2020”. Já na legenda, o perfil acrescenta: “Essa é mais uma prova de que tudo foi orquestrado”.
No entanto, o conteúdo original mostra que, em nenhum momento, Doria afirmou que a assinatura do acordo ocorreu no ano passado. O governador fez apenas uma referência à Missão China, não relacionada à pandemia da covid-19, realizada em agosto, quando uma comitiva do Instituto Butantan visitou a sede da Sinovac, entre outros compromissos.
Como verificamos?
O Comprova buscou as declarações originais de João Doria e encontrou o conteúdo publicado na página do governo do estado de São Paulo no YouTube. A transmissão foi feita ao vivo, no dia 11 de junho de 2020, e mostra entrevista de autoridades a jornalistas. Os trechos podem ser vistos a partir de 10 minutos e 30 segundos de vídeo.
A reportagem entrou em contato com o Instituto Butantan e o governo de São Paulo para entender a relação entre o contrato de parceria para testes da vacina com a Sinovac e a missão empresarial paulista à China em agosto de 2019.
O governo de São Paulo e o instituto de pesquisa afirmaram que a assinatura do contrato foi feita em 10 de junho de 2020, um dia antes da coletiva. O Butantan também informou que as tratativas sobre o desenvolvimento da vacina contra a covid-19 começaram somente em abril deste ano. No entanto, o acesso ao documento foi declinado por “questões de compliance”.
Ao buscar o termo “Sinovac” no Diário Oficial do Estado de São Paulo, a reportagem encontrou apenas a publicação de um acordo de confidencialidade entre o laboratório e a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), assinado em 12 de maio de 2020 e publicado no DiO em 5 de junho. Questionada, a instituição de ensino disse que o acordo serviu para dar início a conversas sobre uma eventual participação no estudo, mas que ainda não há nada oficial a respeito.
O Comprova consultou documentos públicos e reportagens para entender a agenda e o contexto da visita empresarial à China em agosto de 2019. Também pesquisou o histórico do laboratório chinês Sinovac e o atual cenário do desenvolvimento de vacinas contra o novo coronavírus, por meio de notícias, publicações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e outras fontes confiáveis.
Por fim, a Sinovac foi contatada por e-mail na segunda-feira, 15, mas não retornou até o fechamento da verificação.
Verificação
O governador de São Paulo, João Doria, anunciou a parceria entre o Instituto Butantan e a empresa chinesa Sinovac para testes de vacina contra o novo coronavírus no Brasil em entrevista a jornalistas no dia 11 de junho. “Eu, ontem (10 de junho), fui ao Instituto Butantan pessoalmente e, ao lado do doutor Dimas Covas (diretor do Instituto Butantan), assinei o contrato formalizando o acordo com a Sinovac Biotech”, afirmou em evento transmitido ao vivo no canal do governo estadual no YouTube.
A seguir, o governador paulista afirma que mais de 100 vacinas estavam em desenvolvimento no mundo naquela data, mas apenas 10 atingiram a etapa de testes em humanos, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. De fato, publicação no site oficial da OMS, de 9 de junho, aponta que existiam 136 projetos de vacina contra a covid-19 em desenvolvimento e que 11 obtiveram sucesso nos testes pré-clínicos e avançaram a etapa.
Um desses projetos é a CoronaVac, liderada pela Sinovac Biotech. A vacina obteve sucesso em estudo com macacos, publicado na revista Science, e já foi testada em 743 pessoas na China. Segundo o laboratório, “mais de 90% dos voluntários desenvolveram anticorpos, sem a incidência de efeitos colaterais graves”, reporta a Bloomberg. Agora, o estudo “ingressará na fase três, que envolve amostragens populacionais maiores” — nesse caso, 9 mil brasileiros, no próximo mês. A estimativa do governo estadual é de que a vacina seja produzida em larga escala e distribuída pelo Sistema Único de Saúde (SUS) até junho de 2021, caso demonstre eficácia.
Depois de anunciar detalhes da parceria, Doria argumenta que ela foi possível em razão do “apoio e investimento do governo de São Paulo em ciência e tecnologia e também na cooperação internacional e na boa relação com as nações”. É nesse contexto, omitido pelo vídeo falso, que ele declara que o acordo assinado com a Sinovac teve início em agosto de 2019, quando visitou a China. O trecho pode ser visto a partir de 14 minutos de gravação.
Na mesma apresentação, o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, questionado sobre a escolha do laboratório entre os projetos em desenvolvimento no mundo, afirma: “Essa parceria com a China, ela já é de longa data, como mencionei, foi fruto dessa visita que nós fizemos à China, nós pessoalmente fomos conhecer a Sinovac. A Sinovac tem interesses, é uma empresa privada, ela tem interesse no codesenvolvimento de outras vacinas com o Butantan, então é uma parceria já estabelecida”. A explicação dada para o acordo com a empresa chinesa foi o estágio de desenvolvimento da vacina e as características de produção, que exigiriam técnicas já executadas pelo Butantan para fornecer vacinas contra a dengue, por exemplo.
Com sede em Pequim, a Sinovac foi responsável pelo desenvolvimento da primeira vacina no mundo contra a H1N1, em 2009.
Visita à China
Em agosto de 2019, uma comitiva de empresários e representantes do governo paulista — incluindo o governador João Doria — esteve na China para a inauguração de um escritório comercial de São Paulo em Xangai; a gestão buscava investimentos externos no estado. Na ocasião, Doria declarou que a viagem se tratava de uma “oportunidade para o Brasil” e chegou a dizer que o país deveria se aproveitar da guerra comercial travada entre a China e os Estados Unidos para abocanhar novos acordos.
Após questionamentos do Comprova, o governo de São Paulo e o Instituto Butantan, em nota conjunta enviada por e-mail, negaram que o governador paulista tenha afirmado que o acordo foi assinado em agosto de 2019. O texto acrescenta que a parceria para a produção de vacinas contra o novo coronavírus só foi firmada em junho deste ano.
Questionada pelo Comprova se Doria teria visitado a Sinovac em algum momento da viagem, a assessoria de imprensa do governo de São Paulo enviou os links de todas as agendas oficiais do governador durante a Missão China para a reportagem “conferir que não houve nenhum compromisso na referida empresa”. As agendas datam dos dias 5, 6, 7, 8, 9 e 10 de agosto de 2019. Conferimos todas elas e, de fato, não há nenhum registro de visitas à sede da Sinovac.
Já a assessoria do Instituto Butantan afirmou, por telefone, que houve uma visita institucional de sua equipe à sede da Sinovac em agosto do ano passado. No entanto, o governador João Doria não estava presente. Por mensagem, a comunicação reforçou que as tratativas para o desenvolvimento da vacina só tiveram início em abril deste ano, diante da aceleração do aumento de casos do novo coronavírus em São Paulo.
Assinatura do contrato
Durante o anúncio da parceria, Doria e Dimas Covas disseram que o contrato entre governo, Instituto Butantan e a Sinovac havia sido assinado em 10 de junho — informação confirmada ao Comprova tanto pela instituição quanto pelo governo.
Em uma busca pelo Diário Oficial do Estado de São Paulo para saber se o governo já havia negociado com a farmacêutica chinesa antes de firmar o convênio, o Comprova encontrou na edição de 5 de junho de 2020 um acordo de confidencialidade entre a Sinovac Research & Development (conhecida como “Sinovac R&D”) e a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) — assinado em 12 de maio.
A Sinovac R&D é uma subsidiária da Sinovac Biotech voltada exclusivamente para a produção da vacina CoronaVac e recebeu US$ 15 milhões de financiamento em pesquisas sobre o novo coronavírus.
Embora vizinho da USP e parceiro em pesquisas, o Instituto Butantan não é subordinado à Universidade. O Butantan é reconhecido desde 1901 como instituição autônoma.
O Comprova procurou a assessoria da Faculdade de Medicina da USP para saber qual seria o acordo com a farmacêutica chinesa e se teria relação com o desenvolvimento da vacina para o novo coronavírus pelo Butantan. Por mensagem, a comunicação afirmou que a assinatura foi para discutir uma possível participação da universidade nas pesquisas, mas que o processo ainda segue na fase de tratativas e, portanto, não há nada oficial até o momento.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conteúdos que apresentam informações suspeitas sobre a pandemia do novo coronavírus e alcançam um grande número de pessoas nas redes sociais. É o caso do vídeo em questão aqui. Até a data de publicação da verificação, o vídeo do canal registrava 163 mil visualizações no YouTube. O conteúdo também teve mais de 359 mil interações no Facebook, incluindo 80,7 mil compartilhamentos.
Falso para o Comprova é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Informações falsas ou enganosas na internet podem fazer com que parte da população fique mais exposta a riscos de contaminação e a sofrer graves consequências em termos de saúde.
O conteúdo investigado é perigoso porque sugere que a covid-19 é uma manipulação política e lança dúvidas sobre uma ferramenta que pode ser útil no combate ao novo coronavírus, caso a vacina demonstre eficácia nos estudos científicos.
Conteúdos que contestam a existência do vírus e o propósito de seguir orientações de isolamento social — conforme recomendado pela Organização Mundial de Saúde —, vêm sendo replicados em sites e redes sociais. O Comprova já checou um vídeo alegando que a pandemia se tratava de uma farsa.
Outro boato alegava que o vencedor do Nobel de Medicina teria dito que o novo coronavírus foi desenvolvido em laboratório — fala desmentida pelo próprio médico. Um estudo publicado em 17 de março pelo conceituado periódico médico Nature Medicine analisou o genoma do vírus SARS-CoV-2, que provoca a covid-19, e concluiu “claramente que o SARS-CoV-2 não é uma construção de laboratório ou um vírus propositadamente manipulado.” Outro vídeo que circulava em redes sociais acusava os hospitais de “provocar a morte” de pacientes com outras doenças para registrá-las como óbitos por covid-19.
O próprio governador João Doria já teve uma frase utilizada fora de contexto por uma publicação que o acusava de inventar dados sobre países afetados pela pandemia. Em relação ao anúncio da parceria com a farmacêutica chinesa, Doria foi alvo de críticas por opositores. Algumas das postagens o acusavam de conspiração contra o governo.
A negociação da produção da vacina também foi verificada pelo Fato ou Fake, que aponta como falsa a mensagem de que Doria teria negociado o contrato para as vacinas no ano passado, quando o vírus sequer havia sido identificado.
Esta verificação tem como base as informações disponíveis até a publicação do texto. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/oms-nao-se-desculpou-por-reviravoltas-com-hidroxicloroquina/ | COMPROVA | OMS não se desculpou por reviravoltas com hidroxicloroquina | null | 2020-06-12 | Texto distorce declarações de representantes da OMS para dar a entender que a entidade se arrependeu de ter interrompido as pesquisas com o medicamento
Conteúdo verificado: post do site Jornal da Cidade Online, de 7 de junho, com o título “OMS pede desculpa pelo erro na controvérsia sobre a hidroxicloroquina”
Um texto do Jornal da Cidade Online engana o leitor ao distorcer declarações de representantes da Organização Mundial de Saúde (OMS). O artigo afirma que o diretor-executivo do Programa de Emergências em Saúde da OMS, Mike Ryan, “pediu desculpas pelo erro na controvérsia sobre a hidroxicloroquina”, dando a entender que a entidade se arrependeu de ter interrompido as pesquisas com o medicamento. Não foi isso que Ryan disse.
Em uma entrevista coletiva na sede da organização, no dia 5 de junho, o diretor-executivo foi questionado sobre a polêmica envolvendo a paralisação e subsequente retomada de pesquisas da OMS com hidroxicloroquina para o tratamento da covid-19. Ele respondeu que “isso é ciência bem feita”.
Ryan acredita que o enorme interesse público por assuntos relacionados à pandemia de covid-19 faz que com os desdobramentos sejam noticiados 24 horas por dia. E, para o público leigo, avanços e retrocessos normais no processo científico acabam parecendo confusos. “Eu sei que, às vezes, pode passar a impressão de que a comunidade científica está confusa ou que está mandando sinais conflitantes e, por isso, nós pedimos desculpas a todos vocês. Mas nós precisamos seguir a ciência”, disse.
O Comprova considerou o texto verificado enganoso porque em nenhum momento um representante da OMS pediu desculpas por ter paralisado temporariamente os estudos com hidroxicloroquina para o tratamento da covid-19.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conteúdos suspeitos sobre a covid-19 que tenham alcançado grande viralização. A postagem verificada foi compartilhada mais de 500 vezes superando 400 mil interações de acordo com o CrowdTangle, uma ferramenta de monitoramento de conteúdos compartilhados em redes sociais.
Desde os primeiros casos de covid-19 no Brasil, os temas relacionados à pandemia têm sido usados para reforçar narrativas que se alinham ou contrariam o discurso do presidente da República, Jair Bolsonaro. A contrariedade do presidente às medidas mais restritivas de isolamento adotadas por governadores e prefeitos, o questionamento às medidas sugeridas pela OMS e o incentivo ao uso de medicamentos de eficácia ainda não comprovada são alguns dos temas recorrentes em páginas e perfis em redes sociais que apoiam Bolsonaro.
O conteúdo verificado pelo Comprova se insere nesse contexto. A polarização dos discursos em defesa do uso de medicamentos sem eficácia comprovada pode servir de incentivo à automedicação e causar efeitos colaterais danosos.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor ou que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos?
O primeiro passo foi encontrar a declaração original de Mike Ryan, feita em uma entrevista coletiva no dia 5 de junho. A partir de 19 minutos e 47 segundos, o diretor-executivo responde sobre as “mensagens conflitantes” que a mudança de postura da entidade pode passar ao público leigo. A cientista chefe da entidade, Soumya Swaminathan, fala logo em seguida, a partir de 23 minutos e 45 segundos. Ela explica que as idas e vindas são normais no processo de pesquisa científica. A transcrição do áudio, em inglês, está disponível no site da OMS.
Procuramos a assessoria de imprensa da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), braço da OMS para as Américas. Por e-mail, solicitamos informações sobre as credenciais de Mike Ryan e de Soumya Swaminathan e pedimos esclarecimentos sobre as diretrizes da entidade para o uso de cloroquina e de hidroxicloroquina no tratamento da covid-19. Também questionamos se a organização tem alguma relação com o estudo realizado com dados da empresa americana Surgisphere e retirado do ar pelo periódico científico “The Lancet”.
Em seguida, conversamos com pesquisadores da área médica para explicar como funciona o processo de pesquisa de um novo medicamento ou vacina. Em entrevista concedida ao Comprova, o médico Reinaldo Guimarães, vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), afirmou que se trata de um procedimento longo, com várias etapas e que é comum ocorrerem retratações de pesquisas após novas checagens serem realizadas por outros pesquisadores.
Por fim, realizamos uma pesquisa sobre o site que publicou o texto verificado, o Jornal da Cidade Online e sua relação com a disseminação de desinformação.
Verificação
A polêmica começou por causa de um estudo, publicado no dia 22 de maio, afirmando que a cloroquina e a hidroxicloroquina não mostravam eficácia no combate ao novo coronavírus e alertando para os riscos de arritmia cardíaca trazidos pelos medicamentos. A publicação levou a OMS a suspender os testes clínicos que a entidade já realizava com hidroxicloroquina. Mas no dia 2 de junho a “The Lancet” publicou uma “nota de preocupação” em relação ao estudo. No novo texto, 150 pesquisadores levantaram questões sobre a metodologia e de integridade dos dados. As informações são de uma empresa de saúde norte-americana, a Surgisphere. O dono da companhia, Sapan Desai, foi um dos autores do artigo. Desde então, surgiram evidências de que os dados foram manipulados.
As críticas levaram a “The Lancet” a retirar o estudo do ar. O “New England Journal of Medicine” também retratou um estudo sobre covid-19 com base em dados da Surgisphere.
Depois da retratação, a OMS resolveu retomar sua pesquisa com hidroxicloroquina. O “Estudo Solidariedade” é um ensaio clínico, lançado pela organização em março de 2020, para investigar um tratamento eficaz para a covid-19. Uma das drogas pesquisadas é a hidroxicloroquina, mas outros medicamentos — como Remdesivir, Lopinavir/Ritonavir e Lopinavir/Ritonavir combinado com Interferon beta-1a — são analisados.
O grupo tinha resolvido fazer uma pausa temporária no braço de hidroxicloroquina do estudo em 23 de maio por causa de preocupações sobre a segurança do medicamento. Os dados de mortalidade disponíveis foram revisados pelo Comitê de Segurança e Monitoramento de Dados do Estudo Solidariedade. Os membros não encontraram motivos para modificar o protocolo do estudo, que foi retomado em 3 de junho.
Por e-mail, a OPAS — braço pan-americano da organização — afirmou que “a OMS não tem histórico de colaboração com a Surgisphere”. E completou: “A prioridade da OMS é focar nas evidências geradas por ensaios clínicos randomizados de última geração”.
No dia 5 de junho, durante entrevista coletiva, uma repórter da revista norte -americana “Politico” perguntou ao diretor-executivo do Programa de Emergências em Saúde da OMS, Mike Ryan, sobre as “mensagens conflitantes” que essas mudanças de posição passam ao público. Ryan explicou que a decisão de paralisar os estudos com hidroxicloroquina foi tomada para não colocar os pacientes em risco. Mas, ao contrário do que afirma o texto verificado, o diretor-executivo não se desculpou pela paralisação — e nem pela retomada da pesquisa com a hidroxicloroquina. “Nós precisamos seguir a ciência. Precisamos seguir as evidências e estamos totalmente dedicados a garantir que as pessoas que participam de testes clínicos estão entrando em testes seguros e planejados com o seu bem estar em mente”. Ryan defende que “isso é ciência bem feita”. Foi nesse momento que fez o “pedido de desculpas” a que o texto verificado se refere. “Eu sei que às vezes pode passar a impressão de que a comunidade científica está confusa e, por isso, pedimos desculpas a todos vocês.”
A declaração foi acompanhada pela cientista chefe da OMS, a pediatra Soumya Swaminathan. “É um processo normal na ciência”, garantiu. “É bastante normal ter resultados um pouco diferentes vindos de estudos diferentes é por isso que o mundo científico normalmente exige mais de um teste para que o efeito de qualquer droga ou vacina seja realmente confirmado. (…) É nossa responsabilidade explicar para o público que cada um dos resultados não significa que estamos mudando as recomendações ou nos contradizendo. Porque é assim que a ciência progride.”
Esta resposta foi questionada no texto do “Jornal da Cidade Online”: “Normal??? Parece que a OMS deve novo pedido de desculpas…”.
O médico Reinaldo Guimarães, vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), afirmou ao Comprova, em entrevista por telefone, que retratações em pesquisas científicas são comuns e que existe uma base de dados mundial, chamada Retraction Watch, onde é possível consultá-las.
“Alguém, não sei realmente quem foi, analisou novamente os dados que levaram a OMS a dizer que [a hidroxicloroquina] não era eficaz e encontrou algum tipo de problema. Na verdade, o que a OMS fez foi retirar a recomendação até que isso se esclareça”, afirmou o médico.
Para entender o porquê de um estudo ser retratado, Guimarães explica que é necessário entender como ele é feito. Uma medicação só pode ter a eficácia comprovada após cumprir um longo processo. O desenvolvimento se inicia em laboratório, após uma série de estudos, com resultados feitos in vitro, ou seja, num ambiente controlado. Se a eficácia funcionar ali, a etapa seguinte envolve testes em animais e, depois, testes em humanos.
Na etapa de testagem entre humanos, são três fases: a primeira em indivíduos saudáveis, a segunda em pequenos grupos de pacientes e a terceira em quantidade maior. Nessa fase, os estudos são feitos de forma que metade dos pacientes faz uso da medicação e a outra metade recebe um placebo, substância que não causa reações no organismo. A escolha de quem toma o quê é aleatória. Os pacientes não sabem se receberam o medicamento ou o placebo e os médicos que aplicam as substâncias também não são informados sobre qual paciente recebeu qual elemento. Este processo é chamado duplo cego randomizado.
A partir da aprovação de todas essas etapas, a medicação deve ser encaminhada para uma agência reguladora, que recebe do fabricante um dossiê completo e o analisa. Caso o documento seja considerado satisfatório, o medicamento recebe um registro para ser comercializado no país da dita agência — no caso do Brasil, os remédios devem ser registrados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Se um medicamento for indicado para o tratamento de outra doença, ele deve ser reavaliado pela agência e ter a bula modificada.
“O que aconteceu com a retratação dos estudos sobre cloroquina é que todas as informações que chegavam à OMS eram relativas a ensaios clínicos, que são os testes feitos em seres humanos. As informações que foram chegando à OMS diziam que a cloroquina não era eficaz. Particularmente, quando essas informações vinham a partir dos estudos clínicos randomizados [ou seja, na terceira fase de testes com humanos]”, explicou Guimarães. “O estudo retratado é um estudo publicado que levou a uma recomendação, mas foi retirado porque havia lá um problema qualquer que eles estão continuando a estudar”, resumiu.
Pesquisas com cloroquina
A cloroquina — e sua versão menos tóxica, a hidroxicloroquina — é um medicamento usado para o tratamento de malária e lúpus. Seu uso para o combate ao novo coronavírus começou a ser defendido em fevereiro pelo pesquisador francês Didier Raoult, diretor do Instituto Mediterrâneo de Infecções em Marselha com base em estudos realizados na China. Desde então o estudo de Raoult foi desacreditado, mas a propaganda para o uso da cloroquina permaneceu. Ela foi impulsionada, principalmente, pela propaganda feita pelo presidente norte-americano Donald Trump, que declarou tomar hidroxicloroquina para evitar a covid-19.
O desdobramento mais recente foi um novo estudo da Universidade de Minnesota, nos EUA, divulgado pelo New England Journal of Medicine no dia 03 de junho. Os pesquisadores acompanharam 821 norte-americanos e canadenses com risco de alto a moderado de contrair covid-19. De acordo com padrões científicos internacionais, parte dos voluntários recebeu uma dose diária de hidroxicloroquina ao longo de cinco dias. Outro grupo recebeu placebo. A conclusão foi de que a hidroxicloroquina não foi eficiente para prevenir a infecção pelo novo coronavírus. “Foi decepcionante, mas não surpreendente”, declarou em entrevista o pesquisador responsável pelo estudo, David Boulware.
Orientações para o uso da cloroquina
A OMS não recomenda o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento de pacientes infectados pelo novo coronavírus. Ainda por e-mail, representantes da organização lembraram que “não há evidência científicas que os medicamentos sejam eficazes e seguros no tratamento de covid-19”. E lembram: “A maioria das pesquisas até agora sugere que não há benefício e já foram emitidos alertas sobre efeitos colaterais do medicamento”. Para a OPAS e a OMS, as drogas só podem ser usadas apenas “no contexto de estudos devidamente registrados, aprovados e eticamente aceitáveis”.
Aqui no Brasil, os Conselhos Federais de Medicina (CFM) e de Enfermagem (Cofen) e a Associação Médica Brasileira (AMB) publicaram orientações e recomendações reforçando que ainda não há evidências que comprovem a eficácia do medicamento.
O Ministério da Saúde lançou um protocolo para o manuseio de medicamentos para pacientes com covid-19 na rede pública desde os casos com sintomas mais leves. O documento sugere o uso da cloroquina ou da hidroxicloroquina associadas ao antibiótico azitromicina desde o primeiro dia, com doses que aumentam de acordo com a gravidade e com o tempo de infecção. Há uma série de exames que precisam ser realizados antes que as drogas sejam indicadas, como eletrocardiograma e diagnóstico para covid-19. O texto também ressalta que faltam estudos para embasar o uso dos medicamentos. “Não há meta-análises de ensaios clínicos multicêntricos [testes em humanos feitos em mais de um centro de estudos], controlados, cegos e randomizados que comprovem o benefício inequívoco dessas medicações para o tratamento da covid-19”, diz. Por fim, o protocolo é claro ao deixar a decisão final sobre o uso da cloroquina nas mãos do médico e do paciente, que precisa assinar um Termo de Ciência e Consentimento.
Contexto
Mesmo sem eficácia comprovada, o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina tem sido defendido pelo presidente Jair Bolsonaro e seus seguidores desde o começo da epidemia, alinhados com o discurso do presidente Donald Trump.
A insistência de Bolsonaro para a recomendação do uso da cloroquina levou à demissão de dois ministros da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, em 16 de abril, e Nelson Teich, em 15 de maio. Desde então, a pasta está nas mãos do general Eduardo Pazuello, promovido de secretário-executivo a ministro interino no dia 3 de junho. Foi sob o comando dele que o Ministério da Saúde publicou o protocolo para uso da cloroquina no combate ao novo coronavírus.
Os Estados Unidos lideram as estatísticas de covid-19, com 2.031.173 casos confirmados e 114.065 mortes até o dia 12 de junho, de acordo com levantamento da Universidade Johns Hopkins. O presidente Trump passou a antagonizar a OMS e, em 29 de maio, anunciou que o país estava deixando a organização. Ele disse que a “China tem controle total da OMS” e criticou a organização por dar “direcionamentos errados” ao mundo sobre o novo coronavírus.
A OMS é uma das agências da Organização das Nações Unidas (ONU), criada em em 1948 para dar atenção a questões relativas à saúde. O Brasil é um dos membros fundadores da organização. Inspirado no discurso de Trump, o presidente Bolsonaro também passou a fazer críticas e disse que a entidade “perdeu a credibilidade”. O presidente brasileiro defende o uso da cloroquina e insiste em minimizar os efeitos da pandemia e estimular a reabertura de país, contrariando governadores e prefeitos. O Brasil é o segundo país com maior número de casos confirmados de covid-19, com 802.828. Foram 40.919 mortes até o dia 12 de junho, também de acordo com levantamento da Universidade John Hopkins.
Alcance
O texto foi publicado pelo Jornal da Cidade Online em 7 de junho. Até o dia 12 já tinham sido registradas mais de 97,4 mil interações no site. A página de Facebook também repercutiu o texto, com 55 mil compartilhamentos e 5,7 mil comentários.
Alguns seguidores repassaram o texto pelo Twitter. A postagem que teve mais viralização teve 1,7 mil curtidas até o dia 12. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/post-distorce-informacoes-sobre-eficacia-da-ivermectina/ | COMPROVA | Post distorce informações sobre eficácia da ivermectina | null | 2020-06-12 | Médico defende uso do medicamento em pacientes com a covid-19 mas diz que é irresponsável post em grupo de Facebook que afirma que ele descobriu a cura para a doença
Conteúdo verificado: Publicação feita em 6 de junho por uma usuária no grupo de Facebook Aliança pelo Brasil independente
É enganosa a afirmação que a combinação de ivermectina e azitromicina é a cura para a covid-19, conforme post do dia 6 de junho que viralizou no Facebook. A autora da postagem em um grupo chamado Aliança pelo Brasil independente escreve “Temos outro remédio contra covid-19! Ivermectina + azitromicina e tchau coronavírus! Definitivamente, Deus é brasileiro!” ao comentar um texto do site Terra Brasil Notícias. A publicação não menciona a azitromicina, mas, afirma, no título: “Medicamento ivermectina elimina 97% do covid-19 dentro da célula em 48h, diz infectologista”.
O médico a que se refere a publicação é Fernando Suassuna, “um dos entusiastas do uso do medicamento” que, no texto, sugere o uso da droga como medida profilática. Em entrevista ao Comprova, Suassuna confirmou que realiza um estudo com o medicamento, mas disse que a pesquisa ainda está em fase preliminar. Declarou ainda que sua fala foi deturpada por alguns blogueiros.
Procuradas pelo Comprova, as autoridades da área da saúde não reconhecem o uso do medicamento para prevenção ou tratamento da covid-19. Por e-mail, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) afirmou que a ivermectina “não está registrada contra essa doença, portanto não é reconhecida pela agência como eficaz contra ela”. Também por e-mail, o Conselho Federal de Medicina (CFM) esclareceu que “não existem evidências robustas de alta qualidade que possibilitem a indicação de uma terapia farmacológica específica para a covid-19”. Em pesquisa no site do Food and Drug Administration (FDA), autoridade sanitária americana, o Comprova encontrou a recomendação de que pessoas não devem tomar ivermectina para prevenir ou tratar a covid-19.
Até a publicação desta verificação, o Comprova não conseguiu entrevistar Dedez Amaral, autora do post. Sua publicação foi na página Aliança pelo Brasil Independente, que se define como um “grupo oficial de apoio ao novo partido do Presidente Jair Messias Bolsonaro”.
Por que investigamos?
Posts e vídeos com link para reportagens com conteúdo que distorcem a realidade viralizam rapidamente nas redes sociais e trazem risco à população. Este post, leva a uma matéria que afirma que a “ivermectina elimina 97% do covid-19 dentro da célula em 48h”, desinforma ao fazer com que os leitores acreditem que a doença causada pelo novo coronavírus possa ser curada por uma droga cuja eficácia não está cientificamente comprovada.
No dia 9 de junho, a publicação, feita três dias antes, já tinha mais de 9.330 compartilhamentos e 576 comentários. Alguns internautas escreveram que já haviam comprado o remédio na farmácia e, outros, estavam perguntando onde achar. São pessoas que podem acreditar na cura, se automedicar e achar que não precisam mais se proteger do vírus.
Enganoso, para o Comprova, é todo conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos?
A verificação foi realizada em várias etapas. Primeiro, o Comprova tentou apurar quem é a autora do post, se ela de fato trabalha para o Ministério da Saúde e se é possível identificar em seu perfil no Facebook alguma interação com páginas e conteúdos duvidosos sobre a pandemia.
Na sequência, o Comprova investigou se a associação dos medicamentos ivermectina e azitromicina é realmente eficaz para o tratamento de pacientes com a covid-19. Buscamos estudos científicos e opiniões de especialistas que pudessem revelar os possíveis benefícios desses medicamentos. Foram consultados, também, o Conselho Federal de Medicina e autoridades sanitárias do Brasil e dos Estados Unidos.
Em um terceiro momento, a investigação do Comprova se debruçou sobre a figura do médico Fernando Suassuna, apontado pela reportagem como entusiasta e defensor do uso da ivermectina para o tratamento da covid-19. Investigamos se ele realmente disse ter tido resultados promissores com o uso do medicamento em um lar de idosos localizado em Natal e se esse protocolo estaria de acordo com as orientações dos órgãos de saúde da cidade e do Rio Grande do Norte.
Por fim, a verificação se ateve ao portal que publicou a notícia veiculada no post do Facebook, a fim de verificar sua veracidade. Analisamos se o portal já havia publicado outros conteúdos sobre a pandemia e qual o tom das reportagens. Investigamos, também, as redes sociais e o canal de YouTube do portal.
Verificação
Quem é a autora do post
Segundo o perfil da autora do post no Facebook, ela é funcionária do Ministério da Saúde no Rio de Janeiro. O Comprova enviou mensagem privada pedindo o contato, mas não teve resposta. Dedez Amaral respondeu a um comentário em um post recente, mas, depois, não retornou. Também encontramos um perfil no Instagram, mas está fechado e sem atividade.
Mesmo sem saber se o nome é verdadeiro (ou se “Dedez” é um apelido), entramos em contato por e-mail com o Ministério da Saúde, que respondeu não ter autorização para “informar sobre servidores” (print abaixo).
No perfil da autora do post no Facebook, é possível descobrir que ela apoiou Jair Bolsonaro durante a eleição presidencial. Em um outro post, em março do ano passado, se solidarizou quando o ex-presidente Lula perdeu o neto.
A ivermectina
De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a ivermectina está registrada como “medicamento contra infecções causadas por parasitas”. A Food and Drug Administration (FDA), órgão de vigilância sanitária dos Estados Unidos, libera o uso da ivermectina para o tratamento de vermes intestinais e de parasitas tópicos, como piolho e rosácea. Também é usada para o tratamento de parasitas em animais.
A primeira publicação sobre o uso da droga no tratamento de pacientes com covid-19 ocorreu na Austrália. A Universidade de Monash publicou um artigo no dia 3 de abril mostrando que a droga poderia eliminar o Sars-CoV-2, em uma cultura de células in vitro, dentro de 48 horas. O próprio estudo já ressalva, porém, que esse resultado não prova a eficácia da medicação contra a infecção em humanos pelo novo coronavírus e que era preciso aguardar novos testes.
Em e-mail enviado ao Comprova no dia 4 de junho, o Departamento de Medicina, Enfermagem e Ciências da Saúde da instituição explicou que o estudo apenas mostrou que a ivermectina tem efeito em eliminar o vírus em laboratório. E foi taxativo: “a ivermectina não pode ser usada em pacientes com covid-19 até que outros testes tenham sido conclusivos em estabelecer a eficácia do medicamento em níveis seguros para dosagem em humanos”.
Até o início de junho, havia um único estudo clínico sobre o uso da ivermectina para tratar pacientes com o novo coronavírus. O artigo tinha como autor principal o médico Amit Patel, então vinculado ao Departamento de Bioengenharia da Universidade de Utah. O estudo administrou em 704 pacientes com covid-19 (outros 704 foram selecionados como grupo de controle) em 169 hospitais na América do Norte, Europa e Ásia. Mas a pesquisa foi retirada do ar porque os dados foram coletados pela empresa Surgisphere; a mesma cuja metodologia de coleta dos dados levou a retratação de um estudo sobre a segurança da hidroxicloroquina publicado pela The Lancet. Em sua conta no Twitter, o médico Amit Patel disse não ter mais vinculação com a Universidade de Utah e não saber o que aconteceu com a Surgisphere.
Quem é Fernando Suassuna
Segundo os sites do Conselho Federal de Medicina e do Conselho Regional de Medicina do Rio Grande do Norte, Fernando Suassuna é médico inscrito desde 1978 com especialidade nas áreas de infectologia e de alergia e imunologia. De acordo com a plataforma de currículos acadêmicos Lattes, mantida pelo CNPq, Suassuna é formado em Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e mestre pela Universidade Federal de Pernambuco. Em 1983, fez um intercâmbio de três meses na Université Laval, em Quebec, no Canadá. Foi professor da UFRN, da Universidade Potiguar (UnP) e de cursos pré-vestibulares. Também trabalhou como infectologista no Hospital Giselda Trigueiro, no Rio Grande do Norte, e em clínicas privadas.
Suassuna defendeu o uso da ivermectina para tratar pacientes com covid-19 em entrevistas aos sites Tribuna do Norte, no dia 06 de junho, e Agora RN, no dia 08.
Na pesquisa do Google, o Comprova encontrou o site do infectologista Fernando Suassuna, que mora em Natal. No Facebook, o Comprova localizou o perfil o médico. As duas páginas apontavam para o mesmo número de contato da clínica.
Por telefone, o médico Fernando Suassuna confirmou ao Comprova que tem conduzido um estudo sobre o uso da ivermectina para tratar pacientes com covid-19, mas afirmou estar em fase observacional e que nenhum artigo foi publicado até o momento. Ele disse desconhecer o site Terra Brasil Notícias. Mas contou que, após ter dado entrevista à Tribuna do Norte, viu que alguns blogueiros haviam “deturpado” a fala dele, como se a cura da doença tivesse sido descoberta; o que o médico classificou de “irresponsável”.
Segundo Suassuna, ele ministrou a ivermectina em 116 idosos de três asilos de Natal: o Lar Jesus Misericordioso, o Instituto Juvino Barreto e o Lar do Ancião Evangélico, conhecido como LAE. Nos três locais, o medicamento teria sido prescrito após a confirmação de um primeiro caso de paciente com o novo coronavírus. Segundo o médico, não houve óbitos. Um idoso foi internado e 24 desenvolveram a doença na forma leve. “A gente tem mais 17 asilos para continuar o trabalho. Quando aparece um caso, a gente toma conta. A gente faz o tratamento, acompanha. E espera que esse seja o modelo para grupos de risco. Para evitar que eles vão para o hospital e levem ao colapso do sistema”, afirmou.
Fernando Suassuna disse que o estudo tem sido acompanhado por seis infectologistas do comitê municipal para enfrentamento da pandemia. Mas negou que seus estudos comprovem a cura da covid-19 porque ainda estão em fase inicial.
Além disso, o médico disse ter conhecimento de que o estudo clínico americano está sendo contestado. Mas afirmou que os resultados positivos em Natal estão sendo verificados in loco.
O uso da ivermectina em Natal
O Comprova procurou, então, a Prefeitura de Natal e o Governo do Rio Grande do Norte para saber se a ivermectina está sendo adotada no estado para o tratamento de pacientes com covid-19. Por email, a Secretaria Municipal de Saúde enviou uma cópia do protocolo de manejo para síndromes gripais frente à pandemia do novo coronavírus, que foi publicado no Diário Oficial do Município no dia 03 de junho.
O protocolo da Prefeitura de Natal prevê o uso da ivermectina em dois contextos. O primeiro é o tratamento de pacientes que, em função de questões alérgicas ou de possíveis efeitos colaterais, não possam fazer uso da cloroquina ou da hidroxicloroquina como tratamento para a covid-19.
O segundo é como medida profilática destinada a profissionais com elevado nível de exposição ao Sars-CoV-2 (como profissionais de saúde, policiais, bombeiros) ou indivíduos com fatores de risco para desenvolver a forma grave da covid-19 (portadores de síndrome metabólica, obesos, diabéticos, HAS isolada ou idosos).
Se a ivermectina for usada para profilaxia, o protocolo recomenda o acompanhamento médico da função hepática. A medicação não pode ser adotada por nutrizes e gestantes. O documento também desestimula o uso profilático em pacientes jovens saudáveis “para que se alcance a imunidade de rebanho [coletiva] progressivamente”.
Também por e-mail, a Secretaria Estadual de Saúde enviou uma nota ao Comprova. O Estado “não prevê o uso de Ivermectina no tratamento da covid-19 por não existir recomendação científica e não ter uma eficácia comprovada em vivo”. Além disso, o governo estadual “não recomenda nem sugere a utilização no tratamento até que esta droga se mostre comprovada cientificamente eficaz”.
A Secretaria Estadual de Saúde afirma ainda que a adoção da ivermectina pelo município de Natal foi feita “sem evidência científica nem recomendação do Ministério da Saúde”. O governo do Estado diz que pode rever sua posição se algum dos estudos em andamento comprovar a eficácia da ivermectina no combate ao novo coronavírus.
Em uma das entrevistas, Fernando Suassuna afirma que o Conselho Regional de Medicina vinha debatendo o uso da ivermectina. No dia 20 de maio, o Conselho lançou as recomendações para o uso de medicamentos para tratamento do novo coronavírus. Todos os medicamentos citados no documento exigem o consentimento do paciente para serem ministrados. O texto cita a ivermectina como uma das substâncias estudadas para combater a covid-19. Mas a droga só é opção para pacientes que estejam em tratamento hospitalar. O Comprova ligou para a entidade para entender mais sobre as orientações e a recepcionista pediu que a demanda fosse encaminhada por e-mail. Não houve resposta até o fechamento da verificação.
O que dizem as autoridades?
No dia 05 de junho, o Comprova consultou autoridades sanitárias sobre o uso da ivermectina em pacientes com covid-19 como parte de outra verificação sobre a droga. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) afirma que a ivermectina “não está registrada contra essa doença, portanto não é reconhecida pela agência como eficaz contra ela”.
No dia 10 de abril, a Food and Drug Administration (FDA), autoridade sanitária dos Estados Unidos, divulgou uma carta aberta em que alerta as pessoas a não usar remédios à base de ivermectina destinados a animais como tratamento contra a covid-19 (print abaixo). Segundo a FDA, as pessoas não devem tomar ivermectina para prevenir ou tratar a doença. Também não há nenhuma autorização da FDA para o uso emergencial da droga nos Estados Unidos em função da pandemia.
O site do National Center for Biotechnology Information, vinculado à US National Library of Medicine, afirma que a nota da FDA foi publicada porque o estudo da Austrália vinha sendo “difundido com grande interesse em sites voltados amédicos e veterinários”. O texto é assinado por Mike Bray, editor da Antiviral Research.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) não comenta casos específicos, mas, por e-mail, afirmou ao Comprova que “não existem evidências robustas de alta qualidade que possibilitem a indicação de uma terapia farmacológica específica para a covid-19” e que “muitos medicamentos têm sido promissores em testes através de observação clínica, mas nenhum ainda foi aprovado em ensaios clínicos com desenho cientificamente adequado, não podendo, portanto, serem recomendados com segurança”. Acrescenta ainda que os médicos “devem observar o Código de Ética Médica”, segundo o qual devem evitar o sensacionalismo, entendido como “utilização da mídia, pelo médico, para divulgar métodos e meios que não tenham reconhecimento científico”.
Contexto
Mesmo sem eficácia comprovada, a ivermectina vem sendo defendida por médicos em conteúdos que costumam viralizar nas redes sociais. Muitos desses materiais contêm informações distorcidas, dando a impressão de que existe uma cura para a covid-19, contrariando o que dizem autoridades de saúde, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O órgão afirmou ao Comprova que a ivermectina “não está registrada contra essa doença, portanto não é reconhecida pela agência como eficaz contra ela”. O Conselho Federal de Medicina (CFM) disse que não comenta casos específicos, mas afirmou ao Comprova que “não existem evidências robustas de alta qualidade que possibilitem a indicação de uma terapia farmacológica específica para a Covid-19“.
Grande parte dos brasileiros já completou mais de três meses em casa e não vê a hora de sair. Ao ler que há uma cura, essas pessoas podem relaxar o isolamento, apontado como a única medida capaz de frear o avanço da doença até o momento – estimuladas pelo presidente, que descumpre as regras de distanciamento social e pelos governos estaduais, que começam a reabrir o comércio em algumas cidades.
No momento em que cientistas do mundo inteiro correm contra o tempo para descobrir a cura da covid-19 e controlar o novo coronavírus, alguns sites tentam se destacar usando informações enganosas sobre curas milagrosas, que atrapalham o processo.
Isso tudo no momento em que o Brasil registrou 802.828 casos confirmados e 40.919 óbitos por covid-19 até a tarde de 11 de junho, de acordo com informações do Ministério da Saúde. Até a data, 311.064 pessoas haviam se recuperado e 390.033 estavam em acompanhamento.
Alcance
A postagem original foi compartilhada por mais de 9.600 pessoas no Facebook. Havia 586 comentários e 2.700 reações (apenas uma negativa).
Por meio da busca de imagem reversa do Google, foi possível encontrar o link replicado em outros sites, como Agora RN, Blog do BG e Blog Max Bezerra. E, de acordo com a ferramenta CrowdTangle, no total, o texto teve 55.960 interações na internet. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/video-de-aglomeracao-em-genebra-e-real-mas-nao-prova-que-pandemia-e-farsa/ | COMPROVA | Vídeo de aglomeração em Genebra é real, mas não prova que pandemia é farsa | null | 2020-06-11 | Ao relacionar as imagens da reabertura em Genebra com o fato de a sede da OMS estar na mesma cidade e argumentar que isso revelaria uma “manipulação”, youtuber omite duas questões importantes. A primeira é que a pandemia está sob controle na Suíça depois de oito semanas de medidas restritivas de isolamento social. A segunda é que a OMS não tem poder para emitir ordens, nem mesmo na cidade onde fica a sua sede
É enganoso o vídeo publicado em 4 de junho pelo canal “Seu Mizuca”, no Youtube, que traz imagens sobre a situação em Genebra, na Suíça, e aponta que a pandemia de coronavírus “é uma farsa”.
Antes de exibir uma gravação – narrada em espanhol e que mostra pessoas interagindo na cidade suíça sem máscaras e sem levar em conta o distanciamento social – o responsável pelo canal afirma que tais cenas, que teriam sido gravadas em 1º de junho na cidade-sede da Organização Mundial de Saúde (OMS), revelariam uma “manipulação” do cenário da pandemia. O mesmo vídeo foi publicado um dia antes na página do empresário Luciano Hang, dono da rede de lojas Havan, no Facebook.
O Comprova não conseguiu identificar o autor do vídeo utilizado por “Seu Mizuca” e nem confirmar se as imagens foram realmente captadas em 1º de junho, mas verificou que a gravação foi, de fato, feita em Genebra. Além disso, foi possível confirmar com pessoas que trabalham na região que a cidade suíça retomou suas atividades de forma praticamente normal.
Ao relacionar as imagens da reabertura em Genebra com o fato de a sede da OMS estar na mesma cidade e argumentar que isso revelaria uma “manipulação”, o youtuber omite duas questões importantes. A primeira é que a pandemia atingiu a Suíça antes do Brasil e que o país europeu passou por oito semanas de medidas restritivas de isolamento social. Depois disso, o governo local vem conseguindo manter a pandemia sob controle. O vídeo foi publicado pela primeira vez no Facebook, na página Proyecto Segunda República Río Cuarto y Sur de Córdoba, e no YouTube, no canal Miralo antes que lo censuren, em 1º de junho, data em que Genebra estava havia três dias sem novos casos de infecção pelo novo coronavírus registrados.
Em segundo lugar, o youtuber não menciona que a OMS faz apenas recomendações aos países e não emite ordens, nem mesmo para Genebra, onde está sediada.
Por que investigamos?
O Comprova verifica conteúdos que tenham grande viralização e repercussão nas redes sociais. É o caso do vídeo em questão, que foi visto, apenas no YouTube, mais de 270 mil vezes.
Este vídeo se junta a uma série de outros conteúdos que têm como objetivo minimizar a extensão da pandemia de covid-19, a doença provocada pelo novo coronavírus. Recentemente, o Comprova mostrou que eram enganosos conteúdos que falavam sobre enterros falsos ou supernotificação de casos.
A denúncia de uma suposta “farsa” pode ter como resultado uma desmobilização da sociedade diante das medidas necessárias para conter a pandemia, o que pode provocar comportamentos danosos.
No caso do vídeo verificado aqui, o responsável por sua divulgação não explica ao público que o papel da OMS se restringe a fazer recomendações às autoridades, mas que elas não são obrigadas a seguir tais sugestões. Isso vale, também, para a Suíça, onde está sediada a organização. O governo suíço é, inclusive, exemplo de um país que não seguiu todas as recomendações da OMS.
Para o Comprova, o conteúdo enganoso é aquele retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos?
Para realizar esta verificação, o Comprova utilizou a ferramenta InVid; o aplicativo desmembra o vídeo em frames e permite que se faça uma busca no Google em cima das imagens congeladas. Assim, é possível encontrar outras publicações com imagens similares, que nos levaram à mesma gravação em outros locais. Essa busca levou os verificadores a sites e perfis argentinos e espanhóis. Alguns deles foram contactados, mas não responderam aos pedidos de informação.
O Comprova também realizou buscas por palavras-chave no YouTube e no Facebook para tentar identificar a origem do vídeo. Em um dos comentários feitos no YouTube, um usuário citou como local da gravação o “Bains des Paquis”, atração turística em Genebra, na Suíça. Essa informação foi confirmada por meio de imagens encontradas no Google Maps e também por meio do contato com dois recepcionistas de hotéis da região. Ambos atestaram a movimentação intensa na área e o funcionamento normal de estabelecimentos e passeios de barco.
Também utilizamos ferramentas que nos ajudaram a comprovar que o clima e as sombras que aparecem no vídeo são compatíveis com os registrados em Genebra no dia em que o vídeo teria sido gravado. Utilizando o WolframAlpha, recuperamos os dados e verificamos as condições climáticas da cidade. De acordo com as informações da ferramenta, o dia teve uma temperatura média de 18ºC, chegando a 25ºC perto das quatro horas da tarde. A incidência de luz solar esteve alta o dia todo, enquanto poucas nuvens estavam no céu. Todas as informações batem com o que é possível observar no vídeo e condizem com uma movimentação de pessoas ao ar livre.
Com a SunCalc, uma ferramenta que ajuda a encontrar a posição do sol em determinado momento do dia, foi possível simular o posicionamento solar durante todo o dia 1º de junho. Podemos observar que as sombras das pessoas que caminham na orla e da lixeira são quase perpendiculares à fachada dos prédios nas ruas. Para as sombras serem exibidas desta maneira, o sol precisaria estar atrás dos prédios. Segundo a ferramenta, o sol estava em uma posição compatível com as sombras nessa posição no período compreendido entre as 17h e as 19h (nesta época do ano, o sol se põe em Genebra depois das 21 horas). É difícil cravar o momento exato em que o vídeo foi feito, já que o ângulo da filmagem não permite descobrir o quanto as sombras estão perpendiculares em relação aos prédios do fundo, mas, com as imagens existentes, comparando com a posição solar do SunCalc, é possível estimar que o vídeo tenha sido gravado perto das 18h.
[Atualização em 22 de junho de 2020 – o parágrafo acima foi atualizado para corrigir a estimativa do horário em que o vídeo deve ter sido feito. É provável que tenha sido perto das 18h e não perto das 13h, como publicado originalmente. A imagem da interface da ferramenta SunCalc, abaixo, também foi trocada.]
O Comprova também entrou em contato com a assessoria de imprensa do empresário Luciano Hang, cuja logomarca aparece no vídeo compartilhado, e o questionou sobre a origem das imagens. Publicações com o vídeo foram postadas, em 3 de junho, nas redes sociais de Hang (Twitter, Facebook e Instagram); nas legendas, ele afirma se tratar de uma gravação feita por um argentino que vive em Genebra. A assessoria do empresário disse por mensagem que Hang apenas compartilhou o vídeo que recebeu em um grupo do WhatsApp. O nome do grupo não foi mencionado.
Além disso, buscamos no site da Universidade Johns Hopkins, que agrega números mundiais de covid-19, a quantidade de casos e mortes pelo novo coronavírus na Suíça na época do vídeo. Também levantamos que o país foi o primeiro na Europa a flexibilizar o isolamento social, reabrindo restaurantes e bares em 11 de maio.
Por fim, verificamos que a cidade de Genebra abriga, de fato, a sede da Organização Mundial de Saúde (OMS). No entanto, o órgão internacional não possui jurisdição sobre qualquer cidade, estado ou país — incluindo a região onde está localizada.
Verificação
No conteúdo verificado pelo Comprova, o youtuber Seu Mizuka introduz um vídeo em seu canal alegando se tratar de um “choque de realidade” sobre a situação em Genebra, na Suíça, sede da OMS. “Talvez esse vídeo seja um dos vídeos mais importantes do século, para que as pessoas possam enxergar não seguiu todas as recomendações da OMS o quão manipulado é (sic) as coisas no Brasil e no mundo”, diz ele.
O vídeo em questão mostra um cais lotado de pessoas, a maioria sem máscaras, sentadas em mesas de restaurantes e circulando ao som de música alta. A narração do vídeo, feita em espanhol por um interlocutor que não aparece, afirma que as imagens foram gravadas em Genebra em 1º de junho.
“Aqui está a sede da OMS, essa mesma que manda em todos os lugares do mundo”, diz o narrador, em espanhol, em um dos trechos do vídeo.
Publicação no exterior
O Comprova utilizou a ferramenta InVid, que busca no Google frames do vídeo, para tentar encontrar outras postagens. A primeira delas foi feita no canal “Proyecto Segunda República Río Cuarto y Sur de Córdoba”, no Facebook. Restringimos nossa busca a veículos que republicaram postagens feitas na data em que o vídeo teria sido gravado – não encontramos nenhuma feita antes de 1º de junho.
A maioria das publicações encontradas consta em canais do YouTube e portais argentinos e espanhóis, incluindo dois veículos da Argentina: El Entre Ríos e Crónica TV. Ambos os sites alegam que o vídeo foi feito por um argentino que vive em Genebra, repetindo afirmação de Hang nas redes sociais. Enviamos e-mails para as duas redações questionando onde conseguiram o vídeo e não recebemos nenhum retorno até a publicação do texto.
Entramos em contato com um perfil no Facebook de uma mulher chamada Liliana Dayan, que diz viver em Buenos Aires, e publicou o vídeo em 1º de junho – mesma data em que supostamente foi gravado. Ela não nos retornou.
O vídeo também viralizou ao ser compartilhado pelo cantor espanhol Miguel Bosé, em 4 de junho. O músico disse que a pandemia é uma farsa. A fala de Bosé repercutiu em veículos como o Record (Portugal), El Periódico (Espanha) e até em portais esportivos espanhóis como Marca e Mundo Deportivo. Em março deste ano, a atriz Lucia Bosé, mãe do cantor, morreu em decorrência de uma pneumonia. Inicialmente foi divulgado que ela teria falecido pelo novo coronavírus, mas depois o diagnóstico foi descartado.
Narração real?
Alguns dos comentários feitos em canais do YouTube questionam se a narração é original ou se foi enxertada por cima do vídeo. “Pode ser uma gravação por cima do vídeo. Muito ruim publicarem assim”, escreveu o usuário identificado como Juan Pignata. Acima, o comentário do internauta Simon Gatti questiona a veracidade do vídeo: “Preciso de um indício, qualquer um, que me diga que a afirmação é atual. Simples assim”.
O Comprova não conseguiu descobrir se o vídeo foi modificado antes de ir ao ar.
Imagens são de Genebra
Outro comentário feito em um dos canais do Youtube indica que as imagens foram feitas na praça “Bains des Paquis”, um dos pontos turísticos de Genebra.
O Comprova conseguiu confirmar a informação verificando a localidade citada no Google Maps. No vídeo, várias vezes, o narrador afirma que ali se encontra a sede da OMS, o que pode induzir o espectador ao erro. O prédio da organização fica mesmo em Genebra, mas não no local onde foram feitas as filmagens.
Também pelo Google Maps, verificamos que a distância entre o “Bains des Paquis” e a sede da OMS é de 3,8 km.
Conforme esta reportagem da CNNMoney Suíça, os bares, restaurantes e cafés do país foram autorizados a reabrir no dia 11 de maio, depois de oito semanas de restrição no funcionamento. Diante da flexibilização da quarentena, perguntamos a dois funcionários de hotéis próximos ao “Bains des Paquis” se havia movimentação na data dos vídeos.
O Comprova conversou por telefone com o recepcionista Florence, do hotel President Wilson, em frente à Bains des Paquis, que relatou que “está tudo funcionando. Tudo aberto mesmo. É como se não tivesse nada.”
Em outra ligação, desta vez com a recepcionista Charla, do hotel Le Richemond, também próximo ao local, a informação foi similar: “Tem gente, sim, nas ruas. Os restaurantes estão abertos, mas alguns fechados porque não quiseram abrir”. Questionada se há orientação do governo suíço para que bares e restaurantes se mantenham fechados, ela respondeu: “Não, no momento, não! Tudo está aberto e tudo está bem”.
Segundo a página do ponto turístico no Facebook, os únicos serviços que ainda não haviam retornado, de saunas e massagens, voltaram a funcionar no dia 6 de junho.
OMS não pode dar ordens
No vídeo, o narrador acusa a OMS de ser a responsável pelas medidas adotadas para tentar conter o vírus. “Aqui está a sede da OMS, essa mesma que manda o mundo todo usar máscaras (…), que nos obriga a manter distanciamento de um metro entre as pessoas”, diz.
No entanto, não é função do órgão dar ordens. A OMS pode recomendar diretrizes, mas não possui poder de fiscalização.
A entidade pode alertar os países dos riscos do novo coronavírus (e diversas outras questões de saúde), apresentar dados consolidados sobre a situação da pandemia no mundo e até orientar quais ações podem ser tomadas no combate à doença. Mas ela não tem poder para aplicar multas ou interferir em um país que não cumprir as recomendações.
Isso se aplica também à cidade de Genebra e à Suíça. Mesmo sediando o órgão, nem a prefeitura e nem o país têm a obrigação de seguir com os protocolos recomendados pelo órgão internacional.
Situação da Covid-19 na Suíça
A Suíça registrou o primeiro caso do novo coronavírus no dia 25 de fevereiro, no cantão (uma das unidades da federação) de Ticino, que faz fronteira com a Itália. Três dias depois, em 28 de fevereiro, o Conselho Federal (o Poder Executivo do país) classificou a situação como “especial”, com base em uma legislação voltada para períodos de epidemia, e passou a tomar decisões que, normalmente, caberiam aos governos regionais. Na mesma data, passou a ser proibida a realização de grandes eventos, com mais de mil pessoas. A 43ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, prevista para ocorrer no começo de março, em Genebra, acabou sendo cancelada.
A partir de 13 de março, o país passou a adotar uma série de medidas para prevenir a ampliação da epidemia no território nacional, impedir a entrada de estrangeiros que pudessem estar contaminados e melhorar a estrutura de atendimento e tratamento aos doentes. As determinações vão do fechamento das fronteiras e espaços de lazer, como cinemas, teatros e boates, à paralisação das aulas presenciais dos estudantes de nível fundamental e médio.
As restrições impostas pelo governo suíço começaram a ser relaxadas no dia 27 de abril, conforme decisão do dia 16. Na data da reabertura, o país ainda tinha um total de 5.299 casos ativos da covid-19, com 22.200 pessoas recuperadas da doença, e 1.665 mortes, segundo o monitoramento realizado pela Universidade Johns Hopkins.
O processo de reabertura e retomada das atividades econômicas foi feito de forma gradual e coordenada pelo governo central do país. Os bares, cafés e restaurantes, como os que aparecem no vídeo, foram autorizados a reabrir no dia 11 de maio, em uma segunda fase da flexibilização da quarentena.
Também passou a ser permitido praticar esportes — tudo com a garantia da adoção de medidas de higiene e um mínimo distanciamento social. A partir desta data, quando o país registrava 1.699 casos ativos da doença, as autoridades passaram a traçar as origens e contatos de todos os novos casos registrados da covid-19.
No dia 30 de abril, a campanha nacional de prevenção ao novo coronavírus mudou o nível de alerta para o “rosa”’, que indicava a atenção ao distanciamento social e às medidas de higiene – sobretudo lavar as mãos, mas o país não adotou o uso obrigatório de máscaras nos espaços públicos.
A reabertura das fronteiras com a Alemanha, Áustria e França, bem como a permissão de entrada de estrangeiros da União Europeia e Reino Unido está prevista para o próximo dia 15.
Situação em Genebra
O cenário do país e da cidade é bem parecido. Segundo o monitoramento publicado pelo Google, consultado no dia 10 de junho, a curva epidemiológica está praticamente estabilizada, depois de uma forte queda no registro diário de novos casos.
Ao todo, a cidade registra 5.142 casos do novo coronavírus, e contabilizou, até 10 de junho, 259 mortes. Na comparação com o restante do país, o único dado que chama a atenção é o número de casos registrados por milhão de habitantes: proporcionalmente, Genebra teve bem mais casos (10.295) do que o país como um todo (3.612). A Suíça também está bem acima da média global, que é de 905 casos a cada um milhão de pessoas.
Considerando que o vídeo verificado tenha sido realmente gravado no dia 1º de junho, a cidade já não tinha novos casos há três dias. O último registro de novas infecções em maio (e não há dados disponíveis sobre junho) ocorreu no dia 27, quando 3 casos foram confirmados.
No dia 10 de junho, se subtraídos os casos de pessoas recuperadas e os de óbitos, a Suíça ainda registrava 377 casos ativos do novo coronavírus, segundo o mapa global da Johns Hopkins.
Contexto
O questionamento das orientações dadas pela OMS no combate à pandemia da covid-19 tem sido uma constante nos discursos que tentam minimizar a doença. Nos Estados Unidos, Donald Trump já acusou o braço da ONU na saúde de estar ligado à China, e o país norte-americano chegou a romper com o órgão.
No Brasil, os ataques de Jair Bolsonaro à Organização Mundial da Saúde são frequentes, e o presidente, nesta semana, insinuou que a intenção das recomendações seja “quebrar os países”.
Frequentemente, os apoiadores de Bolsonaro e Trump acusam a OMS de contradições nas medidas recomendadas e dão a entender que o órgão não está seguindo as próprias orientações — o que não condiz com a verdade, já que, como apontado nesta verificação, a organização atua apenas de forma recomendatória.
Alcance
Até o dia 10 de junho, todas as páginas mantiveram os respectivos conteúdos no ar. O vídeo de Seu Mizuka apresentava, no YouTube, 277.616 visualizações, 56 mil curtidas e 625 descurtidas. No Twitter, foram 21 retuítes e 68 curtidas.
Somando todos os outros compartilhamentos, até 10 de junho o YouTube registrou 365.483 visualizações, 6.025 curtidas e 379 descurtidas. No Facebook, as postagens somam 26.824 interações e 3,1 mil compartilhamentos. Já no Twitter, foram 16,5 mil visualizações, 2.381 retuítes e 5.200 curtidas. No Instagram, o vídeo teve 350.818 visualizações. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-verdade-que-crianca-com-suspeita-de-covid-19-foi-colocada-em-caixao-lacrado-e-mais-tarde-testou-negativo/ | COMPROVA | É verdade que criança com suspeita de covid-19 foi colocada em caixão lacrado e, mais tarde, testou negativo | null | 2020-06-10 | O procedimento de lacrar o caixão é padrão em casos de óbitos confirmados ou com suspeitas de coronavírus, como é o caso da morte de uma menina cujo caixão aparece em vídeo publicado nas redes sociais sendo aberto pela família. O resultado do exame foi divulgado somente uma semana depois e o teste deu negativo
É verdadeira a história que circula nas redes sociais de que uma criança com suspeita de covid-19 foi colocada, sem limpeza, dentro de caixão lacrado. Ela, contudo, não havia sido infectada pelo novo coronavírus, de acordo com resultado do exame divulgado uma semana depois. Um vídeo, que mostra o momento que a família abre a urna e se depara com a menina suja de sangue, viralizou na internet.
O caso ocorreu na cidade de Touros, no Rio Grande do Norte, no dia 19 de maio. A menina seria enterrada com a urna lacrada por suspeita de covid-19, mas a família abriu o caixão e descobriu que a limpeza do corpo não havia sido realizada para o sepultamento. O procedimento de lacração é padrão em casos de suspeita de contaminação pelo novo coronavírus, de acordo com o Guia para o Manejo de Corpos no Contexto do Novo Coronavírus – COVID-19 do Ministério da Saúde.
A Prefeitura de Touros abriu um processo administrativo para investigar o que ocorreu. E informou, uma semana após o fato, que o resultado do teste da criança deu negativo para o novo coronavírus e que o óbito não foi contabilizado nas estatísticas do estado de mortes relacionadas à pandemia.
Por que investigamos?
O Comprova monitora conteúdos sobre o novo coronavírus compartilhados em redes sociais e aplicativos de mensagens que tenham grande alcance e repercussão. No caso do vídeo investigado, em uma publicação no Facebook, no dia 22 de maio, ele foi visto por cerca de 8,4 milhões de pessoas.
Além disso, a história é compartilhada em um contexto em que mensagens tentam minimizar os efeitos da pandemia e questionam informações fornecidas por órgãos oficiais, alegando uma suposta supernotificação de casos contabilizados de mortes causadas pela covid-19 no Brasil.
Em maio, o Comprova fez uma verificação de uma publicação enganosa a partir de um post que continha a foto de um caixão aberto com um travesseiro dentro. A alegação era de que caixões vazios estariam sendo enterrados no estado do Amazonas. A imagem era, na realidade, de 2017 e foi publicada em uma reportagem que denunciava um golpe para resgate de seguro de vida.
O selo comprovado, para o Comprova, é fato verdadeiro, evento confirmado, localização comprovada ou conteúdo original publicado sem edição.
Como verificamos?
Para verificar a origem do vídeo, o Comprova utilizou busca reversa de imagens, a partir do Google Imagens, quando retratos paralisados do vídeo são usados para achar outras publicações da mesma gravaçã,. Também foi usada a pesquisa avançada em buscadores para encontrar registros do caso.
O sepultamento teve cobertura local do portal “Agora RN” e do programa “Primeiro Impacto”, do SBT. Nas redes sociais da prefeitura do município de Touros também foram encontrados comentários sobre o acontecimento.
O Comprova entrou em contato com a prefeitura por telefone. A Polícia Civil do Rio Grande do Norte também foi procurada e não retornou. Já a funerária que prestou o serviço disse que não iria se pronunciar sobre o assunto. O Comprova não conseguiu contato com a família.
Verificação
Segundo informações da Secretaria Municipal de Saúde, a criança de 9 anos deu entrada no Hospital de Touros com falta de ar, às 21h30 do dia 18 de maio. O caso se agravou e a menina morreu. Na declaração emitida pela unidade, o motivo da morte era “insuficiência respiratória aguda e suspeita de covid-19”. O diagnóstico, contudo, foi contestado pela família, segundo a própria prefeitura.
O serviço funerário foi realizado com auxílio da prefeitura. Como havia suspeita de infecção pelo novo coronavírus, o caixão foi lacrado, conforme orientação do Ministério da Saúde.
No dia do sepultamento, familiares da menina, que contestavam o diagnóstico, resolveram abrir o caixão. O vídeo que circula na internet mostra o momento em que a urna é aberta e a criança aparece morta apenas com um pedaço de pano cobrindo o corpo, sem a devida limpeza. Nas imagens é possível ver sangue escorrendo do nariz da menina.
Revoltada, a mãe da criança diz que jogaram a menina como um bicho dentro do caixão e que esse teria sido o motivo para lacrar a urna. Em entrevista ao SBT, ela informou que tinha certeza de que a filha não estava com o novo coronavírus e que os médicos sabiam que esta não era a causa.
O vídeo da família abrindo o caixão viralizou nas redes sociais. Em um canal do Youtube ele havia sido visualizado mais de 75 mil vezes até a noite desta segunda-feira, dia 8 de junho. Os comentários acusavam a prefeitura de esconder o verdadeiro motivo da morte.
O secretário de Saúde do município, Higor Andrade, se manifestou no dia 20 de maio numa rede social. Ele informou que o hospital seguiu todos os protocolo do Ministério da Saúde e que aguardava o resultado do teste de covid-19 realizado na criança após o óbito. Disse também que a prefeitura havia aberto um processo administrativo para apurar o que aconteceu e porque a limpeza do corpo não foi feita. Segundo o órgão, apesar de o auxílio funerário ser concedido pela Secretaria de Assistência Social, o serviço é terceirizado.
Cinco dias depois, a prefeitura voltou a se manifestar nas redes sociais. Por meio de nota, o órgão informou que o resultado do exame da criança era negativo para o novo coronavírus e que a causa da morte da menina seria alterada no sistema de informação de mortalidade do município.
O Comprova entrou em contato com o Secretário de Saúde de Touros, Higor Andrade, por telefone. Ele confirmou a abertura do processo administrativo e disse que o caso da criança nunca foi contabilizado nas estatísticas do novo coronavírus divulgadas pelo município. Contudo, havia suspeita de covid-19 na declaração de óbito e por isso o caixão foi lacrado. A funerária também foi procurada. Uma funcionária informou que os proprietários não iriam se manifestar.
Verificação do Comprova mostrou que as mortes por covid-19 só são incluídas nas estatísticas oficiais após a realização de exames.
O caso também é investigado pela Polícia Civil do estado, mas a Secretaria de Segurança do Rio Grande do Norte não retornou aos pedidos de comentário feitos pelo Comprova.
Contexto
Touros é uma cidade no interior do Rio Grande de Norte com aproximadamente 33 mil habitantes, segundo dados do IBGE. Até esta terça-feira, 09 de maio, o município registrava 118 casos confirmados de covid-19 e seis óbitos causados pela doença, segundo boletim divulgado pela Prefeitura.
No Rio Grande do Norte, 153 dos 167 municípios possuem casos confirmados do novo coronavírus. Ao todo, 11.027 pessoas já foram contaminadas e 459 já morreram no Estado, de acordo com dados do Ministério da Saúde..
Os números divulgados pelos Estados foram foco de polêmica recentemente. O empresário Carlos Wizard, que estava cotado para assumir a Secretaria da Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, informou que o governo iria recontar as mortes no Brasil, pois os dados atuais seriam “fantasiosos ou manipulados”.
Wizard afirmou que os números estavam sendo inflados e que muitos gestores públicos, por interesse em ter um orçamento maior, estavam notificando todos os casos de morte como covid-19.
A fala do empresário gerou revolta entre governadores estaduais e foi repudiada pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass). Wizard desistiu do cargo no Ministério e disse que havia sido mal interpretado.
Na última sexta-feira, 5 de junho, o governo tirou do ar o painel da covid-19 do site do Ministério da Saúde. Ao retornar com o portal, a pasta passou a divulgar apenas os dados das últimas 24 horas, sem dados acumulados de mortes e pessoas contaminadas pelo novo coronavírus. Após decisão do Supremo Tribunal Federal, o governo teve que voltar a divulgar o total de números nesta terça-feira.
Alcance
Até esta terça-feira (9), uma publicação no Facebook com o vídeo tinha 8,4 milhões de visualizações. Postada no dia 22 de maio, a legenda que acompanha a gravação não possui nenhuma informação falsa, mas está desatualizada: o teste com o resultado negativo ainda não havia sido divulgado. No YouTube, uma postagem de 20 de maio havia sido visualizada por 75 mil pessoas. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Comprovado'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/imagem-mostra-boneco-de-plastico-em-protesto-e-nao-corpo-carregado-so-por-uma-mao/ | COMPROVA | Imagem mostra boneco de plástico em protesto, e não corpo carregado só por uma mão | null | 2020-06-09 | Post usou uma foto feita em um ato realizado nos Estados Unidos para minimizar a extensão da pandemia do novo coronavírus
Uma fotografia que mostra uma pessoa carregando o que seria uma figura humana envolta em um saco plástico preto está sendo compartilhada nas redes sociais com o objetivo de desacreditar o número de mortes pela covid-19. A legenda da imagem diz que as pessoas estariam “levando o corpo só com uma mão” e afirma que deveriam “tentar disfarçar melhor”.
A fotografia original não mostra corpos de verdade e não foi tirada em um enterro. Ela foi registrada pelo fotógrafo Cristobal Herrera no dia 27 de maio, durante uma manifestação na cidade de Miami, nos Estados Unidos. O protesto fez um funeral simbólico, no qual os sacos plásticos representavam pessoas que haviam morrido de covid-19 no passado. Ou seja, a fotografia não mostra pessoas levando um corpo só com uma das mãos.
Até o dia 27 de maio, quando a fotografia foi feita, os Estados Unidos tinham confirmado mais de 100 mil mortes e 1,69 milhão de infecções pelo novo coronavírus de acordo com o painel mantido pela Universidade Johns Hopkins.
Por que investigamos?
O Comprova verifica conteúdo suspeito que tem grande alcance nas redes sociais. Vídeos e fotografias desacreditando a ciência e a gravidade da pandemia do novo coronavírus têm circulado nas redes trazendo desinformação para a população e dificultando o controle da doença.
Nesta verificação, a publicação analisada infere que o corpo mostrado na fotografia seria falso e utiliza essa afirmação para desacreditar o número de mortos pela pandemia. De fato, como mostramos na verificação, é um corpo “falso” – mas que não serve para provar nenhum ponto em relação ao número de mortos. O “corpo” foi feito com sacos plásticos e utilizado para representar pessoas reais que morreram por conta da covid-19 nos Estados Unidos.
Para o Comprova, o conteúdo enganoso é aquele retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos?
O Comprova fez uma busca reversa de imagem no Google e encontrou a mesma fotografia publicada em centenas de sites. As publicações mais antigas foram encontradas no site da Agência Lusa e da Agência EPA. As duas são agências de jornalismo que vendem fotografias e outros conteúdos para jornais ao redor do mundo. Em ambos os casos, a imagem estava creditada ao fotógrafo Cristobal Herrera e continha mais algumas informações — teria sido tirada no dia 27 de maio de 2020 no parque Torch of Friendship.
A partir destas informações, pesquisamos no Google sobre o evento e encontramos imagens da fotógrafa Chandan Khanna, da Agência AFP, mostrando outros ângulos do que parecia ser o mesmo evento. De acordo com a legenda, as fotografias eram de um protesto organizado pela New Florida Majority (NewFM) e os sacos plásticos pretos estariam representando corpos em um funeral simbólico. Pesquisamos nas redes sociais da NewFM e encontramos outros vídeos e fotografias dos atos realizados no dia 27 de maio. Também encontramos uma transmissão ao vivo feita neste dia a partir do parque Torch of Friendship — que, posteriormente, ficou salva como um vídeo.
Entramos em contato e conversamos com o fotógrafo Cristobal Herrera via Instagram e Facebook. Também procuramos a NewFM por Instagram e por e-mail, mas até a publicação desta verificação não recebemos resposta.
Verificação
A legenda que acompanha a fotografia afirma que a pessoa estava “levando o corpo só com uma mão”. Também diz que “podiam tentar disfarçar melhor” — esse comentário foi feito com o intuito de desacreditar a pandemia e o número de mortos pela covid-19, doença causada pelo novo coronavírus. Uma busca reversa da imagem no Google mostrou que a fotografia original foi capturada pelo fotógrafo Cristobal Herrera no dia 27 de maio de 2020 no parque Torch of Friendship, na cidade de Miami, na Florida, nos Estados Unidos.
Neste dia, o movimento estadunidense New Florida Majority (NewFM) organizou um protesto contra a reabertura da economia no estado da Flórida. Os manifestantes organizaram um funeral simbólico e colocaram sacos plásticos pretos para representar os corpos de pessoas que morreram pela covid-19. Durante o evento, eles fizeram uma transmissão ao vivo que, posteriormente, ficou salva no Facebook como um vídeo. Nela, é possível perceber que se trata do mesmo local — o parque Torch of Friendship — em que a fotografia foi tirada.
Por mensagem, o fotógrafo Cristobal Herrera confirmou que a imagem foi feita durante o protesto. “São corpos falsos. A legenda das fotografias é bem clara sobre a imagem. Mas algumas vezes isso [a confusão em relação à imagem] acontece porque as pessoas não leem as legendas”, afirmou Herrera. “Eles [os manifestantes] me disseram que foi um longo processo para fazer os corpos simbólicos”, complementou.
Em outros vídeos e fotografias feitos no mesmo dia, publicados pela NewFM e também pela Agência AFP, é possível observar os mesmos “corpos simbólicos” retratados na fotografia de Herrera.
Contexto
Desde o começo da pandemia do novo coronavírus, circulam nas redes sociais diversas narrativas que têm como objetivo negar ou relativizar os efeitos da covid-19. O Comprova já verificou publicações que, supostamente, mostravam covas abertas sem enterros, redução no número de mortes depois de operação policial e número de casos menor que o oficial.
Desta vez, a publicação verificada infere de maneira equivocada, a partir de uma fotografia verdadeira, que estariam enterrando “corpos falsos”. No começo de maio, diversas publicações que mostravam caixões vazios ou “cheios de pedras” foram checadas por agências independentes. O objetivo é desacreditar o número de mortos divulgados pelo Ministério da Saúde. Até o dia 8 de junho, o Brasil já tinha 37.134 mortos pela covid-19.
Alcance
O usuário responsável pelo post enganoso apagou a publicação, mas até isso ocorrer o conteúdo já tinha sido compartilhado mais de 10 mil vezes no Facebook. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/protocolo-de-uso-da-cloroquina-nao-aumentou-o-numero-de-pacientes-recuperados-de-covid-19-no-brasil/ | COMPROVA | Protocolo de uso da cloroquina não aumentou o número de pacientes recuperados de covid-19 no Brasil | null | 2020-06-08 | Post que viralizou nas redes sociais afirma que depois da adoção do “protocolo da cloroquina” o Brasil passou a ter o “número de curados quase duplicado”, mas o Comprova verificou que a porcentagem de pessoas recuperadas da covid-19 ante o número de casos da doença provocada pelo novo coronavírus se mostra estável
É falsa a afirmação de que o número de pacientes recuperados de covid-19 no Brasil aumentou depois que o Ministério da Saúde passou a recomendar o uso de cloroquina em casos leves de covid-19. O Projeto Comprova verificou o texto publicado no dia 29 de maio no site “Agora Paraná”, assinado por Oswaldo Eustáquio. O autor diz que depois da adoção do “protocolo da cloroquina” o Brasil passou a ter o “número de curados quase duplicado”. Mas os dados do Ministério da Saúde desmentem essa alegação.
O blogueiro, conhecido defensor do presidente Jair Bolsonaro, comemora que o Brasil tinha o segundo maior número de pacientes curados até um dia antes da publicação — ou seja, 28 de maio — e que havia ultrapassado a Alemanha. Em entrevista por telefone, ele disse que se baseou em dados da Universidade Johns Hopkins para chegar a essa conclusão. “Minha matéria é muito específica e clara. A fonte é uma instituição reconhecida mundialmente como a maior faculdade de ciências do mundo, e isso está no ranking [da John Hopkins], e a minha matéria não diz sobre estatística, sobre porcentagens, é sobre números [absolutos]“, afirmou.
De fato, os dados da universidade informam que, na data, o Brasil tinha o segundo lugar em quantidade de pacientes recuperados, 177.604 (veja mais detalhes abaixo). Mas a forma como Eustáquio usou a informação é enganosa já que, naquele momento, o país também era medalha de prata em infecções: 438.238 casos confirmados. Uma taxa de recuperação de 40,5%. No mesmo dia, a Alemanha registrou 163.360 pacientes livres da covid-19, mas sobre um universo de infectados muito menor: 182.196. No caso dos alemães, a taxa de recuperação mais que dobra, chegando a 89%.
Por que investigamos?
O Comprova verifica conteúdos sobre o novo coronavírus, e a covid-19, doença provocada por ele, que tenham grande viralização. É o caso da reportagem do site Agora Paraná.
Esses conteúdos são relevantes pois se inserem em uma lista de materiais que circulam com o intuito de minimizar a pandemia de covid-19. O potencial negativo desses conteúdos é significativo, pois eles podem ter como resultado uma desmobilização da sociedade em praticar o isolamento social e adotar medidas de higiene necessários para combater a proliferação do vírus, para o qual não há cura ou vacina.
No Brasil, após o presidente Jair Bolsonaro defender a tese de que a pandemia não é grave e de que a cloroquina é uma alternativa para a doença, páginas conhecidas por apoiá-lo adotaram esse discurso. Nas últimas semanas, o Comprova verificou, por exemplo, conteúdos que levantavam dúvidas sobre o número de mortes por covid-19 e os registros de óbitos em cartórios.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos?
A equipe do Comprova foi atrás de dados sobre infecção, óbito e recuperação de pacientes de covid-19 no Ministério da Saúde e nos arquivos da Universidade John Hopkins. Com eles foi possível calcular as taxas de recuperação dos pacientes infectados aqui no Brasil e na Alemanha na data de publicação do texto verificado.
Também buscamos as diretrizes para o tratamento medicamentoso de pacientes com covid-19, divulgadas pelo Ministério da Saúde no dia 20 de maio. Esse protocolo trata do uso da cloroquina e da hidroxicloroquina em pacientes mesmo que estejam com sintomas leves. Determina como deve ser feita a aplicação e a dosagem. O doente deve autorizar o uso do medicamento.
Também procuramos a assessoria de imprensa do ministério, para entender se há relação entre a publicação das diretrizes e um aumento na média de pacientes recuperados de covid-19.
Ainda sobre o uso de cloroquina, buscamos as pesquisas mais recentes sobre o medicamento em todo mundo. E questionamos o Conselho Federal de Medicina para saber se é possível falar em “cura” quando se trata de covid-19.
Por fim, o Comprova entrou em contato com o autor do texto, o blogueiro Oswaldo Eustáquio. Inicialmente, o Comprova enviou um Whatsapp questionando o texto escrito por ele, que respondeu com prints de números de recuperados. Perguntado sobre a fonte dos dados, ele ligou para o Comprova.
Verificação
Não é possível afirmar que há uma relação direta entre o uso da cloroquina e a recuperação de pacientes de covid-19. No texto verificado, o autor comemora “a marca de 177 mil pessoas curadas” até o dia 28 de maio e afirma que após a “prescrição e o uso deste medicamento (cloroquina), o Brasil começou a ter o número de curados praticamente duplicado”. Os números oficiais divulgados pelo Ministério da Saúde não confirmam a afirmação. Cruzamos o número de casos confirmados até o dia da postagem (28 de maio), 438.238, com o de pacientes recuperados na mesma data, 177.604, e chegamos a uma taxa de recuperação de 40,5%. Esse índice pouco variou depois da adoção do protocolo. Era de 38,4% no dia 16 de maio e 40% no dia em que o documento entrou em vigor, 20 de maio. No dia 03 de junho era de 40,8%. Veja a variação nos gráficos abaixo.
A Flourish chart
A Flourish chart
O blogueiro diz ainda que temos “oito mil curados, em média, por dia”. De fato, nos oito dias entre as diretrizes entrarem em vigor e a publicação do texto no “Agora Paraná” a média de pacientes recuperados, ainda segundo os dados do ministério, foi de 7,8 mil por dia. Mas o número de “curados” não foi “duplicado”, como ele alega. Nos oito dias que antecederam o protocolo a média foi de 4,9 mil pacientes recuperados por dia.
Calculamos também o número de óbitos em relação ao total de infecções. Essa taxa sofre uma pequena variação depois da adoção do protocolo. Era de 6,7% em 16 de maio, dia em que foram registradas 15.633 mortes. No dia 20 de maio foram 18.859, 6,4% do total. No dia da publicação do texto verificados, 28 de maio, o registro foi de 26.754 mortes, 6,1% do total de casos confirmados. Confira o gráfico.
A Flourish chart
Quem é Oswaldo Eustáquio
Filho de pai militar e mãe paraguaia, Eustáquio se define no Twitter como “jornalista investigativo, apaixonado pela verdade, inimigo da corrupção. Conservador”. Ele assina textos no site “Agora Paraná” que publica conteúdos enviesados e distorcidos, como o publicado no dia 3 de junho que informa que Eustáquio teria sido arrastado pelo carro da reportagem do “Estadão”. Segundo nota da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), “a versão do vídeo divulgada por militantes bolsonaristas não (…) inclui o momento em que Eustáquio tenta impedir a equipe do ‘Estadão’ de deixar o local, ao manter sua mão na porta do carro”.
Em fevereiro deste ano, Eustáquio foi condenado pela Justiça a pagar R$ 15 mil por publicar uma informação falsa envolvendo o jornalista norte-americano Glenn Greenwald, do site The Intercept Brasil.
Em uma reportagem da TVCI, de Paranaguá (PR), publicada em maio de 2019 no YouTube, Eustáquio se diz “amigo pessoal” da ministra Damares Alves e conta que trabalhou na comunicação da pasta durante a transição, no início do governo Bolsonaro. A matéria é sobre a saída de Eustáquio da emissora, onde ele ficou por oito anos no comando do jornalismo, e sua mudança para Brasília. “Fiquei de dezembro até fevereiro na condução da comunicação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, da ministra Damares Alves, minha amiga pessoal. Fiz toda essa transição. Agora vou a Brasília trabalhar com comunicação”, ele diz na reportagem.
Ainda sobre a relação de Eustáquio com o governo federal, sua mulher, a indígena Sandra Terena, é secretária nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
Mais recentemente, em maio, ajudou a criar o acampamento “Os 300 do Brasil”, em Brasília. Segundo a ativista de grupo de extrema direita Sara Winter contou em uma Live com o blogueiro, foi ele quem teve a ideia: “O Oswaldo falou assim, ‘acho que a gente tinha que chamar todo mundo para acampar aqui em Brasília; a gente tinha que fazer um acampamento, se mobilizar’”.
Existe cura para a covid-19?
Um paciente que foi diagnosticado com covid-19 é considerado “recuperado” depois de dois resultados negativos em exames laboratoriais para SARS-CoV-2. Isso costuma acontecer 14 dias depois da infecção inicial. O Ministério da Saúde brasileiro segue esta orientação.
Para o Conselho Federal de Medicina, ainda não há medicamentos capazes de “curar” a covid-19. Por e-mail, o CFM disse que “até o momento, não existem evidências robustas de alta qualidade que possibilitem a indicação de uma terapia farmacológica específica para a covid-19”. Para o Conselho, há justificativas para o uso de a cloroquina e a hidroxicloroquina no tratamento de covid-19 por causa da ação anti-inflamatória, do baixo custo e dos efeitos colaterais conhecidos dos medicamentos. Mas ressalva: “não existem até o momento estudos clínicos de boa qualidade que comprovem sua eficácia em pacientes com covid-19. Esta situação pode mudar rapidamente, porque existem dezenas de estudos sendo realizados ou em fase de planejamento e aprovação”.
Eficácia em xeque
Um estudo sobre a eficácia da cloroquina foi divulgado pelo New England Journal of Medicine no dia 3 de junho. Realizado por pesquisadores da Universidade de Minnesota, nos EUA, com 821 norte-americanos e canadenses risco alto a moderado de contrair covid-19. O teste foi planejado de acordo com padrões científicos internacionais. Parte dos voluntários recebeu uma dose diária de hidroxicloroquina — forma menos tóxica da cloroquina — ao longo de cinco dias. Outro grupo recebeu placebo. A conclusão foi de que a hidroxicloroquina não foi eficiente para prevenir a infecção pelo novo coronavírus. “Foi decepcionante, mas não surpreendente”, declarou em entrevista o pesquisador David Boulware.
A Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), o Conselho Federal de Medicina (CFM), a Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI), a Sociedade Brasileira de Virologia (SBV), a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), a Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) e a Associação Médica Brasileira (AMB) são algumas das organizações científicas e profissionais que publicaram orientações e recomendações reforçando que ainda não há evidências que comprovem a eficácia do medicamento, e que sua eventual aplicação seja feita conforme a situação ou protocolo determinado.
Protocolo para uso da cloroquina
A partir de maio, o Ministério da Saúde passou a orientar a prescrição da cloroquina e da hidroxicloroquina já a partir de sintomas leves. O protocolo sugere o uso da cloroquina ou da hidroxicloroquina associadas ao antibiótico azitromicina desde o primeiro dia, com doses que aumentam de acordo com a gravidade e com o tempo de infecção. Por e-mail, a assessoria de imprensa do Ministério da Saúde ressaltou que “o Sistema Único de Saúde (SUS) é tripartite e funciona com a articulação das ações entre Governo Federal, estados e municípios. Sendo que cada esfera tem autonomia para tomar decisões que estão sob a sua gestão”, inclusive sobre o uso do medicamento.
No protocolo, há uma série de exames que precisam ser realizados antes que a cloroquina seja indicada, como eletrocardiograma e diagnóstico para covid-19. O texto também ressalva que faltam estudos para embasar o uso dos medicamentos. “Não há meta-análises de ensaios clínicos multicêntricos, controlados, cegos e randomizados que comprovem o benefício inequívoco dessas medicações para o tratamento da covid-19”, diz. Por fim, o protocolo é claro ao deixar a decisão final sobre o uso da cloroquina nas mãos do médico e do paciente, que precisa assinar um Termo de Ciência e Consentimento.
Ainda por e-mail, a assessoria do Ministério da Saúde informou que “não possui o levantamento de pacientes que adotaram o protocolo de uso de cloroquina no tratamento para a covid-19 nem o número de pacientes recuperados que fizeram o uso deste medicamento”.
Contexto
Mesmo sem eficácia comprovada, o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina tem sido defendido pelo presidente Jair Bolsonaro desde o começo da pandemia. Não há nenhum estudo internacional que reconheça a eficiência do medicamento. Ainda assim, Bolsonaro e seus seguidores insistem em defender a prescrição, alinhados ao discurso do presidente norte-americano Donald Trump.
A polêmica sobre o uso da cloroquina foi pivô da demissão de dois ministros da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, em 16 de abril, e Nelson Teich, em 15 de maio. Desde então, a pasta está nas mãos do general Eduardo Pazuello, promovido de secretário-executivo a ministro interino pelo presidente Jair Bolsonaro, no dia 03 de junho. Foi sob o comando dele que o Ministério da Saúde publicou o protocolo de uso da cloroquina no combate ao novo coronavírus.
Críticas ao distanciamento social
As críticas às medidas de distanciamento social são outro lugar-comum entre os apoiadores de Jair Bolsonaro, e Oswaldo Eustáquio não é diferente. O blogueiro acredita governadores e prefeitos vão manter as populações isoladas “enquanto houver dinheiro público para gastar sem licitação”. Essa ideia aparece com frequência em boatos sobre a pandemia, numa tentativa de enfraquecer as políticas de isolamento que vão contra as ideias do presidente. O Comprova já verificou desinformação sobre desvios de dinheiro público.
No texto verificado Eustáquio afirma, sem provas, que o número de “curados” é uma informação “escondida a sete chaves pela grande mídia” para “assustar e enganar a população através dos meios de comunicação de massa para legitimar os governos estaduais e a manterem o lockdown”. Na contramão desse raciocínio, as políticas de isolamento têm sido afrouxadas pelos estados nas últimas semanas, depois que o protocolo foi publicado.
Alcance
Os dados coletados até o dia 08 de junho mostram que o texto de Oswaldo Eustáquio teve bastante alcance nas redes sociais, embora nem sempre associado ao nome do blogueiro. O texto original, publicado no site “Agora Paraná” teve 28,1 mil interações. O link foi reproduzido pelo perfil de Twitter de Eustáquio, alcançando 5,4 mil likes e 2,5 retweets.
O site “Canal Gama” reproduziu o texto na íntegra e, embora tenha dado crédito ao “Agora Paraná”, não usou o nome de Oswaldo Eustáquio. Nessa página foram 10,6 mil interações. Já no perfil de Facebook ligado ao site foram mil compartilhamentos. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/hospitais-nao-estao-provocando-a-morte-de-pacientes/ | COMPROVA | Hospitais não estão “provocando a morte” de pacientes | null | 2020-06-06 | Vídeo que circula nas redes sociais afirmando que hospitais estariam “provocando a morte” de pessoas com outras doenças para poder registrá-las com covid-19 tem informações enganosas com o objetivo de desacreditar a gravidade da pandemia do novo coronavírus
É enganoso um vídeo publicado no Facebook afirmando que hospitais estariam “provocando a morte” de pessoas com outras doenças para poder registrá-las com covid-19.
No vídeo, uma mulher afirma que durante a internação no Hospital Casa Italiano, no Rio de Janeiro, foi submetida a procedimentos que não havia autorizado e que também recebeu medicamentos que não poderia tomar porque era alérgica. Ela ainda diz que foi privada de higiene, de contato com a família e que foi isolada em uma área destinada para pacientes com covid-19 mesmo sem ter diagnóstico da doença. Por fim, sugere que as pessoas que tenham sintomas e complicações da covid-19 não procurem hospitais e se tratem em casa.
Em nota, o diretor médico do Hospital Casa Italiano, Vitor Luiz Ferreira Gomes, informou que “as alegações que a paciente passa no vídeo em questão são mentirosas e falsas”. De acordo com o hospital, a mulher do vídeo realmente esteve internada no hospital entre os dias 12 e 19 de maio. Ela teve diagnóstico de covid-19 confirmado por exame RT-PCR e tomografia.
Ainda segundo o hospital, a mulher deixou o local sem ter recebido alta. A instituição alega não poder enviar os exames por se tratar do sigilo médico, apenas a paciente poderia fazer tal solicitação.
Na gravação, a mulher conta que, após deixar o hospital, recebeu a visita de um médico em casa, e que, dias depois, estava bem. O profissional é Raul de Amoedo Monteiro, que confirma o atendimento. Ele diz que não viu exames nessa visita e que não achou que os sintomas de febre e tosse pudessem ser de covid-19. Diagnosticou-a com resfriado e, por conta da idade da paciente, receitou antibióticos e expectorante.
De acordo com Monteiro, ela relatou que havia ficado nervosa no hospital porque viu pessoas passando muito mal e não estava se sentindo da mesma forma. “Ela estava muito ansiosa, e juntou com a perda da filha”, disse o médico. Ele refere-se à morte da filha de Luzia no dia 10 de maio por um infarto, um dia antes de ser internada – fato que ela conta no vídeo. A equipe assistencial do Hospital Casa Italiano também ressaltou que ela parecia nervosa por causa da perda da filha.
Ainda segundo Monteiro, dez dias depois de consultá-la em casa, Luzia foi a sua clínica, em uma consulta de retorno, e estava bem.
Por que investigamos?
O Comprova verifica conteúdos suspeitos que circulam nas redes sociais e alcançam grande audiência. Vídeos e declarações desacreditando a medicina e a ciência têm circulado nas redes, trazendo desinformação para a população e dificultando o controle do novo coronavírus. No vídeo em questão, há uma grave denúncia de que profissionais da saúde estariam “provocando a morte” de pessoas com outras doenças para diagnosticar de forma adulterada com covid-19″.
Além disso, Luzia Maria Medeiros Menezes, a senhora que aparece na gravação, é clara ao dizer que as pessoas não devem ir ao hospital: “Quem tiver seus parentes, não vá para o hospital. O hospital está matando do nada. Eu vi com esses olhos que a terra há de comer um dia, eu vi. Muita gente morrer sem ter nada”. A declaração vai contra recomendação médica e pode levar pessoas que estejam com sintomas a interpretarem que não devem buscar ajuda médica em hospitais – o que pode levar a complicações em caso de covid-19 e à morte.
Como afirmou por WhatsApp o Hospital Casa Italiano, que Luzia acusa de maus-tratos, “este tipo de postagem acaba por afastar as pessoas dos hospitais, e muitos poderão vir a óbito em casa como vem acontecendo, ao ficarem com medo de irem aos hospitais”.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos
Utilizando a ferramenta InVID, foi possível dividir o vídeo analisado em diversas fotografias. Em um determinado momento da filmagem, a mulher mostra uma pasta de exames que contém um nome. Utilizando um software simples de edição, como o Microsoft Paint, foi possível aproximar a imagem e identificar o nome dela. A legibilidade não era a adequada e não era possível compreende todos os sobrenomes da mulher, mas foi possível ler “Luzia Maria”.
Em uma busca simples na plataforma Twitter com os dizeres “Luzia Maria” foi possível encontrar o mesmo vídeo publicado por uma conta com apenas cinco seguidores. No texto do tuíte, constava que o nome da paciente era “Luzia Maria Medeiros Meneses”. Depois disso, uma busca no Google mostrou uma reportagem do jornal Extra, de 2016, que entrevistava uma “Luzia Maria Medeiros Menezes”, com a letra “z” no lugar da “s” no último sobrenome. A fotografia da reportagem era de uma mulher muito parecida com a que gravou o vídeo analisado.
Entramos em contato com a jornalista que escreveu a reportagem para o Extra para tentar obter mais informações, mas a repórter informou que não possuía mais detalhes sobre a mulher entrevistada. A partir deste ponto, como os indicativos mostravam que existia uma grande chance de as duas mulheres serem a mesma pessoa, partimos para uma busca manual no Facebook. Como o hospital em que ela se consultou ficava localizado no Rio de Janeiro, delimitamos a busca por pessoas que tinham marcado na rede social que viviam na capital fluminense.
Encontramos diversos perfis e, entre eles, um com uma fotografia com enorme similaridade com a Luzia que gravou o vídeo. Ao pesquisar nas publicações recentes, pudemos nos certificar que o vídeo pertence realmente à Luzia Menezes. Em 28 de maio, ela publicou o vídeo com a legenda: “Gente por favor me ajude a compartilhar esse meu testemunho até chegar em alguma autidsde (sic) [autoridade] ”
Paralelamente, procuramos os hospitais que Luzia cita no vídeo.
Entramos em contato com o Hospital São Vicente de Paulo por meio de sua assessoria de imprensa. A equipe de comunicação nos enviou resposta por meio de e-mail.
Conversamos por telefone com o diretor médico Vitor Luiz Ferreira Gomes, do Hospital Casa Italiano. Também ligamos para o médico Raul de Amoedo Monteiro, que atendeu Luzia em casa depois que ela deixou o Hospital Casa Italiano.
Ainda consultamos o protocolo de manejo clínico do Ministério da Saúde para verificar se as práticas descritas à reportagem condizem com as recomendações oficiais.
Verificação
Hospital São Vicente de Paulo
Luzia Maria Medeiros Menezes afirma, na filmagem, que foi atendida primeiramente no Hospital São Vicente de Paula. Na verdade, ela foi atendida no Hospital São Vicente de Paulo — e não Paula. Por e-mail, o hospital confirmou que ela esteve na instituição no dia 11 de maio. “Após exame clínico e alguns exames iniciais, ela ficou em observação em nossa emergência. Devido às suas queixas, a paciente foi submetida a exames complementares e nossa equipe recomendou internação para investigação da covid-19”, afirma o hospital. Como não existia vaga para internação na unidade, foi recomendado que ela procurasse outro hospital. Luzia foi, então, ao Hospital Casa Italiano.
Acusações contra o Hospital Casa Italiano
Na filmagem, Luzia Menezes faz diversas acusações contra o Hospital Casa Italiano, no Rio de Janeiro. Ela afirma que foi internada no isolamento como se tivesse covid-19. Em nota, o Hospital Casa Italiano afirmou que Luzia foi submetida ao teste para confirmar a presença do novo coronavírus (SARS-CoV-2) e o resultado foi positivo pelo método RT-PCR. O diretor médico da instituição, Vitor Luiz Ferreira Gomes, afirmou que o exame foi coletado no dia 12 de maio e que o resultado demorou seis dias para ficar pronto. Ainda de acordo com o médico, Luiza Menezes tinha uma saturação de oxigênio em torno de 60% (quando níveis normais são superiores a 95%) quando chegou ao hospital e exames realizados em outra instituição mostravam um comprometimento de 25% do pulmão — sinais compatíveis com a covid-19, que posteriormente foi confirmada.
No vídeo, Luiza Menezes ainda afirma que foi “cortada” e “retalhada” no pescoço, peito, virilha e braço. Em nota, o hospital afirmou que “os pacientes não são cortados como alegado” e que “pacientes graves necessitam de monitorização da pressão arterial (PAM), feitas por punção com critérios específicos pela equipe médica para controle do quadro, assim como medicações venosas, todos prescritos individualmente a critério médico no prontuário do doente”.
Luzia também acusa o hospital de falta de higiene, afirmando que ficou dias sem tomar banho e lavar a boca. Em nota, o hospital negou todas as acusações e afirmou que tem “cirurgiãs dentistas que visitam os pacientes para higiene oral reduzindo as infecções orais e pulmonares. Os pacientes recebem roupas adequadas para internação, banhos diários usando Drybath, além de lençóis e cobertores da hotelaria”, afirma a nota.
Na filmagem, Luzia ainda acusa o hospital de aplicar dois medicamentos (AAS e Berotec) mesmo com recusas e avisos de que seria alérgica. Em entrevista por telefone, o diretor médico da instituição afirmou que ela deixou de tomar dois medicamentos que constam do protocolo de atendimento porque se recusou. “Os medicamentos que ela informou serem alérgicos não foram ministrados. Isso está tudo no prontuário”, afirmou Vitor Luiz Ferreira Gomes.
A mulher também diz que o hospital “não tinha médicos, só enfermeiros” e que ficou isolada. Em resposta, o hospital disse que possui “médicos em todos os turnos que não saem do setor”. Também explicou que faz parte do protocolo o isolamento dos pacientes diagnosticados com covid-19 e que uma médica designada atualiza os pacientes diariamente com a evolução do quadro de saúde dos pacientes. O Protocolo de Manejo Clínico da covid-19 na Atenção Especializada orienta as instituições com pacientes infectados pelo novo coronavírus que suspendam as visitas.
Por fim, ela afirma que o hospital estaria “provocando a morte” de pessoas. Em nota, o Hospital Casa Italiano informou que foram registradas 14 internações, 7 altas e 3 óbitos por covid-19 no centro de tratamento intensivo (CTI) no período em que Luzia esteve internada.
O hospital afirmou, por telefone, que Luzia Menezes não teve alta médica e deixou o local à revelia, após assinar juntamente com o marido um termo de autorização.
Visita médica em casa
Na filmagem, Luzia Menezes afirma que conseguiu sair do Hospital Casa Italiano e foi para casa. De acordo com ela, o marido chamou um médico para consultar Menezes em casa. Em contato via WhatsApp, Luzia informou que o médico se chamava Raul Monteiro e atendia na clínica Promed, no Rio de Janeiro.
Por telefone, Monteiro confirmou que foi à casa da paciente, mas não achou que ela poderia estar com covid-19. Para ele, era um resfriado mas, por ser mais velha, achou melhor recomendar tratamento para pneumonia, receitando antibióticos e expectorante – “é melhor pecar por excesso do que por falta”. Segundo o médico, Luzia respondeu bem à medicação e foi à clínica dele para um retorno dez dias depois.
Confronto de versões
Ao ser questionada com as versões médicas, Luzia Menezes disse não concordar com nenhuma argumentação do Hospital Casa Italiano. “Não concordo com nada deles, vou morrer com a minha versão pois é real. Tenho a minha consciência limpa que tudo que falei é verdade”, afirmou por mensagem no WhatsApp. Luzia ainda disse que vai entrar em contato com uma advogada.
Voltamos a falar com o Hospital Casa Italiano depois de falar com Luzia e a instituição negou todas as acusações feitas pela mulher. Disse que elas “são mentirosas e falsas”. De acordo com a assessoria de imprensa do hospital, a instituição está estudando as medidas legais cabíveis e possui o prontuário médico como provas.
Estados recebem dinheiro por cada paciente diagnosticado com covid-19?
O vídeo com as queixas de Luzia viralizou e recebeu comentários adicionais. Uma mulher compartilhou o vídeo no Facebook e escreveu: “Eles querem números? Lembrem-se que cada paciente na UTI o estado recebe 4,5 mil (reais). Para políticos corruptos o dinheiro vale mais que a sua vida!”
A Portaria nº 568 do Ministério da Saúde, de 26 de março de 2020, autorizou a habilitação temporária de leitos de UTI para tratamento da covid-19 em estados e municípios pelo prazo inicial de três meses. A medida permite o repasse pelo governo federal de R$ 1,6 mil diários para pagar luz, serviço, pessoal, manutenção entre outros itens.
O Hospital Casa Italiano, no entanto, é uma instituição particular e não recebe esta compensação federal.
Contexto
Narrativas que contestam a real dimensão da pandemia são utilizadas para atacar medidas políticas de lockdown, isolamento social e fechamento do comércio. O Projeto Comprova já checou vídeos que mostravam covas abertas e nenhum enterro em um cemitério da capital paulista.
Outro boato utilizou o vídeo do corredor vazio de um hospital para dizer que o local não estaria atendendo pacientes com a covid-19. Um vídeo compartilhado para causar confusão falsamente afirmava que uma enfermeira teria sido demitida na Bahia por denunciar a falta de pacientes em seu local de trabalho.
Conteúdos que contestam as mortes por causa do novo coronavírus viralizam facilmente por conta da indignação e do medo da população. Uma corrente falsa de whatsapp utilizou dados falsos de óbitos por covid-19 para erroneamente dizer que teriam morrido menos pessoas no começo de 2020 em comparação ao mesmo período de 2019.
Alcance
O vídeo foi compartilhado na quinta-feira, 28, pelo perfil pessoal de uma, amiga de Luzia e foi visto mais de 112 mil vezes até a publicação dessa verificação. Outra postagem do vídeo um dia depois foi compartilhada 67 mil vezes e foi visto mais de 1,2 milhão de vezes. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/publicacao-distorce-informacoes-sobre-protocolos-para-uso-de-medicamentos-contra-a-covid-19/ | COMPROVA | Publicação distorce informações sobre protocolos para uso de medicamentos contra a covid-19 | null | 2020-06-05 | Post usa vídeo de uma médica que explica o protocolo adotado pela Prefeitura de Porto Seguro para o tratamento de casos de covid-19. Em nenhum momento a médica “desmascara” políticos ou faz referência ao presidente Jair Bolsonaro
É enganosa a publicação feita no Facebook afirmando que uma médica “desmascarou governadores e prefeitos” e que o “presidente sempre esteve certo com relação à cloroquina”. A legenda é acompanhada de um vídeo gravado pela médica Raissa Soares, que trabalha no Hospital Navegantes e na Prefeitura de Porto Seguro, na Bahia, e defende o uso do medicamento para o tratamento do novo coronavírus com base em experiências pessoais.
Na filmagem, a médica explica o protocolo adotado pela Prefeitura de Porto Seguro para o tratamento de casos de covid-19. As medidas recomendam a utilização de ivermectina e nitazoxanida associadas ao antibiótico azitromicina logo no começo da infecção e, em caso de piora dos sintomas, o uso da hidroxicloroquina. Em nenhum momento a médica “desmascara” políticos ou faz referência ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Além disso, o protocolo municipal é baseado nas diretrizes do Ministério da Saúde e do governo estadual da Bahia. Os dois documentos atestam que não existem evidências científicas robustas para nenhum medicamento no tratamento da covid-19, mas mesmo assim indicam o uso da hidroxicloroquina em alguns casos. Essa também é a opinião da médica, que defende que os profissionais deveriam fazer a prescrição mesmo sem evidências científicas de que os medicamentos funcionem contra a covid-19 e que o risco aos pacientes é baixo. “Não busque evidência nesse momento, nós estamos em guerra”, declara.
Essa postura, no entanto, não é aconselhada por entidades médicas como a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) e a equivalente norte-americana, a Infectious Diseases Society of America (IDSA), que defendem esse tipo de medicação apenas em ambientes de pesquisa. “Todas as estratégias, seja a hidroxicloroquina ou qualquer outra (azitromicina, ivermectina e nitazoxanida), estão em estudo, e não se justifica o uso por experiência pessoal porque isso não é ciência, isso é empirismo”, afirmou ao Comprova o infectologista Alexandre Naime Barbosa, professor da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e consultor da SBI.
Relatos de experiências clínicas da médica com seus pacientes também não são suficientes para atestar a eficácia. Barbosa ressalta que a doença não evolui para quadros graves em 81% dos casos, segundo estimativa da Organização Mundial da Saúde. Portanto, casos isolados não confirmam a alegação de melhora, já que não é possível apontar se foi efeito do medicamento ou simplesmente a evolução esperada do paciente a partir da resposta do organismo. Até 4 de junho, a taxa de letalidade no Brasil era de 5,5%, de acordo com o Ministério da Saúde.
Essa relação só pode ser confirmada por meio de pesquisas randomizadas — quando, aleatoriamente, metade dos pacientes toma o remédio e a outra metade, placebo — e com os chamados testes duplo-cego — ou seja, aqueles em que nem médico, nem paciente sabem qual dos dois produtos foi administrado. Depois, é feita a comparação entre os grupos para verificar quais tiveram melhores resultados. Nenhum dos quatro medicamentos citados apresenta evidência de que funcionem nesse tipo de estudo até o momento.
Em entrevista ao Comprova, a médica Raissa Soares afirmou que o vídeo é “descontextualizado da questão política” e que a intenção era apenas sugerir a aplicação de protocolo na cidade e na região. Em relação à legenda que foi adicionada ao vídeo por outras pessoas, afirmando que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) estaria certo sobre a hidroxicloroquina, ela afirma que “não é verdade absoluta, porque a hidroxicloroquina é uma prescrição médica”.
A médica disse que defende o uso da hidroxicloroquina porque observa que é “resolutiva quando dada na fase viral, na fase inicial da doença”. Sobre a decisão ter como base experiências pessoais, e não evidências clínicas mais robustas, a médica afirma que a experiência “não é totalmente empírica” porque, de acordo com ela, existem algumas publicações que concluíram que o remédio funciona. “A nossa experiência não é grande, mas é suficiente para mim, enquanto médica, e para os meus colegas. (…) O que a gente tem percebido é que estamos tendo resultados excelentes”, afirma.
Por fim, ela disse respeitar pareceres de entidades médicas contrários ao uso fora de protocolos de pesquisa, mas que o Conselho Federal de Medicina (CFM) autoriza a decisão do ponto de vista legal. Na publicação, a autarquia afirma que “reforçou seu entendimento de que não há evidências sólidas de que essas drogas tenham efeito confirmado na prevenção e tratamento dessa doença”, mas que “diante da excepcionalidade da situação e durante o período declarado de pandemia, (…) o CFM entende ser possível a prescrição desses medicamentos”.
Por que investigamos?
O Comprova verifica conteúdos de grande alcance nas redes sociais sobre a pandemia do novo coronavírus. O projeto também prioriza conteúdos que apresentem informações potencialmente danosas à saúde da população. É o caso de materiais que abordam formas de tratamento da covid-19.
Diante do avanço da doença no país, as pessoas podem se basear em conteúdos compartilhados nas redes sociais para fazer automedicação ou recomendar tratamento a amigos e familiares. O problema é que nenhum remédio ou “solução caseira” é comprovadamente eficaz, até o momento, na prevenção ou no tratamento do novo coronavírus — e estes também pode ser bastante prejudiciais, principalmente sem o devido suporte médico.
Além disso, boatos sobre curas e tratamentos são comuns durante a pandemia. Apenas no mês passado, o Comprova verificou quatro conteúdos enganosos sobre a cloroquina: um texto sobre o esvaziamento de UTI em hospital do Piauí, um vídeo defendendo tratamento “sem internação e sofrimento”, um vídeo de um homem indicando o remédio e criticando isolamento social e o uso de respiradores e um vídeo que minimiza os efeitos colaterais do medicamento ao comparar com a bula da Novalgina.
Para o Comprova, o conteúdo enganoso é aquele retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos?
No vídeo analisado, a mulher que aparece na filmagem se identifica como Raissa Soares, médica formada na Universidade Federal de Minas Gerais. O Comprova encontrou o perfil da médica no Instagram. O vídeo consta na página, e foi confirmado que era o mesmo que está circulando nas redes, sem qualquer tipo de edição.
A reportagem procurou informações no site do Conselho Federal de Medicina (CFM) para descobrir se ela realmente era médica registrada. De acordo com o CFM, a médica Raissa Oliveira Azevedo de Melo Soares tem o registro ativo e está inscrita de maneira regular.
O terceiro passo foi buscar informações sobre os hospitais citados no vídeo, como o Hospital Navegantes Porto Seguro. Uma das últimas publicações na página oficial do hospital no Facebook era um compartilhamento do vídeo de Raissa Soares — e o texto que acompanhava a publicação também confirmou que a médica atende na unidade.
Também entramos em contato com a Secretaria Municipal de Saúde de Porto Seguro. O órgão municipal confirmou que Raissa Soares é médica na rede pública de Porto Seguro e atende na Unidade de Saúde da Família Arlindo Almeida, no Hospital Regional Deputado Luís Eduardo Magalhães, além de ser a diretora técnica da Unidade de Pronto Atendimento Frei Calixto.
No vídeo, a médica afirma que as condutas dela estão baseadas em protocolos da Prefeitura de Porto Seguro e do governo estadual da Bahia. Pedimos os documentos à secretaria de Saúde e confirmamos a publicação no Diário Oficial do município.
A reportagem entrou em contato com a autora do vídeo por meio de um número de telefone cedido pela Secretaria Municipal de Saúde. O Comprova também ouviu um especialista da Sociedade Brasileira de Infectologia sobre o assunto.
Procurado pela reportagem, o ex-senador Magno Malta, que foi o primeiro a compartilhar o vídeo com a legenda enganosa, não respondeu às mensagens deixadas nas páginas oficiais do Facebook e do Instagram. Quando procurado pelo WhatsApp, bloqueou dois jornalistas e não atendeu nenhuma ligação.
Verificação
No vídeo, Raissa Soares afirma que o hospital de referência para o atendimento de covid-19 na cidade de Porto Seguro, na Bahia, está “lotado” e, dessa forma, propõe a outros médicos que prescrevam quatro medicamentos aos pacientes, ainda que não haja evidência de que funcionem e testes estejam em andamento. Ela alega que obteve redução de sintomas ao tratar mais de 30 pacientes com base em protocolo da Secretaria Municipal de Saúde.
O relato, porém, não é capaz de atestar a eficácia desse tipo de tratamento, como destaca o professor da Unesp e consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia Alexandre Naime Barbosa. Procurada pelo Comprova, Raissa Soares afirmou, por telefone, que a experiência “não é totalmente empírica” e que, para ela e os colegas do Comitê de Operações de Emergência do município, é “suficiente” para a decisão de administrar a medicação diante de um cenário difícil de atendimento na rede de saúde.
Protocolo de tratamento da covid-19 em Porto Seguro
De fato, os protocolos de tratamento alegados pela médica Raíssa Soares existem e foram publicados no Diário Oficial de Porto Seguro, na Bahia, em 22 de maio. Eles são assinados pelo secretário municipal de saúde, Kerrys Ruas.
O documento recomenda o início precoce de terapias para pacientes com síndrome gripal e com sintomas sugestivos de infecção leve pelo novo coronavírus, com a prescrição de azitromicina em associação com nitazoxanida nesses casos. O protocolo traz como opção a administração de ivermectina no lugar de nitazoxanida, a partir de avaliação de “risco e benefício”, destacando a contraindicação do segundo remédio para pessoas com doenças de fígado, rins e diabéticos.
Caso os pacientes apresentem piora do quadro clínico e do padrão respiratório, especialmente a partir do quinto dia de sintomas, a secretaria de saúde afirma que o médico deve “considerar o uso da hidroxicloroquina sob vigilância médica no Hospital Luís Eduardo Magalhães”. Por fim, há sugestão de uso de vitamina C, zinco e vitamina D para “auxiliar na resposta clínica do indivíduo” durante o período de internação.
É necessário que os pacientes assinem termo de consentimento, declarando ciência dos possíveis efeitos colaterais dos remédios, para a prescrição médica.
Remédios não têm eficácia comprovada contra a doença
Nenhum dos medicamentos apontados é comprovadamente eficaz no tratamento da covid-19 até o momento. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), não há vacina nem medicamento antiviral específico para prevenir ou tratar a covid-19. O que existem, de fato, são pesquisas com essas e outras drogas para descobrir se elas podem ajudar no combate da covid-19 em alguma maneira. Porém, ainda não há resultados conclusivos.
Utilizada contra a malária e doenças autoimunes, a hidroxicloroquina foi combinada com o antibiótico azitromicina em algumas pesquisas e obteve resultados iniciais promissores, passando a ser defendida publicamente pelo presidente Jair Bolsonaro. No final de março, o Ministério da Saúde autorizou o uso do medicamento para pacientes em estado grave, a critério do médico. Desde maio, a orientação vale também para casos leves e moderados.
Seguindo as diretrizes, o Comitê Operacional de Emergência da Bahia divulgou nota orientando sobre o uso da hidroxicloroquina no estado. São esses documentos que embasam a recomendação da substância pela Secretaria de Saúde de Porto Seguro.
Estudos recentes, porém, colocaram em dúvida a eficácia da cloroquina e da hidroxicloroquina contra a covid-19. Em maio, duas das mais importantes revistas médicas do mundo – o Journal of the American Medical Association (Jama) e o British Medical Journal (BMJ) – publicaram estudos que concluíram que os pacientes tratados com cloroquina e hidroxicloroquina, associadas ou não ao antibiótico, não tiveram melhores resultados que aqueles que não receberam os medicamentos. Os trabalhos foram conduzidos na China, na França e nos Estados Unidos e submetidos à revisão por outros pesquisadores.
Em 3 de junho, o New England Journal of Medicine (NEJM) publicou um estudo “padrão ouro” — ou seja, com pacientes randomizados, grupo controle e testes duplo-cego — com 821 voluntários que tiveram contato com infectados pelo novo coronavírus nos Estados Unidos e no Canadá, mas ainda não apresentavam sintomas de covid-19. O objetivo era descobrir se a droga se mostrava eficiente como forma de prevenir o aparecimento da doença. Os pesquisadores concluíram que a incidência “não diferiu significativamente entre os pacientes que receberam hidroxicloroquina e os que receberam placebo” e que “os efeitos colaterais foram mais comuns com a hidroxicloroquina do que com o placebo, mas nenhuma reação adversa grave foi relatada”.
A ivermectina, recomendada para o tratamento de condições causadas por vermes e parasitas, se tornou popular no debate público após a publicação de estudo feito por pesquisadores da Monash University e do Hospital Royal Melbourne, na Austrália, que demonstrou que o medicamento é capaz de matar o novo coronavírus in vitro em 48 horas. No entanto, os próprios cientistas pediram cautela sobre a descoberta e afirmaram que são necessários testes clínicos para avaliar a eficácia do remédio fora do laboratório.
Além dos testes in vitro, a Secretaria de Saúde de Porto Seguro argumenta que “estudos iniciais comprovam redução da gravidade em pacientes hospitalizados”, citando estudo divulgado pelo engenheiro biomédico Amit Patel, da Universidade de Utah, em 19 de abril. Pacientes tratados com ivermectina teriam tido taxas de letalidade menores tanto no geral (1,4% contra 8,5%) quanto entre os que precisaram de ventilação mecânica (7,3% contra 21,3%), em uma análise com 1.408 pessoas hospitalizadas em razão do novo coronavírus.
Na conclusão, os cientistas que assinam o estudo americano sobre a ivermectina ressaltam que “embora relatamos um forte sinal de potencial benefício na covid-19, os dados não podem ser considerados conclusivos, pois fatores de confusão desconhecidos não podem ser sempre contabilizados” e complementam afirmando que “estes achados precisam de confirmação em estudos controlados e randomizados”. Além disso, os dados utilizados neste estudo sobre a ivermectina foram fornecidos pela empresa Surgisphere — a mesma que está no centro da polêmica de dois estudos sobre hidroxicloroquina publicados revistas The Lancet e NEJM (não relacionado com o outro citado acima) que foram retratados após a empresa negar acesso às informações por auditorias independentes.
A nitazoxanida é um vermífugo. Ela ficou conhecida depois que o ministro Marcos Pontes, da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, divulgou que o ministério teria encontrado um remédio com 94% de eficácia em células contaminadas. Na época, o ministro não divulgou o nome do medicamento para evitar que as pessoas procurassem o remédio nas farmácias, como aconteceu com a hidroxicloroquina. Um dia depois, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou uma resolução que restringia a venda do medicamento.
O Boletim Ética em Pesquisa, da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), passou a listar dois ensaios clínicos com a nitazoxanida a partir do dia 17 de abril. De acordo com o último boletim, do dia 2 de junho, existem três testes clínicos sendo realizados com a substância: um com 50 participantes no Hospital Vera Cruz, de São Paulo; um com 500 participantes na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); e outro com 392 participantes também na UFRJ.
A Secretaria da Saúde de Porto Seguro cita dois estudos relacionados à nitazoxanida na nota técnica que estabelece o protocolo contra a covid-19 no município da Bahia. Um deles é uma revisão de 1.315 artigos publicada no Jama, em 13 de abril. Os pesquisadores escrevem que o medicamento “possui ampla atividade antiviral e um perfil de segurança relativamente favorável” e que testes in vitro demonstraram eficácia contra o SARS-CoV-2. Dessa forma, defendem a continuidade de estudos com a droga para encontrar mais evidências, mas que estas ainda estavam “pendentes”.
O outro é um preprint assinado por médicos do St. Joseph Medical Center, em Tacoma, nos Estados Unidos, que “resume evidências convincentes para avaliar o NTZ (nitazoxanida) em ensaios clínicos” como tratamento da covid-19. A pesquisa apresenta os mecanismos de atividade antiviral do remédio, entre outros aspectos, e conclui que “são necessários ensaios urgentes para testar a eficácia” da nitazoxanida, de modo a expandir as possibilidades de combate à doença. Foi publicada em 24 de abril.
Contexto
A opinião da médica ganhou repercussão nas redes sociais, em grande medida, porque defende o tratamento da covid-19 com o uso de medicamentos sem eficácia comprovada, especialmente a hidroxicloroquina. Raissa Soares argumenta no vídeo que o Brasil vive “uma guerra” contra o novo coronavírus e que não é possível esperar por estudos conclusivos para introduzir tratamentos alternativos nos hospitais.
Essa declaração é semelhante à justificativa dada pelo presidente Jair Bolsonaro quando o ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello, aprovou protocolo que recomenda o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina em casos leves e moderados da doença, em 20 de maio. Pelo Twitter, Bolsonaro escreveu: “Ainda não existe comprovação científica. Mas sendo monitorada e usada no Brasil e no mundo. Contudo, estamos em guerra: ‘Pior do que ser derrotado é a vergonha de não ter lutado’”.
Desde março, Bolsonaro é um dos principais defensores do uso da cloroquina e da hidroxicloroquina para o tratamento precoce da covid-19. Ele também costuma minimizar a gravidade da doença e discorda das medidas de quarentena adotadas por governadores e prefeitos no país. A insistência nessas posições já provocou a saída de dois ministros da Saúde durante a pandemia, Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich.
Diversas entidades médicas alertam para os possíveis efeitos colaterais graves desses e outros medicamentos, sem comprovação de que realmente ajudam no combate à doença por estudos mais robustos. É o caso da Sociedade Brasileira de Infectologia, que destacou em nota que “os estudos clínicos atuais com cloroquina ou hidroxicloroquina, associada ou não à azitromicina, permitem concluir que tais medicamentos, até o presente momento, não mostraram eficácia no tratamento farmacológico de covid-19” e que, por outro lado, “alguns estudos mostraram seu potencial malefício, podendo causar alteração cardiológica (…) que está associada a uma maior chance de arritmias ventriculares, potencialmente fatais”.
Nos últimos meses, Bolsonaro entrou em conflito com governadores e prefeitos a respeito da quarentena. Em pronunciamento em rede nacional, chegou a afirmar que a covid-19 era uma “gripezinha” e que as lideranças regionais deveriam “abandonar o conceito de terra arrasada”. O presidente também defendeu um “isolamento vertical”, ou seja, destinado apenas aos grupos de risco. Esses posicionamentos foram ignorados por diversas autoridades do país que optaram por decretar medidas restritivas mais amplas após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que garantiu essa autonomia.
O Brasil registrou 614.941 casos confirmados e 34.021 mortes por covid-19 até a noite de 4 de junho, de acordo com informações do Ministério da Saúde. O país é o terceiro com mais mortes no mundo e bateu o recorde de número de óbitos em 24h no mesmo dia, com 1.473. Até a data, 254.963 pessoas estavam recuperadas e 325.957 em acompanhamento.
Alcance
O vídeo original, publicado no perfil da médica Raissa Soares no Instagram, teve 7,4 mil visualizações até 5 de junho. Republicado na página do ex-senador Magno Malta, pelo deputado estadual Jânio Natal (Podemos-BA) e por perfis e grupos bolsonaristas no Facebook, alcançou mais 83,6 mil interações, de acordo com a plataforma de monitoramento CrowdTangle. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/nao-ha-prova-de-que-ivermectina-cure-covid-19-ao-contrario-do-que-diz-medica/ | COMPROVA | Não há prova de que ivermectina cure covid-19, ao contrário do que diz médica | null | 2020-06-05 | A ivermectina está registrada como medicamento contra infecções causadas por parasitas e todos os estudos sobre seu uso para tratamento da covid-19 estão ainda em estágio inicial. A Anvisa não reconhece o medicamento para o tratamento da doença
É enganoso o conteúdo de um vídeo que afirma que a covid-19 pode ser curada com a ivermectina, remédio usado para tratar parasitas. Em uma publicação no YouTube, no dia 20 de maio, a médica Lucy Kerr diz ter tratado 20 pacientes com ivermectina e afirma que o novo coronavírus “tem cura”. Todos os estudos sobre a ivermectina, porém, estão ainda em estágio inicial. A autoridade sanitária dos Estados Unidos, FDA, emitiu um alerta em relação ao uso de ivermectina por pessoas com covid-19. E, no Brasil, a Anvisa não reconhece o medicamento para o tratamento da doença.
Consultada, Lucy Kerr afirmou que a maioria dos pacientes que ela “curou” não fizeram teste de covid-19 nem o teste que verifica se o vírus não está mais no organismo. Disse que a comprovação da eficácia do remédio é observacional. Depois, por e-mail, afirmou que, embora os dados sejam observacionais, ela e médicos com quem conversa em um grupo de WhatsApp estão tendo “resultados de cura em tempo muito mais curto – 48 horas em média – do que seria a recuperação natural de covid-19”.
Catorze dias após a publicação do vídeo, o YouTube retirou-o do ar. A plataforma não comenta casos específicos, mas afirmou que “o YouTube tem políticas claras sobre o tipo de conteúdo que pode estar na plataforma e não permite vídeos que promovam desinformação sobre a covid-19”.
Após a retirada do vídeo do ar, a médica entrou em contato com o Comprova, reforçando “o potencial de cura da covid-19 [pela ivermectina]” e dizendo que os resultados “serão maravilhosos”.
Por que investigamos?
Vídeos e textos falando sobre curas milagrosas contra o novo coronavírus viralizam rapidamente nas redes sociais e colocam a população em perigo ao fazê-la acreditar em milagres. Neste vídeo, a médica diz que a “covid tem cura, nós podemos liquidar com essa moléstia em pouquíssimo tempo” – ou seja, está criando uma falsa sensação de esperança. No dia 1º de junho, a publicação, feita em 20 de maio, já tinha mais de 360 mil visualizações e cerca de 2 mil comentários. Muitos internautas estavam apoiando a médica. Um deles parabenizou Lucy Kerr “pela coragem de contradizer as mais ‘poderosas pessoas da ciência’, que tentam esconder remédios baratos que estão salvando vidas”.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos?
Buscamos cadastros da médica nos sistemas do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), do Conselho Federal (CFM) e em sites como o do Currículo Lattes para confirmar sua identidade profissional. O Comprova ligou nos telefones informados no Portal Lucy Kerr, mas ninguém atendeu. Depois, telefonou para a Sociedade Brasileira de Ultrassonografia e conseguiu, com uma funcionária, o telefone da casa da médica. À tarde, o Comprova ligou para Lucy e conversou com ela por uma hora.
Paralelamente, o Comprova verificou a existência dos estudos sobre os quais a médica comenta no vídeo em sites de publicação científica e tentou localizar seus autores através de e-mails e de perfis em redes, como o LinkedIn e o Facebook.
Também procuramos a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para saber se há algum protocolo ou orientação em relação ao uso da ivermectina para tratar pacientes com covid-19. Também buscamos o posicionamento da US Food and Drug Administration (FDA), a agência federal de vigilância sanitária dos Estados Unidos.
Por fim, ouvimos a opinião de dois infectologistas sobre o uso do medicamento e consultamos o Conselho Federal de Medicina.
Verificação
O medicamento
Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a ivermectina está registrada como “medicamento contra infecções causadas por parasitas”.
A Food and Drug Administration (FDA), órgão de vigilância sanitária dos Estados Unidos, descreve a ivermectina como liberada para humanos no tratamento de vermes intestinais e, também, de parasitas tópicos como piolho e rosácea. Ela também é usada para o tratamento de vermes em diversas espécies de animais.
Segundo a FDA, possíveis efeitos colaterais incluem vômito, diarreia, dor estomacal, erupções cutâneas, eventos neurológicos (tais como convulsões, tontura e confusão), queda repentina da pressão arterial e danos ao fígado.
Lucy Kerr
Na entrevista feita por telefone, a médica disse que a maioria dos pacientes que “curou” não fez teste de covid-19, nem o teste que comprova que o novo coronavírus não está mais no organismo. Disse que a comprovação da eficácia do remédio é observacional. Depois, em e-mail, afirmou: “Embora todos os nossos dados pessoais e dos 570 médicos que eu administro em grupo de Whatsapp e Telegram sejam observacionais, estamos tendo resultados de cura em tempo muito mais curto — 48 horas em média, do que seria a recuperação natural do covid-19 .”
Após a retirada do vídeo do YouTube do ar, ela entrou em contato com o Comprova e mandou o texto que enviou à plataforma: “É vídeo educativo para médicos e pacientes sobre essa droga e seu potencial de cura da covid-19 e dou referências científicas no texto anexo ao vídeo. Não visa o lucro, presta serviço social, apresentando a possibilidade real de cura, inclusive para vocês, funcionários do youtube e seus parentes”.
No dia seguinte 4 de junho, mandou novo Whatsapp ao Comprova citando um estudo e dizendo: “Vamos aguardar os resultados — mas antecipo que serão maravilhosos por todos os casos de pacientes que eu tratei e relataram melhoras quase imediata após a ingestão da medicação. Estou agora guardando todos relatos dos pacientes que estão mencionando melhora rápida e efetiva dos sintomas covid-19”.
Efeito in vitro
O primeiro estudo sobre o uso do medicamento foi publicado no dia 03 de abril pela Universidade de Monash, que fica no sul da Austrália (print abaixo). Os pesquisadores conseguiram eliminar o vírus responsável pela covid-19, o SARS-CoV-2, em uma cultura de células in vitro 48 horas após aplicar a ivermectina. O próprio estudo ressalta, porém, que esse resultado inicial “não prova” o uso da droga para o tratamento da doença, ressaltando a necessidade de se realizarem estudos clínicos.
O artigo afirma claramente que “embora tenha mostrado efetividade no laboratório, a ivermectina não pode ser usada em humanos para tratar a covid-19 até que novos testes consigam estabelecer com exatidão a efetividade da droga e a dosagem segura para humanos”. Você pode conferir a íntegra do estudo aqui.
O Comprova procurou a Universidade de Monash para saber sobre novas fases da pesquisa. Por e-mail, o Departamento de Medicina, Enfermagem e Ciências da Saúde da instituição explicou que o estudo apenas mostrou que a ivermectina tem efeito em eliminar o vírus em laboratório. E foi taxativo: “a ivermectina não pode ser usada em pacientes com covid-19 até que outros testes e ensaios clínicos tenham sido conclusivos em estabelecer a eficácia do medicamento em níveis seguros para dosagem em humanos”.
Eles também informam que, recentemente, conseguiram financiamento para ensaios pré-clínicos em laboratório.
República Dominicana
No vídeo, a médica cita que a ivermectina passou a ser adotada por médicos em outros países após a publicação do estudo australiano. Ela cita José Natalio Redondo, que trabalharia no Centro Médico Doutor Bournigal, na República Dominicana, e Gustavo Aguirre Chang, que teria escrito um artigo sobre o uso do medicamento no Peru.
No Google Maps, nós conseguimos encontrar um registro do Centro Médico Doutor Bournigal. O mapa aponta para um endereço em Porto Prata, na República Dominicana.
Fizemos, então, uma busca online pelo médico José Natalio Redondo. A primeira coisa que achamos foi uma entrevista concedida à Acento TV, onde ele afirma ter tratado 500 pessoas com covid-19 usando a ivermectina. A Acento TV tem um site com domínio .do, que é o usado na República Dominicana. O site do canal diz que ele integra o pacote da Claro TV no país. Então, conseguimos confirmar a existência do canal no site da Claro TV na República Dominicana.
A partir daí, conseguimos encontrar um perfil com o nome do doutor José Natalio Redondo no Facebook. O perfil tem o mesmo nome, afirma trabalhar no mesmo centro médico e a foto é igual a do homem que deu entrevista para a Acento TV. Contatamos o perfil nos dias 2 e 3 de junho, mas não tivemos retorno até o publicação desta checagem.
Procurando pelo uso da ivermectina na República Dominicana, descobrimos que, no dia 13 de maio, a Sociedade Dominicana de Infectologia divulgou um comunicado expressando preocupação com a possibilidade de que a ivermectina seja adotada como medicação contra a covid-19 no país sem a devida comprovação de que a droga pode ser usada para tratar a doença. O comunicado pode ser encontrado na página deles no Facebook.
Embora o mesmo texto não apareça no site da entidade, a página aponta para o mesmo perfil do Facebook em que o comunicado foi postado. Além disso, a divulgação do texto foi notícia nos portais El Día e El Caribe, ambos com domínio da República Dominicana. No dia 19 de maio, a médica Rita Rojas, presidente da Sociedade Dominicana de Infectologia, deu uma entrevista para a Acento TV em que falou sobre o comunicado e sobre as preocupações com o uso da ivermectina para tratar dos pacientes com coronavírus no país.
Peru
No caso do Peru, o artigo citado por Lucy Kerr e escrito pelo médico Gustavo Aguirre Chang é, na verdade, uma revisão acadêmica sobre outros estudos que analisaram o uso da ivermectina no combate à covid-19; principalmente a pesquisa australiana e outra de que trataremos abaixo. O texto foi publicado no dia 2 de maio no site de uma empresa chamada Megalabs e a íntegra do artigo pode ser conferida aqui.
A Megalabs se apresenta em seu site como uma multinacional farmacêutica que atua em toda a América Latina, inclusive no Brasil. Ela comercializa um medicamento à base de ivermectina, o Securo.
No LinkedIn, achamos um perfil de um médico com o mesmo nome do autor do artigo. Na plataforma, ele se apresenta como gerente encarregado da Unidade de Saúde Ocupacional e Exames do Complejo Hospitalario San Pablo, em Lima, no Peru. Também conseguimos encontrar uma referência a essa unidade de saúde no Google Maps.
Em troca de mensagens pelo LinkedIn, o médico confirmou ser o autor do artigo publicado no site da Megalabs. Ele enviou ao Comprova informações sobre dosagem e sobre a evolução no número de óbitos da covid-19 no Peru após a adoção do medicamento. Não foi possível localizar esses dados em outros estudos já publicados.
Apesar de não conseguirmos comprovar se o Gustavo Chang conduziu um estudo clínico sobre o uso da ivermectina, nós sabemos que o Peru tem administrado o medicamento na pandemia. No dia 8 de maio, o Ministério da Saúde do país editou uma resolução autorizando o uso de ivermectina, hidroxicloroquina e azitromicina no tratamento de pacientes com covid-19. Pela resolução, a ivermectina pode ser aplicada tanto em casos leves quanto em casos graves da doença. Porém, o médico precisa avaliar a situação individual do paciente, obter o consentimento dele e fazer um monitoramento de possíveis efeitos colaterais.
Nos dias 26 e 29 de maio, o governo peruano enviou doses de ivermectina, junto de outros insumos, para locais que estão à frente do tratamento da covid-19. Em outra matéria, essa do dia 1º de junho, o ministro da Saúde do Peru, Víctor Zamora, afirma que o paracetamol e a hidroxicloroquina farão parte do tratamento padrão contra a covid-19 no país, e que a ivermectina será administrada em pacientes sintomáticos e vulneráveis.
Estudo clínico
O Comprova constatou a existência de ao menos um estudo clínico que testou a aplicação da ivermectina em pacientes com o novo coronavírus. A referência é citada no artigo de Gustavo Chang. O estudo é assinado por quatro pesquisadores baseados nos Estados Unidos e o autor principal é o médico Amit Patel, vinculado ao Departamento de Bioengenharia da Universidade de Utah. Esse estudo administrou a ivermectina em 704 pacientes com covid-19 (outros 704 pacientes foram selecionados como grupo de controle) em 169 hospitais na América do Norte, Europa e Ásia.
Os resultados mostram que, entre os pacientes que precisavam de ventilação mecânica, apenas 7,3% dos que tomaram ivermectina morreram (contra 21,3% no grupo de controle). Entre todos os pacientes, a taxa de óbito foi de 1,4% para os que tomaram ivermectina (contra 8,5% no grupo de controle).
A conclusão do estudo, ressalta, porém: “Embora relatemos um forte sinal potencial de benefício na covid-19, esses dados não devem ser considerados conclusivos, pois fatores de confusão desconhecidos nem sempre podem ser contabilizados de maneira confiável, mesmo quando técnicas de correspondência de propensão são empregadas no desenvolvimento de grupos de controle. Não há substituto para um ensaio clínico randomizado adequadamente conduzido.”
E complementa: “Estes achados requerem confirmação em ensaios clínicos randomizados.”
Por e-mail, Lucy Kerr enviou uma lista com 14 links de referências sobre a ivermectina. A maioria das referências apontam para o mesmo estudo da Austrália de que tratamos acima ou para matérias de sites que abordam os resultados dele. O único artigo com o qual ainda não havíamos nos deparado é o de um trio de pesquisadores que tentaram identificar qual seria a dose ideal para a administrar a ivermectina em humanos. Mas eles também não conduziram estudos clínicos sobre a droga.
O que dizem as autoridades?
Procurada, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) afirmou que a ivermectina “não está registrada contra essa doença, portanto não é reconhecida pela agência como eficaz contra ela” (print abaixo).
Além disso, no dia 10 de abril, a Food and Drug Administration (FDA), autoridade sanitária dos Estados Unidos, divulgou uma carta aberta em que alerta as pessoas a não usar remédios à base de ivermectina destinados a animais como tratamento contra a covid-19 (print abaixo). Segundo a FDA, as pessoas não devem tomar ivermectina para prevenir ou tratar a covid-19. Também não há nenhuma autorização da FDA para o uso emergencial da droga nos Estados Unidos em função da pandemia.
O site do National Center for Biotechnology Information, vinculado à US National Library of Medicine, afirma que a nota da FDA foi publicada porque o estudo da Austrália vinha sendo “difundido com grande interesse em sites voltados para médicos e veterinários”. O texto é assinado por Mike Bray, editor da Antiviral Research.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) não comenta casos específicos, mas afirmou ao Comprova que “não existem evidências robustas de alta qualidade que possibilitem a indicação de uma terapia farmacológica específica para a covid-19” e que “muitos medicamentos têm sido promissores em testes através de observação clínica, mas nenhum ainda foi aprovado em ensaios clínicos com desenho cientificamente adequado, não podendo, portanto, serem recomendados com segurança”. Acrescenta ainda que os médicos “devem observar o Código de Ética Médica”, segundo o qual devem evitar o sensacionalismo, entendido como “utilização da mídia, pelo médico, para divulgar métodos e meios que não tenham reconhecimento científico”.
Busca de consenso
Para o médico Demetrius Montenegro, chefe do Serviço de Infectologia do Hospital Universitário Oswaldo Cruz, referência para o tratamento de Covid-19 em Pernambuco, é errado tratar um medicamento que ainda está em fase de testes como a cura do vírus.
“Tem que se levar em conta que quando se tem a publicação de um trabalho mostrando um determinado efeito de uma droga sobre pacientes, ele pode não ser conclusivo. Fazer um teste clínico com 50 pessoas é uma coisa. Fazer um teste clínico com 7 mil ou 12 mil pessoas é outra bem diferente. E, às vezes, não dá para extrapolar um achado para a grande maioria dos pacientes. Por isso, inclusive, muitos desses artigos terminam citando a necessidade de mais testes. Então, dependendo do grau de complicação de um paciente, não se deve tomar condutas baseadas em uma publicação só. É preciso levar em consideração se há um consenso da comunidade médica”, explicou ao Comprova.
Ele lembra ainda que não há “remédio milagroso” para tratar a covid-19. E que é importante que os pacientes não tomem nada sem ouvir a orientação de um médico antes. “O paciente não deve nunca pensar que tomando essa medicação ele vai estar livre de contrair o vírus e de ter complicações. Nem que ele não precisa se prevenir”, alerta.
Retirada do vídeo do ar
No dia 2 de junho, o YouTube retirou o vídeo de Lucy Kerr do ar. Procurado, informou, por e-mail, que não comenta casos específicos e enviou a seguinte nota:
“O YouTube tem políticas claras sobre o tipo de conteúdo que pode estar na plataforma e não permite vídeos que promovam desinformação sobre o Covid-19. Desde o início de fevereiro, analisamos e removemos manualmente milhares de vídeos relacionados a afirmações perigosas ou enganosas sobre o vírus. É nossa prioridade fornecer informações aos usuários de maneira responsável, por isso continuaremos com a remoção rápida de vídeos que violem nossas políticas. Além disso, qualquer usuário que acredite ter encontrado um conteúdo no YouTube em desacordo com as diretrizes da nossa comunidade pode fazer uma denúncia e nossa equipe fará a análise do material.”
O Youtube também nos enviou um página com detalhes sobre a política de informações médicas incorretas relacionadas à covid-19, que lista os conteúdos que não são aceitos na plataforma.
Contexto
No momento em que cientistas do mundo inteiro se debruçam sobre possibilidades de cura da covid-19, algumas pessoas tentam se destacar usando informações enganosas sobre curas milagrosas, que atrapalham o processo.
O primeiro vídeo de Lucy, registrado na página “Lucy Kerr” no YouTube, há nove anos, tem 278 visualizações. O primeiro a ter mais de 1.000 visualizações é de seis anos atrás, um curso on-line de Elastografia (exame de fígado). Os vídeos mais assistidos são sobre câncer, mas, até janeiro de 2020, os números variavam de 149 a 19 mil views – a exceção foi um 15 de setembro de 2014, sobre “Inutilidade e malefícios da mamografia”, que teve 117 mil visualizações.
Neste ano, um vídeo de 10 de janeiro teve 464 visualizações até 2 de junho. O segundo de 2020, foi o que investigamos, “Ivermectina contra a Covid-19”. Postado em 20 de maio, teve quase 370 mil views. Sobre a covid-19, em 24 de maio, outro material foi postado, e visto por quase 108 mil pessoas. O título é “O que funciona e o que não funciona para tratar covid-19.” Este vídeo ainda está disponível na plataforma.
Alcance
A postagem original havia sido visualizada 369.126 vezes quando foi feito o último acompanhamento pelo Comprova, antes do vídeo ser apagado, na noite de 2 de junho. Havia 2.207 comentários, 21 mil curtidas e 342 “não curti”.
Através da busca de imagem reversa do Google, foi possível encontrar o vídeo replicado em outros três canais: aaanjr, Jornal Cidade e Chicote Neles. Juntos, eles registravam 19.589 visualizações até o dia 4 de junho. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/fala-de-medicos-sobre-coronavirus-perder-forca-nao-tem-apoio-de-orgaos-de-saude/ | COMPROVA | Fala de médicos sobre coronavírus perder força não tem apoio de órgãos de saúde | null | 2020-06-04 | As falas de dois médicos italianos, um deles ligado a Silvio Berlusconi, são reais, mas não têm respaldo científico e foram desautorizadas por autoridades sanitárias da Itália.
São enganosos os vídeos e textos com comentários feitos por dois médicos da Itália a respeito da possibilidade de o novo coronavírus estar “perdendo força”. Este conteúdo tem circulado na internet e nas redes sociais acompanhado de afirmações segundo as quais o vírus “não existe mais” e os novos casos teriam se abrandado. As falas dos médicos são reais, mas não têm respaldo científico e foram desautorizadas por autoridades sanitárias da Itália.
Os médicos em questão são Alberto Zangrillo — ligado ao ex-primeiro-ministro da Itália, Silvio Berlusconi –, e Matteo Bassetti. Após as manifestações da dupla, diferentemente do que foi veiculado em postagens investigadas pelo Comprova, o presidente do Conselho Superior da Saúde rechaçou os comentários e se disse “consternado” com as entrevistas.
Os médicos também receberam críticas de pessoas ligadas ao Ministério da Saúde italiano por não apresentarem evidências científicas sobre suas argumentações.
Por que investigamos?
O Comprova verifica conteúdos sobre o novo coronavírus, e a covid-19, doença provocada por ele, que tenham grande viralização. É caso do vídeo e texto em questão aqui.
Esses conteúdos são relevantes pois se inserem em uma lista de materiais que circulam com o intuito de minimizar a pandemia de covid-19. O potencial negativo desses conteúdos é significativo, pois eles podem ter como resultado uma desmobilização da sociedade diante da necessidade manter o isolamento social e medidas de higiene para combater o vírus, para o qual não há cura ou vacina.
No Brasil, após o presidente Jair Bolsonaro adotar como posição do governo a tese de que a pandemia não grave, páginas conhecidas por apoiá-los adotaram esse discurso. Nas últimas semanas, o Comprova verificou, por exemplo, conteúdos que levantavam dúvidas sobre o número de mortes por covid-19, os registros de óbitos em cartórios e que divulgavam boatos sobre enterros falsos. Um dos conteúdos nessa linha citava, como o alvo desta verificação, a Itália, onde teria sido descoberto que o novo coronavírus não seria responsável por milhares de mortes – o que não é verdade.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos?
A verificação foi dividida em duas etapas. Na primeira delas, o Comprova investigou quem são Alberto Zangrillo e Matteo Bassetti, os médicos citados no vídeo; se são mesmo profissionais da área da saúde; onde trabalham; se as falas são verdadeiras e se foram endossadas pelo Conselho Superior da Saúde. Ainda, verificamos o contexto em que foram ditas e se renderam algum tipo de repercussão — tanto na Itália quanto no exterior.
Na segunda etapa da investigação, o Comprova acessou a plataforma que divulgou o vídeo e tentou entrar em contato com os responsáveis pelo site, mas não encontrou nenhuma forma de contato e nem registro oficial do portal no ICANN, que fornece informações sobre domínios de sites em todo o mundo. O vídeo, publicado em 1º de junho, foi deletado no dia 3 de junho.
A notícia também foi publicada pelo site “Plantão ao Vivo”. Sem encontrar uma forma de contatar a equipe do site, o Comprova pesquisou o registro do domínio do portal por meio da ferramenta Whois, criada pelo Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br) e que verifica todos os registros que usam o “.br”, e confirmou no cadastro da Receita Federal para chegar ao e-mail do dono da empresa registrada e tentar descobrir de onde veio a informação.
Quem é Alberto Zangrillo
Um dos médicos citados nas postagens, o italiano Aberto Zangrillo é anestesista, trabalha no hospital San Raffaele e é professor da Universidade Vita-Salute San Raffaele, ambos em Milão.
Zangrillo é uma figura conhecida na Itália. É médico pessoal do ex-primeiro ministro Silvio Berlusconi, de quem é próximo e com quem esteve, inclusive, em campanhas políticas. Crítico do atual primeiro-ministro, Giuseppe Conte, Zangrillo já foi acusado de fraudar o sistema de saúde italiano e também ocupou cargos públicos no país.
Em 15 de maio, o hospital San Raffaele anunciou que mais de 120 pacientes com covid-19 haviam passado pelas unidades de terapia intensiva e que o local apresentava baixa mortalidade nas alas em função da aplicação de terapias inovadoras. O texto menciona que parte se deve às pesquisas coordenadas por Zangrillo.
Em entrevista concedida à emissora italiana Rai, o médico, ao comentar as restrições da Grécia para a entrada de italianos no país, afirmou que “clinicamente o vírus não existe mais” na Itália. Segundo Zangrillo, “cerca de um mês atrás, os infectologistas temiam uma segunda onda de contágios. Entretanto, testes feitos nos últimos dez dias apontam uma carga viral infinitesimal em comparação com pacientes infectados há um ou dois meses”. Disse, ainda, que as evidências que confirmam o fato são clínicas, afirmando que há cerca de um mês as taxas de ocupação de leitos de terapia intensiva vem caindo progressivamente em toda Itália.
A declaração foi republicada pelo perfil do programa no Twitter. No Brasil, trechos da entrevista foram reproduzidos pelas agências AFP e ANSA.
Quem é Matteo Bassetti
O outro médico citado nas postagens é o infectologista italiano Matteo Bassetti, diretor clínico de doenças infecciosas do hospital San Martino e professor de infectologia na Universidade de Gênova. Bassetti de fato declarou, em sucessivas oportunidades, que o novo coronavírus está perdendo força quando em comparação com o início da pandemia na Itália, ocorrido entre os meses de março e abril.
A primeira manifestação do infectologista sobre a possível perda de força do vírus foi feita por meio de uma postagem em seu perfil no Facebook, no dia 26 de maio, na qual Bassetti afirma que “parece bastante evidente que há uma circulação menor do Sars-CoV-2 em comparação com semanas anteriores. Prova disso são os pacientes recuperados nos hospitais e o número de pessoas em observação com sintomas compatíveis com os da doença que foi drasticamente diminuído”. Sem apresentar evidências, o médico completa que “isso é o que temos observado [como quem atua na linha de frente no combate à doença] junto com outros profissionais de outras regiões italianas”.
Em entrevista à agência de notícias ANSA publicada no dia 31 de maio, Bassetti voltou a afirmar que o vírus perdera potência quando comparado ao início da pandemia. “Para além das demonstrações científicas, como médico que atua cotidianamente na linha de frente, [afirmo que] os pacientes atuais são diferentes daqueles de dois meses atrás: antes os pacientes apresentavam uma condição muito mais grave, agora menos. É evidente que hoje a covid-19 é outra, porque o quadro clínico e os sintomas são mais leves — se no início o vírus possuía um ‘arsenal bélico poderosíssimo’, para utilizar uma metáfora, agora as armas à sua disposição são menores”, disse o médico.
O Comprova ainda identificou mais duas manifestações de Bassetti que reforçam as falas anteriores. Em outra postagem no Facebook, do dia 01 de junho, e em entrevista concedida no dia seguinte à emissora italiana Canale 5, o médico utiliza outra metáfora para explicar a possível perda de força do vírus, “se no início nos deparávamos com um tigre, agora estamos diante de um gato doméstico”. Ambas as vezes, Bassetti diz que o enfraquecimento do vírus não tem relação com um maior preparo das equipes médicas para lidar com os pacientes, mas com um quadro clínico diferente e menos severo.
Em nenhuma das suas manifestações Bassetti apresentou evidências capazes de provar uma possível menor gravidade da doença nos pacientes atuais, limitando-se a dizer que isso é um fato percebido pelos médicos que atuam na linha de frente das regiões italianas mais afetadas pelo vírus — como a Lombardia, a Emília-Romana e a Ligúria. Quando questionado pelos jornalistas do Canale 5 sobre qual poderia ser a causa dessa menor gravidade, Bassetti disse que “os cientistas e laboratórios de pesquisa vão responder isso em momento oportuno. Mas, por ora, é um fato observado por vários médicos que atuam no combate à doença”.
O Comprova entrou em contato com o hospital San Martino, onde trabalha o infectologista, para verificar se os boletins médicos poderiam atestar uma menor gravidade dos pacientes. A assessoria de imprensa do hospital não respondeu nossa solicitação e recomendou que entrássemos em contato com Bassetti. Até o momento do fechamento deste texto o médico não havia retornado nosso contato.
O que diz o Conselho Superior de Saúde italiano
Tanto no vídeo quanto no texto checados pelo Comprova, há a informação que o Presidente do Conselho Superior de Saúde italiano, órgão ligado ao Ministério de Saúde do país, teria concordado com os médicos e dito que “até olhos leigos” perceberam que o vírus está com menos força agora do que no início da pandemia. A informação, entretanto, é falsa.
Em entrevista à agência ANSA publicada no dia 1º, Franco Locatelli, presidente do Conselho e membro do Comitê Técnico-Científico (CTS) criado pelo primeiro-ministro Giuseppe Conte para o combate da pandemia, disse sentir um “absoluto desconcerto” pelas declarações dos médicos. Locatelli afirmou ainda que o número de novos casos diários é uma demonstração que a circulação do novo coronavírus persiste no país e que há de se ter cuidado com “declarações perigosas” que arriscam desestimular a mobilização social em relação às medidas de combate ao vírus.
No dia 3 de junho, data em que os italianos puderam voltar a circular pelas regiões do país e as fronteiras foram abertas para os países da União Europeia, o Ministério da Saúde italiano publicou um comunicado alertando que “a batalha ainda não foi vencida”. Segundo o ministro da Saúde, Roberto Speranza, que recomendou atenção e cautela aos italianos e destacou o sacrifício dos italianos no combate à doença, “o vírus ainda é muito perigoso”.
O Comprova tentou entrar em contato com o Conselho Superior de Saúde por e-mail, mas não obteve resposta.
No rastro do conteúdo
O vídeo divulgado na plataforma br.didiadidia em 1º de junho não fornece informações sobre quem faz o upload do material. A cada atualização da página, o nome do perfil de quem subiu o conteúdo muda, embora a foto permaneça a mesma. O Comprova chegou a ver três usuários diferentes como os responsáveis pelo envio: Guzz, Bárbara e Luuan. Em cada um deles, a quantidade de visualizações do vídeo é diferente. Ou seja: a cada atualização da página, os números são modificados, para mais ou até para menos, e tornam difícil descobrir se algum deles é verdadeiro.
Ao clicar no perfil, seja ele em qualquer um dos nomes, o usuário é direcionado para outra página, chamada Canal Quadrado TV 163 Artigo. A interface é similar à apresentada por canais do YouTube, embora não exista opção de clicar em nada e nem lista de uploads recentes.
Sem registro do domínio do portal no ICANN, o Comprova não encontrou o responsável pela plataforma. O vídeo foi deletado no dia 3 de junho.
O site “Plantão ao Vivo” publicou em 1º de junho um texto com as mesmas informações e uma das telas no vídeo — embora não tenha publicado o vídeo em si. Para contatar a equipe do portal, o Comprova pesquisou no Whois o domínio da página e confirmou o e-mail no cadastro da Receita Federal.
O Comprova questionou no e-mail enviado ao responsável pela página de onde a informação havia sido retirada. Em resposta, o proprietário disse que havia “repassado o portal” e que o site não era mais de sua responsabilidade. Ele também encaminhou o e-mail do novo responsável, a quem o Comprova procurou pelo correio eletrônico. Não houve retorno até a publicação da reportagem.
Nas redes sociais
As entrevistas de Zangrillo e Bassetti foram amplamente repercutidas pela mídia internacional, sem se restringir apenas aos veículos italianos. No entanto, o link para o vídeo que cita a suposta chancela do Conselho Superior de Saúde foi republicado em quatro páginas do Facebook, três delas com mais de um milhão de seguidores. Todas as postagens datam do dia 1º de junho.
As quatro páginas do Facebook mantém posts com mensagens de bom dia, piadas de cotidiano, orações e postagens de cunho religioso, além de links para notícias de portais desconhecidos. Não há questionamentos sobre a veracidade do conteúdo. Os comentários, em sua maioria, são de pessoas agradecendo as “boas notícias”.
Duas páginas deletaram o conteúdo em 3 de junho. As outras duas o mantiveram no ar. Apesar da grande quantidade de seguidores, as postagens renderam algumas centenas de compartilhamentos, conforme apresentado mais para frente na sessão “Alcance”, que finaliza este texto.
Contexto
As declarações de Zangrillo e Bassetti surgem no momento de retomada das atividades na Itália e em outros países da Europa. órgãos ligados ao Ministério da Saúde italiano demonstram preocupação com a possibilidade de uma segunda onda de contágios, que possa novamente comprometer o sistema de saúde do país e obrigar os italianos retrocederem ao isolamento social mais restritivo.
Alguns países da Europa, como a Áustria e Grécia, anunciaram restrições à entrada de turistas italianos em seu território devido ao fato de o país ter sido fortemente atingido pela pandemia. Em resposta às barreiras, Luigi di Maio, ministro das Relações Exteriores da Itália, declarou que o país não é composto “por leprosos” e cobrou da União Europeia a reabertura das fronteiras.
O país havia decretado uma quarentena ampla em março deste ano. No mesmo mês, a Itália ultrapassou a China em óbitos e tornou-se o país com maior quantidade de mortes pelo novo coronavírus em todo o mundo. A marca foi superada em abril pelos Estados Unidos.
Apesar de ser o terceiro no mundo com mais mortes pela covid-19 (até 4 de junho foram 33.689 óbitos, segundo levantamento da Universidade Johns Hopkins), só nesta semana ocorreram duas marchas em protestos às medidas adotadas para conter o avanço da doença no país. Um dos atos chegou a negar a existência da pandemia. Já o outro, realizado durante a Festa da República, teve manifestações do partido de extrema-direita La Lega, contrário ao premier Giuseppe Conte.
No protesto da La Lega, o ex-ministro do Interior e nome forte do partido, Matteo Salvini, chegou a citar as entrevistas de Zangrillo e Bassetti para justificar as aglomerações nas ruas e a falta de cuidados com medidas de proteção. “Eu tenho uma máscara mas especialistas dizem que o vírus está morrendo”, declarou ele.
Alcance
Somadas as postagens das quatro páginas do Facebook, o link chegou a 1.114 compartilhamentos até o dia 4 de junho — 687 foram publicações já apagadas. Não foi encontrada nenhuma menção ao vídeo no Twitter.
As alegações dos médicos, apesar de proferidas pelos profissionais, foram contextualizadas por veículos como El País e UOL. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/acao-da-pf-nao-reduziu-numero-de-mortes-no-ceara/ | COMPROVA | Ação da PF não reduziu número de mortes no Ceará | null | 2020-06-02 | Dados do Ministério da Saúde e da Secretaria de Saúde do Ceará apontaram, de fato, para uma redução no número de mortes entre a data da operação da PF e a publicação. Mas nada próximo da queda de 90% apontada em post que viralizou no Facebook
É falsa a informação que tem circulado nas redes sociais sobre uma redução de 90% no número de mortes por covid-19 depois que a Polícia Federal deflagrou uma operação no Ceará. Uma imagem publicada em um perfil pessoal no Facebook no dia 27 de maio afirma que, em dois dias, o número de óbitos do estado pelo novo coronavírus teria caído 90%. A postagem diz ainda que a Polícia Federal seria o “remédio infalível” para a redução.
De fato, a PF deflagrou uma operação, chamada de “Dispnéia”, no Ceará, no dia 25 de maio, para apurar superfaturamento na compra de respiradores para o município de Fortaleza. A ação aconteceu em parceria com o Ministério Público Federal e a Controladoria-Geral da União.
Dados do Ministério da Saúde e da Secretaria de Saúde do Ceará apontaram, de fato, para uma redução no número de mortes entre a data da operação da PF e a publicação. Mas nada próximo da queda de 90% apontada no post, como mostram os números abaixo.
Por que investigamos?
O Comprova investiga conteúdos suspeitos publicados nas redes sociais sobre o novo coronavírus e a covid-19 que tenham grande viralização. A postagem original, cujo conteúdo está sendo checado, foi compartilhada 13 mil vezes no Facebook antes de ser apagada.
Muitos conteúdos duvidosos sobre a covid-19 fazem parte de narrativas usadas em disputas políticas e podem direta ou indiretamente levar as pessoas a minimizar os efeitos da pandemia e relaxar os cuidados com a higiene pessoal, uso de máscaras e o distanciamento social, medidas importantes para conter a transmissão do novo coronavírus.
O conteúdo investigado pelo Comprova se insere também no contexto da disputa entre governadores que decretaram medidas de distanciamento social e o presidente da República, que reiteradas vezes minimiza o impacto do novo coronavírus e pede o isolamento apenas de grupos de risco.
Falso para o Comprova é todo o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos?
A verificação foi realizada em duas etapas. Primeiro, o Comprova investigou se houve, de fato, uma operação da Polícia Federal no Ceará em datas próximas à da postagem e se havia relação com o contexto da pandemia do novo coronavírus. Em seguida, checou os registros de óbitos do estado em datas próximas à da postagem para verificar se houve uma redução de 90% dos registros.
O Comprova entrou em contato com a Polícia Federal por e-mail, em 1º de junho. A assessoria de comunicação da Superintendência da PF no Ceará informou que há uma investigação em curso que apura um possível desvio de recursos públicos federais na compra de respiradores através de duas dispensas de licitação feitas pela Prefeitura de Fortaleza. E que, no âmbito da investigação, foi deflagrada, no dia 25 de maio, a Operação Dispnéia, que contou com o cumprimento de oito mandados de busca e apreensão em Fortaleza e São Paulo — onde fica a sede da empresa de equipamentos médicos. Detalhes da operação podem ser encontrados no site da PF.
Para a checagem dos registros de óbito, o Comprova acessou dados fornecidos pelo Ministério da Saúde, pela Secretaria de Saúde do Ceará e pela iniciativa Brasil.io, que utiliza programação para fornecer dados mais precisos ao cidadão. Nenhum deles apontou uma redução de 90% do número de óbitos nos dias subsequentes à realização da operação da Polícia Federal no estado.
Por fim, tentamos falar com a autora da postagem para entender a origem dos dados e que relação a ação da PF teria com a redução do número de mortes. Até o momento da publicação, porém, não houve resposta.
Verificação
Os boletins técnicos do Ministério da Saúde, publicados diariamente pela pasta, apontam que em 25 de maio o estado registrou 169 novas mortes em relação ao dia anterior. Dois dias depois, na data da postagem, o número de mortes confirmadas em 24 horas foi de 68. A queda no número de óbitos diários foi de 60% — e não de 90%, como alega a autora do post. Os valores apontados pela pasta são os mesmos apresentados pelo Brasil.io, que reúne dados públicos a respeito de casos e óbitos de covid-19 no país.
Já os dados da Secretaria de Saúde do Ceará, embora sejam diferentes dos enviados pelo governo federal, também desmentem a redução de 90% alegada na postagem. Segundo a secretaria, 69 novos óbitos foram registrados em 25 de maio. Em 27, a quantidade de novas mortes confirmadas foi de 49, uma queda de 29% entre as duas datas.
A Flourish chart
Os dados do gráfico acima foram coletados no dia 1º de junho e — no caso do levantamento feito com a InfoSus, plataforma usada pelo governo do Ceará — podem apresentar variação se pesquisados em outras datas. Isso porque a plataforma é constantemente atualizada.
Assim que novas ocorrências são registradas, os óbitos são redistribuídos de forma retroativa, conforme a data em que efetivamente ocorreram. Portanto, entre 31 de maio e 1º de junho, os 236 novos registros de mortes também incluem óbitos que ocorreram em dias anteriores — o que explicaria o valor baixo apresentado entre 30 e 31 de maio, de 8 mortes. O atraso no diagnóstico se deve à fila para realização dos testes.
Procurada por email pela equipe do Comprova, a Secretaria de Saúde do Ceará não respondeu diretamente se houve redução de 90% no número de mortes. No entanto, a pasta enviou o link de um boletim epidemiológico, datado de 26 de maio, contendo a informação de que, em uma semana, a letalidade no Estado passou de 6,8 para 7. A taxa de letalidade mede o percentual de pacientes diagnosticados com a doença que acabam evoluindo para óbito. Ou seja: a probabilidade de pessoas com covid-19 morrerem em decorrência da doença aumentou no Ceará.
Já o Ministério da Saúde, também procurado pelo Comprova, disse por e-mail que a diferença entre os dados apresentados pelos governos federal e estadual se dá pela diferença de tempo entre a pasta ser notificada e a inclusão de todos os casos e óbitos, consolidados, no boletim diário. Enquanto a plataforma do governo estadual é atualizada várias vezes ao longo do dia, o governo federal publica os dados ligados à covid-19 uma única vez no dia.
Na mira da PF
A autora do post associa a queda no número de mortes no Estado desde o dia 25 de maio à Operação Dispnéia da Polícia Federal, que investiga suposto desvio de recursos públicos federais na compra de respiradores adquiridos pela Secretaria de Saúde de Fortaleza. Foram cumpridos oito mandados de busca e apreensão na capital do estado e em São Paulo, onde fica a sede da empresa investigada. Segundo a PF, há indícios de superfaturamento de R$ 34,7 milhões nos contratos e de ausência de capacidade técnica da empresa contratada. A polícia acrescenta que há um potencial prejuízo financeiro de R$ 25,4 milhões aos cofres públicos.
Procurada pelo Comprova, a PF afirmou, por e-mail, que investigação “está em andamento”. A corporação acrescentou à resposta o link para um release sobre a operação. No texto, a PF afirma que a ação não envolveu nenhuma apreensão de equipamentos — também não há menção sobre possíveis novas aquisições de respiradores.
“A operação policial se desenvolve sem quaisquer prejuízos à continuidade do serviço público de saúde, inclusive, não estão sendo apreendidos equipamentos que são utilizados para o atendimento à população na rede hospitalar”, diz trecho do texto sobre a ação divulgado para a imprensa.
O prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio (PDT) publicou um vídeo apontando “motivações políticas eleitorais” na operação da Polícia Federal. Roberto Cláudio vai ser candidato à reeleição.
Críticas ao governo
A imagem foi publicada em um perfil pessoal do Facebook no dia 25 de maio. A autora se apresenta como moradora de Fortaleza e afirma que é formada em Odontologia pela Universidade Federal do Ceará. Na página, ela costuma postar mensagens a favor do presidente Jair Bolsonaro e contra o governador do Ceará, Camilo Santana (PT).
As críticas se estendem a partidos de esquerda; instituições democráticas, como o Supremo Tribunal Federal; e antigos aliados de Bolsonaro, como o ex-ministro da Justiça Sergio Moro. As postagens relacionadas à pandemia de covid-19 seguem na toada dos apoiadores do presidente, com links para sites de conteúdo de direita reclamando da quarentena e estimulando o uso da cloroquina para o tratamento da doença.
A mensagem verificada foi publicada no dia 27 de maio, viralizou rapidamente e chegou a mais de 13 mil compartilhamentos. Muitos dos comentários alertavam para o conteúdo falso da mensagem, questionando uma queda de 90% no número de mortes por covid-19 no estado. Na defensiva, a autora afirmou que usou uma “figura de linguagem” e que “pessoas com inteligência limitada” não conseguiram entender o que quis dizer. Ela acabou apagando o post.
Mas voltou a compartilhar o mesmo conteúdo, dessa vez como uma foto. O Facebook alerta para os usuários que a imagem traz informações falsas. E sugere o link para uma verificação feita pela Agência Lupa.
A equipe do Comprova entrou em contato com a autora da postagem. Perguntamos de onde são os dados que ela usou para afirmar que houve uma queda no número de mortes de vítimas do novo coronavírus no Ceará, mas não tivemos retorno até a publicação desta verificação.
Contexto
Os governos estaduais são o alvo preferencial de Jair Bolsonaro na crise política e econômica causada pela pandemia do novo coronavírus. A crise começou em março, com os governos estaduais decretando medidas de distanciamento social, enquanto o presidente diminuía o impacto do novo coronavírus, comparando a covid-19 a “uma gripezinha”.
O Ceará foi um dos estados que adotou uma quarentena rigorosa. Até um sistema de câmeras foi usado para fiscalizar a circulação de pessoas. No dia 30 de maio, o governador Camilo Santana renovou o decreto de isolamento social, com foco em cidades do interior do Estado. Mas anunciou a flexibilização das medidas de distanciamento social na capital, Fortaleza, com a retomada de algumas atividades, como a construção civil. O prefeito Roberto Cláudio falou da melhora nos indicadores do município, como a redução no número de mortes, para justificar o afrouxamento. Mas nenhum dos dois associou essa queda à ação da Polícia Federal.
O Projeto Comprova já verificou críticas de apoiadores do presidente a governadores e prefeitos como forma de fortalecer o discurso do governo federal e minimizar os efeitos da pandemia. O Comprova também já checou denúncias de que governos estaduais estariam se aproveitando do caos causado pela covid-19 para desviar dinheiro público.
O jornal O Estado de São Paulo checou conteúdo semelhante sobre a redução de mortes no Rio de Janeiro.
Alcance
A postagem original chegou a 13 mil compartilhamentos, antes de ser apagada. A imagem com o mesmo conteúdo teve menos alcance, com apenas 59 interações até o dia 2 de junho.
Publicações afirmando que o número de mortes por covid-19 caiu 90% no Ceará depois da intervenção da Polícia Federal também circularam no Twitter. A publicação que mais viralizou teve mais de 1,1 mil interações até o dia 2 de junho. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-o-numero-de-casos-de-covid-19-seja-menor-que-o-oficial/ | COMPROVA | É falso que o número de casos de covid-19 seja menor que o oficial | null | 2020-06-01 | Ao contrário do que diz apresentador de canal no Youtube, as mortes confirmadas pelo novo coronavírus só entram na estatística após o resultado positivo do teste
Um vídeo publicado no YouTube afirma que o número de mortes por covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, é menor do que o divulgado pelas autoridades brasileiras. O autor do conteúdo atribui a informação a uma reportagem da Record TV que teria revelado a “fraude” e também o registro de mortes por pneumonia como sendo de covid-19. As afirmações são, no entanto, falsas. As mortes confirmadas pelo novo coronavírus só entram na estatística após o resultado positivo do teste.
O vídeo foi publicado em 25 de maio no canal de Youtube “Giro de Notícias” por um homem chamado Alberto Silva, que se identifica como apresentador. Nas redes sociais e no próprio YouTube, Silva diz ter um canal de “jornalismo independente”. Com 1,15 milhão de inscritos, o canal faz críticas ao STF, defende o presidente da República, Jair Bolsonaro, e a intervenção militar.
Uma matéria do jornal O Globo, publicada neste domingo (31), mostra que o canal Giro de Notícias é um dos veículos conhecidos por divulgar notícias falsas abastecidos por verbas publicitárias de estatais. O canal, inclusive, foi o que mais veiculou anúncios da Petrobras, com 10.027 anúncios. O youtuber faturou em dose dupla com a Eletrobras. O “Giro de Notícias” veiculou 2.355 anúncios da estatal. Já seu canal pessoal, “Alberto Silva”, recebeu 1.950.
Por que investigamos?
O Comprova verifica conteúdos que tenham grande repercussão nas redes sociais. No caso da pandemia, conteúdos falsos ou enganosos têm o potencial de provocar prejuízos à saúde de pessoas e à saúde pública, por incentivarem comportamentos danosos.
Este vídeo se insere em um grupo de conteúdos que tem como objetivo minimizar a extensão da pandemia e, portanto, a gravidade da situação pela qual passa o mundo e, em particular, o Brasil.
Quando da chegada da pandemia ao país, em março, o presidente Jair Bolsonaro fez diversos comentários que tinham o objetivo de minimizar os efeitos do novo coronavírus. Desde então, páginas e perfis de apoiadores têm insistido nessa estratégia. Recentemente, o Comprova verificou conteúdos que, de maneira falsa ou enganosa, tentavam reduzir o impacto da pandemia usando números de mortes registradas em cartório, de sepultamentos em um cemitério de São Paulo e o resultado de autópsias na Itália.
Como verificamos?
O Comprova entrou em contato com Alberto Silva pelo número de telefone divulgado no vídeo. Em três tentativas por WhatsApp, foi solicitado o link da reportagem da Record TV à qual ele se referia. O apresentador não respondeu às mensagens e ligação.
Além disso, o Comprova buscou, sem sucesso, reportagens da Record TV disponíveis no site da emissora que trouxessem alguma referência a uma “farsa” nos números das mortes por covid-19. A Record TV também foi procurada, mas não se pronunciou.
Procuramos também o Ministério da Saúde para entender como funciona a confirmação de casos e mortes por covid-19, com a intenção de entender as diretrizes e protocolos.
Por fim, foram entrevistados dois pneumologistas para explicar a relação da pneumonia com a covid-19.
Verificação
No vídeo verificado, Alberto Silva diz que uma reportagem da Record TV teria denunciado uma fraude na contagem de mortos por covid-19 no Brasil. Segundo ele, nem toda pessoa cujo óbito entra para as estatísticas da doença morreu devido ao novo coronavírus. Silva, inclusive, insinua que todas as mortes por pneumonia estariam sendo diagnosticadas como covid-19.
“A pessoa tem um infarto, covid-19, a pessoa cai de um andaime, covid-19, a pessoa é atropelada, covid-19. A reportagem mostrou então que o nosso pico de informações pode ser possivelmente que não seja nem a metade do que eles estão anunciando. Estamos na casa de 22, 23 mil pessoas falecidas pelo covid-19, mas se forem descartadas as pessoas que não testaram, a gente não chega nem a 5 mil”, afirma Alberto no vídeo.
Durante a apresentação, Silva afirma que não poderia compartilhar o link da reportagem porque poderia ser banido do YouTube. Assim, o Comprova entrou em contato com ele solicitando o link da reportagem. Silva visualizou a mensagem, mas não respondeu.
O Ministério da Saúde, por sua vez, contesta a alegação. A pasta informou, por nota, que os números divulgados diariamente de casos e óbitos por covid-19 são informados pelos estados ao ministério por meio do Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe (SIVEP-Gripe). Os casos de óbitos são confirmados pelo teste RT-PCR realizado nos pacientes antes do óbito. Até domingo (31), o Brasil registrava 29.314 mortes confirmadas.
A pasta esclareceu ainda que os dados de óbitos em investigação são os casos de pacientes que fizeram o teste e, até a data do óbito, não tinham resultado confirmado ou foram diagnosticados por critérios clínicos epidemiológicos. Após o óbito, esses casos continuam a ser investigados para confirmar a causa da morte.
A Record TV também foi procurada para comentar o vídeo, mas até o fechamento desta verificação, na sexta-feira (29), não havia respondido.
A secretaria de Estado de Saúde de São Paulo também informou, por nota, que a confirmação da morte ocorre apenas se o teste de PCR comprovar a infecção pelo novo coronavírus, com diagnóstico por laboratórios já validados na rede de saúde.
Covid-19 e pneumonia
No vídeo verificado, o apresentador afirma que pessoas diagnosticadas com pneumonia estariam sendo registradas como doentes por covid-19. O Comprova decidiu, então, verificar a relação entre as doenças.
Um dos principais fatores de morte por covid-19 é a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG). Essa complicação também é observada em pacientes com pneumonia. De acordo com especialistas, a pneumonia é uma inflamação no pulmão que pode ser causada tanto por vírus quanto por bactérias.
O médico pneumologista Valderio do Valle Dettoni, professor de medicina da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), explica que a covid-19 pode ocasionar um quadro de pneumonia, mas não é a única doença capaz de fazer isso porque há outros vírus e bactérias com a mesma capacidade. Dettoni esclareceu, ainda, que nem todas as pessoas com o novo coronavírus irão desenvolver a inflamação no pulmão.
“Tem muita gente com o novo coronavírus no organismo que não vai apresentar sintomas ou a doença poderá vir de forma leve”, disse ele. “A pneumonia é uma inflamação no pulmão, a complicação do quadro é que pode levar à Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), causadora da maioria das mortes por covid-19”, explica.
A pneumologista Karina Tavares Oliveira, médica da Unimed no Espírito Santo, acrescenta que a covid-19 também pode levar à morte por outros motivos. “A pessoa pode desenvolver a pneumonia e, com um pouco mais de tempo, consegue resolver a infecção no pulmão. Entretanto, o agravamento da doença pode desenvolver outras comorbidades causadoras da morte, ou seja, a pneumonia não será a fonte primária”, destacou.
Contexto
O vídeo foi publicado em um momento de contínua tensão política no Brasil sobre a covid-19. Como destacado anteriormente, o presidente Jair Bolsonaro, defensor do retorno à normalidade, vem tentando minimizar a pandemia do novo coronavírus, assim como muitos de seus apoiadores. Na mais famosa declaração com este teor, Bolsonaro afirmou que a covid-19 era uma gripezinha.
Bolsonaro quer a retomada de todas as atividades econômicas no país. Essa visão contraria as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) que, para países sem capacidade de testar, rastrear e isolar as pessoas com covid-19, recomenda políticas de distanciamento social para evitar a disseminação do novo coronavírus e, consequentemente, o aumento do número de casos da covid-19.
Por outro lado, os governos estaduais mantêm o isolamento em seus territórios, mesmo trabalhando para reabrir determinados setores. De acordo com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em casos de saúde pública, como a pandemia de covid-19, não há hierarquia entre os entes da federação. Ou seja, um decreto federal não vale mais que um estadual. Na ocasião, o ministro Alexandre de Moraes criticou a falta de atuação do governo federal na coordenação do combate à pandemia.
Alcance
O vídeo publicado no YouTube no dia 25 de maio teve mais de 220 mil visualizações até sexta-feira (29). Já no Facebook, o conteúdo teve 9,3 mil curtidas e 6,1 mil compartilhamentos, tendo sido comentado por mais de 900 pessoas. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/audio-vazado-de-suposto-assessor-do-governador-do-ceara-e-falso/ | COMPROVA | Áudio vazado de suposto assessor do governador do Ceará é falso | null | 2020-03-31 | Os envolvidos negam o conteúdo do áudio e o nome Ricardo Certi não consta na lista de servidores estaduais do Ceará nem foi encontrado em outros sistemas de busca. O único nome semelhante encontrado pelo Comprova é Riccardo Certi, um barítono italiano de Bréscia
São falsos os áudios e vídeos divulgados em páginas e grupos de Facebook, Twitter e no WhatsApp que atribuem a um suposto assessor da Casa Civil do Governo do Ceará, chamado Ricardo Certi, o envio de uma mensagem para o Sistema Verdes Mares de Comunicação. O governador do estado, Camilo Santana, publicou uma postagem na sua página oficial do Facebook desmentindo o conteúdo e a autoria da mensagem. Ricardo Certi não é um nome que consta na lista de servidores estaduais. De acordo com a Secretaria de Estado da Casa Civil do Ceará, o caso foi informado às autoridades policiais para investigação.
Na mensagem de áudio, o suposto assessor pede ao interlocutor para “fazer a sua parte”, que seria criticar Jair Bolsonaro. “A parte de vocês é meter o pau só no Bolsonaro, só no Bolsonaro, porque a nossa parte aqui a gente está fazendo, que é fechar os comércios para ter a revolta”, diz, em um trecho, o autor do áudio. Em outro, afirma que “quando o povo se revoltar, a gente quer a revolta, que o povo passe fome mesmo. […] Pedir o impeachment do Bolsonaro. Aí vocês jogam aí na imprensa essa coisa: ah, o Bolsonaro não está sabendo lidar com a covid.” A mensagem finaliza dizendo que “[…] a intenção é essa mesmo. Começar a deixar faltar coisas nos supermercados ou então limitar o acesso ao supermercado, que é para o povo ir para a rua, mas contra o Bolsonaro.”
A Associação Cearense de Rádio e Televisão (ACERT) emitiu nota na qual afirma que “o áudio, que sugere que um servidor do Governo do Ceará está conversando com um suposto colaborador do SVM, é inverídico e criminoso”.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
Para realizar esta verificação, o Comprova consultou o portal Ceará Transparente e verificou que o nome de Ricardo Certi não consta na lista de servidores estaduais. Também não há registro de servidores com nomes de grafia semelhante, como Ricardo Serti, Certti, Sertti. ou Certe. A busca pelo nome também não traz resultados no Google, a não ser do próprio áudio vazado. Buscando em um sistema de busca de pessoas no Brasil, também não foi encontrado nenhum resultado nem o CPF do suposto assessor, nem quando a busca foi feita pelos sobrenomes de grafia similar (Certi, Serti, Serte, Certe, Certti, Sertti). A única pessoa com nome semelhante e registro na internet é Riccardo Certi, um barítono italiano de Bréscia.
Além da publicação na página oficial do Facebook, o Comprova buscou a assessoria de comunicação do governador do Ceará, que desmentiu o conteúdo do áudio. Também entramos em contato com a Associação Cearense de Rádio e Televisão (ACERT), que nos enviou uma nota de repúdio ao conteúdo do áudio, na íntegra. O Comprova entrou em contato com a assessoria de comunicação do Grupo Edson Queiroz, detentor do Sistema Verdes Mares, que corroborou a nota da Acert.
Diferente do que afirma o conteúdo do áudio, o decreto para fechamento do comércio no estado do Ceará, publicado no dia 19 de março, ocorreu para intensificar as medidas para enfrentamento da infecção pelo novo coronavírus. A decisão considerou o decreto anterior, n.º 33.510, de 16 de março de 2020, que determinou situação de emergência em saúde no âmbito estadual em função do crescente aumento no Estado do Ceará do número de casos de pessoas infectadas pelo novo coronavírus. O governo também seguiu a recomendação expedida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para enfrentamento da pandemia do novo coronavírus.
O que diz o governo: comércio e desabastecimento
Ao contrário do que diz o áudio compartilhado, o Governo do Ceará não decretou limite de acesso a supermercados nem o fechamento desses espaços. De acordo com decreto, prorrogado por mais sete dias no último dia 28, “todas as atividades essenciais à vida da população permanecem funcionando, toda a sua cadeia, desde a produção de alimentos, a distribuição, logística e os supermercados.” O próprio governador explicou, em áudio publicado no site oficial do governo, quais são as exceções ao fechamento do comércio no Ceará.
O Comprova também consultou a Associação Cearense de Supermercados (ACESU). A entidade diz, em seu site, que “os supermercados fazem parte do rol de atividades essenciais instituído pelo governo federal e estão funcionando normalmente no estado do Ceará”. Além disso, a entidade regional diz que acompanha de forma atenta, com a Associação Brasileira de Supermercados, toda a cadeia de abastecimento do segmento, e que “não há desabastecimento de gêneros alimentícios, de higiene pessoal, bem como, de limpeza em geral”.
Viralização
O áudio, muitas vezes acompanhado de um vídeo, do suposto assessor Ricardo Certi teve mais de 1.500 compartilhamentos no Facebook, mais de 500 vezes no Twitter. No Youtube, o conteúdo falso teve mais de 150.000 visualizações.
O material foi enviado ao Comprova por meio do nosso Whatsapp (11 97795-0022)
A Agência Lupa e o Boatos.Org também fizeram a checagem deste áudio. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/video-do-diretor-da-oms-foi-tirado-de-contexto-para-validar-discurso-de-bolsonaro/ | COMPROVA | Vídeo do diretor da OMS foi tirado de contexto para validar discurso de Bolsonaro | null | 2020-03-31 | Alerta de Tedros Adhanom Ghebreyesus, no entanto, não significa que a OMS tenha deixado de apoiar o isolamento social como estratégia contra o novo coronavírus
Um trecho fora de contexto de uma fala do diretor-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), no qual ele alerta para os impactos econômicos do distanciamento social, tem sido compartilhado nas redes sociais de modo a referendar a posição do presidente Jair Bolsonaro sobre o enfrentamento à pandemia do novo coronavírus, contrária à implementação do isolamento social. O alerta de Tedros Adhanom Ghebreyesus, no entanto, não significa que a OMS tenha deixado de apoiar o isolamento social como estratégia contra o novo coronavírus.
Em sua colocação, feita durante coletiva de imprensa da OMS no dia 30 de março, Adhanom pede que os governos levem em consideração os impactos econômicos que um lockdown pode ter sobre as pessoas mais pobres.
Ele respondia à pergunta de uma repórter da Índia sobre a crise humanitária que o país tem enfrentado em meio à pandemia. Na semana passada, o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, impôs a 1,3 bilhão de habitantes a maior quarentena da história da humanidade.
“Alguns países têm um forte sistema de bem-estar social e outros não”, disse. “Os governos devem ter em conta esta população; se estamos fechando ou se estamos limitando a movimentação, o que vai acontecer às pessoas que têm de trabalhar diariamente e têm de ganhar o pão de cada dia?”, questiona o diretor-geral da OMS.
Por conta da repercussão de sua fala, o diretor-geral da OMS esclareceu posteriormente, em sua conta de Twitter, que não quis dizer que os países não deveriam impor o distanciamento social para conter a disseminação da covid-19. Adhanom afirmou que os governos deveriam desenvolver políticas para proteger os mais vulneráveis.
“Cresci na pobreza e entendo essa realidade”, escreveu. “Peço que os países desenvolvam políticas públicas para garantir proteção econômica àqueles que não podem ganhar dinheiro ou trabalhar em meio à pandemia da covid-19. Solidariedade!”
A fala de Adhanom não representou uma mudança de postura da OMS em relação ao isolamento social, como as publicações do vídeo da coletiva nas redes sociais insinuam. Em resposta à mesma pergunta feita pela repórter indiana, o diretor do programa de Emergências de Saúde da entidade, Michael Ryan, reforça a importância dos lockdowns para contenção da doença.
“Infelizmente, em algumas situações neste momento, [lockdowns] são a única medida que os governos podem realmente tomar para conter este vírus”, disse Ryan. “É lamentável, mas essa é a realidade e precisamos explicar continuamente as razões para isso às nossas comunidades”.
A assessoria de comunicação da OMS, em resposta ao Comprova, declarou: “o que podemos esclarecer é o que o diretor-geral da OMS disse em suas declarações à imprensa ontem. Ele foi muito claro. Disse que cada país precisa fazer sua própria avaliação [de quais medidas, incluindo restrições de movimento, eles devem implementar], e ao fazer isso eles precisam levar em conta a realidade daqueles que precisam ganhar a vida diariamente e que essas pessoas precisam ser protegidas, cuidadas. A íntegra está aqui (o trecho mencionado por você está a partir de 34:30).
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos
O Comprova consultou a transcrição oficial e o vídeo oficial da entrevista coletiva da OMS do dia 30 de março; além da conta oficial de Twitter de Adhanom e da OMS.
Quem publicou o vídeo do diretor-geral da OMS?
O vídeo fora de contexto da fala de Adhanom foi publicado no dia 30 de março às 16h19 com legendas em português no Twitter pelo usuário @RFGlau, que usou o trecho para justificar as opiniões de Bolsonaro em relação ao isolamento social. A conta de @RFGlau foi criada em março deste ano e usa a mesma foto de perfil de outros dois perfis suspensos, @RafaGlau e @RFLGlau.
O mesmo vídeo, com marca d’água de @RFGlau, foi republicado no mesmo dia pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e por seus filhos Carlos (vereador do Rio de Janeiro pelo Partido Social Cristão), Eduardo (deputado federal de São Paulo pelo PSL) e Flávio Bolsonaro (senador do Rio de Janeiro atualmente sem partido). Os deputados federais Osmar Terra (MDB-RS), Bia Kicis (PSL-DF) e Daniel Silveira (PSL-RJ) também divulgaram o clipe.
O vídeo foi reproduzido ainda no canal de YouTube do pastor Silas Malafaia, aliado de Bolsonaro.
O que Tedros Adhanom Ghebreyesus disse sobre isolamento social de pessoas mais pobres? Leia a transcrição completa:
Uma repórter da Índia fez a seguinte pergunta durante coletiva de imprensa da OMS direcionada ao diretor de Emergências, Michael Ryan:
“Dr. Ryan, deve estar ciente de que a Índia por conta de seu lockdown está testemunhando uma crise humanitária sem precedentes sob a forma de movimento de migrantes de uma parte do país para outro. Eu entendo que você não gosta de comentar sobre decisões individuais de país, mas esta é uma crise humanitária sem precedentes. Qual seria o seu conselho para o nosso governo?”
O diretor do programa de Emergências de Saúde da OMS, Michael Ryan, respondeu o seguinte:
“Voltando ao que acredito ser a parte mais importante da sua pergunta, e que é sobre os impactos das quarentenas, restrições de movimento, número um, precisam ser vistas com muito cuidado e, dois, obviamente que independentemente da sua intenção, são difíceis de serem aceitas pelas comunidades porque as pessoas precisam se movimentar e querem se movimentar pelas famílias, por razões econômicas e outras razões.
É importante que os governos se comuniquem de forma aberta e transparente às pessoas sobre as razões de as quarentenas, fechamentos ou restrições ao movimento estarem acontecendo porque elas colidem com a liberdade de movimento das pessoas. E se as pessoas precisam abrir mão da sua liberdade de movimento, precisam entender porque isso está acontecendo. Restrições ao movimento são lamentáveis em todas as situações. Ninguém quer que elas aconteçam, mas em situações nas quais você tem uma epidemia muito, muito intensa em uma parte do país e em outra parte do país não é tão intensa assim, você pode precisar implementar algum tipo de medida para pelo menos encorajar – Às vezes é uma recomendação, às vezes é uma forte recomendação e às vezes é uma restrição na qual o transporte é suspenso.
Cada governo deve escolher o equilíbrio entre o que é recomendação para as comunidades e, em alguns casos, o que é uma quarentena forçada. Qualquer uma que seja escolhida, é importante que a comunicação e a aceitação da comunidade estejam no centro da preocupação do governo. É impossível ter uma efetiva restrição de movimento sem que a comunidade esteja de acordo com aquela restrição de movimento.
E, como o Tedros Adhanom Ghebreyesus disse no seu discurso, quando tais medidas são postas em prática é excepcionalmente importante que essas medidas sejam realizadas não só com a aceitação da população, mas também com os direitos humanos e a dignidade das pessoas afetadas no centro. Isso nem sempre é fácil, mas é o que deve ser o centro do objetivo do processo. Eu não estou falando especificamente sobre a Índia; estou falando sobre isso em termos gerais, mas penso que o que ele [Tedros Adhanom Ghebreyesus] fala é que essas medidas para toda a sociedade são difíceis, não são fáceis e estão prejudicando as pessoas.
Mas a alternativa é ainda pior se os países forem capazes de se afastar dessa abordagem. Se nós vamos nos afastar disso como estratégia para suprimir o vírus, temos de pôr em prática a saúde pública. A vigilância, o isolamento, a quarentena, as descobertas, a detecção. Temos de ser capazes de mostrar que podemos ir atrás do vírus, porque só os bloqueios não vão funcionar.
Mas, infelizmente, em algumas situações, neste momento, os lockdowns são a única medida que os governos podem utilizar. É preciso desacelerar este vírus e isso é lamentável, mas essa é a realidade e nós precisamos para explicar continuamente as razões para isto às nossas comunidades”.
O diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, complementou a resposta:
“Sobre a questão do chamado lockdown, talvez alguns países já tenham tomado medidas para o distanciamento físico, fechamento de escolas e prevenção de reuniões e assim por diante. Isso pode ganhar tempo mas, ao mesmo tempo, cada país é diferente.
Alguns países têm um forte sistema de bem-estar social e outros não. Eu sou da África, como sabem, e sei que muitas pessoas têm de trabalhar todos os dias para ganhar o seu pão de cada dia. Os governos devem ter em conta esta população; se vamos fechar ou limitar os movimentos, o que vai acontecer às pessoas que têm de trabalhar diariamente e têm de ganhar o pão de cada dia?
Então cada país, com base na sua situação, deve responder a esta pergunta. Não estamos vendo isso como um impacto econômico sobre um país, como uma média de perda do PIB, ou as repercussões econômicas. Temos que ver também o que significa para o indivíduo na rua e talvez eu tenha dito muitas vezes: eu venho de uma família pobre e sei o que significa preocupar-se sempre com o seu pão de cada dia e isso tem que ser levado em conta.
Porque cada indivíduo é importante e como cada indivíduo é afetado por nossas ações tem que ser levado em conta. É isso que estamos dizendo. Trata-se de qualquer país; não se trata da Índia; trata-se de qualquer país da Terra.
Mesmo o país mais rico da Terra pode ter pessoas que precisam trabalhar pelo seu pão de cada dia. Nenhum país é imune. Todos e cada país têm que ter a certeza de que isto é levado em conta”.
Viralização
Os vídeos foram publicados em canais com grande número de inscritos, como do presidente Jair Bolsonaro e de seus filhos. Juntos, os vídeos somam mais de 500 mil visualizações. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/reportagem-de-tv-italiana-sobre-virus-criado-em-laboratorio-chines-nao-tem-relacao-com-a-covid-19/ | COMPROVA | Reportagem de TV italiana sobre vírus criado em laboratório chinês não tem relação com a covid-19 | null | 2020-03-31 | A reportagem em questão, na verdade, fala sobre um grupo de cientistas que criou uma versão híbrida de um coronavírus de morcego na China cinco anos atrás e foi baseada em um estudo da revista científica Nature. Em março de 2020, o periódico esclareceu que não há evidências de que esse experimento tenha relação com a pandemia atual e, em análise posterior, pesquisadores afirmaram que o SARS-CoV-2 não foi fabricado em laboratório ou produzido propositalmente
São enganosas as publicações que afirmam que uma reportagem, veiculada em novembro de 2015, pela emissora de TV italiana RAI, demonstra que o novo coronavírus foi criado em um laboratório pelo governo chinês.
A matéria em questão, que fala sobre um grupo de cientistas que criou uma versão híbrida de um coronavírus de morcego na China cinco anos atrás, foi baseada em um estudo da revista científica Nature. Em março de 2020, o periódico esclareceu que não há evidências de que esse experimento tenha relação com a pandemia atual.
Em análise posterior publicada no periódico britânico, pesquisadores afirmaram que o SARS-CoV-2 não foi fabricado em laboratório ou produzido propositalmente.
A alegação verificada neste artigo foi publicada no Twitter em 25 de março pelo ex-vice-premiê da Itália Matteo Salvini e aparece em múltiplos artigos e postagens compartilhados no Facebook, Twitter e YouTube ao menos desde 28 de março.
Enganoso para o Comprova é o conteúdo que foi retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; ou que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.
Como verificamos
Para esta verificação foram consultadas reportagens da mídia italiana, a plataforma digital de vídeos da emissora de TV RAI e estudos publicados pelo periódico científico britânico Nature. Outra fonte de informação foi o site da Organização Mundial da Saúde (OMS).
O que diz a reportagem
Para afirmar que o novo coronavírus – que já deixou mais de 38 mil mortos no mundo desde que foi detectado na cidade chinesa de Wuhan em 2019 – foi criado em um laboratório, as publicações utilizam uma reportagem veiculada no quadro sobre ciências de um telejornal da emissora de TV italiana RAI, o TGR Leonardo, em 16 de novembro de 2015.
“Cientistas chineses criaram um supervírus pulmonar a partir de morcegos e ratos. Serve apenas para fins de estudo, mas há muitos protestos. Vale a pena arriscar?”, diz um jornalista ao apresentar a reportagem.
A matéria detalha a maneira como pesquisadores chineses conseguiram criar um organismo modificado “alterando a proteína superficial de um coronavírus encontrado em morcegos” para que este crie uma síndrome respiratória aguda grave (SARS). Segundo a reportagem, o vírus criado em laboratório poderia contagiar humanos, levando a um debate sobre se os aprendizados promovidos por experimentos deste tipo justificariam os possíveis riscos.
Por conter elementos semelhantes aos presentes na pandemia atual, a reportagem passou a ser compartilhada como se provasse que “o novo coronavírus foi criado em um laboratório na China” e que teria “escapado”. Uma busca no Google pelos termos mencionados na reportagem e o nome do programa levou a um artigo da agência de notícias italiana ANSA sobre a recente repercussão da matéria de 2015.
No texto, o diretor do programa TGR Leonardo, Alessandro Casarin, explica que a reportagem foi baseada em uma publicação da revista científica Nature e que “há apenas três dias, a mesma revista deixou claro que o vírus sobre o qual o serviço relata, criado em laboratório, não tem relação com o vírus natural [que causa a ] COVID-19”.
De fato, uma análise dos materiais publicados pela Nature em novembro de 2015 localiza um artigo intitulado, em tradução livre: “Vírus de morcego projetado gera debate sobre pesquisas arriscadas”.
Em março de 2020, uma nota foi acrescentada no topo do texto, afirmando: “Sabemos que essa história está sendo usada como base para teorias não verificadas de que o novo coronavírus que causou a COVID-19 foi projetado. Não há evidências de que isso seja verdade; os cientistas acreditam que um animal é a fonte mais provável do coronavírus”.
Após a reportagem de 2015 começar a ser associada ao novo coronavírus, o programa Porta a Porta, da mesma emissora de TV italiana, convidou um especialista para debater o tema. Na emissão, o professor Fabrizio Pregliasco, especialista em virologia da Universidade de Milão, classificou a possibilidade do novo coronavírus ter “escapado” de um laboratório como uma “teoria da conspiração”.
“Há, pelo contrário, confirmações de que se trata de uma origem natural, através sempre de uma variação de um vírus do morcego. O genoma que foi isolado mostra uma origem natural. Teórica, essa possibilidade entra nas possibilidades de complôs, de teorias da conspiração que são também ligadas ao fato que em Wuhan há um belíssimo laboratório de alta segurança onde acontecem estudos. Mas reforço que, na realidade, essa não seria a origem desse vírus”, afirmou Pregliasco, em tradução livre do italiano.
Origem do novo coronavírus
Estudo publicado em 17 de março deste ano no período científico Nature reitera a informação de que o novo coronavírus tem origem natural. “Nossas análises mostram claramente que o SARS-CoV-2 não é uma construção de laboratório ou um vírus manipulado propositadamente”, afirmaram os pesquisadores.
Como parte do estudo, os autores analisaram a estrutura genética do SARS-CoV-2, concluindo que, se houvesse manipulação genética em laboratório, a estrutura do novo coronavírus seria semelhante a de outros organismos existentes. “No entanto, os dados genéticos mostram irrefutavelmente que o SARS-CoV-2 não é derivado de nenhuma estrutura central de vírus usada anteriormente”, afirma a pesquisa.
Esta possibilidade também é considerada como mais provável pela Organização Mundial de Saúde (OMS). “Atualmente, a origem do SARS-CoV-2, o coronavírus que causa a COVID-19, é desconhecida. Todas as evidências disponíveis sugerem que o SARS-CoV-2 tem uma origem animal natural e que não é um vírus construído”, explica a organização em seu site.
Os primeiros caso de infecção pelo novo coronavírus foram confirmados em dezembro do ano passado na cidade chinesa de Wuhan. A região, que chegou a registrar milhares de novos casos por dia no auge do surto, no fim de fevereiro, foi considerada no último dia 28 de março uma zona de “baixo risco” por uma fonte do governo local. No restante do mundo, países intensificam as medidas de confinamento para controlar a doença.
Viralização
A alegação de que a reportagem de 2015 da TV italiana comprovaria que o novo coronavírus foi gerado em um laboratório na China circulou amplamente pelo WhatsApp e foi enviada ao Comprova por meio do número (11 97795-0022).
O vídeo, acompanhado da mesma afirmação, foi compartilhado mais de 4 mil vezes em postagens no Facebook e Twitter, desde 28 de março. A mesma alegação acumula mais de 54 mil visualizações no YouTube, além de ter sido publicada em artigo com 9.627 interações no Facebook. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/limao-com-bicarbonato-nao-cura-covid-19-e-pode-fazer-mal-a-saude/ | COMPROVA | Limão com bicarbonato não cura covid-19 e pode fazer mal à saúde | null | 2020-03-31 | Ao contrário do que afirma a corrente, o Ministério da Saúde diz que ainda não existe vitamina, terapia alternativa ou remédio licenciado capaz de evitar o contágio ou tratar a doença. Especialistas informam que ingerir a mistura em excesso pode causar prejuízos à saúde. O sódio presente no bicarbonato pode ser prejudicial para pessoas que apresentam problemas cardiovasculares, além de poder aumentar a pressão arterial em indivíduos saudáveis
É falso que a mistura de limão com bicarbonato de sódio cure a covid-19, ao contrário do que afirma uma corrente que circula no WhatsApp e nas redes sociais. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Ministério da Saúde, ainda não existem tratamentos ou remédios específicos comprovadamente capazes de curar pacientes com o novo coronavírus.
O texto do boato afirma também que a cura foi anunciada por Israel, onde o vírus não teria causado nenhuma morte. Isso não é verdade. De acordo com dados compilados pela Universidade Johns Hopkins, até esta terça-feira, 31, foram registradas 17 mortes causadas pela covid-19 no país do Oriente Médio. Ao todo, são 4.831 casos confirmados de infecções pelo novo coronavírus até essa data.
O Comprova analisou publicações em perfis e páginas de Facebook e mensagens compartilhadas por WhatsApp.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.
Como verificamos
O Comprova consultou materiais sobre coronavírus divulgados pela OMS e pelo Ministério da Saúdee dados de infecção compilados pela Universidade Johns Hopkins. Também entramos em contato com o farmacêutico Leandro Medeiros, que coordena um observatório sobre covid-19 na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap).
Ainda não existe cura para coronavírus
A OMS informa que não há evidências de que os remédios existentes possam curar a covid-19, ainda que certos medicamentos ou tratamentos caseiros possam aliviar os sintomas causados.
Da mesma forma, o Ministério da Saúde afirma que “não existe vitamina, terapia alternativa ou remédio licenciado capaz de evitar o contágio ou tratar a doença”. Os médicos tratam os sintomas para evitar o agravamento da doença e reduzir o desconforto dos pacientes.
Consultado pelo Comprova, o farmacêutico Leandro Medeiros, da Unicap, afirmou que a mensagem “não tem fundamento algum”. “Até então, não há estudos científicos que comprovem este benefício do limão e do bicarbonato, o que é necessário para gerar uma recomendação de uso”, disse ele. “Ainda que o limão contenha nutrientes importantes para o sistema imunológico, como a vitamina C, a inexistência destes estudos feitos em seres humanos coloca em xeque esta afirmação”.
Medeiros também alertou que ingerir a mistura em excesso pode causar prejuízos à saúde. O sódio presente no bicarbonato pode ser prejudicial para pessoas que apresentam problemas cardiovasculares, além de poder aumentar a pressão arterial em indivíduos saudáveis.
O farmacêutico destacou ainda que bicarbonato em excesso pode prejudicar a função dos rins e causar a chamada alcalose metabólica, que resulta em irritabilidade, contrações e cãibras musculares.
A cura vem de Israel?
O texto do boato afirma que os israelense bebem limão e bicarbonato como se fosse um chá quente; por isso, ninguém por lá estaria preocupado com a doença. Isso não é verdade. Até esta terça-feira, 31, foram registrados 4.831 casos da covid-19 em Israel, com 17 mortes. O país tem mais registros que o Brasil.
Como o Comprova mostrou em checagem publicada em 27 de março, a nação do Oriente Médio adotou diversas medidas de isolamento social para contenção do vírus. Em 25 de março, o governo israelense estabeleceu a proibição de sair de casa, exceto em casos urgentes, e o fechamento de estabelecimentos comerciais não essenciais e parques.
Não há nenhuma evidência que Israel aprove o uso de limão com bicarbonato de sódio. Na página do Ministério da Saúde israelense, as recomendações são as mesmas que no restante do mundo: ficar em casa, lavar as mãos e se dirigir a um serviço médico em caso de sintomas como febre e dificuldade de respirar.
Viralização
Leitores solicitaram a checagem deste texto por meio do WhatsApp (11 97795-0022). O boato também foi compartilhado no Facebook. Em um dos perfis pessoais,a mensagem obteve 512 compartilhamentos até a manhã do dia 31 de março.
Fato ou Fake, Snopes e Reuters também checaram esta corrente. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falsa-a-corrente-que-fala-em-etapa-maxima-de-infeccao-pelo-novo-coronavirus-ate-3-de-abril/ | COMPROVA | É falsa a corrente que fala em “etapa máxima de infecção” pelo novo coronavírus até 3 de abril | null | 2020-03-30 | Segundo especialistas, o Brasil ainda está no início da curva de crescimento da covid-19. E não está proibido sair de casa, o Ministério da Saúde só recomenda que as pessoas evitem ao máximo sair de casa. Cada Estado brasileiro está adotando medidas próprias de quarentena, como o fechamento de serviços não essenciais
É falsa a mensagem compartilhada no WhatsApp e nas redes sociais que recomenda à população o total isolamento até o dia 3 de abril, prazo da “etapa de máxima infecção” do coronavírus. De acordo com especialistas consultados pelo Comprova, o Brasil ainda está no início da curva de crescimento da covid-19 e não há previsão de pico no número de infecções.
O Ministério da Saúde também disse desconhecer as informações disseminadas na mensagem viral.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
O Comprova entrou em contato com o Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde (NOIS), formado por especialistas das seguintes instituições: Departamento de Engenharia Industrial e Instituto Tecgraf (PUC-Rio); Barcelona Institute for Global Health (ISGlobal); Divisão de Pneumologia do InCor (Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo); Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro; Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino; e Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Também consultamos o Ministério da Saúde, além de recomendações de quarentena em diferentes localidades e reportagens sobre projeções de evolução de casos da covid-19.
Etapa de máxima infecção?
O texto que circula no WhatsApp e nas redes sociais afirma que entre os dias 23 de março e 3 de abril ocorrerá a “etapa de máxima infecção” do coronavírus e por isso a recomendação é não sair de casa “para nada”, “nem para ir comprar pão”. Isso não é verdade, de acordo com especialistas consultados pelo Comprova.
O Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde (NOIS), que faz projeções sobre a evolução no número de casos de covid-19 no País, informou, por e-mail, que não há como prever quando ocorrerá o pico da pandemia no Brasil.
Os estudos do NOIS comparam a disseminação do novo coronavírus no Brasil com a de outros países, a partir do momento em que cada nação registrou 50 casos (chamado de dia zero ou D0).
“O Brasil começou o D0 em 11 de março, ainda está no início da curva de crescimento da doença e não há como prever quando será o pico. Nem mesmo os países europeus chegaram a esse ponto”, comunicou o NOIS.
A mensagem disseminada no WhatsApp afirma ainda que a “etapa de máxima infecção” duraria duas semanas, depois das quais ocorreriam “duas semanas de calmaria” e só então, depois de mais duas semanas, os casos diminuíram.
Segundo o NOIS, essa lógica também não faz sentido. Nos Estados Unidos, 30 dias depois do “D0”, o crescimento no número de infecções pela covid-19 ainda era grande. Atualmente, o país tem o maior número de casos no mundo, superando a marca de 156 mil nesta segunda-feira, 30.
Na China, a pior fase da epidemia terminou 23 dias após o registro dos 50 casos iniciais. Passados 32 dias do “dia zero”, o número de casos diários caiu para menos de 500, e, depois de 45 dias, a menos de 100.
Na Itália, após 31 dias do “D0”, percebeu-se uma diminuição no número de novos casos, mas de acordo com o NOIS, “ainda não é possível determinar se o número de novos casos irá diminuir”.
O NOIS afirma que a evolução no número de infectados pelo coronavírus no Brasil depende das medidas tomadas para contenção da doença: “Se as medidas de isolamento e contenção propostas pelos Estados forem respeitadas, podemos considerar um crescimento da epidemia melhor do que na França”.
“Se a população seguir o que foi preconizado pelo presidente Bolsonaro, ou seja, reabertura do comércio e escolas, a trajetória da epidemia pode seguir a de países como Espanha, onde as medidas de isolamento foram tardias”, informou o grupo de estudos.
É importante destacar que as projeções sobre coronavírus mudam rapidamente; as respostas do NOIS foram enviadas ao Comprova no sábado, 27.
Nesse mesmo dia, o Grupo de Resposta à Covid-19 do Imperial College de Londres divulgou um estudo que previa 529 mil mortes no Brasil caso fossem adotadas apenas medidas de isolamento de idosos; com distanciamento social intensivo, o número de óbitos varia entre 44 mil e 206 mil, dependendo da data em que a estratégia é iniciada.
Recomendação é ‘não sair de casa nem pra comprar pão’?
O Ministério da Saúde pede que as pessoas evitem ao máximo sair de casa, principalmente as mais velhas. De acordo com a pasta, “reduzir a circulação é extremamente importante para diminuir a transmissão do coronavírus”.
Isso não quer dizer, no entanto, que é proibido sair de casa. A recomendação do Ministério é simplesmente evitar aglomerações. Ou seja, passear com o cachorro, correr sozinho, levar o filho ao parquinho — tudo isso é permitido, desde que se evite juntar pessoas e que se tome as medidas adequadas de higiene.
Ao chegar em casa, é preciso lavar as mãos, tirar os sapatos e deixar a casa bem arejada: medidas básicas de higiene.
Cada Estado brasileiro está adotando medidas próprias de quarentena, como o fechamento de serviços não essenciais. Em São Paulo, por exemplo, a quarentena vai até 7 de abril e tem como objetivo evitar aglomerações de pessoas.
Viralização
Leitores do Comprova solicitaram a checagem do boato por WhatsApp (11 97795-0022). O texto também foi divulgado no Facebook, onde obteve 62 mil compartilhamentos desde o dia 27 de março. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/videos-de-osmar-terra-sao-compartilhados-como-se-fossem-do-ex-ministro-adib-jatene/ | COMPROVA | Vídeos de Osmar Terra são compartilhados como se fossem do ex-ministro Adib Jatene | null | 2020-03-30 | Vídeos do deputado Osmar Terra defendendo o isolamento vertical circulam nas redes atribuídos erroneamente ao cardiologista Adib Jatene, falecido em 2014
São falsos os vídeos que atribuem ao falecido médico e ex-ministro da Saúde Adib Jatene a defesa do chamado isolamento vertical, estratégia assumida pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como política oficial para enfrentar o novo coronavírus. Quem aparece nas imagens, na verdade, é o deputado federal Osmar Terra (MDB-RS).
Essa verificação foi realizada com base em buscas reversas de dois vídeos encontrado pelo Comprova atribuídos ao ex-ministro.
Depois de um pronunciamento em rede nacional realizado na terça-feira, 24, o presidente da República passou a defender o isolamento vertical, em que apenas idosos e pessoas em grupo de risco sejam mantidos isolados durante a pandemia de covid-19, a doença provocada pelo novo coronavírus. Os demais cidadãos, segundo Bolsonaro, deveriam voltar às “atividades normais” para reduzir os impactos econômicos do isolamento social.
Desde o pronunciamento do presidente, circulam nas redes sociais dois vídeos diferentes, ambos creditados ao famoso médico cardiologista. Adib Jatene, contudo, morreu em 14 de novembro de 2014.
Jatene foi secretário estadual da Saúde de São Paulo e ministro da Saúde nas gestões Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso. Também foi diretor-geral do Hospital do Coração, em São Paulo, e um dos pioneiros da cirurgia cardíaca no Brasil.
Em alguns dos textos que acompanham os vídeos, Adib é creditado como infectologista, o que também é falso. Ele foi um médico conhecido pela sua especialização em cardiologia e respeitado pelos serviços público e acadêmico prestados. Apesar de ter assumido cargos públicos, nunca foi filiado a nenhum partido político.
Quem aparece nos vídeos é, na realidade, um aliado de Bolsonaro. Trata-se de Osmar Terra, ex-ministro da Cidadania do governo Bolsonaro. No último dia 21, Terra, publicou em seu canal no YouTube um vídeo em que defende algumas medidas alinhadas ao posicionamento do presidente da República, como, por exemplo, o fim da quarentena e o isolamento vertical para que a economia não seja prejudicada. Este vídeo, por sua vez, foi relacionado várias vezes na internet a Adib Jatene, falecido em 2014.
Além de ex-ministro, Terra é médico e está no sexto mandato como deputado federal. Alinhado ao discurso do presidente da República, vem defendendo diariamente em postagens e entrevistas as medidas propagadas por Bolsonaro, que contrariam as diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS) e também do Ministério da Saúde. Outro vídeo de Osmar Terra com circulação alta e creditado a Jatene é um discurso que o deputado fez na Câmara, no último dia 18, com o mesmo tom e argumentos parecidos a favor do isolamento vertical.
Como verificamos
Osmar Terra é uma figura pública reconhecida, é deputado federal pelo estado do Rio Grande do Sul e aliado do presidente Jair Bolsonaro. A partir da identificação, buscamos nas redes sociais do deputado pronunciamentos a respeito do novo coronavírus. As entrevistas e declarações sobre o tema também estão disponíveis no perfil dele no Twitter, possibilitando o cruzamento com os vídeos que circulam. Em consulta na internet é possível localizar as imagens do político.
Sobre Adib Jatene foi possível identificar sua história e biografia com buscas na internet. Apenas usando no nome dele em buscadores é simples encontrar reportagens sobre o cardiologista e sobre as instituições das quais ele participava. Estão na internet, por exemplo, diversas reportagens sobre a morte dele, publicadas por jornais como O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e portal G1.
Diferença entre os isolamentos
A orientação majoritária dos epidemiologistas e infectologistas tem sido pelo distanciamento social máximo possível, em que apenas os serviços considerados essenciais são mantidos. As medidas são de precaução para minimizar o período e a intensidade do colapso do sistema de saúde. Essa política é chamada de “isolamento horizontal”.
O que médicos como Osmar Terra argumentam, apesar de escassos dados disponíveis, é que seria possível conter a doença reduzindo as massivas perdas econômicas que o modelo de contenção pode causar.
Viralização
O Comprova recebeu o vídeo pelo seu canal no WhatsApp e no Twitter, onde há o registro de dezenas de publicações do suposto vídeo relacionado ao famoso médico cardiologista morto em 2014. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/formulario-que-pede-dados-para-receber-beneficio-emergencial-e-falso/ | COMPROVA | Formulário que pede dados para receber benefício emergencial é falso | null | 2020-03-30 | O Projeto de Lei que cria o benefício ainda tramita no Congresso. Se aprovado, precisa ser sancionado pelo presidente da República e ter definido o modo como o valor será distribuído
É falso o formulário divulgado por meio de uma mensagem de WhatsApp para o recebimento do auxílio emergencial a pessoas de baixa renda durante a crise do novo coronavírus. Os sites com o formulário estão registrados fora do Brasil, em servidores que comportam outros endereços de internet em português e sem informações sobre seus proprietários.
O projeto do benefício, que nasceu na Câmara dos Deputados, onde já foi votado, ainda está em tramitação. O texto precisa ser referendado pelo Senado, cuja sessão está marcada para a tarde desta segunda-feira, 30, e depois deve passar pela sanção do presidente da República, ainda sem data para acontecer. O governo federal também tem que decidir como o valor será distribuído.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
Para realizar esta verificação, o Comprova consultou o texto do projeto de lei que tramita no Congresso, os sites noticiosos da Câmara e do Senado e o DNSlytics, uma ferramenta online para descobrir dados como a localização dos servidores de sites na internet.
Sites de formulário estão registrados no exterior
A mensagem falsa que circula com o suposto formulário leva os usuários a um site que simula ser oficial. Há, inclusive, a imitação de um logo utilizado pelo governo federal nas gestões do Partido dos Trabalhadores (PT), com o slogan “Brasil, País de Todos”. Na página, o usuário precisa responder um questionário com informações pessoais.
Utilizando a extensão para Chrome do aplicativo DNSlytics (IP Adress and Domain Information), é possível verificar que os sites estão registrados no exterior, uma estratégia muitas vezes realizada por grupos que tentam aplicar golpes online.
Um dos sites investigados pelo Comprova estava hospedado no Québec, no Canadá, com o mesmo IP (uma espécie de cadastro único dos sites) de páginas como “saboreaqui.online”, “tecnologiaws.online”, “noticiasdahora.website”, “receitasdecomidas.club” e “focofamaetv.com”. Outro estava baseado nos Estados Unidos, no mesmo IP de sites como “gotoceleb.com”, “osforums.net” e “fundwise.com”.
O projeto de lei do benefício
O benefício votado na Câmara é uma medida emergencial diante da pandemia da covid-19. Como as providências para conter a doença envolvem medidas de distanciamento social, como o fechamento do comércio, e, portanto, terão um impacto negativo na economia, o Congresso decidiu aprovar o pagamento deste valor para minimizar os efeitos de uma eventual crise sobre as populações mais vulneráveis.
O texto aprovado é de autoria do deputado Marcelo Aro (PP-MG), relator do Projeto de Lei 9236/17, originalmente apresentado por Eduardo Barbosa (PSDB-MG). O projeto se tornou prioridade da Câmara na última semana e foi aprovado na quinta-feira, 26.
O valor original que constava no projeto era de R$ 500, bem acima dos R$ 200 ventilados inicialmente pelo governo de Jair Bolsonaro. Durante as negociações, parlamentares e Executivo chegaram aos R$ 600 aprovados. Inicialmente, o valor será pago por três meses.
Quem tem direito
O benefício é direcionado aos trabalhadores informais, que compõem mais de 40% da força de trabalho no Brasil, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), realizada pelo IBGE. Esses autônomos estão em posições que não desfrutam dos direitos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
Para ter direito ao benefício é necessário, no entanto, que o trabalhador informal integre, também, famílias de baixa renda. Como fica claro no texto aprovado pela Câmara, para ter acesso ao auxílio emergencial a pessoa deve cumprir, ao mesmo tempo, cinco requisitos:
– Ter mais de 18 anos
– Não ter emprego formal;
– Não receber benefício previdenciário ou assistencial, seguro-desemprego ou de outro programa de transferência de renda federal que não seja o Bolsa Família;
– Ter renda familiar mensal per capita (por pessoa) de até meio salário mínimo (R$ 522,50) ou renda familiar mensal total (tudo o que a família recebe) de até três salários mínimos (R$ 3.135,00); e
– Não ter recebido rendimentos tributáveis, em 2018, acima de R$ 28.559,70.
Além disso, para receber o benefício, a pessoa deve exercer atividade na condição de microempreendedor individual (MEI) ou ser contribuinte individual ou facultativo do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) ou ser trabalhador informal inscrito no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico).
Caso o trabalhador informal não pertença a nenhum desses cadastros, é preciso ter cumprido, no último mês, um dos requisitos de renda citados acima.
Duas pessoas de uma mesma família poderão acumular os benefícios, sendo um do auxílio emergencial e um do Bolsa Família. Se o auxílio for maior que a bolsa, é possível fazer a opção pelo auxílio. As mães que são chefes de família poderão receber duas cotas do auxílio, totalizando R$ 1,2 mil.
Faltam a votação no Senado e a sanção presidencial
Para que o projeto se torne lei, o próximo passo é sua votação no Senado. Davi Alcolumbre, presidente da Casa, disse que a votação deve ocorrer nesta segunda-feira, 30. A tendência é que o texto seja aprovado com facilidade e, depois, siga para a sanção do presidente da República. Como o governo federal concordou com o valor de R$ 600, Bolsonaro deve sancionar o projeto.
Quando o projeto for aprovado pelo Senado e sancionado pela Presidência da República, quem deve cuidar da logística do pagamento é a Caixa Econômica Federal, seguindo um decreto presidencial que ainda não foi divulgado. Pedro Guimarães, presidente do banco, afirmou em entrevista coletiva nesta sexta-feira, 27, que a Caixa é a única com capilaridade no país para efetuar a distribuição dos valores por meio de suas agências e caixas lotéricas. O Banco do Brasil e o INSS devem ser usados nas próximas fases do pagamento do benefício.
Dados de viralização
Essa verificação foi proposta por leitores que receberam a mensagem por WhatsApp. Não é possível mensurar o alcance dessas mensagens. O Comprova não faz verificações de conteúdos suspeitos que não tenham grande viralização, mas abre uma exceção neste caso dado o dano que a circulação desse conteúdo pode causar. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-israel-controle-o-coronavirus-sem-distanciamento-social/ | COMPROVA | É falso que Israel controle o coronavírus sem distanciamento social | null | 2020-03-27 | Ao contrário do que afirma mensagem divulgada nas redes sociais, o país do Oriente Médio mantém ativas algumas medidas de isolamento e não tem a “melhor situação do mundo” diante da pandemia
É falsa mensagem que circula no WhatsApp e em redes sociais que atribui a Israel “a melhor situação do mundo no controle do coronavírus” por supostamente não adotar medidas de isolamento social. Na verdade, o país do Oriente Médio tem tomado várias iniciativas para restringir a circulação de pessoas, como o fechamento de escolas e universidades. Em 25 de março, o governo israelense endureceu as regras e estabeleceu a proibição de sair de casa, exceto em casos urgentes, e o fechamento de estabelecimentos comerciais não essenciais e parques. Além disso, o país tem mais casos confirmados pela covid-19 do que outros com IDH semelhante, no mesmo período.
O texto que foi objeto desta verificação circula no WhatsApp e nas redes sociais com um vídeo em que o ministro da Defesa israelense, Naftali Bennett, apoia o isolamento prioritário de idosos, grupo com maior risco de mortalidade pela covid-19. Esse vídeo foi publicado em 21 de março no Twitter de Bennett. Em postagens subsequentes na rede social, ele afirma a necessidade de permanecer em quarentena nacional e também propõe outras estratégias de enfrentamento à pandemia, como a adoção de testes em massa.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
O Comprova consultou o painel de contagem de casos de coronavírus da Universidade Johns Hopkins. Também acessou os portais do governo e do Ministério da Saúde israelense. Outras fontes de informação foram reportagens da imprensa local, cujos links estão incluídos nesta verificação.
Número de casos da covid-19 em Israel
Ao contrário do que afirma a mensagem publicada em 25 de março no Facebook, Israel não tinha até então “1700 casos e 1 morte” registradas pelo novo coronavírus. Naquela data, o número de infectados pelo novo coronavírus no país era de 2.369, segundo o Ministério da Saúde israelense. Nesta sexta-feira, 27, este número aumentou para 3.035. No dia 25, eram cinco mortes no país pela covid-19, e agora são 11 mortos.
O gráfico abaixo, que mostra a evolução dos casos confirmados em Israel até o dia 24 de março, apresenta uma acentuada curva de pacientes do novo coronavírus. Os números foram compilados pela Universidade Johns Hopkins.
Em pronunciamento na quarta-feira, 25, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, afirmou que o número de pacientes dobrava a cada três dias.
“Em duas semanas, podemos ter milhares de pacientes, muitos dos quais estarão em risco de morte”, disse o premiê. “Por isso, já estou dizendo que se não vermos uma melhora imediata nessa tendência, não teremos outra alternativa a não ser impor o lockdown completo”.
O Comprova também consultou os números de contágio em nações com índice de desenvolvimento humano (IDH) semelhante ao de Israel, como Coreia do Sul, Espanha e Japão. Comparamos a evolução do número de casos no mesmo período: 36 dias, o tempo transcorrido desde o primeiro caso registrado em Israel (20 de fevereiro).
Ao longo desse período, todas as nações citadas tinham número inferior de infectados pelo coronavírus: em 36 dias, a Coreia do Sul tinha 1,8 mil casos; a Espanha, 673; e o Japão, 214.
Nesta sexta-feira, 27 de março, a Coreia do Sul tem 9.332 casos. Embora tenha um número de pacientes maior, o exemplo do país asiático é interessante, pois conseguiu “achatar” a curva de crescimento de casos confirmados da covid-19. O número de novos casos por dia tem diminuído desde o fim de fevereiro e início de março. Uma das estratégias adotadas pela Coréia foi a adoção de testes em massa da população e o isolamento dos infectados.
O gráfico abaixo mostra o “achatamento” na curva de casos da Coréia do Sul. Os dados são da Universidade Johns Hopkins.
Isolamento social em Israel
É igualmente falsa a afirmação de que Israel não tem adotado amplas medidas de isolamento social, optando apenas por restringir a circulação de pessoas do grupo de risco, como afirma a mensagem compartilhada em redes sociais.
Desde 9 de março, o Ministério da Saúde israelense determinou que qualquer pessoa que tenha voltado de um país estrangeiro, ou que tenha tido contato com um paciente confirmado da covid-19, entre em isolamento domiciliar por 14 dias. No site da pasta é possível consultar um mapa com a quantidade de pessoas que estão nesta situação pelo país.
No dia 12 de março, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, anunciou o fechamento de escolas e universidades.
Depois da difusão do vídeo de Bennett, Israel anunciou outras iniciativas, mais rígidas, de isolamento social. Em medida aprovada no último dia 25 de março, o governo implementou regulamentações de emergência, determinando o fechamento de estabelecimentos comerciais considerados “não essenciais” e proibindo a circulação de pessoas em espaços públicos, com poucas exceções, incluindo saídas para comprar comida e medicamentos.
Em pronunciamento na mesma data, Netanyahu defendeu a implementação destas medidas, pedindo enfaticamente que a população evitasse sair de casa.
“Nós publicamos regulamentações de emergência para os próximos dias. Elas reduzem ainda mais as saídas para a esfera pública. Eu sei que há muitos paradoxos e que é possível dizer uma grande quantidade de coisas, mas não importa. Primeiro, leiam-nas e fiquem em casa; essa é a principal questão. Eu digo isso da forma mais clara possível: vocês precisam ficar em casa! Fiquem em casa, fiquem seguros. O perigo espreita para todos”, afirmou.
No discurso, o premiê destacou que as medidas também são válidas para crianças – indo contra a afirmação de que Israel só estaria isolando idosos. “Eu sei que com crianças pequenas é muito difícil mantê-las em casa, mas não há escolha”, disse Netanyahu.
Situação da Economia e dos hospitais em Israel
O texto viralizado afirma, ainda, que a economia e o sistema de saúde de Israel têm funcionado normalmente frente à pandemia do novo coronavírus, o que também não é verdade.
O governo proibiu no dia 19 de março qualquer atividade de comércio ou lazer dentro de shoppings com mais de 10 lojas, clubes, bares, academias, piscinas públicas, cinemas, teatros, parques, pontos turísticos, entre outros.
As medidas de emergência foram ampliadas em 25 de março, determinando o fechamento de estabelecimentos comerciais considerados “não essenciais” e que restaurantes funcionassem apenas por delivery.
Farmácias e lojas que vendem principalmente produtos de higiene foram autorizadas a funcionar, mas mantendo uma distância de dois metros entre um cliente e outro, e uma média de no máximo quatro pessoas por caixa ativo dentro da loja. Motoristas de táxi também podem circular, mas apenas com um passageiro, ou dois quando um acompanhante médico for necessário.
O Ministério de Finanças do país estimou que a pandemia do novo coronavírus deve causar um dano de aproximadamente 12 bilhões de dólares na economia do país. Comerciantes entrevistados pela AFP neste mês em Jerusalém afirmaram já sentir os efeitos da doença em seus negócios.
O Ministério da Saúde também se prepara para um impacto no serviço médico. No dia 16 de março, o Jerusalem Post informou que o governo iria importar mil respiradores para tratar pacientes com covid-19. A imprensa local também registrou uma corrida nos hospitais israelenses para aumentar o números de leitos nas unidades de tratamento intensivo (UTI).
Viralização
A mensagem com informações falsas sobre o combate ao coronavírus em Israel circulou principalmente no WhatsApp. Leitores solicitaram a verificação por meio do número (11 97795-0022). No Facebook, o texto verificado pelo Comprova foi publicado por diversos usuários. Um dos posts obteve 740 compartilhamentos desde o dia 25 de março. Mensagem semelhante somou outros 2.138 compartilhamentos desde a mesma data. A ferramenta Google Trends, que mede tendências de busca, também registrou um pico de interesse por Israel e Naftali Bennett. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-italia-tenha-registrado-232-mortes-de-criancas-pela-covid-19/ | COMPROVA | É falso que Itália tenha registrado 232 mortes de crianças pela covid-19 | null | 2020-03-25 | O governo italiano não havia registrado óbitos de pessoas com menos de 30 anos até o dia 24 de março
São falsas as postagens segundo as quais a Itália registrou as mortes de 232 crianças na atual pandemia de covid-19, a doença provocada pelo novo coronavírus. Até o dia 24 de março, o governo italiano ainda não havia registrado óbitos de pessoas com menos de 30 anos.
Essa verificação foi realizada com base em consultas a diversos documentos oficiais de diferentes órgãos do governo da Itália.
O post que foi objeto desta verificação foi escrito no Facebook por um usuário à 1h22 da manhã desta quarta-feira, 25 de março. O texto dizia que “morreram 232 crianças num dia na Itália e o demente manda as crianças voltarem pra escolas”.
A postagem era uma referência ao pronunciamento do presidente da República, Jair Bolsonaro, na noite de 24 de março. O mandatário minimizou a epidemia de covid-19 e sugeriu que os governadores deveriam descumprir as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), entre elas a de fechar escolas e universidades.
Outros posts de mesmo teor foram encontrados pelo Comprova no Facebook. Esses, no entanto, traziam uma outra informação, a de que as supostas 232 mortes de crianças teriam ocorrido em um dia com 793 mortes por covid-19 na Itália.
O Comprova verificou uma postagem feita por um perfil pessoal no Facebook.
Falso para o Comprova é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
Para fazer a verificação, o Comprova procurou, inicialmente, os dados oficiais publicados pelo Ministério da Saúde da Itália. Como mostram os relatórios diários da pasta, de fato houve um dia em que o país teve 793 mortes provocadas pelo novo coronavírus. Isso ocorreu entre os dias 20 de março, quando o total de óbitos era de 4.032, e o dia 21 de março, quando o total chegou a 4.825 mortes. Diante desses números, a imprensa registrou que aquele fora o dia, até então, com mais mortes no país europeu. Uma rápida pesquisa no Google com os termos “793 mortes Itália” mostra diversos links semelhantes com o registro desse fato.
Desde então, a Itália registrou um total de 651 mortes em 22 de março, 601 no dia 23, 743 no dia 24 e 683 nesta quarta-feira, 25, chegando ao total de 7.503 óbitos.
Em seguida, o Comprova foi atrás do número de mortes de crianças italianas por conta da covid-19.
Na Itália, os dados a respeito das mortes provocadas por covid-19 são também congregados pelo Instituto Superior de Saúde (Istituto Superiore di Sanità-ISS), órgão técnico do Serviço Nacional de Saúde (Servizio Sanitario Nazionale) italiano, equivalente ao Sistema Único de Saúde (SUS) existente no Brasil.
Desde 28 de fevereiro, o ISS coordena um sistema de informações abastecido pelos dados dos governos regionais e locais italianos. Todos os dias, esse sistema de vigilância integrada divulga neste site informações consolidadas a respeito do andamento da epidemia provocada pelo novo coronavírus.
Segundo o mais recente relatório, disponível tanto em italiano quanto em inglês e publicado em 25 de março, a Itália tinha 6.157 mortes provocadas pela covid-19, sendo que nenhuma delas era de crianças. Na realidade, 100% das mortes registradas na Itália, segundo o relatório do ISS, foram de pessoas com 30 anos ou mais.
Os dados do ISS italiano usam uma metodologia diferente daquela utilizada pelo Ministério da Saúde da Itália para consolidar os dados. Dessa forma, podem haver discrepâncias entre os relatórios.
Como afirma o ISS italiano na nota técnica que acompanha seu relatório diário, os dados coletados “estão em fase de consolidação contínua e, como previsível em situações de emergência, algumas informações estão incompletas”. O órgão governamental informa ainda que diferenças nos dados ocorrem principalmente por conta de eventuais atrasos entre a confirmação do diagnóstico e a inclusão da informação na plataforma oficial que congrega os dados.
O Comprova entrou em contato com o usuário que fez a postagem no Facebook referente ao discurso de Bolsonaro, solicitando a fonte de informação. O usuário não respondeu o contato e, após receber a mensagem, apagou o post. Naquela altura, o conteúdo já havia sido compartilhado mais de 38 mil vezes.
Viralização
Outras duas postagens encontradas pelo Comprova no Facebook e feitas em 21 de março continuam no ar. Juntas, tiveram quase 7 mil compartilhamentos.
O jornal Observador e o site de fact-checking Polígrafo, ambos de Portugal, e o site brasileiro Aos Fatos também verificaram conteúdos com esses números a respeito da epidemia de covid-19 na Itália. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/imagem-de-reporter-com-traje-de-protecao-contra-o-coronavirus-e-tirada-de-contexto-para-atacar-a-midia/ | COMPROVA | Imagem de repórter com traje de proteção contra o coronavírus é tirada de contexto para atacar a mídia | null | 2020-03-25 | Repórter não usou traje de proteção contra coronavírus "para causar pânico" como afirma post verificado pelo Comprova. Ela estava demonstrando uso de roupa produzida para médicos
A foto de uma repórter de TV vestida em traje completo de proteção no Líbano viralizou no Facebook no Brasil com legenda que acusa a mídia de fabricar pânico em torno da pandemia do novo coronavírus — já que o cinegrafista que captava as imagens não usava nenhum item de proteção. A realidade é que a jornalista paramentada produziu uma reportagem sobre uma fábrica local de roupas de proteção para profissionais da área da saúde e experimentou um dos trajes apenas para demonstrá-lo em uma aparição ao vivo na emissora em março deste ano.
A matéria foi divulgada no dia 18 de março pela Al Hadath, uma TV com base em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos. A repórter, Ghinwa Yatim, fez uma transmissão ao vivo de Beirute, no Líbano. Como ela explicou em seu Twitter, a reportagem focava em uma fábrica que produzia equipamentos médicos com materiais alternativos, uma vez que existe dificuldade em importar trajes para proteção contra o coronavírus em meio à crise da economia libanesa.
Na rede social, a repórter Yatim acrescentou que, durante a entrada ao vivo, afirmou que não havia motivo para pânico em Beirute. Ela frisou que só usou o traje para demonstrá-lo, e por isso o cinegrafista não precisou vesti-lo. O Comprova entrou em contato com uma jornalista da AFP em árabe, que confirmou o que Yatim disse nos vídeos.
Esta verificação investigou uma postagem feita por um perfil pessoal no Facebook. Enganoso para o Comprova é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado.
Como verificamos
Um comentário postado na publicação da foto no Facebook indicava o contexto original da imagem e fornecia links para a reportagem sobre a fábrica de trajes. A partir daí, o Comprova encontrou a conta de Ghinwa Yatim no Twitter, onde ela explica em inglês a motivação de sua matéria.
Por que a repórter usava um traje completo de proteção e o cinegrafista não?
A reportagem veiculada pela emissora Al Hadath mostrava a produção de trajes de proteção contra o coronavírus por mulheres libanesas para uso pela equipe médica de hospitais. A repórter Ghinwa Yatim explicou no Twitter que a fabricação local de roupas poderia reduzir a crise de importação de equipamentos no exterior.
Enquanto entrava ao vivo de uma rua de Beirute para falar da reportagem, Yatim foi gravada por uma terceira pessoa, o produtor e vídeojornalista Michael Downey. Ele publicou o vídeo em seu Twitter com críticas à repórter. Na rede social, Downey afirma ter feito trabalhos para veículos como New York Times e BBC.
Após a repercussão negativa do uso do traje de proteção, Yatim publicou uma thread no Twitter em que explica a reportagem. A jornalista explicou que estava experimentando um traje que foi especialmente produzido na fábrica para ela. A repórter informou também que usou a roupa apenas para falar sobre ela, e por isso não havia necessidade de o cinegrafista também usar o traje.
Yatim acrescentou que Beirut já estava em quarentena e ela escolheu uma rua mais vazia para gravar a entrada ao vivo. Até esta quarta-feira, 25, foram registrados 333 contágios por coronavírus no Líbano, com quatro mortes e oito recuperações.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda a utilização de máscaras apenas por pessoas que tiverem contato com pacientes da covid-19 ou por aqueles que apresentarem sintomas como tosse e espirros.
Viralização
O produtor e vídeojornalista Michael Downey filmou Yatim e seu cinegrafista em Beirute, criticando o fato de a repórter estar em traje de proteção. Seu vídeo obteve 1,8 milhão de visualizações no Twitter desde o dia 18 de março. No Facebook, a foto da jornalista foi publicada por um usuário no dia 23 de março e obteve mais de 78 mil compartilhamentos desde então. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/nobel-de-medicina-tasuku-honjo-nao-disse-que-o-coronavirus-e-artificial/ | COMPROVA | Nobel de Medicina Tasuku Honjo não disse que o coronavírus é artificial | null | 2020-04-29 | O próprio pesquisador Tasuku Honjo desmentiu as alegações atribuídas a ele em mensagens no WhatsApp e em publicações em redes sociais. Além disso, pesquisas científicas confirmaram que o vírus causador da covid-19 não foi desenvolvido em laboratório. O Comprova verificou que o boato circula há alguns dias em diversos idiomas
São falsos os textos que circulam pelo WhatsApp e os posts em redes sociais segundo os quais o prêmio Nobel de Medicina Tasuku Honjo teria afirmado que o novo coronavírus não é natural. O próprio Honjo desmentiu as alegações atribuídas a ele e, além disso, pesquisas científicas confirmaram que o vírus causador da covid-19 não foi desenvolvido em laboratório.
Por que checamos esse conteúdo?
A verificação deste texto foi solicitada por leitores que enviaram os pedidos via WhatsApp. O monitoramento das redes sociais realizado pelo Comprova detectou que este conteúdo vem circulando há alguns dias em diversos idiomas, em uma aparente tentativa organizada de criar desinformação a respeito da pandemia de covid-19.
Falso, para o Comprova, é todo o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
Para verificar este conteúdo, o Comprova buscou estudos científicos a respeito da origem do novo coronavírus e também a posição oficial do pesquisador Tasuku Honjo e da Universidade de Kyoto, onde ele trabalha.
O coronavírus que causa a covid-19 é artificial?
Especulações a respeito da origem do novo coronavírus acompanham a pandemia desde o seu início e se tornaram campo fértil para desinformação.
No texto que circula com afirmações falsas atribuídas a Tasuku Honjo, a argumentação é de que o novo coronavírus teria sido criado em um laboratório de Wuhan, cidade na província chinesa de Hubei que foi a primeira com infecções provocadas por este vírus. O texto afirma, ainda, que Honjo trabalharia há quatro anos no “laboratório Wuhan na China.”
Uma visita à biografia de Honjo no site da Universidade de Kyoto mostra que em toda sua carreira ele trabalhou apenas nos Estados Unidos e no Japão, onde atua seguidamente desde 1974. Honjo trabalha na mesma universidade desde 1984 e, desde 2018, é o vice diretor-geral do Instituto de Estudo Avançado da instituição. Em 2018, ele foi um dos vencedores do Nobel de Medicina ou Fisiologia pela descoberta ligada ao combate do câncer por meio da imunoterapia, estratégia que busca aumentar a função do sistema imunológico.
Em 27 de abril, a Universidade de Kyoto emitiu uma nota oficial em nome de Honjo, na qual ele lamenta que seu nome tenha sido usado “para espalhar falsas acusações e desinformação”. O médico destaca que, no momento atual, “quando todas as nossas energias são necessárias para tratar os doentes, impedir a propagação do sofrimento e planejar um novo começo, a transmissão de alegações infundadas sobre as origens da doença é perigosamente perturbadora”.
Mais importante, não há nenhum indício de que o novo coronavírus seja artificial ou tenha sido fabricado.
Um estudo publicado em 17 de março pelo conceituado periódico médico Nature Medicine analisou o genoma do vírus SARS-CoV-2, que provoca a covid-19, e concluiu “claramente que o SARS-CoV-2 não é uma construção de laboratório ou um vírus propositadamente manipulado.”
Segundo os pesquisadores, as características genéticas do vírus, o sétimo coronavírus a infectar seres humanos, indicam que ele é fruto de seleção natural, ocorrida em um animal ou em uma pessoa.
O texto compartilhado nas redes sociais afirma ainda que o fato de o SARS-CoV-2 ter sido transmitido para países de climas diferentes é um indício da artificialidade do vírus. O Comprova não encontrou referências ou estudos que embasassem essa hipótese.
Uma análise inicial de cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), do final de março, apontou que a maioria das transmissões do novo coronavírus se deu em temperaturas mais baixas, entre 3°C e 17°C. Isso não quer dizer, no entanto, que a contaminação não ocorra em países de clima mais quente. A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que o vírus pode ser transmitido em todas as áreas.
Contexto
O texto com conteúdo falso atribuído ao médico japonês circula em um momento de elevada tensão nas relações entre os Estados Unidos e a China a respeito de responsabilidades sobre a pandemia de covid-19.
Agências de inteligência norte-americanas estão, atualmente, analisando a possibilidade de o vírus não ter começado a circular em um mercado de alimentos em Wuhan, mas sim em um laboratório da cidade que pesquisa diversos tipos de coronavírus.
A suspeita tem como base observações feitas por diplomatas dos Estados Unidos em 2018. De acordo com a coluna do jornalista Josh Rogin, do jornal The Washington Post, há dois anos diplomatas alertaram sobre a precariedade dos níveis de segurança de pesquisas com coronavírus de morcego realizadas no Instituto de Virologia de Wuhan.
O instituto busca ativamente novos tipos de coronavírus na natureza, especialmente em cavernas de morcegos nas províncias ao sul da China, desde que a Ásia foi afetada pela epidemia de SARS, também provocada por um coronavírus, em 2003. O objetivo é que a pesquisa ajude o país a se antecipar a novas infecções.
À revista Scientific American, a diretora do Instituto de Virologia de Wuhan, Shi Zhengli, negou que o novo coronavírus tenha relação com os estudos dirigidos por ela. Segundo a pesquisadora, seu laboratório verificou as sequências genéticas dos vírus circulando na China e nenhuma delas coincidia com a dos vírus que sua equipe havia obtido das amostras coletadas em morcegos. “Isso realmente tirou um peso da minha mente”, disse ela. “Eu não dormi nada por dias”, afirmou.
Alcance
No Facebook, o Comprova encontrou 76 posts com o texto falso sobre Tasuku Honjo, que somaram 5.091 interações (curtidas, comentários e likes) desde o dia 26 de abril. A medição foi feita por meio da ferramenta CrowdTangle. A reportagem falou com a autora da publicação mais antiga em português. Ela disse ter recebido o texto de um amigo e, depois de ter sido avisada que o conteúdo era falso, apagou o post.
O tweet em português que mais circulou e foi encontrado pelo Comprova teve mais de 700 interações entre sua publicação, em 27 de abril, e a publicação desta verificação.
As agências AFP e Aos Fatos, o jornal Observador (Portugal) e o site Factly (Índia) também checaram este conteúdo. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/video-que-alerta-sobre-a-importacao-de-mascaras-contaminadas-e-montagem/ | COMPROVA | Vídeo que alerta sobre a importação de máscaras contaminadas é montagem | null | 2020-04-27 | A OMS não fez alertas sobre máscaras importadas da China e da Índia como afirma um vídeo publicado no YouTube. O vídeo verificado pelo Comprova sobrepõe um áudio à gravação original e usa logotipos de GloboNews e G1, mas ele não foi veiculado nesses dois canais
É falso o vídeo que diz que a Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou sobre máscaras importadas da China e da Índia que estariam infectadas com o novo coronavírus. Na publicação, uma narração em off sobrepõe o áudio original do diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, com informações completamente diferentes do conteúdo original. A edição usa os logotipos do canal GloboNews e do site G1, mas o vídeo não foi exibido por nenhum dos dois veículos.
Ao Comprova, a OMS informou, em nota, que não emitiu nenhum alerta sobre importação de máscaras. O Escritório da OMS para as Américas também desmentiu a necessidade de esterilização do equipamento de proteção. “Se a máscara cirúrgica descartável estiver lacrada antes do uso, não é necessário fazer nada”, comunicou. “Se a máscara tiver sido contaminada, não se deve tentar esterilizá-la e sim descartá-la imediatamente.”
O Ministério da Saúde, por sua vez, afirmou que não há nenhuma evidência de que produtos enviados da China estejam contaminados: “Os vírus geralmente não sobrevivem muito tempo fora do corpo de outros seres vivos, e o tempo de tráfego destes produtos costuma ser de muitos dias”.
A pasta explicou ainda que importou máscaras apenas da China, assim como fizeram “diversos outros países”.
Por que checamos este vídeo?
A verificação deste vídeo foi pedida por leitores do Comprova. Nossa decisão por verificar considerou três motivos.
O primeiro deles, o tema. Postagens que denunciam a importação de máscaras contaminadas têm sido comuns durante a pandemia do novo coronavírus. O Projeto Comprova já verificou conteúdo semelhante recentemente.
Outro motivo foi a viralização. O Comprova só verifica conteúdos suspeitos sobre a covid-19 que tenham grande viralização. O vídeo verificado foi postado no dia 23 de abril no canal Xadrez Brasil12 no YouTube e, até o dia 27, foi assistido mais de 500 mil vezes.
Finalmente, chamou a atenção do Comprova o fato de o vídeo estar publicado no YouTube como “não listado”. Quando um vídeo é caracterizado desse modo, ele não aparece nos mecanismos de busca e só pode ser assistido por quem tem o link para a publicação. Mesmo com essa restrição, o vídeo obteve grande alcance.
Falso, para o Comprova, é todo o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos?
Buscamos os poucos trechos com o áudio original que aparecem na publicação para localizar o vídeo original, sem adulteração no áudio. Depois fizemos a busca por esse vídeo no G1 e no site da GloboNews para conferir se as imagens foram exibidas e se houve edição.
Em seguida, procuramos publicações com as imagens das máscaras sendo produzidas em condições precárias para identificar o país em que elas foram feitas.
Também entramos em contato com o Ministério da Saúde para saber de que países os equipamentos de proteção individual (EPIs) como máscaras estão sendo importados. Por fim, consultamos a OMS e a OPAS para esclarecer se há algum tipo de restrição às máscaras produzidas na China e na Índia.
Qual a declaração original do diretor-geral da OMS?
As imagens foram tiradas de uma entrevista coletiva que os dirigentes da OMS concederam no dia 20 de abril quando, aos 54 minutos e 54 segundos, Tedros Adhanon critica o uso político da pandemia do novo coronavírus. “Nós avisamos que esse vírus ia surpreender até mesmo os países desenvolvidos”, lembrou.
O trecho exato usado na edição foi publicado no mesmo dia 20 pelo canal no YouTube da agência de notícias Bloomberg, com o discurso verdadeiro. Conseguimos identificá-lo porque a edição deixou duas frases no inglês original. A primeira, “vamos evitar essa tragédia”, e a última: “enough is enough”, ou seja, “já chega”. Todo o resto da fala foi coberto por uma narração em off em que uma voz masculina diz que a OMS “alerta que as máscaras vindas da Índia e da China estão apresentando um alto grau de contaminação por coronavírus”.
Para reforçar, a edição alterna a imagem de Adhanon com um vídeo de máscaras sendo produzidas em condições precárias. O registro mais antigo dessas imagens no YouTube é do dia 25 de março, em uma publicação que descreve uma oficina clandestina na Índia. Outros usuários também apontam a Índia com o local onde as imagens teriam sido captadas. De acordo com uma reportagem veiculada pelo telejornal India Today no dia 26 de março, essas oficinas piratas são um problema para as autoridades indianas.
O Comprova não encontrou registros de que o Ministério da Saúde tenha importado máscaras indianas. Em nota, a pasta informou apenas que comprou equipamentos de proteção chineses.
Apesar de usar vinhetas e logomarca do canal GloboNews e do site G1, nenhum dos dois veículos exibiu as imagens editadas da forma como elas aparecem no vídeo que viralizou. Uma reportagem exibida no dia 20 de abril no Jornal Nacional, da Rede Globo, usou trechos da entrevista de Adhanon. Esta sim foi a matéria reproduzida tanto pelo G1 quanto pela GloboNews.
OMS não divulgou alerta sobre máscaras
Por e-mail, a assessoria de imprensa da OMS informou que a organização não divulgou nenhum alerta sobre compra de máscaras. Atualmente, a entidade recomenda expressamente o uso de máscaras médicas por profissionais da saúde, pessoas cuidando de pacientes com a covid-19 e todos aqueles que apresentarem sintomas da doença, como tosse e dor de garganta.
O Ministério da Saúde, por sua vez, indica a utilização de máscaras de pano por toda a população. Para garantir a proteção, é necessário que a máscara seja de uso individual, tenha ao menos duas camadas de pano e cubra o nariz e a boca completamente.
Contexto
Desde que o uso de máscaras virou uma orientação do Ministério da Saúde, a desinformação sobre a importação dos equipamentos de proteção tem se espalhados pelas redes sociais. A acusação mais comum é a de contaminação pelo novo coronavírus. Alguns usuários chegam a afirmar que a China produziu o vírus em laboratório justamente para vender os EPIs. O Projeto Comprova já verificou denúncia semelhante no dia 14 de abril.
Outros veículos já verificaram denúncias de máscaras contaminadas, como o Boatos.org, a agência Aos Fatos e o Fato ou Fake, do G1.
Alcance
O canal Xadrez Brasil12 tem 1,72 mil inscritos no YouTube, mas há apenas um vídeo público, com 962 visualizações. Mesmo sem ter ligação com a Rede Globo, o canal usa o logotipo da emissora. O conteúdo que viralizou está cadastrado como “não listado” e não aparece nos mecanismos de busca. Entre 23 e 27 de abril ele foi visualizado mais de 500 mil vezes. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-enfermeira-tenha-sido-demitida-apos-filmar-leitos-vazios-em-hospital-na-bahia/ | COMPROVA | É falso que enfermeira tenha sido demitida após filmar leitos vazios em hospital na Bahia | null | 2020-04-24 | Vídeo foi gravado em março e imagens mostram a ampliação de leitos na unidade para o tratamento de covid-19 do Instituto Couto Maia (ICOM), hospital de referência para o tratamento da doença na Bahia. A Secretaria da Saúde nega a demissão da funcionária
É falsa a informação divulgada em redes sociais de que uma enfermeira do Instituto Couto Maia (ICOM), hospital de referência para o tratamento de covid-19 na Bahia, tenha sido demitida esta semana por filmar a UTI com apenas dois pacientes infectados pelo novo coronavírus. Os posts usam um vídeo feito por uma funcionária do hospital mostrando os leitos vazios, alegando que as imagens são do dia 21 de abril de 2020. Mas a gravação foi feita em março e circula desde então.
A legenda do vídeo afirma que a enfermeira se chama Sandra M. Guerra e que foi demitida depois da divulgação das imagens. A Secretaria da Saúde da Bahia confirmou que as imagens foram gravadas por uma enfermeira do ICOM em março, mas nega que ela tenha sido desligada do emprego.
A diretora do ICOM, Ceuci Nunes, também desmentiu a publicação pelo Facebook. Segundo ela, as imagens foram registradas em 21 de março e mostram a ampliação de leitos na unidade para o tratamento de covid-19. Ela também afirmou que o nome informado na legenda não é o da enfermeira que integra o quadro de funcionários da instituição.
Por que checamos isto?
Imagens enganosas de hospitais vazios têm sido comuns em postagens nas redes sociais que tentam minimizar os efeitos da pandemia de covid-19 no Brasil. O Comprova já verificou conteúdos similares há alguns dias. No caso desse vídeo, cuja verificação foi sugerida por leitores, ainda havia um outro elemento comum em conteúdos verificados recentemente, a figura de um governador. Governadores que se opõem a políticas de isolamento mais flexíveis têm sido alvo de grupos alinhados ao governo federal.
O vídeo verificado pelo Comprova circula desde o começo desta semana. Ele seria uma “prova” de que a pandemia do novo coronavírus está sendo superdimensionada pela imprensa e pelos governos estaduais. As imagens captadas pela enfermeira compõem uma montagem que inclui também a foto do governador da Bahia, Rui Costa (PT), em vídeo compartilhado pelo canal Jornavideo News, no YouTube. O canal costuma publicar conteúdo crítico ao trabalho da imprensa e às medidas de isolamento adotadas por governos e prefeituras para o combate à pandemia do novo coronavírus.
Falso para o Comprova é todo conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos?
Usamos a ferramenta de checagem de vídeo InVID para encontrar mais informações sobre as imagens divulgadas, tentando localizar a autoria da gravação original. Nos comentários da publicação do Jornavideo News, usuários acusam o canal de disseminar desinformação, com links que mostram que as imagens circulam desde março.
Entramos em contato com a assessoria de imprensa da Secretaria da Saúde da Bahia, responsável pela administração do Instituto Couto Maia, para esclarecer se houve demissão. Também consultamos o posicionamento da diretora do ICOM, Ceuci Nunes, pelo Facebook e conversamos com Washington Vinagre, autor da postagem mais antiga do vídeo que conseguimos localizar no Facebook, em 23 de março.
O Comprova ainda está tentando falar com a autora do vídeo.
Imagens foram feitas em março e a profissional não foi demitida
Por telefone e e-mail, a Secretaria da Saúde da Bahia confirmou que as imagens foram feitas no ICOM, em Salvador, em março de 2020. O hospital é uma referência para o tratamento de doenças infecto-contagiosas no Estado e, na época em que as imagens foram feitas, passava por um processo de adaptação para receber somentes casos de covid-19. Por isso, poucos leitos estavam ocupados. O ICOM tem 50 vagas na UTI. Segundo a secretaria, entre 60 e 70% estavam ocupadas na data da apuração, dia 23 de abril.
A secretaria confirmou que a mulher que aparece nas imagens é funcionária do hospital e negou que ela tenha sido demitida por causa do vídeo. Em um post no Facebook publicado no dia 22 de abril, a diretora do ICOM, Ceusi Nunes, disse que a enfermeira não se chama Sandra M. Guerra e negou a demissão.
A diretora do ICOM também confirmou que as imagens foram gravadas no hospital em 21 de março, durante ampliação da UTI: “Hoje os leitos estão todos cheios. Fake absurda”, afirmou. E pede aos seguidores: “Se recebeu desminta por favor (sic)”.
Postagens no Youtube e no Facebook em 23 de março confirmam que o vídeo já circula há pelo menos um mês. O autor de uma delas, Washington Vinagre, diz que recebeu as imagens de amigos e não conhece a enfermeira. Ele apagou o post depois de conversar com a equipe do Comprova.
Contexto
A Bahia já registrou 1.845 casos confirmados de covid-19 e 62 mortes. De acordo com balanço divulgado no dia 23 de abril, 231 pessoas estão internadas, 67 delas em UTIs. No dia em que o vídeo foi feito, 21 de março, o Estado tinha 41 casos de covid-19 e nenhuma morte. Naquele momento, a orientação para os doentes era permanecer em isolamento domiciliar.
Os governadores são o principal alvo do presidente Jair Bolsonaro, que critica o isolamento social determinado pelos Estados. Rui Costa, do PT, é presidente do Consórcio Nordeste, que reúne nove chefes governadores da região, e faz críticas à postura de Bolsonaro no enfrentamento da pandemia do novo coronavírus. “Ele parece que anda com a garrafa de gasolina na mão e o isqueiro na outra, tocando fogo onde ele passa”, reclamou em entrevista.
O atrito mais recente foi no último domingo. Rui Costa foi um dos governadores que criticou a participação do presidente em manifestações contra o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal.
Alcance
O vídeo com a legenda falsa circulou amplamente pelas principais redes sociais. Até o dia 23 de abril, os posts que mais se destacaram haviam tido 2,4 mil visualizações no Instagram e mais de 43 mil no Twitter. O vídeo com a foto do governador Rui Costa, publicado no canal Jornavideo News, foi assistido 10 mil vezes.
O post de Washington Vinagre, feito em março, chegou a ter 3 mil visualizações. Mas, depois de conversar com a equipe do Comprova, ele apagou a publicação. A postagem da diretora do ICOM, Ceusi Nunes, esclarecendo a autoria do vídeo foi compartilhada 174 vezes.
O site Boatos.org também verificou o conteúdo desse vídeo. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/sem-apresentar-evidencias-texto-sugere-que-governadores-e-prefeitos-usam-a-pandemia-para-driblar-a-lei/ | COMPROVA | Sem apresentar evidências, texto sugere que governadores e prefeitos usam a pandemia para driblar a lei | null | 2020-04-24 | Publicação feita em blog e compartilhada nas redes sociais mistura dados verídicos e enganosos para sugerir uma atuação não fiscalizada do poder público e desvios de dinheiro. Sem apresentar evidências, texto diz que governadores e prefeitos estariam driblando a lei em contratos firmados sem licitação
É enganoso o texto publicado em 18 de abril por um blog e republicado pelo site Hoje Notícias, que acusa governadores e prefeitos de se beneficiarem de ações governamentais relacionadas à covid-19 – doença causada pelo novo coronavírus – para cometer irregularidades.
A publicação afirma que os políticos se aproveitaram da pandemia para dar um “drible” na lei em contratos firmados sem licitação. Segundo o autor, Junior Takamoto, o cenário de pandemia se tornou “uma oportunidade de ouro para meter os dois pés na jaca, dando o drible da vaca nas leis de controle fiscal”.
O texto não apresenta nenhuma evidência de roubo ou desvio de verba pública na construção de hospitais de campanha e em outras ações emergenciais feitas pelo governo.
Ao falar sobre ações promovidas pelos governadores do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), e do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), e pelo prefeito de Fortaleza (Ceará), Roberto Cláudio (PDT), a publicação mistura dados verídicos e enganosos para sugerir uma atuação não fiscalizada do poder público e desvios de dinheiro.
Por que checamos isto?
O Comprova monitora conteúdos duvidosos compartilhados nas redes sociais sobre coronavírus e políticas públicas de combate à covid-19 e que tenham muita viralização. Muitos desses conteúdos afloram nas redes a partir de notícias e fatos reais.
No último domingo, 19 de abril, 20 governadores divulgaram uma carta em repúdio ao discurso do presidente Jair Bolsonaro em um ato de apoio a uma intervenção militar. Desde então, ganhou tração nas redes um texto publicado no dia 18 de abril no blog Junior Takamoto e republicado no dia 19 pelo site Hoje Notícias. A publicação acusa prefeitos e governadores de se aproveitarem da pandemia para cometer irregularidades. Este segundo post alcançou mais de 720 mil interações no Facebook e esse alcance fez com que o Comprova decidisse pela investigação da veracidade do conteúdo publicado.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos?
Para verificar o conteúdo publicado pelo site Hoje Notícias, o Comprova utilizou dados públicos sobre os contratos realizados pelo Rio de Janeiro, disponíveis no Portal de Compras do Estado. Checou informações e notas oficiais disponibilizadas pelo Ministério Público do Rio de Janeiro e pelo Tribunal de Contas do Estado.
O projeto entrou em contato com a Secretaria de Saúde do Distrito Federal e acessou publicações do Diário Oficial do DF. A equipe tentou falar pelo Facebook com Júnior Takamoto, autor da postagem, mas até a publicação desta verificação não recebeu resposta. Também foram consultadas reportagens sobre o temas citados por Takamoto.
Você pode refazer o caminho da verificação do Comprova usando os links para consultar as fontes originais.
As ações dos governos em Brasília, Rio de Janeiro e Fortaleza
Cada parte do texto “Pandemia vira roubalheira de governadores e prefeitos”, do site Hoje Notícias, foi verificada. Para ficar mais fácil a compreensão de como foi feita a investigação, o Comprova dividiu em 3 blocos: Brasília, Rio de Janeiro e Fortaleza.
Também há abaixo uma breve contextualização das divergências entre os governadores e o presidente Jair Bolsonaro sobre o isolamento social para explicar referências que o texto faz a uma suposta negligência do STF (Supremo Tribunal Federal) com o Executivo.
Brasília
O texto afirma que o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), fez 50 leitos no autódromo de Brasília para abrigar “sem tetos” em uma obra que teria custado R$ 2,4 milhões – o equivalente a R$ 48 mil reais por leito.
Esta informação é enganosa. De acordo com reportagem da TV Globo, que foi ao ar em 8 de abril, um termo de cooperação emergencial realmente foi firmado entre o Governo do Distrito Federal e o instituto Tocar, ONG que vai gerir o espaço. O valor do contrato foi R$ 2.394.837,70 conforme publicado no DOU de 4 de abril.
Mas, ao contrário do que afirma o texto, as tendas têm capacidade para receber até 200 pessoas e contam com 50 dormitórios, lavanderia, refeitório e pelo menos 30 banheiros – e não apenas 50 leitos. O objetivo é abrigar pessoas em situação de rua durante a pandemia.
A publicação do site Hoje Notícias também diz que o governo construiu um albergue em Planaltina (GO) – a 35 km do autódromo – que está “pronto para receber milhares de sem teto, mas que o governo quer construir um novo”.
O prédio a que o texto se refere realmente foi planejado pelo governo e receberia 500 moradores em situação de rua. Apesar de ter começado a ser construído em 2013 e ter ficado pronto em 2014, o albergue nunca foi entregue a população e está abandonado. De acordo com reportagem da TV Globo que foi ao ar em 21 de janeiro de 2019, o prédio virou alvo de vandalismo e está depredado.
A pandemia pressiona o sistema de saúde público e privado. Uma das maiores preocupações dos especialistas da área é a quantidade de leitos nos hospitais para os doentes. O texto do Hoje Notícias denuncia que em Águas Claras, região administrativa do Distrito Federal, existem dois hospitais com mais de 300 leitos prontos, mas que não podem funcionar. Por isso o governo teria feito um hospital de campanha no estádio Mané Garrincha. A publicação não fala no entanto o nome dos hospitais ou se eles são públicos ou privados.
Ao fazer uma busca no Google, o Comprova encontrou uma publicação do jornal Metrópoles, de 23 de março, que anuncia a inauguração de um hospital em Águas Claras. A unidade conta com 267 leitos disponíveis para internação. Além desse, não foi encontrado nenhum hospital com 300 leitos que estivesse fechado.
O Comprova entrou em contato com a Secretaria de Saúde do DF para saber se existe alguma obra de hospital público para ser entregue. De acordo com o órgão, Águas Claras não tem nenhum hospital público. “A população desta região administrativa deve buscar atendimento no Hospital Regional de Taguatinga [cidade ao lado] quando necessário”, diz o e-mail.
O governo do DF de fato construiu, sem licitação, um hospital de campanha no Mané Garrincha. Assim como afirma o texto de Takamoto, foram construídos 200 leitos por meio de um contrato no valor de R$ 5.092.313,27. A autorização foi publicada no Diário Oficial do Distrito Federal em 9 de abril. A empresa responsável pela obra foi a Contarpp Engenharia.
Rio de Janeiro
O texto de Takamoto diz que governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), já comprometeu, sem licitação, mais de R$ 1,9 bilhões com despesas relacionadas à pandemia do coronavírus.
Os contratos realizados pelo Estado para as ações de combate à pandemia de covid-19 foram realmente realizados sem licitação sob as determinações da Lei Federal 13.979, de 6 de fevereiro de 2020.O texto é de iniciativa do governo federal, e foi sancionado antes da confirmação do primeiro caso da covid-19 no Brasil. Desde então, todos os entes federativos – municípios, estados e União – estão autorizados a adquirir bens ou serviços – inclusive de engenharia – sem a necessidade de realizar todo o processo de licitação normal, previsto na Lei n. 8.666/93, desde que sejam necessários para o combate ao coronavírus. A lei de fevereiro permite esse tipo de contratação enquanto durar a emergência sanitária internacional.
Porém, diferentemente do que o texto checado diz, os 70 contratos relacionados no Portal de Compras no governo do Rio de Janeiro somam R$1,5 bilhão, e não R$1,9 bilhão. Para chegar a esse montante, o Comprova somou os valores de todos os contratos em 23 de abril. Segundo o Portal de Compras, a maior parte dos acordos ainda não foi executada.
Uma nota técnica publicada pelo Tribunal de Contas do RJ orienta o Estado e os municípios fluminenses sobre a realização dos procedimentos com base na Lei publicada para o período da pandemia do coronavírus. Segundo o texto, mesmo os contratos firmados sem licitação devem obedecer a uma série de critérios objetivos e ser devidamente fiscalizados, geridos e publicizados.
O Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro criou uma força tarefa de atuação integrada para a fiscalização das ações estaduais e municipais de enfrentamento à covid-19. Entre os objetivos da iniciativa, está o acompanhamento preventivo da atuação do poder executivo, inclusive no exame de contratos, licitações e outras formas de convênio realizadas para o combate ao novo coronavírus. A força-tarefa vai atuar em cooperação com o Tribunal de Contas do Estado, na avaliação das ações realizadas pelo governo estadual e pelas prefeituras.
Desde que foi criada a força tarefa, o MP-RJ já instituiu um inquérito civil para analisar o contrato de compra de respiradores realizado pelo governo do estado.
Ainda sobre o Rio de Janeiro, o texto diz que existe uma forte pressão dos deputados bolsonaristas para que seja instalada uma “Comissão Parlamentar de Inquérito do Coronavírus” na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio). O objetivo seria investigar as contratações emergenciais, sem licitação, feitas pelo governo Witzel.
A criação de uma CPI para avaliar os gastos emergenciais durante a pandemia chegou a ser cogitada e as assinaturas necessárias foram angariadas entre os deputados, mas a CPI acabou arquivada na ALERJ em 21 de abril. Segundo uma reportagem d’O Globo, parte dos apoiadores da investigação recuou após a nomeação, pelo governador, de um novo presidente para o Detran, ligado ao MDB. A justificativa oficial da Mesa-Diretora da Casa, porém, foi a existência da investigação, já em curso, do Ministério Público Estadual e do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro.
Fortaleza
O texto verificado fala ainda sobre a contratação da Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina para gerir o Hospital de Campanha construído no Estádio Presidente Vargas, em Fortaleza (Ceará), pelo valor de R$ 96 milhões. Isso de fato ocorreu.
O contrato chegou a ser suspenso, na última semana, por uma decisão judicial, mas a liminar – decisão provisória – concedida pela primeira instância foi derrubada no Tribunal de Justiça do Ceará.
O Hospital de Campanha tem, atualmente, 102 leitos em funcionamento, e outros dois blocos devem ser entregues até 26 de abril. A estrutura temporária já recebe pacientes, a maioria de média e baixa complexidade. Segundo a prefeitura da cidade, também será possível atender a casos graves.
O isolamento social e as divergências entre governadores e Bolsonaro
A pandemia de covid-19 acirrou o atrito entre os governos estadual e federal. Um dos principais motivos é o decreto de isolamento social defendido pelos governadores e rechaçado pelo presidente Jair Bolsonaro. A medida visa frear o contágio da doença causada pelo novo coronavírus.
Vários líderes estaduais defendem que as pessoas devem ficar em casa e os comércios permanecer fechados pelo menos durante o pico das infecções da covid-19 para que o sistema de saúde não seja sobrecarregado. Em abril, estados como o Amazonas, São Paulo, Rio de Janeiro e Ceará já enfrentam crise nos hospitais por falta de leitos de UTIs e pronto-socorro.
Já o presidente Bolsonaro teme que o fechamento das lojas resulte em uma grande recessão econômica, afirma que a cura não pode ser pior que a doença e defende que apenas idosos e grupos de risco devem ficar de quarentena. Para Bolsonaro, caso os serviços considerados não-essenciais – como bares e restaurantes – voltem a funcionar, a economia volta a reaquecer. O presidente já afirmou que o decreto para mandar os comércios abrir está na gaveta.
O atrito entre os Executivos federal e estaduais ficou ainda mais latente quando Bolsonaro fez um pronunciamento em rede nacional na TV e no rádio, criticou o fechamento de escolas e pediu o fim do “confinamento em massa”. Também subiu o tom contra os governadores e disse que algumas poucas autoridades estaduais e municipais deveriam abandonar o conceito “de terra arrasada” e reabrir o comércio.
No dia seguinte, governadores rebateram as afirmações de Bolsonaro e, por meio de suas contas no Twitter, disseram que o posicionamento do presidente era “inaceitável e lamentável” e que Bolsonaro “atrapalha” o trabalho estadual.
O texto de Takamoto faz referência às divergências das autoridades brasileiras e cita também o “apoio” de quase todos os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) a posição dos governadores. “O colegiado [STF] virou as costas para a roubalheira que promete ser intensa durante a pandemia e retirou quase todos os poderes do governo federal na gestão da crise para transferi-los para Estados e municípios”, afirma o texto.
O STF proibiu o Planalto de suspender isolamento social nos Estados. O ministro Alexandre de Moraes atendeu parcialmente um pedido da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), segundo o qual o presidente Bolsonaro estava atuando como “agente agravador da crise“.
O isolamento é recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e pelo Ministério da Saúde para evitar a propagação do vírus.
O posicionamento de Bolsonaro também causou imbróglio com o ex-ministro da saúde, Luiz Henrique Mandetta, que foi demitido da pasta em 16 de abril depois de discordar publicamente de Bolsonaro. O próprio presidente admitiu que os dois andavam “se bicando”. O substituto é o oncologista Nelson Teich. No discurso de posse, Teich se disse alinhado com o Executivo Federal “na saúde e na economia”.
Viralização
Até 24 de abril, a publicação “Pandemia vira roubalheira de governadores e prefeitos”, do site Hoje Notícias, havia sido compartilhada mais de 20 mil vezes depois de ser postada em grupos do Facebook que apoiam o presidente Jair Bolsonaro alcançando mais de 750 mil interações. O post no blog de Takamoto obteve 49 mil interações no Facebook até 24 de abril. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/pesquisa-brasileira-nao-usou-doses-letais-para-matar-pacientes-e-atacar-cloroquina/ | COMPROVA | Pesquisa brasileira não usou doses letais para matar pacientes e atacar cloroquina | null | 2020-04-24 | Publicações nas redes sociais usam dados de uma pesquisa brasileira para acusar pesquisadores de tramarem contra o uso de cloroquina no tratamento de pacientes com a covid-19. Algumas postagens acusam pesquisador de ser ligado ao PT
É falso que um grupo de pesquisadores brasileiros tenha aplicado uma dosagem letal de cloroquina em pacientes com covid-19 para causar má-impressão sobre o medicamento no tratamento contra a doença causada pelo novo coronavírus.
Tal alegação foi feita pelo empresário americano Mike Coudrey em sua página no Twitter, em 14 de abril, e reproduzida um dia depois pelo canal Papo Conservador com Gustavo Gayer, no Youtube. O vídeo tinha mais de 55 mil visualizações até a publicação deste texto e seu conteúdo foi amplamente compartilhado nas redes sociais.
O empresário norte-americano Mike Coudrey é dono da empresa de comunicação digital Yuko Social, que ele define como “um time de milennials especialistas em redes sociais prontos a te ajudar com suas necessidades”.
Postagens acusam diretamente o médico Marcus Vinícius Guimarães Lacerda, da Fundação de Medicina Tropical Dr. Heitor Vieira Dourado, de Manaus, e especialista em Saúde Pública da Fiocruz-Amazonas, de ter matado intencionalmente pacientes com covid-19 com doses altas de cloroquina.
Algumas postagens também afirmavam que o pesquisador é militante petista e traziam uma imagem dele com apoio à candidatura de Fernando Haddad à presidência em 2018. Outras ainda traziam sua foto com uma indicação de apoio ao candidato derrotado Ciro Gomes. As publicações relacionavam sua suposta militância com a tentativa de tirar o mérito da cloroquina.
Marcus Lacerda confirmou que ambas as fotos são verídicas e que refletem seu posicionamento nas urnas em 2018. Ressaltou, porém, que não é militante petista e que não votou em Haddad no primeiro turno. O Comprova confirmou que ele não é filiado a nenhum partido político.
Por que checamos isto?
Embora não existam ainda evidências conclusivas sobre a eficácia da cloroquina na cura da covid-19, alguns trabalhos indicam que o medicamento pode aliviar quadros graves da doença. A partir do momento que esses estudos começaram a vir a público – com destaque para estudo do francês Didier Raoult, que chamou a atenção de lideranças globais, como o presidente norte-americano Donald Trump – a cloroquina passou a ser usada em debates polarizados.
O microbiologista francês Didier Raoul publicou um estudo segundo o qual a cloroquina teria curado 75% dos pacientes em 6 dias. No entanto, Raoul excluiu dos resultados finais 6 dos 26 pacientes testados porque não completaram o tratamento. Desses, um morreu, 3 foram parar na UTI, outro desistiu por sentir náuseas e o último decidiu deixar o hospital. O estudo de Didier também é alvo de críticas por ter avaliado um número pequeno de pessoas.
No Brasil, a discussão se intensificou no início de março, depois que o presidente Jair Bolsonaro começou a defender o uso da cloroquina para o tratamento da doença. Porém, o então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, apresentou resistência na recomendação do medicamento uma vez que a OMS (Organização Mundial da Saúde) informa que ainda não há cura ou remédio para a covid-19.
O mal estar gerado pela divergência entre Bolsonaro e Mandetta culminou na demissão do ministro e serviu para aflorar debates na internet sobre a cloroquina. Esses debates ganharam mais tração nas redes sociais quando a pesquisa brasileira foi divulgada pela imprensa e, sobretudo, quando começaram a circular imagens de um dos pesquisadores relacionando-o à candidatura de Fernando Haddad, adversário de Jair Bolsonaro no segundo turno da eleição presidencial de 2018.
O Comprova entendeu que pela gravidade das acusações e pelo alcance das postagens deveria investigar esses conteúdos.
Enganoso para o Comprova é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado.
Como verificamos?
O Comprova recebeu pelo site a sugestão de verificação sobre o vídeo do canal Papo Conservador publicado no YouTube. O vídeo reproduz alguns comentários de Twitter do perfil @pauloeneas que, por sua vez, citam o norte-americano Mike Coudrey como fonte.
Ao procurar o nome de Coudrey na rede social, identificamos o seu perfil de usuário. Ele tomou conhecimento da pesquisa de Manaus por meio de uma reportagem do jornal The New York Times que comentava a suspensão da pesquisa. Coudrey, então, teceu críticas ao estudo que, por sua vez, foram reproduzidas por perfis brasileiros nas redes sociais.
Fazendo uma busca por essas publicações, identificamos o nome da pesquisa e também o seu pesquisador principal, Marcus Vinícius Guimarães Lacerda. Ele era alvo de muitos ataques das publicações.
Ao buscar o título do artigo foi possível conferir que o estudo estava de fato publicado na plataforma MedRxiv. Com o estudo em mãos, pudemos analisar o seu conteúdo e a forma como a pesquisa foi conduzida. Procuramos a presença de aspectos formais de legitimação do estudo, como número de aprovação pelo Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep).
No estudo encontramos os contatos de Marcus Lacerda e mandamos mensagem por e-mail. Fizemos contato em duas ocasiões e tivemos resposta por e-mail. Marcus Lacerda explicou algumas decisões que sua equipe fez para conduzir o estudo e também negou militância política. Checamos suas informações na plataforma cruza.dados.org.
Por fim, entrevistamos dois médicos infectologistas que comentaram os aspectos técnicos da pesquisa. Também procuramos as notas técnicas do Ministério da Saúde sobre a aplicação de cloroquina no tratamento da covid-19.
Você pode refazer o caminho da verificação acessando os links para sites e documentos.
Que resultados a pesquisa pretendia encontrar?
A pesquisa “Cloroquina em Duas Dosagens Diferentes como Terapia Adjuvante de Hospitalizados com Síndrome Respiratória Grave no Contexto de Coronavírus” foi aprovada no dia 20 de março pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e começou no dia 23. O órgão é ligado ao governo federal e responsável pela regulamentação ética de protocolos de pesquisas envolvendo seres humanos no país.
A pesquisa foi estruturada como um estudo de fase II. Isso quer dizer que o foco são diferentes dosagens e a segurança dos pacientes. De 81 pacientes infectados, 11 morreram enquanto eram monitorados pela equipe de Lacerda. Sete deles foram submetidos às dosagens mais altas de cloroquina.
Além de a metodologia do estudo ter passado pelo crivo do Conep, a Fundação de Medicina Tropical conduziu as pesquisas. Ela é um centro de referência mundial para o tratamento de enfermidades tropicais, explica Jaime Rocha, médico responsável pela Unimed Laboratório, diretor de Prevenção e Promoção à Saúde da Unimed Curitiba e vice-presidente da Sociedade Paranaense de Infectologia.
“Eles sabem usar cloroquina em função da malária, doença comum na região amazônica. Por essa experiência, ninguém melhor do que eles para tentar responder se a cloroquina é eficiente no caso da covid-19”, disse. No Brasil, o medicamento tem autorização da Anvisa para ser usado no tratamento da malária e de lúpus.
Inicialmente, o estudo previa a inclusão de 440 pacientes hospitalizados já em estado grave, no Hospital Delphina Aziz, referência para covid-19 no estado do Amazonas. O Governo do Estado do Amazonas, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam) são os patrocinadores oficiais do estudo.
Rocha explica ainda que para colocar em prática um estudo como esse, o comitê de ética avalia se a pesquisa traz uma resposta cientificamente válida para a sociedade e se deve prosseguir. “Essa decisão é tomada em conjunto por cientistas familiarizados com o tema e também por pessoas que não são especialistas, para ‘verem com outros olhos’, e enxergar se há questões religiosas, raciais ou outro tipo de interesse escuso”, disse.
Como foi realizado o estudo
O levantamento reuniu 70 profissionais, entre pesquisadores, estudantes de pós-graduação e colaboradores de instituições com tradição em pesquisa, como Fiocruz, Fundação de Medicina Tropical Dr. Heitor Vieira Dourado, Universidade do Estado do Amazonas e Universidade de São Paulo.
No Twitter, o empresário Mike Coudrey ainda havia acusado a pesquisa de usar o difosfato de cloroquina, medicamento supostamente menos seguro que a hidroxicloroquina. Mas Lacerda rebate esse argumento: “No curto prazo, não há qualquer diferença de toxicidade entre as duas apresentações da medicação (hidroxicloroquina e difosfato de cloroquina). A toxicidade da forma difosfato de cloroquina só é maior por períodos prolongados de uso, como em lúpus e artrite reumatoide.”
O Ministério da Saúde considera seguro o uso tanto do difosfato de cloroquina quanto de hidroxicloroquina, desde que sejam respeitadas regras restritas e uma janela terapêutica.
Fonte: Comissão Nacional de Ética em Pesquisa
1º grupo de pacientes – 40 pessoas
Receberam 450 mg diárias ao longo de cinco dias, sendo que no primeiro dia a medicação foi administrada duas vezes, totalizando 2,7 g. Esta é a dose que o Ministério da Saúde, junto à Secretaria de Ciência e Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCETIE), indicou para o tratamento de pacientes com quadro clínico grave. A cloroquina deve ser aplicada como terapia paralela ao tratamento e não deve ter outras terapias preteridas a seu favor.
2º grupo de pacientes – 41 pessoas
Foram medicados com a maior dose de cloroquina. Eles receberam 600 mg do medicamento duas vezes ao dia durante dez dias (num total de 12g ao longo de todo o tratamento).
Sobre a escolha da maior dosagem, os pesquisadores informaram os seguintes motivos:
Doses mais altas têm maior atividade antiviral in vitro, ou seja, em laboratório, realmente mais altas do que a dose usada para malária, por exemplo;
É a mesma dose, por peso dos pacientes, usada na China, e que consta atualmente no Consenso Chinês de Tratamento de covid-19;
Uso em pacientes com choque, ou seja, com baixa perfusão intestinal, e que, portanto, absorvem menos a medicação, que só tem apresentação em comprimidos;
Em uma doença que se revelou, no mundo ocidental, muito letal, o risco de benefício da eficácia x de efeitos colaterais, de diferentes doses, precisava ser avaliado e conhecido dentro de parâmetros científicos;
Boa segurança dessa mesma dose alta em pacientes com câncer, em vários estudos publicados, que usaram por períodos ainda mais longos, de 28 dias.
O Consenso Chinês de Tratamento a que se refere Lacerda foi publicado em estudo por especialistas chineses do Departamento de Ciência e Tecnologia e da Comissão de Saúde da Província de Guangdong. Eles recomendaram a aplicação de 500 mg de cloroquina duas vezes ao dia, por 10 dias, em casos leves, moderados e graves de covid-19.
A equipe liderada por Lacerda aplicou 200 mg a mais por dia do que o indicado pelo Consenso Chinês de Tratamento. Ao Comprova, Lacerda justificou: “A nossa [dosagem] foi ainda maior, porque tínhamos pacientes mais obesos e sabemos que a droga só mata o vírus em doses muito altas.”
Os dados da mortalidade no grupo da maior dosagem foram analisados no 6º dia. Após identificar um risco maior para a saúde dos participantes, esse braço da pesquisa foi cancelado. Todos os participantes passaram a utilizar a menor dosagem. “A primeira conclusão do estudo, portanto, foi que pacientes graves com covid-19 não deveriam mais usar a dose recomendada no Consenso Chinês de Tratamento, fato que até o momento não se tinha qualquer evidência, uma vez que nenhum estudo realizou adequadamente a avaliação de segurança”, esclareceu Lacerda.
“A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) foi comunicada oficialmente do acontecido [da interrupção da aplicação da maior dosagem por conta da toxicidade] no dia 11 de abril, por meio da Plataforma Brasil, e os dados, para maior transparência e visibilidade internacional, foram divulgados no site MedRxiv.
A intenção foi advertir demais pesquisadores do mundo sobre a toxicidade de uma dose alta, que apesar de teoricamente parecer mais eficaz, estava causando mais danos do que benefícios, disse Lacerda.
Sobre o site estrangeiro medRxiv, o médico Jaime Rocha, responsável pela Unimed Laboratório, lembra que é uma plataforma dedicada a divulgar trabalhos incompletos ou que ainda aguardam revisões. “A plataforma destaca em sua página inicial, inclusive, que não recomenda o uso dos estudos ali, pois são análises preliminares”, explica o infectologista.
Vale ressaltar que, para serem publicados nessa plataforma, todos os manuscritos passam por um processo de triagem de conteúdo ofensivo e/ou não científico e de material que possa representar um risco à saúde. Os textos também são verificados quanto ao plágio.
O estudo de Lacerda não permite concluir se a cloroquina em doses baixas funciona ou não para o tratamento da covid-19, pois não tem o grupo de controle, isto é, o grupo que não recebeu o medicamento e serviria como parâmetro para comparar os resultados no grupo submetido à droga.
Eficácia da cloroquina
Normalmente usada no tratamento de doenças como malária, artrite e lúpus, a cloroquina passou a ganhar evidência após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, dizer em 19 de março que o medicamento era um “agente de mudança de jogo”.
Dois dias depois, o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, anunciou o aumento da produção da droga no país. Esse posicionamento acabou virando um dos pontos de desentendimento entre Bolsonaro e o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, não recomendava o uso indiscriminado do medicamento.
O Ministério da Saúde passou a oferecer, em 27 de março, cloroquina a médicos da rede pública que queiram usar no tratamento de casos graves de covid-19 como terapia auxiliar.
No documento, o ministério destaca que não existem terapias farmacológicas e imunobiológicas específicas para a covid-19, mas considera publicações científicas que apontam possível capacidade de inibição da reprodução viral do novo coronavírus. A pasta ainda lembra que há dezenas de outros estudos clínicos nacionais e internacionais em andamento, avaliando a eficácia e a segurança dos medicamentos. “Portanto, essa medida poderá ser modificada a qualquer momento, a depender de novas evidências científicas”, afirma a Nota Informativa.
Enquanto isso, a cloroquina segue sendo objeto de estudos pelo mundo, mas nenhum deles provou até agora a sua eficácia no tratamento da covid-19.
Viralização
Desde a sua publicação, em 15 de abril, até o dia 23, o vídeo de Gustavo Gayer no canal Papo Conservador já teve 55.951visualizações. As acusações contra o médico Marcus Lacerda tiveram maior divulgação, sendo que uma delas, compartilhada pelo site Gazeta Brasil, teve 760,9 mil visualizações em menos de 24 horas. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/ainda-nao-ha-cura-oficial-para-a-covid-19-tratamento-com-corticoides-nao-tem-estudo-publicado/ | COMPROVA | Ainda não há cura oficial para a covid-19; tratamento com corticoides não tem estudo publicado | null | 2020-04-22 | Médico que aparece em entrevista à TV Record diz ter resultados animadores, mas ele próprio rejeita a tese de que o método já possa ser considerado uma cura
É falso que infectologistas e imunologistas tenham descoberto a “cura oficial” da covid-19 – doença causada pelo novo coronavírus –, ao contrário do que afirma um post viral no Facebook. A publicação na rede social usa um vídeo de entrevista do médico Roberto Zeballos à TV Record.
O clínico geral e imunologista afirma ter obtido resultados animadores em tratamento realizado com pacientes do hospital Vila Nova Star, em São Paulo, baseado em estudos anteriores. Zeballos também diz que a evidência clínica motivou estudo apoiado pelo Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR) e que os resultados ainda não foram publicados. Tanto a Organização Mundial de Saúde (OMS) quanto o Ministério da Saúde informam que ainda não existe tratamento oficial comprovadamente eficaz no combate à covid-19.
Portanto, ainda não é possível afirmar que o tratamento desenvolvido por Zeballos seja aplicável a outras pessoas infectadas pelo vírus. “Eu só posso falar da minha experiência e não tem nada concluído ainda, nada documentado”, esclareceu o médico imunologista ao Comprova. “Na hora em que tiver algo concluído e documentado, aí sim, poderemos fazer uma contribuição muito boa para as pessoas que se infectam com o coronavírus”.
O médico informou que está recrutando pacientes para participar da pesquisa. Terminada essa fase, ele estima demorar até 40 dias para obter conclusões. Não há previsão para publicação do estudo. O IDOR informou, em nota, que desenvolve dez projetos de pesquisa sobre a covid-19. “Em todos esses casos, os resultados serão divulgados conforme o andamento das pesquisas”, comunicou a instituição.
Por que checamos isto?
O Comprova monitora conteúdos duvidosos sobre o novo coronavírus publicados nas redes sociais e que tenham grande viralização. Informações enganosas sobre curas milagrosas ou medicamentos e terapias cuja eficácia tenha sido comprovada têm sido comuns nas redes sociais. Essas informações têm potencial de causar danos à saúde e contam com a esperança das pessoas para ganharem tração nas redes.
Na entrevista de Zeballos à TV Record, o médico conta ter obtido resultados positivos no tratamento clínico de pacientes da covid-19, mas ressalta ainda não ter um estudo publicado sobre o assunto. O post que republica o vídeo no Facebook, no entanto, afirma que o imunologista já teria encontrado a “cura oficial”, o que não é verdade. Apesar de a própria entrevista do médico desmentir essa alegação, a postagem obteve mais de 40 mil compartilhamentos.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos?
Checamos o vídeo da entrevista de Zeballos no canal oficial de YouTube da TV Record. Apesar de a gravação ser mais longa do que a publicada no Facebook, não há grandes diferenças de conteúdo entre as duas versões do vídeo.
Entramos em contato com a assessoria de imprensa do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino. Também falamos com Zeballos por meio da assessoria da editora Peirópolis, que publicou um livro do médico.
Qual é o tratamento praticado por Zeballos
O imunologista Roberto Zeballos tem tratado pacientes da covid-19 com corticoides. Na entrevista à Record, ele cita combinar esse medicamento com o uso dos antibióticos azitromicina ou claritromicina. “Haviam estudos com coronavírus anteriores que mostravam que o uso de corticoides aumentava a replicação viral. Mesmo assim, vimos que [entre os pacientes da covid-19] quem tomou corticoide teve uma evolução um pouco menos deletéria”, afirmou o médico.
Zeballos ressaltou que, apesar de ter obtido resultados animadores, ainda não tem uma estatística muito grande. Segundo ele, foram tratados 30 pacientes, dos quais oito apresentaram quadros graves. Nenhum deles precisou ser entubado, afirmou o imunologista.
O médico reforçou que ainda não tem uma cura para o novo coronavírus; disse que essa afirmação só poderá ser feita após a publicação do estudo. Por enquanto, as evidências obtidas são da experiência clínica de médicos que testaram o tratamento.
Viralização
O vídeo com legenda enganosa obteve 40 mil compartilhamentos no Facebook de 13 a 22 de abril. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-audio-atribuido-ao-general-braga-netto-que-pede-intervencao-militar/ | COMPROVA | É falso áudio atribuído ao general Braga Netto que pede intervenção militar | null | 2020-04-22 | Casa Civil nega que a voz em um áudio atribuído ao general Walter Souza Braga Netto seja dele. O Comprova também encontrou uma postagem de um homem que reivindica a autoria da gravação e fez comparações entre a voz do ministro e a que se escuta no áudio que viralizou nas redes sociais
A voz em um áudio atribuído ao ministro-chefe da Casa Civil que defende a intervenção militar e pede para que as pessoas confiem nas Forças Armadas, não é do general Walter Souza Braga Netto.
A gravação circula nas redes sociais ao menos desde o dia 15 de abril, quatro dias antes das manifestações ocorridas em diversas cidades brasileiras no último domingo (19). A data comemora o dia do Exército. Entre os pedidos dos manifestantes estavam a intervenção militar, um novo AI-5, o fim do isolamento social, o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal.
O Comprova fez a transcrição do áudio e a enviou para a Casa Civil, que negou que a voz que se escuta na gravação seja do ministro-chefe da Casa Civil.
O Comprova também encontrou um perfil no Facebook de um militante intervencionista que dizia ser o autor do áudio viralizado.
Aqui estão dois trechos para comparação. O primeiro deles é do falso áudio que viralizou; o segundo, é de uma entrevista de Braga Netto para a TV Aparecida em 17 de janeiro de 2019.
O porquê da checagem
O Comprova recebeu a sugestão de verificação pelo WhatsApp no dia 14 de abril. No dia 16, encontramos o mesmo conteúdo no Canal Nação Patriota no YouTube. Um vídeo neste canal, com o título “Vaza áudio do general Braga Netto, prontos para intervenção militar no Brasil”, reproduzia o áudio e já contava com 400 mil visualizações num período de 24 horas. Além da desconfiança sobre a autoria do áudio, pela diferença no tom de voz, muitos comentários questionavam a veracidade da gravação.
O Comprova verifica conteúdos suspeitos compartilhados nas redes sociais que obtenham grande alcance.
Falso para o Comprova é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos?
Depois de receber a sugestão de checagem, O Comprova fez buscas nas redes sociais, usando um aplicativo de monitoramento chamado CrowdTangle para detectar publicações similares ou com o mesmo conteúdo. Usando a funcionalidade busca avançada no YouTube e fazendo buscas no Google também encontrou perfis e páginas em que o áudio havia sido compartilhado.
O Comprova ainda transcreveu o áudio e enviou a transcrição para a Casa Civil. A checagem fez contato com pessoas que publicaram o áudio nas redes sociais, mas não obteve resposta de nenhuma delas até a publicação desta reportagem.
A voz do áudio não é de Braga Netto
Além de obter a negativa da Casa Civil, o Comprova procurou o dono do canal do Youtube e, além dele, uma outra pessoa que declarou em seu perfil no Facebook ser o verdadeiro autor do áudio, mas nenhum dos dois respondeu às mensagens.
O suposto autor da gravação, Joe Patriota, é um ativista pela intervenção militar no seu perfil pessoal. Em alguns compartilhamentos do áudio no Facebook, Joe foi apontado em comentários como o autor original. No dia 15 de abril, publicou um comunicado em sua página do Facebook, mesmo dia em que a gravação foi divulgada no Youtube, com o seguinte conteúdo:
“No dia 31 de março de 2020 tive uma conversa em áudio privado vazado de um grupo do qual eu faço parte, a Liga Cristã Mundial. Ao compartilharem meu áudio na rede minha voz foi erroneamente atribuída ao general Braga Netto e editada sobre imagens do referido ministro. Venho a público esclarecer que o general Braga Netto não gravou o áudio em questão e que tal vazamento da minha voz se deu sem o meu consentimento, conhecimento ou vontade”, dizia o comunicado.
O Comprova não conseguiu contato com o autor do post e, portanto, não pode verificar a veracidade dessa informação.
Contexto
A gravação foi divulgada às vésperas dos protestos de apoiadores de Jair Bolsonaro com pedidos de intervenção militar. O canal no YouTube Nação Patriota, que publicou o áudio, divulgou a programação da última manifestação, que ocorreu no dia 19 de abril. Os protestos pediam o fechamento do Congresso e o retorno do Ato Institucional Número 5, decretado pelo presidente Artur da Costa e Silva em 13 de dezembro de 1968, durante a ditadura militar.
Um dos trechos da gravação pede que a população exija intervenção militar. “As Forças Armadas jamais irão agir sem a força do povo, jamais. Não vão agir sem o apoio do povo e não vão agir sem que o povo peça. (…) A atitude do brasileiro tem que ser outra, tem que ir com ódio, tem que entrar e pedir Forças Armadas com clareza. Não adianta pedir fora corrupção porque ela é totalmente impessoal”, diz o áudio
O presidente Bolsonaro participou de uma dessas manifestações contra o Congresso e o STF. O protesto foi realizado em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília, e provocou um “enorme desconforto” na cúpula militar.
Viralização
O áudio foi reproduzido no Canal Nação Patriota, no último dia 15 no YouTube, e alcançou 1,2 milhão de visualizações até o dia 22 de abril. Também postado no canal BR NOTÍCIAS, no dia 20, possuía mais de 337 mil reproduções até o dia 22 de abril. Este último foi compartilhado por Olavo de Carvalho no Facebook.
Os sites Aos Fatos e o Boatos.org também verificaram o áudio. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/video-e-usado-fora-de-contexto-para-relacionar-acao-da-pm-em-sao-paulo-a-pandemia-de-covid-19/ | COMPROVA | Vídeo é usado fora de contexto para relacionar ação da PM em São Paulo à pandemia de covid-19 | null | 2020-04-17 | Imagens foram gravadas em dezembro de 2019 e mostram abordagem da PM a homem que agrediu companheira, e não investida contra idoso que caminhava na rua
É enganoso o vídeo que circula nas redes sociais acompanhado de um texto sobre um idoso que estaria sendo agredido por policiais militares de São Paulo por estar apenas caminhando na rua. O conteúdo, que viralizou em 14 de abril, foi retirado de contexto. As imagens foram captadas e publicadas no Facebook pela primeira vez no dia 3 de dezembro de 2019, antes do primeiro caso de covid-19 no Brasil. Não há qualquer relação do vídeo com a pandemia, ao contrário do que diz o texto que acompanha as postagens sobre essa ser uma medida adotada pela “Ditadura TraiDoria”. O governador João Doria (PSDB) defende o isolamento social e já cogitou prender aqueles que desobedecerem as regras.
O Comprova confirmou a data da publicação com a responsável pela filmagem. A gravação do vídeo foi feita na Avenida Pedro Machado, na cidade de Mogi das Cruzes, interior de São Paulo. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública do Estado, as imagens foram feitas quando dois policiais militares tentavam deter um homem acusado de agredir a companheira em um posto de combustível. Um Inquérito Policial Militar (IPM) foi Instaurado para apurar a conduta dos profissionais no ato da prisão. A investigação foi finalizada, e o inquérito foi encaminhado ao Tribunal de Justiça Militar (TJM).
Enganoso para o Comprova é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado; que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos
O Comprova entrou em contato com a assessoria de comunicação da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo. O órgão afirmou, em nota, que o homem havia sido encontrado em casa, depois de agredir a esposa, e reagido à prisão.
Para buscar a publicação original do vídeo, o Comprova usou a ferramenta InVID e extraiu um frame do vídeo postado em uma página do Facebook no último dia 14 de abril. Com ele, realizando uma busca reversa no Google, a equipe chegou a outro material, publicado na página Plantão Cariri em 3 de dezembro de 2019. A postagem estava acompanhada do texto: “aconteceu na Av Pedro Machado.!!! PM…. a saga continua.!!!”.
A partir da localização, por meio do Google Street View, foi identificada a residência de onde as cenas foram gravadas. No portão do imóvel, havia um banner – que também aparece no vídeo – com um telefone para serviços de manicure e pedicure. O Comprova entrou em contato com a proprietária do número.
Em uma conversa no Whatsapp, ela confirmou a autoria da gravação e disse que postou o vídeo em seu perfil do Facebook em 3 de dezembro de 2019. Segundo a autora, o material permaneceu no ar por uma semana, mas foi retirado depois da repercussão negativa.
Contexto: Doria falou em “medidas rígidas”
O vídeo passou a circular novamente nas redes sociais, nos últimos dias, com legendas enganosas afirmando que os policiais militares teriam agredido um idoso que caminhava na rua em São Paulo. O boato é motivado por declarações recentes do governador João Doria, de que poderia tomar medidas mais rigorosas, como aplicação de multa e até prisão, caso a população não cumprisse as regras do isolamento social no feriado de Páscoa e na semana seguinte.
“Se não elevarmos esse nível, que hoje é de 50%, para mais de 60% e caminharmos para 70%, na próxima semana, não apenas o governo do Estado, como também a prefeitura de São Paulo, tomarão medidas mais rígidas”, disse em entrevista à Rede Globo, no dia 9 de abril.
Doria adotou tom mais ameno na segunda-feira (13), ao falar em “corrente de amor” e ações educativas em uma entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes. Ao longo da semana, afirmou ainda que o eventual aumento das restrições à circulação de pessoas só ocorreria a partir do próximo dia 22 e que as multas e prisões para quem descumprir a quarentena são encaradas como “última alternativa” pelo governo.
São Paulo é o Estado brasileiro que mais registra casos de covid-19 no país. Também foi o primeiro a confirmar uma infecção pelo novo coronavírus no Brasil, em 26 de fevereiro. Desde então, foram registradas 853 mortes e 11.568 casos, segundo informações divulgadas pelo Ministério da Saúde nesta quinta-feira (16), às 14h —quase o triplo do segundo colocado, o Rio de Janeiro, com 3.944 confirmações e 300 óbitos.
No Brasil, o número de pessoas infectadas é de 30.425 e o de mortes, 1.924, de acordo com o mesmo balanço. Além disso, a estimativa do governo paulista é de que todos os 3,5 mil leitos em Unidades de Terapia Intensiva (UTI) da rede pública estejam lotados até maio.
São Paulo está em quarentena desde 24 de março, em razão de decreto assinado por Doria como medida de controle da pandemia. A medida foi prorrogada pela 2ª vez nesta 6ª feira. A quarentena será mantida até 10 de maio.. O governo determinou o fechamento do comércio e de serviços não essenciais, como bares, restaurantes, cafés, casas noturnas e academias. A decisão abrange todos os 645 municípios paulistas.
Rivalidade com Bolsonaro
Mesmo depois de firmar a aliança “Bolsodoria” no segundo turno das eleições de 2018, o governador de São Paulo tem rivalizado com o presidente Jair Bolsonaro durante a gestão — embate que foi ampliado diante da crise do novo coronavírus no Brasil. No dia da publicação do primeiro decreto de isolamento social em São Paulo, Bolsonaro fez pronunciamento em rede nacional em que defendeu que autoridades deveriam “abandonar o conceito de terra arrasada” e criticou os líderes estaduais.
Os dois entraram em conflito em teleconferência no dia seguinte: Doria disse que o presidente “deveria dar exemplo para o país”, e Bolsonaro pediu que o governador “Saisse do palanque”. O governador ainda pediu, publicamente, no dia 30, que as pessoas “não sigam as orientações do presidente da República”. Foram registrados protestos de grupos bolsonaristas nos dias 5 e 11 de abril, na capital paulista, e ataques virtuais.
O ponto mais recente de atrito envolveu a demissão do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que protagonizou disputa com Bolsonaro sobre a política nacional de combate à pandemia em pontos como o isolamento horizontal e a eficácia da cloroquina no tratamento da doença. Dória apoiou Mandetta e chegou a afirmar que a saída do ministro seria um “desastre”. A demissão foi confirmada ontem (16). O substituto é Nelson Teich.
Viralização
O vídeo havia sido publicado em um perfil pessoal, no Facebook, e chegou a alcançar 16 mil visualizações até o dia 15. O material foi apagado. Desde o dia 4 de dezembro, quando foi postado na página Realidade Cruel, o material teve 8,6 mil comentários e 22 mil compartilhamentos (dados até o dia 17 de dezembro, às 11h37).
Este boato também foi verificado pelo G1, pela Agência Lupa e pelo Boatos.org. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/liberacao-de-uso-da-cloroquina-pela-agencia-reguladora-de-alimentos-e-drogas-dos-eua-nao-e-para-todos-os-pacientes/ | COMPROVA | Liberação de uso da cloroquina pela agência reguladora de alimentos e drogas dos EUA não é para todos os pacientes | null | 2020-04-16 | Ao contrário do que afirma um texto que viralizou no WhatsApp e no Facebook, a agência reguladora de alimentos e drogas dos Estados Unidos (FDA), não liberou o uso de cloroquina e hidroxicloroquina em todos os pacientes com covid-19, doença causada pelo novo coronavírus. E também é falso que a Novartis tenha anunciado a existência de estudos que comprovam que esses dois medicamentos “matam” o vírus
Não é verdade que a agência reguladora de alimentos e drogas dos Estados Unidos tenha liberado o uso de cloroquina e hidroxicloroquina em todos os pacientes com covid-19, doença causada pelo novo coronavírus. Também é falso que a empresa farmacêutica Novartis tenha anunciado a existência de estudos que comprovam que esses dois medicamentos “matam” o vírus. Essas alegações estão em um texto que viralizou em grupos de WhatsApp e no Facebook.
Em 28 de março, a Food and Drug Administration (FDA) emitiu uma autorização de uso emergencial de sulfato de hidroxicloroquina e fosfato de cloroquina em alguns pacientes hospitalizados com a covid-19. A agência permitiu a distribuição desses medicamentos para prescrição para adultos e adolescentes com peso acima de 50 quilos “conforme seja apropriado, enquanto um experimento clínico não estiver disponível ou não for viável”. A indicação de uso deve ser feita por um prestador de serviços médicos licenciado pela agência. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), ainda não há remédio ou vacina comprovadamente eficaz contra a covid-19.
Em um documento de perguntas e respostas sobre o assunto, a FDA esclarece que o uso de cloroquina e hidroxicloroquina não é aprovado para tratar infecções pelo novo coronavírus. Até agora, o uso aprovado para esses medicamentos é no tratamento de malária, lúpus e artrite reumatoide. A OMS faz a mesma recomendação.
A autorização de uso emergencial dos dois remédios permanecia válida até a publicação desta checagem.
O texto compartilhado nas redes sociais afirma ainda que o CEO da farmacêutica Novartis, Vasant Narasimhan, “anunciou que já tem em mãos os resultados de pesquisas que comprovam que a hidroxicloroquina mata o vírus”. A assessoria de imprensa informou ao Comprova por e-mail que a informação está distorcida. A Novartis esclareceu que Narasimhan “comentou que em estudos pré-clínicos o resultado foi promissor, mas não afirmou sobre o resultado final sobre os estudos de hidroxicloroquina”.
A companhia anunciou a doação de 130 milhões de doses de hidroxicloroquina “para apoiar a resposta global à pandemia da covid-19”. A farmacêutica informou estar desenvolvendo um protocolo para um estudo clínico avaliar a segurança e eficácia do uso do medicamento em pacientes da doença.
O Comprova verificou um conteúdo recebido por WhatsApp e compartilhado também em diversos perfis pessoais e páginas no Facebook e no Twitter,.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
O Comprova consultou a página oficial da FDA e entrou em contato com a assessoria de imprensa da Novartis no Brasil. A reportagem também acessou o site oficial da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
O que significa a autorização de uso emergencial da FDA
De acordo com a FDA, o uso emergencial permite a facilitação do acesso a “medicamentos, produtos biológicos, vacinas e dispositivos médicos” que podem ser usados para “diagnosticar, tratar ou prevenir uma doença ou condição grave durante uma emergência de saúde pública”.
Os produtos autorizados não necessariamente são aprovados pela FDA para uso. ”Esta autorização é reservada para situações de emergência e NÃO é o mesmo que aprovação ou licenciamento da FDA”, informa a agência. Para decidir sobre o uso emergencial, a FDA considera que os benefícios conhecidos e potenciais do remédio superam seus riscos.
O que a Novartis anunciou sobre hidroxicloroquina
A empresa farmacêutica anunciou a doação de 130 milhões de doses do medicamento, e informou cooperar com governos e autoridades, inclusive a OMS , “para usar protocolos de tratamento padrão para pacientes hospitalizados”. De acordo com a companhia, a hidroxicloroquina é administrada como parte de um “regime terapêutico”, para evitar a “deterioração” de pacientes com a covid-19.
Em comunicado, a Novartis ressaltou que “embora os resultados iniciais dos estudos da utilização da droga em casos de covid-19 tenham sido promissores, ainda não há nenhum tratamento aprovado disponível e não endossamos o uso de nenhum de nossos produtos fora das especificações de seus respectivos registros”.
Qual o preço da cloroquina e da hidroxicloroquina
O texto cita o baixo custo como uma das vantagens dessa medicação. Segundo tabela da Anvisa, o preço máximo de venda de remédios com princípio ativo de hidroxicloroquina varia entre R$ 22,93 (caixa com 10 comprimidos fabricada pela EMS com alíquota de ICMS a 12%) e R$ R$ 180,15 (caixa com 60 comprimidos fabricada pela EMS com alíquota de ICMS a 20%).
Em remédios com princípio ativo de difosfato de cloroquina, o valor da caixa com 10 comprimidos produzida pela Cristália Químico vai de R$ 186,95 a R$ 205,64, dependendo da alíquota de ICMS em cada Estado.
Esses valores são superiores ao preço citado no texto, de US$ 4,65 por mês (R$ 24,37, em cotação do dia 15 de abril de 2020).
Quem é o autor do texto
O texto foi originalmente publicado pela página de Facebook “jornalista Elisa Robson” no dia 30 de março. Nesse perfil, ela se identifica como “jornalista da direita clássica, defensora do liberalismo econômico e conservadora nos valores da família, educação e cultura.”
No post original, Elisa cita como fontes os sites da FDA, da Novartis, e reportagens da Reuters, Forbes, Money Invest e Economic Times. No dia 11 de abril, ela editou a postagem para modificar a frase que falava que a FDA liberou a cloroquina para todos os pacientes da covid-19.
Em uma transmissão ao vivo no dia 13 de abril, ela comentou sobre a viralização do texto em grupos de WhatsApp e reclamou da cobertura da “imprensa fúnebre” sobre o novo coronavírus.
O nome completo de Elisa Robson é Elisângela Machado dos Santos de Freitas. Ela se candidatou a deputada federal nas eleições de 2018 pelo PRP. No ano passado, a Folha de S. Paulo revelou que Elisângela repassou ao próprio marido 59% dos recursos que recebeu do fundo eleitoral, um montante de R$ 14,9 mil.
Na época em que a reportagem foi publicada, ela era assessora parlamentar do senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro. A jornalista foi exonerada após a repercussão do caso.
Viralização
Leitores do Comprova solicitaram a checagem deste conteúdo por WhatsApp (11 97795-0022). O post de Elisa Robson, feito no Facebook no dia 30 de março, teve 738 compartilhamentos. Dezenas de páginas também compartilharam essa informação no Facebook.
Aos Fatos e Agência Lupa também checaram esse conteúdo. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-pesquisadores-de-harvard-concluiram-que-isolamento-pode-piorar-a-situacao/ | COMPROVA | É falso que pesquisadores de Harvard concluíram que isolamento pode piorar a situação | null | 2020-04-15 | Segundo o estudo em questão, a rápida implementação de medidas duras de distanciamento social é essencial para ajudar a controlar a epidemia do novo coronavírus
É falso que pesquisadores de Harvard teriam concluído que as medidas de distanciamento social impostas na maior parte do mundo contra o novo coronavírus podem “piorar a situação” da pandemia, como é dito em um texto publicado em sites e redes sociais. Também não é verdade que os mesmos pesquisadores teriam referendado as medidas aplicadas na Suécia, consideradas mais leves que as da maioria dos países.
Ao contrário do que diz o texto investigado, os pesquisadores de Harvard afirmam que as simulações realizadas por eles vão ao encontro de outros estudos que concluem que a rápida implementação de regras duras para o distanciamento social é essencial para ajudar a controlar a epidemia do novo coronavírus. O estudo em questão também conclui que, sob as atuais condições, a implantação de medidas de distanciamento social em períodos intermitentes pode ser a melhor maneira de evitar que hospitais esgotem a sua capacidade de atendimento.
A pesquisa foi publicada no site científico MedRxiv, uma plataforma dedicada a divulgar trabalhos que ainda aguardam “revisão por pares” — termo que se refere ao processo de validação dos métodos e conclusões das publicações científicas por outros especialistas da área. Trata-se, portanto, de um relatório preliminar que não pode orientar práticas clínicas, destaca o Cold Spring Harbor Laboratory (CSHL). A instituição gerencia a plataforma com a Universidade de Yale e o periódico BMJ.
Ao jornal The New York Times, John Inglis, co-fundador do MedRxiv, afirmou que audiência da plataforma aumentou mais de 100 vezes desde dezembro. Isso gera preocupação porque o site, que tem como objetivo facilitar a troca de informações entre pesquisadores diante de emergências de saúde como a atual, tem sido utilizado como base para a propagação de rumores e falsidades, aumentando a desinformação a respeito da pandemia.
O Comprova verificou informações contidas em um texto publicado no site Mix Misturado e republicado posteriormente pelo site Agora Notícias Brasil.
Falso para o Comprova é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
O Comprova apurou a origem do boato ao pesquisar diferentes trechos do texto no Google. O resultado indica que o site “Mix Misturado” foi o primeiro a espalhar conclusões equivocadas sobre o estudo e envolver a Suécia. A investigação prosseguiu com a verificação do conteúdo do artigo usado como base pelo site “Mix Misturado”. O link do estudo original leva para um arquivo em formato PDF publicado na página do programa Dash, mantido pela biblioteca da Universidade Harvard.
Ao buscar o título do artigo – “Social distancing strategies for curbing the COVID-19 epidemic” – é possível conferir que o estudo está de fato publicado na página. Ao buscar o título no Google, encontramos o mesmo texto no MedRxiv.
Na sequência, o Comprova realizou uma leitura do estudo e constatou diversas discrepâncias entre o que concluem os pesquisadores e o que diz o site Mix Misturado. Não há, por exemplo, nenhuma referência à Suécia no artigo, ao contrário do que afirma o site.
Também verificamos as medidas aplicadas pela Suécia no controle da epidemia por meio de página oficial do governo local, disponível em inglês. Regras para prevenção foram adotadas — ainda que em “baixa-escala”, como defenderam as autoridades locais — desde 11 de março. Também comparamos estatísticas de casos e mortes por Covid-19 na Suécia com as de outros países da Escandinávia.
O Projeto Comprova entrou em contato com a autora do texto, Cilene Bonfim, pelo Twitter, na terça-feira, 14, para buscar esclarecimentos sobre o conteúdo, mas não recebeu retorno.
Nota de atualização (17/4) — A autora do texto entrou em contato com a reportagem após a publicação desta notícia e respondeu a perguntas do Comprova. Por e-mail, foi questionada a respeito das diferenças entre o que é relatado pelos pesquisadores de Harvard em artigo e o que consta no material do site Mix Misturado. Cilene Bonfim afirma que fez uma “contextualização” do relatório da pesquisa e insistiu em suas conclusões. “Não existe nenhuma informação falsa no meu artigo”, escreve. “Eu nem disse o que eu penso sobre o assunto, apenas relatei os fatos e não fatos falsos, como vocês publicaram”. O Comprova também notou uma série de edições no texto do site Mix Misturado após a publicação desta verificação, incluindo título, URL e citações checadas pela equipe.
Quem são os autores do estudo?
O estudo é assinado por quatro pesquisadores da Escola de Saúde Pública de Harvard. São eles Stephen Kissler, doutor em Matemática Aplicada pela Universidade de Cambridge e pesquisador no Departamento de Imunologia e Doenças Infecciosas; Christine Tedijanto, estudante de doutorado na área de Epidemiologia de Doenças Infecciosas; Marc Lipsitch, professor nos departamentos de Epidemiologia e Imunologia e Doenças Infecciosas; e Yonatan Grad, professor do Departamento de Imunologia e Doenças Infecciosas da instituição.
Quais são os objetivos do estudo?
O estudo destaca que alguns locais, como Cingapura e Hong Kong, conseguiram controlar a epidemia por meio de uma estratégia que envolveu testes intensivos, rastreamento dos infectados e isolamento. Outro países, no entanto, não têm bons sistemas de saúde e capacidade de testar. Entre esses dois polos na capacidade de mobilização, muitos governos estão adotando como alternativa o distanciamento social: o objetivo aqui é “achatar a curva” do contágio, evitando a lotação dos sistemas de saúde e ganhando tempo para a descoberta de uma vacina.
O estudo parte de duas preocupações. A primeira é que essas medidas de distanciamento social podem permanecer ativas por um longo período. Assim, é necessário estimar cenários futuros. Os pesquisadores destacam, também, que ainda não se sabe se o novo coronavírus está sujeito, assim como outros vírus respiratórios, a variações sazonais. Se estiver, dizem eles, deve ser mais difícil achatar a curva no inverno do que no verão.
Outra preocupação gira em torno da capacidade dos governos de proverem cuidados intensivos. A pesquisa tenta avaliar o impacto, na trajetória geral da pandemia, do aumento desta capacidade.
Como o estudo foi feito?
O estudo tem como base modelos matemáticos capazes de projetar tanto o número de infecções quanto a capacidade dos hospitais. Os cálculos levam em conta um cenário em que 95,6% dos pacientes são assintomáticos ou têm efeitos considerados leves; 3,08% requerem internação, mas não em UTIs, e que 1,32% precisarão deste cuidado crítico.
Além disso, assumem o valor de 0,89 leito livre a cada 10 mil habitantes como o mínimo para garantir o atendimento hospitalar para a população. Esse número reflete a situação atual dos Estados Unidos.
Os pesquisadores alertam, ainda, que os resultados devem ser entendidos como o “pior cenário” possível, pois o modelo leva em conta que cada pessoa tem a mesma possibilidade de ser infectada. Na realidade, os cenários reais contêm diferença na estrutura da população, com alguns grupos mais propensos a serem infectados e outros, menos.
A partir desses números, simulações são realizadas em diversos cenários, modificados conforme os dados usados pelos cientistas e as estimativas de variação sazonal.
Quais os resultados do estudo?
O estudo chegou a vários resultados conforme o cenário simulado. Nos testes sem influência sazonal, os pesquisadores estimam que um período único de distanciamento social de fato reduz o pico da epidemia, mas que a infecção tem alta quando tais medidas são relaxadas.
Outra conclusão é de que períodos mais longos com medidas duras de distanciamento social nem sempre geram reduções grandes no pico de infecção. No caso de uma “quarentena” de 20 semanas com redução de 60% no “número básico de reprodução”, o pico após o fim do distanciamento social poderia ser quase o mesmo de um cenário sem nenhuma medida. Isso ocorreria, diz o estudo, porque um distanciamento social tão rigoroso protegeria tanto a população que poucos adquiririam imunidade.
Nos cenários em que as estações do ano influenciam a epidemia, o pico ressurgente (após o fim das medidas de distanciamento social) poderia ser ainda maior que o pico caso nada fosse feito. Isso porque, neste cenário, as medidas da distanciamento social seriam encerradas no fim do outono e começo do inverno, justamente quando as síndromes respiratórias se espalham mais.
O que significa tudo isso?
É neste ponto que o site “Mix Misturado” afirma, equivocadamente, que os pesquisadores teriam concluído que o isolamento pode piorar a situação. Não é essa a conclusão.
Em primeiro lugar, cabe destacar que ainda não se sabe se o contágio pelo novo coronavírus é influenciado pela sazonalidade. Em segundo lugar, os pesquisadores são claros ao dizer que o distanciamento social é, sim, efetivo para conter a epidemia em seu início. O que o estudo discute é a duração dessas medidas e o possível impacto delas conforme os vários cenários analisados.
De acordo com os pesquisadores, mais que longos períodos de distanciamento social, é uma estratégia intermitente com diversos períodos de distanciamento social que pode evitar que a capacidade hospitalar seja superada. A distância entre esses períodos aumentaria à medida que mais pessoas adquirissem imunidade nos intervalos das “quarentenas”.
O estudo alerta ainda que, sob as condições atuais do sistema hospitalar dos Estados Unidos, essa estratégia de períodos intermitentes de distanciamento social teria de durar até 2022. Assim, os pesquisadores indicam que se os Estados Unidos aumentarem sua capacidade de prover cuidados hospitalares intensivos, a população poderá acumular imunidade mais rapidamente e tanto a duração da epidemia quanto os períodos de distanciamento social tendem a ser menores.
Quais as conclusões do estudo?
Os pesquisadores afirmam que as simulações realizadas estão de acordo com outros estudos, segundo os quais a rápida implementação de medidas duras de distanciamento social é essencial para controlar a epidemia do novo coronavírus.
Ao mesmo tempo, afirmam que, “na ausência do desenvolvimento de novas terapias ou medidas preventivas, como uma busca ativa pelos casos [infectados] e quarentena, medidas intermitentes de distanciamento devem ser a única forma de não sobrecarregar a capacidade hospitalar enquanto a população adquire imunidade ao vírus”.
O estudo destaca que a estratégia de impor períodos intermitentes de distanciamento social só pode ser colocada em prática se houver uma forma sofisticada de medir a prevalência da infecção na população. Na ausência dessa capacidade, a disponibilidade de leitos hospitalares pode ser usada como uma variável substituta, mas como a doença não se manifesta imediatamente após o contágio, os hospitais podem acabar sobrecarregados.
Qual a realidade da Suécia?
Ainda que o país não seja citado no artigo dos pesquisadores de Harvard, o Comprova verificou informações quanto ao cenário da pandemia na Suécia e às medidas governamentais adotadas, denominadas de “baixa-escala,” pelas autoridades locais.
Essa abordagem vem sendo criticada por especialistas de fora do governo. Em 14 de abril, 22 especialistas publicaram uma carta aberta no jornal Dagens Nyheter afirmando que as “autoridades de saúde pública falharam” e pedindo medidas mais duras.
Na comparação com os vizinhos da Escandinávia, os números suecos são piores. Para verificar isso, o Comprova utilizou estatísticas populacionais do Eurostat, o departamento oficial de estatísticas da União Europeia, e a base de dados sobre casos e mortes provocadas pelo novo coronavírus montada pela Universidade Johns Hopkins, dos EUA.
A Suécia é o maior país da Escandinávia, com uma população de 10,2 milhões de pessoas, quase o dobro de Dinamarca (5,8 milhões), Finlândia (5,5 milhões) e Noruega (5,3 milhões). O país registrou 1.203 mortes até 15 de abril, 3,8 vezes mais que a Dinamarca (309 mortes), oito vezes mais que a Noruega (72 mortes) e quase 17 vezes mais que a Finlândia (72 mortes).
A Suécia tem diversas medidas restritivas em prática. O texto do site “Mix Misturado”, também desinforma ao afirmar que os suecos “não fecharam nada e não proibiram nada” diante da pandemia do novo coronavírus, o que não é verdade. Informações retiradas de site oficial do governo da Suécia mostram que o país aplica medidas de prevenção ao menos desde 11 de março, quando decidiu proibir aglomerações e eventos públicos com mais de 500 pessoas.
A restrição foi ampliada no dia 29, quando aglomerações e eventos de 50 pessoas ou mais passaram a ser banidas. A punição para quem organizar esse tipo de encontro vai de multa até 6 meses de prisão, e a polícia está autorizada a dispersar os indivíduos.
Ainda em março, a Agência de Saúde Pública da Suécia recomendou aulas a distância para escolas secundárias e de educação para adultos, faculdades e universidades — afetando estudantes com mais de 16 anos. Escolas primárias (6 a 16 anos) e pré-escolas não foram incluídas na medida e podem operar normalmente.
O governo também sugeriu a adoção de home office aos trabalhadores, principalmente na região de Estocolmo, e proibiu aglomerações em restaurantes, bares e cafés — os clientes precisam comer e beber sentados, mantendo distância uns dos outros, ou levar as mercadorias para casa. Autoridades locais podem fechar estabelecimentos que não cumprirem as regras desde o dia 25 de março.
As viagens pelo território sueco foram desaconselhadas pelos órgãos de saúde, sobretudo em zonas metropolitanas. Já para os cidadãos com sintomas de Covid-19, a orientação do governo é de que não viajem de qualquer maneira. Atualmente, vigoram ainda proibições de viagens não essenciais da Suécia para alguns países da União Europeia e de países de fora da Europa para o território nacional.
No início de abril, o governo da Suécia determinou a proibição de visitas às casas de repousos de idosos, considerado grupo de risco para o novo coronavírus. Diversas localidades do país já haviam introduzido algum tipo de medida restritiva semelhante na ocasião. Pessoas com mais de 70 anos também foram orientadas a evitar farmácias, mercados e eventos sociais.
No último dia 7, diante da escalada do número de infectados no país, o primeiro-ministro da Suécia, Stefan Löfven, encaminhou proposta para que o legislativo autorize medidas mais restritivas de controle do novo coronavírus. O governo afirma considerar limitações temporárias de aglomerações, fechamento de shopping centers e outros estabelecimentos comerciais e suspensão de transporte, entre outras ações, caso a proposta seja aprovada. A ampliação dos poderes seria aplicada durante três meses, entre 18 de abril e 30 de junho.
Viralização
Desde a publicação, o link do site Mix Misturado teve mais de 21 mil interações no Facebook e 11,5 mil no Twitter, de acordo com a ferramenta de monitoramento de redes sociais CrowdTangle. O link para o texto foi compartilhado no Twitter por perfis como @leandroruschel e o do Agora Notícias Brasil pelo perfil @rosedbarros.
Esse conteúdo também foi verificado pelo site Boatos.org. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/desembargador-e-advogados-nao-acionaram-forcas-armadas-contra-stf-e-governadores/ | COMPROVA | Desembargador e advogados não acionaram Forças Armadas contra STF e governadores | null | 2020-04-15 | Forças Armadas não foram chamadas para prender ministros do Supremo Tribunal Federal. Desembargador e advogado negam autoria de petição citada em um vídeo publicado no YouTube
É falsa a informação veiculada em vídeo no YouTube de que as Forças Armadas foram chamadas às pressas para prender ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) em função de uma decisão que retiraria poderes e competências do presidente da República.
Publicado em 11 de abril, o vídeo afirma que o jurista Modesto Carvalhosa, o desembargador aposentado Laércio Laurelli e o advogado Luís Carlos Crema acionaram as Forças Armadas contra o STF e governadores. O vídeo atingiu rapidamente 430 mil visualizações.
O conteúdo do vídeo é mais uma versão de boatos que circularam nas redes sociais e aplicativos de mensagem e que citam Laurelli e Carvalhosa como co-autores de uma petição elaborada pela equipe do advogado Luís Carlos Crema para pedir que a União garanta, mediante ação das Forças Armadas, a execução unificada em todo o território nacional de medidas contra os impactos da pandemia do novo coronavírus. A petição foi elaborada no dia 6 de abril.
Já no dia 7 de abril, os juristas em questão fizeram declarações públicas em seus respectivos perfis nas redes sociais negando que tenham entrado em conjunto com a petição. O próprio Crema negou a participação dos juristas em uma postagem em sua página no Facebook. Ele também reafirma que “o objetivo (da petição) é tão-somente que todos os brasileiros tenham tratamento igualitário em todo o território nacional”.
O Comprova verificou o conteúdo de um vídeo publicado no canal Notícias da Hora, no YouTube e postagens no blog do Edgar Ribeiro, no site NBO e em um perfil pessoal no Facebook.
Falso para o Comprova é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
O Comprova entrou em contato com os três juristas citados. Carvalhosa e Laércio Laurelli já haviam se posicionado em suas redes sociais e negado assinatura da peça. O próprio advogado Luis Carlos Crema escreveu em sua página no Facebook que os outros dois não faziam parte da equipe que redigiu a petição.
O Comprova ainda entrou em contato com o escritório do advogado que confirmou o protocolo da petição junto à Presidência da República.
O que dizem os juristas
Modesto Carvalhosa publicou em seu perfil oficial no Facebook: “Soube que tem circulado uma petição eletrônica, com minha assinatura, que requer ao Presidente da República a intervenção das Forças Armadas em decorrência da pandemia do novo Coronavírus. Não redigi essa petição, não assinei essa petição, não autorizei que ninguém apusesse minha assinatura em tão rematado absurdo.”
Carvalhosa é professor aposentado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Participou da Comissão Especial de Investigação criada pelo então presidente Itamar Franco para apurar o escândalo dos Anões do Orçamento.
No mesmo dia, Luís Carlos Crema confirmou, também em seu Facebook, que a petição não teve o apoio e nem a assinatura de Carvalhosa ou do desembargador Laercio Laurelli. Posteriormente, em entrevista sobre o tema, Crema disse que defende uma intervenção pontual e não que os militares assumam o poder. Crema é advogado e autor de ao menos cinco pedidos de impeachment contra a ex-presidente Dilma Rousseff.
O terceiro jurista mencionado no vídeo, Laércio Laurelli, é desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo. Foi o primeiro secretário-geral do Grupo de Apoio à Justiça e membro do Conselho Consultivo da Comissão de Direito Penal Militar da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção São Paulo.
Carvalhosa, Laurelli e Crema já compartilharam a autoria de várias petições, incluindo pedido de impeachment contra o presidente do STF, Dias Toffoli, e os ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes. Os pedidos, no entanto, são anteriores à crise provocada pela pandemia do novo coronavírus. Todos foram engavetados pelo Senado. O trio também já pediu o cancelamento do registro de nove partidos acusados na Operação Lava Jato.
Decisão do STF
Respondendo a um pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu no dia 8 de abril que estados e municípios podem estabelecer políticas de isolamento social no combate ao avanço do novo coronavírus. Isso significa que o governo federal não pode interferir nessas medidas.
A OAB havia pedido ao STF que obrigasse o presidente Jair Bolsonaro a respeitar as decisões dos governadores; não interferir no trabalho técnico do Ministério da Saúde; e seguir o protocolo da Organização Mundial de Saúde (OMS).
Em sua decisão, o ministro cita a existência de “grave divergência de posicionamentos entre autoridades de níveis federativos diversos e, inclusive, entre autoridades federais componentes do mesmo nível de governo, acarretando insegurança, intranquilidade e justificado receio em toda a sociedade”.
Moraes diz ainda que “Não compete ao Poder Executivo federal afastar, unilateralmente, as decisões dos governos estaduais, distrital e municipais que, no exercício de suas competências constitucionais, adotaram ou venham a adotar, no âmbito de seus respectivos territórios, importantes medidas restritivas (…) reconhecidamente eficazes para a redução do número de infectados e de óbitos, como demonstram a recomendação da OMS (Organização Mundial de Saúde) e vários estudos técnicos científicos”.
Divergências com governadores
As divergências entre os poderes Executivos federal e estadual começaram no início de fevereiro, quando Bolsonaro desafiou os chefes dos entes a zerar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), dizendo que estava preparado para zerar os impostos federais sobre os combustíveis como resposta.
O pano de fundo do comentário do presidente envolvia pressões para que o preço da gasolina nos postos caísse, acompanhando os cortes anunciados pela Petrobras no valor do combustível às refinarias.
Foi uma questão de dias até que o clima de tensão entre Bolsonaro e os governadores atingisse um novo pico, mas, desta vez, relacionado às estratégias de combate à disseminação da Covid-19 no país.
“Estão tomando medidas, no meu entender, exageradas. Fecharam o aeroporto do Rio de Janeiro. Não compete a ele, meu Deus do céu! Parece que o Rio de Janeiro é um outro país.”, disse Bolsonaro, no dia 20 de março, diante da intenção do governador Wilson Witzel de isolar o Rio para transportes de passageiros.
Bolsonaro já se posicionou diversas vezes contra o isolamento social e entrou em atrito com governadores que adotaram medidas de restrição aos transportes e ao comércio. Ele foi alvo de críticas de seu ex-aliado Ronaldo Caiado (DEM), governador de Goiás, e trocou acusações com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), durante uma reunião com os governadores do Sudeste.
Artigo 142
O vídeo também sugere que uma eventual intervenção militar seria sustentada pelo artigo 142 da Constituição, o que também é falso, já que a lei brasileira não permite que uma decisão desse tipo seja tomada somente pelo Executivo, sem o aval do Congresso.
Não é a primeira vez que esse artigo surge de forma distorcida em conteúdos virais. Ele diz o seguinte: “As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”. Em outras palavras, o que a lei quer dizer é que o presidente da República é o chefe maior das Forças Armadas.
Viralização
O vídeo publicado no canal Notícias da Hora YouTube tinha 466 mil visualizações no dia 15 de abril. O post do site NBO teve 55 mil interações no Facebook e 733 no Twitter. informação também foi replicada em um perfil pessoal no Facebook, que teve mais de 15 mil compartilhamentos.
A verificação desse conteúdo também foi feita pelo site Boatos.org e pela Agência Lupa. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Políticas públicas'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/acusacao-de-que-china-contaminou-mascaras-com-coronavirus-foi-inventada-por-autor-de-audio/ | COMPROVA | Acusação de que China contaminou máscaras com coronavírus foi inventada por autor de áudio | null | 2020-04-14 | Em contato com o Comprova, o responsável por uma gravação que viralizou no WhatsApp disse que a fonte de suas alegações era “ele mesmo” e que a prova era “o próprio áudio”
Circula em grupos de WhatsApp um áudio em que um homem afirma que as máscaras de proteção exportadas pela China estão infectadas com o novo coronavírus. A alegação é falsa. O Comprova entrou em contato com o autor da gravação, que não ofereceu nenhuma evidência de que isso seja verdade. Ele também não citou fontes que corroborassem sua teoria.
A reportagem também consultou o médico infectologista Jean Gorinchteyn, do Hospital Emílio Ribas, em São Paulo, que classificou o boato como “bobagem”. O especialista afirmou ser impossível que as máscaras chegassem infectadas da China. “Pelo tempo que demoraria a produção e o transporte da máscara, o vírus não sobreviveria”, explicou ele.
Um estudo publicado na revista científica The New England Journal of Medicine aponta que o SARS-CoV-19 (nome oficial do novo coronavírus) pode ser detectado por até 72 horas em superfícies de plástico e até 24 horas em papelão. Os pesquisadores concluíram que a quantidade de vírus cai exponencialmente ao longo do tempo.
No dia 8 de abril, o Ministério da Saúde anunciou ter comprado da China 240 milhões de máscaras para proteger profissionais de saúde que atendem pacientes com a covid-19. A encomenda tem 960 toneladas, que serão transportadas em quarenta voos que chegarão ao Brasil em duas semanas. Desde o anúncio, boatos sobre contaminação de máscaras têm circulado em aplicativos de mensagens e em perfis, páginas e grupos de redes sociais.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
O autor do áudio fala seu nome e diz ser cantor, compositor e estudante de Medicina. O Comprova encontrou um canal do YouTube que atendia à descrição feita no áudio e entrou em contato com o número de telefone divulgado na página.
O Comprova também consultou o médico infectologista Jean Gorinchteyn, do Hospital Emílio Ribas, para saber da possibilidade de contaminação de máscaras por coronavírus.
Quem é o autor do áudio
A voz no áudio se identifica como Rodrigues Filho. Por telefone, ele afirmou que a fonte de suas alegações sobre máscaras importadas da China era “ele mesmo” e que a prova era “o próprio áudio”.
O cantor disse ainda que todas as pessoas que estão com coronavírus foram infectadas por máscaras chinesas. A reportagem perguntou se ele tinha realizado testes em máscaras ou se ele mesmo tinha sido infectado, mas Rodrigues negou.
Por WhatsApp, o Comprova voltou a pedir provas ao cantor, mas ele não ofereceu nenhuma evidência de qualquer tipo.
Viralização
O áudio foi distribuído em 43 grupos de WhatsApp monitorados pelo Monitor de WhatsApp da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) nos dias 10 e 11 de abril. Conteúdo semelhante foi encontrado em dezenas de páginas e grupos no Facebook e em publicações no Twitter. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/hospital-nega-que-tenha-tratado-o-primo-antonio-carlos/ | COMPROVA | Hospital nega que tenha tratado o “primo Antonio Carlos” | null | 2020-04-09 | Hospital Unimed-Rio nega que tenha atendido paciente chamado Antonio Carlos, de 67 anos, curado da covid-19 com cloroquina, características descritas em um tuíte que viralizou.
O Hospital Unimed-Rio nega que um paciente com as características descritas em um tuíte que viralizou nas redes sociais tenha sido tratado na instituição. O paciente seria um homem chamado Antonio Carlos, de 67 anos, primo do autor do tuíte, e que teria sido curado da covid-19 com o uso do medicamento cloroquina no hospital localizado na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.
O autor do post afirma que tinha acabado de sair do Hospital Unimed da Barra, onde o “primo Antonio Carlos de 67 anos”, detectado há 16 dias com covid-19, havia sido curado após tratamento com cloroquina.
A mensagem viralizou e foi copiada por uma série de perfis no Twitter e também no Facebook. Muitas pessoas reuniram os posts de diferentes contas das redes sociais para ironizar a quantidade de primos que Antonio Carlos possuiria.
Alguns perfis perguntaram ao autor do post original se ele tinha parentesco com outras pessoas que publicaram o mesmo post, dizendo ser primas de “Antonio Carlos”.
O Comprova verificou a veracidade do conteúdo publicado no Twitter pelo perfil @marcelloneves72 no dia 7 de abril. O perfil tinha 45 mil seguidores na tarde do dia 9 de abril.
Nesta quarta-feira, 8 de abril, Marcello voltou a afirmar, em resposta a uma publicação do presidente Jair Bolsonaro no Twitter a respeito do uso de hidroxicloroquina, que seu primo havia sido curado pelo medicamento.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
Para verificar o conteúdo da mensagem, o Comprova entrou em contato com a Unimed-Rio. Por email, a Instituição informou desconhecer “o referido atendimento ao paciente Antonio Carlos, de 67 anos, diagnosticado com a covid-19”. Questionada se algum paciente tinha sido curado ou tratado com cloroquina na unidade, a Unimed-Rio disse que “segue todas as orientações do Ministério da Saúde para o tratamento dos casos suspeitos ou confirmados da doença”.
O Comprova também tentou falar com Marcello Neves para saber sobre o “primo Antonio Carlos”. A equipe encaminhou mensagens pelo Twitter, que não foram respondidas. Logo em seguida, Marcello restringiu o acesso à sua conta na rede social.
A cloroquina tem sido alvo de debate no país para o tratamento da covid-19. O presidente Jair Bolsonaro tem tratado o medicamento como uma possibilidade de cura da doença e incentivado o uso pelos médicos para acabar com o isolamento social.
A substância, juntamente com a hidroxicloroquina, tem sido administrada em pacientes infectados pelo novo coronavírus por instituições brasileiras e internacionais, mas ainda não há elementos científicos suficientes que assegurem a sua eficácia. O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, tem alertado para os efeitos colaterais do uso indiscriminado do medicamento, como arritmia cardíaca.
Viralização
A mensagem publicada no Twitter tinha 12,5 mil curtidas e 3,7 mil retuítes na tarde da quinta-feira, 9 de abril.
A verificação desse conteúdo também foi feita pelo site Catraca Livre. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falso-que-o-hospital-das-clinicas-de-sao-paulo-nao-tenha-pacientes-com-covid-19/ | COMPROVA | É falso que o Hospital das Clínicas de São Paulo não tenha pacientes com covid-19 | null | 2020-04-09 | Um vídeo que circula pelas redes sociais mostra imagens de outro hospital, que fica em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. Ele também tem pacientes internados com a covid-19
É falsa a alegação que circula em vídeos compartilhados no Facebook e em canais no YouTube de que o Hospital das Clínicas de São Paulo não tem nenhum paciente infectado pela covid-19 – doença causada pelo novo coronavírus – internado na UTI (Unidade de Tratamento Intensivo). Até 7 de abril, a instituição já tinha recebido 256 pacientes com covid-19, sendo que 120 deles estavam internados na UTI.
As imagens que circulam como sendo do HC de São Paulo foram feitas em 3 de abril, no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, a 310 quilômetros da capital. No dia da gravação, 11 pacientes infectados pela covid-19 estavam internados no HC-FMRP, todos em estado grave.
O Comprova verificou o conteúdo do vídeo em postagens em um perfil pessoal e na página Eu sou mais Brasil, no Facebook, e no canal Paulo Pavesi no Brasil, no YouTube.
Falso para o Comprova é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
O Comprova entrou em contato com a assessoria de imprensa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, maior hospital público da América Latina, que sugeriu que as imagens poderiam ser do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Também fizemos contato com a assessoria de imprensa do HC-FMRP. Ambas instituições são administradas pela Universidade de São Paulo.
Também tentamos entrar em contato com as pessoas que publicaram o vídeo com informações falsas nas redes sociais.
Quem é o autor da publicação?
O Comprova conversou com autor da postagem no Facebook que trazia o vídeo que mais teve compartilhamentos. Trata-se de um homem, de Cuiabá. Ele afirmou que recebeu o conteúdo pelo WhatsApp e resolveu postar em seu perfil. Disse que não sabia quem era o autor das imagens.
O vídeo mais antigo que o Comprova encontrou foi postado no YouTube em 5 de abril. O autor também postou as imagens no Facebook. Ele não respondeu às nossas tentativas de contato.
A assessoria de imprensa do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto informou ao Comprova que conseguiu identificar o homem responsável pela gravação das imagens, mas não quis informar de quem se trata. Segundo o hospital, ele não conversou com nenhuma funcionária da instituição, ao contrário do que afirma no vídeo. O departamento do jurídico do HC-FMRP estuda tomar providências contra a pessoa que fez a gravação.
Onde as imagens foram feitas?
A pessoa que gravou o vídeo afirma que está “no balcão 5 do Hospital das Clínicas de São Paulo”, mas não esclarece que as imagens foram feitas no HC de Ribeirão Preto, e não no da capital paulista. Até a quarta-feira, 08 de abril, havia 4946 casos confirmados de covid-19 na cidade de São Paulo e apenas 36 em Ribeirão Preto, como informa um balanço do governo do Estado.
O “balcão 5” é um corredor de acesso ao ambulatório geral do HC-FMRP. O movimento nesta área é baixo atualmente porque apenas os doentes graves estão sendo atendidos. Casos de menor complexidade estão sendo reagendados para priorizar o combate ao novo coronavírus.
Com isso, o número de consultas caiu de 3.000 para 500 por dia. “As medidas foram tomadas para proteger os pacientes que fazem parte dos grupos mais vulneráveis ao coronavírus”, afirmou, por e-mail, a assessoria de imprensa do HC-FMRP Até o momento da checagem, no dia 08 de abril, 11 pacientes infectados com a covid-19 permaneciam internados no hospital.
O diretor do HC-FMRP, Antonio Pazin Filho, publicou um vídeo em que esclarece como funciona a triagem dos pacientes que chegam ao hospital. “Nós estamos, com isso, demonstrando que estamos nos preparando para enfrentar essa pandemia e tudo que não precisamos neste momento são fake news divulgadas da forma irresponsável como foram feitas nessa última vez”, afirma.
Viralização
A postagem no Facebook com o vídeo e que mais viralizou foi compartilhada, 2,2 mil. No YouTube, o vídeo mais antigo foi postado em 5 de abril, dois dias depois que as imagens foram captadas, e teve 10.704 visualizações até a quarta-feira 8 de abril. O homem que publicou o vídeo no YouTube também postou as imagens no Facebook, mas elas foram compartilhadas apenas 35 vezes até a data.
O conteúdo verificado pelo Comprova também foi publicado em outras contas de Twitter, Facebook e YouTube, todas com menos de 100 compartilhamentos até o dia 8 de abril. Entre o dia 5 e o dia 7 também foram publicados no YouTube ao menos dez vídeos com o mesmo tom alarmista denunciando hospitais vazios em Juiz de Fora (MG), Maringá (PR), Taguatinga (DF), além de outro vídeo que visitava unidades de atendimento de saúde menores em Ribeirão Preto. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/video-de-grupo-bolsonarista-engana-ao-falar-em-mobilizacao-nacional-para-a-reabertura-do-comercio/ | COMPROVA | Vídeo de grupo bolsonarista engana ao falar em “mobilização nacional para a reabertura do comércio” | null | 2020-04-09 | Não existe um movimento organizado para a abertura do comércio ou a realização de promoções nesta semana
O vídeo que divulga a “Semana Nacional de Reabertura do Comércio” e a “Semana Bolsonaro” tem informações enganosas sobre uma mobilização nacional para a retomada das atividades comerciais no país. Não existe um movimento organizado para a abertura do comércio ou a realização de promoções nesta semana.
No último domingo, 5 de abril, um grupo denominado “Soberanistas” postou no Youtube um vídeo anunciando a reabertura do comércio com promoções a partir do dia 7 de abril, chamada de “Bolsonaro Week”. A mensagem propunha que todos os estabelecimentos abrissem as portas e que consumidores saíssem às ruas para fazer compras, apesar da política de isolamento social que vem sendo adotada no país como estratégia de combate à pandemia de covid-19 – doença causada pelo novo coronavírus.
O Comprova apurou e não encontrou indícios de qualquer organização nacional de empresários e comerciantes ou a articulação de uma “Black Week”. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) afirmam que o isolamento social é uma medida essencial para o combate à pandemia do coronavírus durante o estágio de transmissão comunitária da doença — fase que o país atingiu em 20 de março.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos
Para realizar esta checagem, o Comprova usou a base de dados Brasil.io, um repositório de dados públicos, e fez buscas em redes sociais e no site da Receita Federal.
Também foram consultadas notas técnicas da Sociedade Brasileira de Infectologia, e transcrições de entrevistas concedidas por representantes da OMS, sobre a covid-19, e ouvido um porta-voz da Ordem dos Advogados do Brasil. Foram ouvidas a Confederação Nacional do Comércio (CNC) e uma das fundadoras do grupo Soberanistas, que protagoniza o vídeo em questão.
O que é o grupo “Soberanistas”?
Na seção de perguntas do blog oficial do movimento, o grupo apresenta-se como um think tank que trabalha a partir da criação de células locais, no ambiente digital, promovendo o “protagonismo histórico, político e cultural, via integração da população total em torno de valores chaves do conservadorismo.
Na página dos “Soberanistas” no Facebook, o grupo também se identifica como conservador e reafirma sua “lealdade” ao presidente Jair Bolsonaro, além de afirmar ter “o professor Olavo de Carvalho como referência”.
Apesar das frequentes indicações de apoio e concordância, por parte do grupo, às ideias de Olavo de Carvalho, o guru bolsonarista negou qualquer relação com o movimento.
O Comprova também entrou em contato com o grupo por mensagem, no Facebook. Recebeu um número de telefone identificado como sendo de um dos responsáveis pelo grupo. O número pertence a Valquíria Lopes, que confirmou ser a pessoa que aparece no vÍdeo que divulga a “Semana Bolsonaro”.
Valquíria Lopes
A mulher que aparece no vídeo dos “Soberanistas” é Valquíria Lopes, fundadora e coordenadora nacional do grupo.
Em seu perfil pessoal no Facebook, ela tem vários posts e fotos em apoio a Bolsonaro, e uma foto de Olavo de Carvalho como figura de capa.
Valquíria Lopes concordou em conceder uma entrevista, pelo WhatsApp, sobre o movimento e o vídeo que viralizou. Ela diz que em todo o Brasil muitas pessoas apoiam a ideia de reabertura do comércio. “Empresários e trabalhadores estão angustiados e com medo de perderem tudo que construíram ao longo da vida”, afirmou.
Val Lopes, como ela se apresenta no vídeo verificado pelo Comprova, é de Ourinhos, no interior de São Paulo, cidade que adotou restrições ao setor de comércio e serviços por causa da covid-19. Ela, que já foi empresária e hoje diz trabalhar como autônoma, avalia que a proposta da Bolsonaro Week foi uma tentativa de evitar o colapso econômico no país durante o período de pandemia.
A mulher aparece em todos os vídeos publicados no blog dos Soberanistas e em vários outros disponíveis no canal do grupo no YouTube.
Nesta quinta-feira, Val Lopes publicou novo vídeo nas redes sociais, afirmando estar sendo processada pelo Ministério Público do Ceará por conta do vídeo da Bolsonaro Week. Ela mostra, ao fundo, uma delegacia da Polícia Civil onde diz ter ido prestar depoimento. Val teria sido denunciada pelo art 267 do Código Penal que se refere a “Causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos”. Nesse mesmo vídeo ela afirma que não retirará o conteúdo do Youtube.
A “Bolsonaro Week”
O vídeo publicado pelos Soberanistas fala em “reabertura do comércio” e retomada de serviços, além da realização de promoções em todo o país, aos moldes de uma “Black Week”.
O Comprova entrou em contato com a Confederação Nacional do Comércio (CNC), para saber se existia algum tipo de mobilização nacional para o retorno das atividades comerciais em todo o país, ou para a realização conjunta de promoções no setor. Em nota, a CNC disse que não sabia de qualquer movimento organizado neste sentido. A entidade afirma que tem acompanhado a “evolução do cenário de pandemia do coronavírus e as recomendações das autoridades competentes em relação às medidas de distanciamento social e a forma mais adequada de volta à normalidade, para que possa orientar da melhor forma os empresários do setor.”
No vídeo, Val Lopes fala em retomada das atividades em nome do “direito de ir e vir”, do “direito de comprar” e do “direito de se sustentar”. O Comprova consultou a OAB para saber mais sobre a manutenção de direitos individuais, como os defendidos pelos “Soberanistas”, em um cenário de pandemia como o atual.
Para o Presidente da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais da OAB, Marcus Vinícius Furtado Coêlho, “não há o direito individual de cometer crimes.” Segundo Coêlho, “o que o movimento defende é o cometimento de crime contra a saúde pública e a exposição a moléstia contagiosa.” “O caso é de polícia”, completou.
O isolamento físico ou social é, atualmente, uma das principais medidas defendidas pelas autoridades mundiais de saúde. No dia 20 de março, em uma entrevista coletiva sobre o cenário do coronavírus, Michael Ryan, diretor executivo do Programa de Emergências em Saúde da Organização Mundial da Saúde (OMS), respondeu diretamente a uma pergunta sobre as medidas adotadas no Brasil, e reafirmou a importância do isolamento.
“Quando a doença chega a um determinado estágio, principalmente na transmissão comunitária, não é mais possível identificar todos os casos ou todos os contatos [com doentes] que você pode mover e separar do restante das pessoas”, explica. Segundo o médico, “você cria distância física entre todos, porque não sabe exatamente quem pode estar contaminado pelo vírus”. [tradução livre]
As orientações da Sociedade Brasileira de Infectologia também são no mesmo sentido. Em uma das notas técnicas publicadas, a entidade criticou um pronunciamento do presidente que falava em afrouxamento de medidas restritivas, e afirmou que “do ponto de vista científico-epidemiológico, o distanciamento social é fundamental para conter a disseminação do novo coronavírus”.
“Quando a covid-19 chega à fase de franca disseminação comunitária, a maior restrição social, com fechamento do comércio e da indústria não essencial, além de não permitir aglomerações humanas, se impõe. Por isso, ela está sendo tomada em países europeus desenvolvidos e nos Estados Unidos da América”, assinou o presidente da entidade, Clóvis Arns da Cunha.
As medidas de distanciamento social já foram inclusive defendidas em um documento técnico do Centro de Estudos Estratégicos do Exército, que foi posteriormente apagado do site oficial da instituição.
Junto com o vídeo, o grupo os soberanistas publicou, no Twitter, uma imagem com um “Protocolo Inteligente Pós Isolamento”. Na postagem, é sugerido, entre outros pontos, que “quem puder ficar em casa, fique”, que todos cuidem da proteção individual e que grupos de risco fiquem isolados. Esta última sugestão faz referência à ideia de “isolamento vertical”, defendida pelo presidente Jair Bolsonaro. A prática já foi analisada por vários especialistas, que afirmam que ela não é uma solução eficaz para a pandemia da covid-19.
Sobre a utilização do nome do Presidente Jair Bolsonaro para nomear a iniciativa, o Comprova procurou o Palácio do Planalto, mas não obteve resposta até o fechamento deste texto.
Viralização
No YouTube, o vídeo no canal dos Soberanistas teve, até a tarde desta quinta-feira, 09/04, 124 mil visualizações, com 34 mil reações negativas e 746 positivas.
O vídeo recebeu muitas críticas também nas redes sociais. No Twitter, quase todas as manifestações eram de repúdio à iniciativa de retorno do comércio em um tipo de “Black Friday” fora de época. O vídeo foi retirado após denúncias.
No Facebook do grupo Soberanistas o vídeo também não está mais disponível desde o meio da tarde desta quarta-feira (8). Não é possível dizer se ele foi apagado propositalmente ou retirado do ar.
Outras pessoas, no entanto, republicaram o mesmo conteúdo em suas redes sociais. Um dos vídeos foi, inclusive, compartilhado pelo deputado federal Alexandre Frota (SP), que também criticou a iniciativa.
No dia 7 de abril, a mulher que aparece no conteúdo que trata da Bolsonaro Week, Val Lopes, ironiza as críticas que recebeu, publicou um novo vídeo, no twitter, “agradecendo” o “apoio” de quem chama de “esquerdistas” e “idiotas úteis”.
Sobre as reações que o conteúdo recebeu nas redes sociais Val Lopes disse que houveram, sim, muitas manifestações de apoio e que a repercussão negativa veio de “agressões e ofensas por parte de pessoas que formam grupos organizados da esquerda radical. Essas pessoas são fanáticas, não são pessoas racionais e querem o pior para o país, apenas estão instrumentalizando politicamente a pandemia.”
O conteúdo também foi repercutido pelo portal GaúchaZH. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/nenhum-dos-homens-que-aparecem-em-videos-criticando-isolamento-e-analista-da-bolsa-nasdaq/ | COMPROVA | Nenhum dos homens que aparecem em vídeos criticando isolamento é analista da bolsa NASDAQ | null | 2020-04-08 | Vídeos de terceiros, com críticas à política de isolamento social como combate à pandemia do novo coronavírus, foram atribuídos a Marcio Rocha, um suposto analista da bolsa NASDAQ, de Nova York
Postagens nas redes sociais usam o nome de um suposto analista da Nasdaq, a bolsa de valores de Nova York, para impulsionar o compartilhamento de vídeos com críticas à política de isolamento social como combate à pandemia do novo coronavírus. Cada vídeo é diferente, mas todos eles trazem uma descrição com poucas variações: “Este é Marcio Rocha, analista da bolsa Nasdaq, de Nova York, que mora em Oakville, no Canadá.”
Um dos vídeos que circula no Facebook, creditado a Marcio Rocha, é na verdade do economista e master coach Djalma Pinho. Ele confirmou ao Comprova que um vídeo publicado em seu canal no YouTube no dia 30 de março foi compartilhado em um perfil de Facebook e creditado a Marcio Rocha.
O mesmo ocorreu com material gravado por Wilian Tonezi, ativista do Movimento Direita Joinville. Ele teve a parte final de um vídeo publicado em 2 de abril na página do movimento recortada e republicada. A nova postagem, feita em um perfil do Twitter, passa a identificá-lo como Marcio Rocha.
Além desses, a reportagem encontrou mais um vídeo atribuído ao suposto analista da bolsa. Desta vez, o alvo foi a Rádio Bandeirantes de Goiânia. A gravação da edição do dia 2 de novembro de 2019 do Programa Cidade 820 foi republicada na página Notícias Servseg, no Facebook, com legenda que citava Marcio Rocha. Na verdade, o convidado da rádio naquele dia era o youtuber conservador Gustavo Gayer. Ele comentava sobre a cobertura da Rede Globo do caso Marielle.
Há ainda um áudio que circula no WhatsApp e nas redes sociais, também atribuído a Marcio Rocha. Nele, uma voz elogia a gestão do governo Bolsonaro sobre a crise do coronavírus. O Comprova não conseguiu verificar a autoria do áudio.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
O Comprova identificou vários vídeos atribuídos a Márcio Rocha no YouTube, Facebook e Twitter.
Em uma das gravações, aparece o nome Djalma Pinho. No canal dele no YouTube, verificamos que o vídeo atribuído a Marcio Rocha foi publicado no dia 30 de março com o título “Alarde inconsequente da mídia ou realidade?”. O coach compara o número de casos de coronavírus no Brasil com o de outros países para afirmar que não há motivo para pânico em torno da doença.
Também entramos em contato com Pinho por meio da editora Record, que publicou o livro “Desvende o poder da inteligência espiritual”. Por e-mail, o autor confirmou que o vídeo era de sua autoria.
No segundo vídeo, é mostrado o link para o perfil de Wilian Tonezi. Além disso, ele fala em frente a um painel com a sigla “MDJ”. Acessamos o seu perfil e encontramos o vídeo original. Identificamos que a sigla MDJ refere-se ao Movimento Direita Joinville. A foto do perfil de Tonezi no Facebook mostra que é a mesma pessoa que aparece na gravação.
No vídeo, o ativista de direita critica as medidas de quarentena adotadas por governadores de diferentes Estados do País, que vão de encontro às opiniões externadas pelo presidente Jair Bolsonaro sobre a necessidade de reabertura do comércio mesmo em meio à pandemia do coronavírus.
Por fim, no terceiro vídeo há identificadores da Rádio Bandeirantes de Goiânia e do programa Cidade 820. Na página da emissora de rádio no Facebook encontramos a gravação original, de 2 de novembro de 2019.
O apresentador do programa identifica o entrevistado como professor Gustavo Gayer. No canal do professor no YouTube, é possível confirmar que se trata da mesma pessoa. Na entrevista à Rádio Bandeirantes, Gayer responde a uma pergunta sobre a cobertura da Rede Globo sobre o caso do assassinato da vereadora Marielle Franco. O youtuber diz que a emissora está “pegando pesado” e que a empresa se beneficia quando o país tem mau desempenho econômico.
Quem é Marcio Rocha?
A ferramenta BrokerCheck lista operadores das bolsas dos Estados Unidos, verificados pela Finra, entidade não-governamental independente que regula a área. Há apenas um “Marcio Rocha” entre os operadores, mas o Comprova não conseguiu confirmar se é a pessoa que fala no áudio disseminado nas redes sociais.
A reportagem encontrou o nome Marcio Rocha em ferramentas de busca de indivíduos, como o site Pipl, mas não conseguiu fazer contato com o suposto operador da NASDAQ.
Viralização
O Comprova verifica conteúdos suspeitos compartilhados em redes sociais e aplicativos de mensagem que tenham grande viralização. Os vídeos falsamente atribuídos a Marcio Rocha tiveram, somados, 16,9 mil visualizações até o dia 8 de abril.
O site Boatos.Org também publicou uma checagem sobre os três vídeos. | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
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https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/orcamento-do-governo-para-hospitais-nao-foi-desviado-para-projetos-culturais/ | COMPROVA | Orçamento do governo para hospitais não foi desviado para projetos culturais | null | 2020-04-07 | O Comprova conferiu a situação de 14 projetos culturais, mencionados em um post no Facebook, que estariam habilitados para captar recursos pela Lei Rouanet. Dois deles não existem e outros oito não conseguiram captar os recursos necessários e foram arquivados. O Comprova não encontrou indícios de que os valores foram retirados do orçamento da Saúde como sugere a publicação
Uma imagem que circula pelas redes sociais atribui a um desvio de orçamento para projetos culturais uma suposta falta de dinheiro para os hospitais brasileiros. A publicação, além de mostrar uma série de projetos e os supostos valores destinados a cada um deles, ainda traz os dizeres: “Toma um calmante, senta e lê isso”.
O texto é semelhante a outros que circulam nas redes sociais pelo menos desde 2018 e voltou a ser compartilhado em meio à pandemia do novo coronavírus. Algumas publicações já alegavam que os recursos para os projetos causaram falta de dinheiro para hospitais. Em outras, que os valores poderiam ser usados para salvar o Museu Nacional, no Rio de Janeiro – que sofreu um incêndio em 2018 e teve parte de seu acervo de 20 milhões de itens destruído.
O Comprova conferiu a situação dos projetos culturais mencionados no texto. Em 12 dos 14 itens apontados na lista os dados usados são de projetos que realmente existem e foram habilitados para captação de recursos pela Lei de Incentivo à Cultura, mais conhecida como Lei Rouanet.
Oito deles, porém, não conseguiram captar os recursos suficientes e foram arquivados. Outros precisaram arrecadar apenas parte do total autorizado pelo governo. Os valores citados na lista também não são exatamente iguais aos que foram apresentados nos projetos culturais. A lista mostra, ainda, projetos cadastrados entre 2010 e 2018.
O Comprova não encontrou indícios de que os valores destinados aos projetos culturais foram retirados do orçamento da Saúde. Cabe salientar que, sendo a lei Rouanet uma lei de incentivo fiscal, não há repasse direto de valores do orçamento do Ministério da Cultura para os responsáveis pelo projeto. Cabe ao ministério apenas autorizar a captação por parte do idealizadores dos projetos junto às empresas.
O Comprova verificou o conteúdo de uma imagem publicada em 30 de março em um perfil pessoal no Facebook e encontrou o mesmo conteúdo em contas de Twitter, Pinterest e Facebook. A versão mais antiga da postagem foi encontrada no “Portal da Direita do Brasil”. Posteriormente, a publicação foi apagada da página.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
A maior parte dos projetos listados no boato consta na plataforma VerSalic, ferramenta do Governo Federal que informa quais projetos culturais foram habilitados para receber incentivos fiscais. Também foram consultadas reportagens que abordam os temas listados e a Agência Nacional do Cinema (Ancine).
Os leitores podem refazer o caminho da verificação acessando os links para visualizar os conteúdos da apuração.
Confira a verificação de cada item da lista
Livro sobre a vida de José Dirceu (R$1.526.536,25): NÃO REALIZADO
Não houve a intenção de se fazer um livro sobre o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu. Em 2013 diversas notícias diziam que foi aprovada a captação de R$ 1,5 milhão para realizar um filme sobre ele. De acordo com a Agência Nacional do Cinema (Ancine), essa quantia era o valor total da obra que poderia ser captada de diversas formas de financiamento. Pela Lei Rouanet nenhum recurso foi destinado e o projeto foi cancelado.
DVD de Mc Guimé (R$ 516 mil): NÃO REALIZADO
Houve um projeto aprovado para um DVD do Mc Guimê em 2015, com o registro de 14 músicas em um show na cidade de São Paulo. No entanto, o projeto de R$ 516.550 não teve recursos captados e foi arquivado.
Livro de poesia de Maria Bethânia (R$ 1,3 milhão): NÃO REALIZADO
O projeto original do blog “O mundo precisa de poesia”, de Maria Bethânia, é de 2010. Ele tinha permissão para captar R$ 1.356.858. Essa quantia, no entanto, não foi atingida e o projeto foi arquivado por excesso de prazo. Após o projeto gerar críticas nas redes sociais, a artista desistiu de criar o blog de poesia.
Turnê de Luan Santana (R$ 4,1 milhões): NÃO REALIZADA
O projeto “Luan Santana – Turnê: Nosso Tempo é Hoje – Parte II” foi aprovado para captação de recursos em 2014. Ele poderia receber até R$ 4.143.325, mas não arrecadou nada. Ele foi arquivado pelo próprio proponente.
Turnê Detonautas (R$ 1 milhão): NÃO REALIZADA
A banda Detonautas teve um projeto aprovado para captar recursos pela Lei Rouanet no valor de R$ 1.086.214,40. Ele foi aberto em 2013, mas arquivado por excesso de prazo sem captação.
Shows de Cláudia Leitte (R$ 5,8 milhões): REALIZADO, COM RESSALVAS
Um projeto para a realização de 12 shows da cantora Cláudia Leitte, em 2012, foi aprovado para captação de R$ 5.883.100. A cantora conseguiu captar R$ 1,2 milhão na iniciativa privada. Em 2016, porém, o Ministério da Cultura (MinC) reprovou as contas apresentadas pela cantora e pediu a devolução do dinheiro aos cofres públicos. O processo continua em tramitação.
Filme do Brizola (R$ 1,9 milhão): NÃO REALIZADO
Não consta na plataforma Versalic nenhum filme sobre Leonel Brizola (1922-2004), mas sim a montagem do espetáculo “Brizola”, que conta a história do político que fundou o PDT e governou os estados do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. O valor aprovado para captação era de R$ 1.641.506, no ano 2015, mas foi arquivado por excesso de prazo sem captação.
Peppa Pig (R$ 1,7 milhão): NÃO REALIZADO
O objetivo do projeto era a realização de uma turnê do espetáculo infantil Peppa Pig. Aprovado em 2014 para receber captação pela Lei Rouanet, no valor de R$ 1.772.320, o projeto acabou arquivado sem nenhuma captação.
Painel do Club São Paulo (R$ 5,7 milhões): NÃO REALIZADO
A proposta era a criação de um painel artístico de difusão cultural nos segmentos da música, dança e artes cênicas, dentro e fora do espaço físico do Club A São Paulo. O projeto, de 2011, no valor de R$ 5.714.399,96, não teve nenhuma quantia captada e foi arquivado por excesso de prazo.
Turnê Shrek, o Musical (R$ 17,8 milhões): REALIZADO COM MENOR VALOR
Em 2010, foi aprovada a captação de recursos para o espetáculo “Shrek, o musical”, no valor de R$ 8.260.620. O projeto conseguiu captar R$ 6 milhões de empresas como a Vivo e o Bradesco. Dois anos depois, em 2012, foi aprovada outra captação de R$ 9.618.120. O projeto levantou um total de R$ 5,36 milhões em sete empresas, entre elas os Correios e BrasilCap Capitalização. As duas prestações de contas foram aprovadas.
Cirque du Soleil (R$ 9,4 milhões): REALIZADO
Em 2006, a empresa CIE Brasil propôs a turnê brasileira do grupo canadense Cirque du Soleil, O projeto era de R$ 22,3 milhões, mas o Ministério da Cultura (MinC) liberou apenas uma parte (R$ 9,4 milhões) para captação via Lei Rouanet.
Livro do Chico Buarque (R$ 414 mil): REALIZADO COM MENOR VALOR
O projeto mais recente da lista é a produção de um livro fotobiográfico sobre a vida e a obra do artista Chico Buarque. A proposta é de 2018 e teve aprovação para captar até R$ 415.958,04. Conseguiu R$ 280.000,29 da empresa Icatu-Hartford e agora está na fase de prestação de contas.
Queermuseu (R$ 800 mil): REALIZADO
A Queermuseu é uma exposição que teve dois projetos aprovados para captação. Um é de 2013 no valor de R$ 539.043,60, mas não obteve recursos e foi arquivado por excesso de prazo sem captação. O outro é de 2016 no valor de R$ 872.560. Este conseguiu captar R$ 800 mil, a maior parte do Banco Santander. A exposição Queermuseu – Cartografias da Diferença na Arte Brasileira, que apresentava trabalhos que discutiam diversidade de gêneros e de sexualidade, foi cancelada pelo banco após uma série de protestos.
Museu Lula (R$ 7.9 milhões): EM TRÂMITE
O projeto do Museu do Trabalho e do Trabalhador, como seria chamado o Museu Lula, é de 2013 e poderia captar R$ 19.859.580,43 pela Lei de Incentivo à Cultura. Conseguiu arrecadar R$ 3,6 milhões da construtora OAS e da Vale. O projeto, no entanto, está parado e com a prestação de contas reprovada. Em 2018, faltando dez dias para deixar o cargo, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, autorizou que o prédio onde seria construído o museu, em São Bernardo do Campo, fosse ocupado por uma Fábrica de Cultura.
Entenda a Lei Rouanet
Criada em 1991, a Lei Rouanet, hoje chamada de Lei de Incentivo à Cultura, é o principal mecanismo de fomento à cultura no Brasil. Ela autoriza empresas a destinar parte de seu Imposto de Renda a pagar para projetos culturais. Para isso, o proponente deve ter seu projeto submetido ao órgão federal responsável pela cultura (atualmente a Secretaria Especial de Cultura, vinculada ao Ministério do Turismo).
Se o projeto é aprovado, é o próprio proponente que deve buscar apoio financeiro diretamente junto aos investidores culturais. Os repasses não são feitos pelo Governo Federal, mas pelos incentivadores cadastrados.
A lei sofreu alterações em 2019. A principal mudança foi a redução no valor máximo para captação por projeto, de R$ 60 milhões, caiu para R$ 1 milhão. No caso das carteiras – que são o conjunto de projetos apresentados por uma empresa ou por um grupo de empresas com sócio em comum – o teto caiu de R$ 60 milhões para R$ 10 milhões.
Saiba como se dá a aprovação de um projeto pela Lei de Incentivo à Cultura:
1) Apresentação de proposta: o proponente, responsável pelo projeto, insere uma proposta cultural no Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura (Salic), de forma eletrônica.
2) Análises: A proposta passa por uma série de análises antes da decisão final quanto à sua aprovação ou rejeição.
3) Captação: após a aprovação do projeto, cabe ao proponente encontrar as empresas que apoiarão a ideia. Quando conseguir captar 20% do valor total aprovado, pode iniciar a execução da proposta.
4) Execução: é a realização do projeto, quando o proponente entra em contato com fornecedores, artistas e outros prestadores de serviço que irão ajudar a executar a proposta. Também envolve a realização em si do espetáculo, show, festival, montagem e visitação de exposições, impressão de livros, etc.
5) Prestação de contas: após o término do projeto, o proponente precisa prestar contas de tudo o que foi realizado. É preciso comprovar como os recursos foram aplicados, se os objetivos e resultados do projeto foram alcançados, quantas pessoas foram atingidas, qual foi a contrapartida social oferecida – tudo acompanhado por notas fiscais, comprovantes de transferência, panfletos, anúncios, matérias de jornal, fotos, etc
Incentivos
Segundo dados do governo Federal, somente em 2017 houve R$ 1,15 bilhão em incentivos fiscais à cultura. Em 2018, esse número foi de R$ 1,2 bilhão. Se forem somados os valores dos dez anos entre 2009 e 2018, o total de incentivos fiscais para projetos culturais foi de R$ 10,66 bilhões.
“Não é verdadeira a informação de que os recursos destinados aos hospitais serviram para o financiamento público de projetos culturais. Salienta-se que o orçamento público é definido pela Lei Orçamentária Anual (LOA) encaminhada pelo Executivo e votada pelo Congresso Nacional”, informou em nota o Ministério da Cidadania.
Os números da saúde são bem mais expressivos que os da cultura no Brasil. A Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2020 tem previsão de R$ 125 bilhões para o Ministério da Saúde. Somente para fortalecer a rede pública de saúde no enfrentamento ao novo coronavírus (covid-19), foram acrescentados R$ 14,5 bilhões ao orçamento deste ano. Isso foi possível através de duas medidas provisórias, uma em março no valor de R$ 5 bilhões, e outra em abril, de R$ 9,4 bilhões.
Viralização
O conteúdo pelo Comprova foi publicado em 30 de março em um perfil pessoal do Facebook. Até o dia 7 de abril, a publicação já teve 12 mil compartilhamentos. No Twitter, a publicação feita pelo perfil @ernanitec, em 16 de maio de 2019, obteve 1,3 mil retuítes. O Comprova também encontrou publicações em outras contas de Twitter, Facebook e Pinterest e recebeu solicitações de verificação de leitores que receberam a imagem pelo WhatsApp. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/imagem-de-predio-da-fiesp-com-bandeira-da-china-e-usada-fora-de-contexto-para-relacionar-a-instituicao-ao-governo-chines/ | COMPROVA | Imagem de prédio da FIESP com bandeira da China é usada fora de contexto para relacionar a instituição ao governo chinês | null | 2020-04-07 | Postagens em redes sociais e mensagens em aplicativo usam imagem e link de uma publicação de 2019 para acusar a FIESP de proteger o governo chinês em meio à pandemia do novo coronavírus
São enganosas as postagens nas redes sociais que acusam o governo de São Paulo e a FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) de “serem comunistas e protegerem o governo chinês em meio à pandemia do novo coronavírus”. Os posts reproduzem imagens de outubro de 2019 do prédio da instituição na Avenida Paulista, em São Paulo, iluminado com a bandeira da China.
Algumas das publicações no Facebook e no Twitter também trazem o link de uma reportagem da Folha de São Paulo de 2 de outubro de 2019, que diz que a entidade iria exibir a bandeira do país asiático em homenagem aos 70 anos da revolução comunista. A matéria antiga explica ainda que não se tratava de uma iniciativa da própria FIESP, mas que diversos países costumam entrar em contato solicitando a exibição de suas bandeiras. São citados Japão e Itália como exemplos.
Em 2020, a FIESP também projetou a bandeira da China em seu prédio, mas o motivo era outro. A bandeira chinesa foi exibida junto a várias outras de países com maior número de casos confirmados de Covid-19 como Estados Unidos e Itália.
O Comprova entrou em contato com a FIESP, que enviou à reportagem uma nota e o vídeo completo com todas as bandeiras exibidas. “Na última semana, nossa galeria digital prestou homenagem e solidariedade aos povos mais atingidos pelo novo coronavírus. Foram exibidas bandeiras dos países com maior número de pessoas infectadas confirmadas, em gesto humanitário. Foram projetadas em sequência as bandeiras de Alemanha, China, Espanha, Estados Unidos, França e Itália”, diz o comunicado.
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro com o propósito de mudar o seu significado ou que induza a uma interpretação diferente da intenção de seu autor.
O Comprova verificou mensagens de WhatsApp enviadas para verificação por leitores e postagens com conteúdos similares em vários perfis no Twitter, em páginas e grupos de Facebook.
Como verificamos
Após constatar que o texto da Folha de S. Paulo reproduzido nos últimos dias se tratava, na verdade, de uma publicação de outubro de 2019, o Comprova entrou em contato com as assessorias de imprensa da FIESP e do governo de São Paulo. A FIESP esclareceu que a bandeira chinesa foi projetada na última semana no prédio junto a de outros países e mandou à reportagem o vídeo completo.
FIESP não é ligada ao governo de São Paulo
Algumas das postagens sobre a bandeira da China no prédio da FIESP atacam o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que é acusado de “comemorar o comunismo”. “Comunismo comemorado em SP #ForaDoria. #BolsonaroTemRazao. Isso foi a (sic) 6 meses. Não é de hoje que DoriAna tem seu projeto”, diz um dos posts, que ainda avisa que a matéria da Folha é antiga, mas reproduz o texto mesmo assim.
Há ainda comentários chamando os chineses de “donos do vírus”: “Homenagem aos donos do vírus. Agora vendem respiradores e demais insumos. Valeu São Paulo homenagem aos fabricantes da pandemia”.
Em contato por telefone, a assessoria de imprensa do governo de São Paulo ressaltou que a FIESP não depende do governo de São Paulo e tem total liberdade para ações próprias.
A FIESP representa 130 mil indústrias de São Paulo de diversos setores e “luta pela competitividade da indústria brasileira com reivindicações para diminuir custos de produção e conter a desindustrialização”, como é explicado em seu site oficial.
João Doria pediu para que ataques à China parassem
Os ataques à China vêm se disseminando pelas redes sociais desde o início da pandemia do novo coronavírus por ter sido o país onde foi confirmado o primeiro caso da doença no mundo. Em 19 de março, o governador de São Paulo João Doria (PSDB) rebateu publicação do deputado federal Eduardo Bolsonaro sobre a China. O filho do presidente havia publicado uma crítica em suas redes sociais no dia 18 de março.
O governador de São Paulo é um dos críticos da postura do presidente Jair Bolsonaro, que defende o fim do isolamento completo da população brasileira no combate ao novo coronavírus. Em São Paulo, João Doria prorrogou a quarentena até 22 de abril. Apenas serviços considerados essenciais estão permitidos funcionar.
“Graças às medidas de isolamento adotadas até aqui, a taxa de ocupação de leitos no estado de SP é de 50% hoje. Sem as medidas de isolamento social, faltariam 3 mil leitos”, escreveu João Doria em seu Twitter em 7 de abril.
Viralização
A imagem e o link da Folha foram compartilhados em dezenas de páginas, grupos e perfis nas redes sociais e em grupos de WhatsApp. O perfil @MBColunista do Twitter obteve 850 interações. A publicação na página Voz da Liberdade Brasil, no Facebook, foi compartilhada 311 vezes e a página Carlos Alberto Brilhante Ustra, também no Facebook, tinha 1.560 interações até a tarde do dia 7 de abril. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/vacina-do-coronavirus-nao-tera-microchip-para-rastrear-a-populacao/ | COMPROVA | Vacina do coronavírus não terá microchip para rastrear a população | null | 2020-04-06 | Não há nenhuma notícia de qualquer vacina com microchip em desenvolvimento no mundo como tenta fazer crer uma publicação que viralizou nas redes sociais. E, embora haja uma série de testes clínicos em andamento, ainda não existe vacina contra o coronavírus
Uma teoria conspiratória sobre a covid-19 que tem se espalhado pelas redes sociais alega que as vacinas contra o novo coronavírus terão “microchips” para colher a “identidade biométrica da população”. A tese é falsa. Não há nenhuma evidência que comprove o conteúdo do texto, publicado no blog “Livro das Revelações”.
O texto mistura uma série de informações falsas sobre projetos internacionais de identidade digital, como a Aliança ID2020 e o a2i, e sobre a Aliança Mundial para Vacinas e Imunização (Gavi, na sigla em inglês), entidade que atua para fornecer vacina para países pobres.
O blog reproduz em português trechos de um texto em inglês sobre a mesma teoria conspiratória, publicado em outubro de 2019 no blog “Natural News”. Na mensagem “original”, o coronavírus sequer é mencionado.
Inicialmente, não há notícia de que qualquer vacina com microchip esteja em desenvolvimento no mundo. A informação foi confirmada pelo presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações, Juarez Cunha, em entrevista pelo telefone.
Cunha também ressaltou que, como tem sido amplamente divulgado pela imprensa mundial, ainda não existe vacina contra o coronavírus. Há uma série de testes clínicos em andamento, mas nenhum concluído até o momento. Segundo a perspectiva mais otimista da comunidade médica, as doses para o combate à covid-19 estarão disponíveis dentro de um ano – esse prazo, contudo, pode ser maior.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
O Comprova consultou a Aliança ID2020 e a Sociedade Brasileira de Imunizações. Também pesquisou o histórico da Aliança Mundial para Vacinas e Imunização e da a2i (Access to Information, na sigla em inglês). Os links utilizados como fonte de informação estão ao longo do texto.
O que são as entidades mencionadas?
Aliança ID2020
O texto do blog “Livro das Revelações” apresenta a Aliança ID2020 como uma conspiração criada para inserir microchips no corpo das pessoas por meio da vacinação. Isso significaria que a população seria controlada “por meio de uma matriz de identificação global”. Nada disso faz sentido.
Na realidade, a Aliança ID2020 é um projeto anunciado em 2017 pelas empresas Accenture e Microsoft. Lançada como um consórcio público-privado em parceria com a Organização das Nações Unidas (ONU), a iniciativa busca atender o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável para 2030 de fornecimento de identidade legal a toda a população mundial.
De acordo com uma estimativa divulgada pela Microsoft em 2018, uma em cada seis pessoas no mundo não tinha qualquer forma de identificação oficial, dificultando o acesso a direitos humanos básicos, como saúde, habitação e educação.
Por e-mail, a ID2020 informou que o consórcio público-privado trabalha com ações de financiamento e suporte técnico de organizações não-governamentais, corporações e governos. O objetivo é ajudar a implementar soluções de identidade digital, sem qualquer relação com a implantação de microchips nas pessoas.
“Tipicamente, a identidade digital depende de telefones celulares como forma de autenticar a identidade do usuário”, afirmou a ID2020. “Os dados do usuário geralmente são armazenados em uma base de dados descentralizada, para garantir o máximo de privacidade e controle sobre as informações pessoais”.
A teoria conspiratória menciona de maneira descontextualizada três programas da Aliança ID2020 que são reais — nos Estados Unidos, na Tailândia e na Indonésia.
O primeiro é uma parceria com a prefeitura de Austin, no Texas, para fornecimento de identidade digital à população sem-teto. A proposta ainda está em fase inicial.
O projeto tailandês tem parceria com as organizações iRespond e Comitê Internacional de Resgate e tem como objetivo providenciar uma plataforma de identidade digital para os refugiados do acampamento Mae La.
Já na iniciativa na Indonésia, a ID2020 atua com a cooperação das organizações Everest e TNP2K, do governo local, para estabelecer um sistema de identidade digital para 6 mil famílias de baixa renda. Nenhum desses programas, contudo, prevê implantação de microchips.
A ID2020 também negou, por e-mail, que tenha qualquer relação com o desenvolvimento de vacinas. O único projeto da entidade relacionado ao assunto é em parceria com a Gavi (leia mais abaixo). “Nossa missão e mandato são bem delimitados, e não desenvolvemos ou participamos do desenvolvimento de vacinas”, informou.
Gavi
A Gavi foi criada em 2000 com o objetivo de imunizar pessoas sem acesso a vacinas em países pobres. Diferente do que é citado no texto, de que a Aliança Mundial para Vacinas e Imunização “contribuirá para a distribuição dessas supostas vacinas com microchips” com o governo de Bangladesh e outras organizações, esse não é o papel da organização.
A Gavi surgiu por iniciativa da Fundação Bill e Melinda Gates que, no final dos anos 1990, projetava que mais de 30 milhões de crianças poderiam estar em risco porque seus países não tinham dinheiro para a compra de vacinas. A ideia consistiu em reunir parceiros que pudessem financiar as vacinas e incentivar os fabricantes a reduzir os preços.
A aliança se tornou uma parceira mundial de saúde de setores privados e públicos. Hoje, a Gavi faz parte da Aliança Global de Força de Trabalho na Saúde (Global Health Workforce Alliance, em inglês) da Organização Mundial da Saúde, uma parceria que envolve governos, sociedade civil, instituições financeiras, pesquisadores e educadores e mobiliza recursos humanos para a saúde.
Bangladesh, citado no texto do blog “Livro das Revelações”, é um dos países contemplados pelo trabalho da Gavi. Em release divulgado pela Gavi em fevereiro, o país aparece como um dos beneficiados para receber doses de vacinas para imunizar crianças nos próximos seis meses. “Gavi financiará vacinas contra sarampo-rubéola para mais de 15,5 milhões de crianças menores de cinco anos. O governo de Bangladesh também apoiará a vacinação de mais 17 milhões de crianças até nove anos de idade”, diz a nota.
O governo de Bangladesh, a Gavi e a ID2020 também são parceiros para o fornecimento de uma identidade digital de saúde no nascimento ou na primeira imunização de crianças do país. Em contato por e-mail, a ID2020 explicou que o programa facilita os atendimentos médicos da criança e que isso continua pela vida toda.
De acordo com estimativa da entidade, em Bangladesh, apenas 20% das crianças recebem uma certidão de nascimento durante os primeiros cinco anos de vida, enquanto mais de 95% recebem pelo menos uma dose da vacina. O projeto prevê que profissionais de saúde, empregados por organizações comunitárias, facilitem a inscrição para “aumentar a porcentagem de crianças registradas, melhorar os resultados da vacinação e melhorar o acesso aos serviços de saúde durante toda a vida útil”, segundo informou a ID2020 em nota.
A2I
O A2i (Acesso à Informação), também mencionado no texto falso, é um setor do governo de Bangladesh que busca desburocratizar o acesso da população a serviços públicos. Em seu site oficial, menciona até mesmo o quanto as pessoas conseguem economizar em tempo e custos graças à iniciativa. Tudo é atualizado em tempo real e até a finalização do texto, já foram quase “2 bilhões de dias economizados”.
Outro citado na teoria conspiratória, Anir Chowdhury é consultor de políticas da a2i e realmente trabalha para o governo de Bangladesh. Porém, não é possível dizer que as falas atribuídas a Chowdhury na matéria falsa são realmente dele. Desde setembro de 2019, as mesmas declarações atribuídas a ele têm sido reproduzidas em sites não-confiáveis.
O Comprova questionou a a2i sobre as falas atribuídas a Anir Chowdhury, mas não teve retorno até o fechamento deste texto.
Viralização
O texto do blog “Livro das Revelações” obteve 3,8 mil compartilhamentos desde o dia 22 de março. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/estudo-do-medico-zelenko-com-hidroxicloroquina-nao-tem-comprovacao-cientifica/ | COMPROVA | Estudo do médico Vladimir Zelenko com hidroxicloroquina não tem comprovação científica | null | 2020-04-06 | O estudo do médico de Nova York que alega ter “resultados positivos tremendos” usando hidroxicloroquina, azitromicina e zinco contra a covid-19 não foi publicado em nenhum periódico de saúde. Pesquisas divulgadas até agora são inconclusivas
É enganosa uma postagem no Youtube que destaca “100% de sucesso” em um tratamento contra a covid-19 realizado por Vladimir Zelenko, um médico de Nova York, nos Estados Unidos, com drogas como a hidroxicloroquina, o zinco e a azitromicina. A postagem acompanha trechos editados de uma entrevista concedida por Zelenko a Rudolph Giuliani, importante apoiador do presidente dos EUA, Donald Trump. O estudo feito por Zelenko não tem comprovação científica, não foi publicado em nenhum periódico médico e a única evidência de sua existência são as declarações do próprio autor da suposta pesquisa.
A cloroquina e sua versão menos tóxica, a hidroxicloroquina, são indicadas no Brasil para tratar doenças como malária, reumatismo, inflamação nas articulações, lúpus, entre outras. A azitromicina, por sua vez, é um antibiótico. O zinco é um suplemento nutricional. Testes com esses medicamentos estão, de fato, sendo realizados em pacientes com graus diferentes de covid-19, a doença causada pelo novo coronavírus, mas ainda não há comprovação científica de sua eficácia e a automedicação com essas substâncias é contra-indicada pela Anvisa, pelo Ministério da Saúde e pela Organização Mundial da Saúde.
Enganoso para o Comprova é o que confunde ou que seja divulgado para confundir, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Como verificamos
Para esta verificação, buscamos as orientações do Ministério da Saúde, da Anvisa e da Organização Mundial da Saúde para o tratamento da covid-19, bem como os estudos recentes envolvendo o tratamento da doença com hidroxicloroquina e azitromicina.
Também buscamos o vídeo original da entrevista com Zelenko, publicado no canal Rudolph Giuliani no Youtube.
Cloroquina ainda está sendo testada para covid-19
A postagem verificada pelo Comprova foi feita em 2 de abril no canal “Embaixada da Resistência” no Youtube, uma página dedicada a traduzir para o português vídeos de apoiadores do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
O vídeo publicado pelo canal mostra trechos editados de uma entrevista feita por Rudolph Giuliani, ex-prefeito de Nova York e advogado de Trump, com Vladimir Zelenko, um médico que atua em Kiryas Joel, comunidade de 35 mil habitantes no Estado de Nova York. A entrevista foi publicada no dia 28 de março deste ano. O texto que acompanha o vídeo diz que Zelenko teve “100% sucesso até agora” usando zinco e as drogas hidroxicloroquina e azitromicina, numa “abordagem pronta e rápida que não deixa a doença evoluir para um quadro de internamento, de onde é difícil recuperar ileso” (sic).
De fato, Zelenko alega ter obtido 100% de sucesso em tratamento realizado com 700 pacientes. Em uma entrevista para o canal no Youtube de um investidor do mercado financeiro, publicada em 1º de abril, o médico disse que apenas seis deles precisaram ser hospitalizados, sendo que dois tiveram pneumonia, mas se recuperaram; dois foram entubados e um faleceu. Este último teria, segundo Zelenko, abandonado o protocolo de tratamento.
Não há evidências de que essa pesquisa tenha realmente sido realizada a não ser a palavra do próprio médico. Em uma carta aberta publicada após o sucesso instantâneo do médico, líderes comunitários de Kiryas Joel acusaram Zelenko de exagerar a extensão da infecção pelo novo coronavírus na comunidade. Os resultados alardeados por Zelenko também não foram divulgados em nenhum periódico acadêmico. Estudos feitos em diversos países têm tentado verificar a eficácia da cloroquina e da hidroxicloroquina, mas seus resultados são, por enquanto, inconclusivos (leia mais abaixo).
No Brasil, o Ministério da Saúde decidiu, em março, distribuir essas drogas em determinados hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS) como tratamento auxiliar a pacientes que estejam internados e em estado grave. Como mostra essa nota informativa da pasta, a automedicação com cloroquina é contra-indicada e, no caso da covid-19, ficará a critério dos médicos responsáveis fazer uso, ou não, do medicamento.
Apesar da recomendação do Ministério de Saúde de tratar casos graves e críticos, a operadora de planos de saúde Prevent Senior orientou, segundo reportagem do portal G1, orientou os médicos da rede a prescrever cloroquina em tratamento para pacientes que relatam sintomas respiratórios e febre, mas sem confirmação de coronavírus.
De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a liberação das substâncias para pacientes em estado grave a partir de dados preliminares ocorreu devido à situação emergencial causada pela pandemia. De acordo com a agência, “esse é o chamado uso compassivo (por compaixão), já que não há alternativa terapêutica específica para esses pacientes.”
Também em março, a Anvisa autorizou a primeira pesquisa com a combinação de hidroxicloroquina e azitromicina no Brasil, a ser realizada pelo hospital Albert Einstein, em São Paulo.
A OMS afirma que está acompanhando os estudos clínicos com o uso da cloroquina e derivados, mas até o momento os dados são insuficientes para estabelecer a eficácia desses medicamentos para o tratamento ou prevenção da infecção pelo novo coronavírus. Por enquanto, o órgão só recomenda o uso da cloroquina para o tratamento da malária e alerta para o risco de superdosagem.
O caminho de Vladimir Zelenko para a fama
Zelenko, de 46 anos, é, segundo a revista norte-americana Forward, um imigrante russo. Ele é médico nas cercanias de uma comunidade judaica ortodoxa, chamada Kiryas Joel, que fica a uma hora da cidade de Nova York.
Antes da entrevista com Giuliani, um vídeo transformou Zelenko em celebridade nos Estados Unidos. Publicado no Youtube em 21 de março, era endereçado a Trump. Desde então, as imagens foram removidas pelo site de vídeos por “violar os Termos de Serviço” da plataforma. O Comprova acessou o canal do médico no Youtube e constatou que ele foi criado em 15 de março deste ano. De fato, o vídeo em questão não consta mais na lista de publicações de Zelenko. Apesar disso, o vídeo continua circulando na internet, como o Comprova pode constatar em dois sites que publicam notícias das comunidades judaicas dos Estados Unidos.
No vídeo direcionado a Trump, de 3 minutos e 6 segundos, Zelenko se apresenta, detalha a experiência que tem realizado em Kiryas Joel e sugere que a combinação de hidroxicloroquina, azitromicina e zinco deve ser usada em pacientes do grupo de risco da covid-19 nos estágios iniciais da infecção ou mesmo como “profilaxia” – antes da infecção, portanto – em pacientes de alto risco. Trata-se de uma recomendação que difere do chamado “uso por compaixão” autorizado pelo Ministério da Saúde no Brasil.
“Eu estou vendo resultados positivos tremendos”, diz Zelenko no vídeo. O médico encerra o vídeo desejando sorte a Trump. “Minha sincera bênção para você, senhor presidente. Eu pessoalmente te amo. Espero que Deus proteja você e sua família e abençoe tudo o que você faz, que é salvar esta nação de um desastre”, diz.
Além de postar o vídeo no Youtube, Zelenko fez o mesmo no Facebook e publicou uma carta aberta no Google Docs divulgando seus resultados, segundo relatou o jornal The Washington Post. Quem colocou os holofotes sobre a experiência do médico de Nova York foi a Fox News, canal de televisão próximo a Trump.
Na noite de 23 de março, Sean Hannity, um dos principais apresentadores da emissora e conselheiro informal de Trump, leu trechos da carta de Zelenko ao vivo, durante uma conversa com o vice-presidente dos EUA, Mike Pence.
Ainda segundo o The Washigton Post, Zelenko foi contactado pelo novo chefe de gabinete de Trump, Mark Meadows, e, na manhã de terça-feira 24, o ex-prefeito de Nova York e advogado de Trump, Rudolph Giuliani, elogiou seu trabalho no Twitter.
No último dia 28, Giuliani publicou uma entrevista de 41 minutos e 36 segundos com Zelenko em seu canal no Youtube. Nela, o médico afirmou que prescreveu hidroxicloroquina, zinco e azitromicina para cerca de 450 pacientes que apresentavam os primeiros sintomas da covid-19. Ele acredita que os medicamentos devem ser usados por pacientes que estão em casa, para diminuir o risco de serem internados. Mas faz uma ressalva: só receita o “coquetel” para pessoas com mais de 60 anos ou com doenças crônicas, alegando receio por causa dos efeitos colaterais das drogas. “É a arte da medicina, você quer o máximo de benefícios com o mínimo de efeitos colaterais”, disse.
Zelenko também especifica as dosagens de cada medicamento e quantas vezes por dia as prescreve para cada paciente. Dessa entrevista que foram retirados os trechos que estão no vídeo de 7 minutos e 53 segundos publicado no canal Embaixada da Resistência.
Ao divulgar a conversa no Twitter, Giuliani disse haver provas de que “a cloroquina é 100% eficiente contra a covid-19”. Como não há evidência científica disso, o tweet de Giuliani foi apagado pelo Twitter por violar as regras de uso da plataforma durante a pandemia da doença. Outros tweets de Giuliani nos quais ele não garante a cura da covid-19 continuam disponíveis em seu perfil na rede social.
Trump apoia a cloroquina, apesar da controvérsia
Há semanas, Trump tem apoiado o uso de cloroquina e hidroxicloroquina contra a covid-19, mesmo na ausência de evidências científicas sobre sua eficácia. Em 21 de março (mesma data em que Zelenko postou seu vídeo para Trump), o presidente dos Estados Unidos afirmou no Twitter que “hidroxicloroquina e azitromicina, tomadas em conjunto, têm uma chance real de ser um dos maiores fatores de mudança na história da medicina”.
Desde então, Trump vem incentivando com frequência o uso dessas substâncias. Diante da comoção provocada por seus discursos, pelo menos 20 estados tiveram, segundo levantamento do Wall Street Journal, de emitir diretrizes limitando a prescrição da hidroxicloroquina. A intenção é garantir que o medicamento continue disponível para os pacientes de doenças como o lúpus, por exemplo, que dependem da substância.
No sábado, 4, a agência de notícias Reuters publicou uma reportagem segundo a qual Trump e a Casa Branca pressionaram as autoridades sanitárias dos EUA para acelerar a permissão de uso da hidroxicloroquina contra a covid-19. Em um comunicado enviado à Reuters, a Food and Drug Administration (FDA), órgão equivalente à Anvisa, afirmou que “foi determinado, com base nas evidências científicas disponíveis, que é razoável acreditar que os medicamentos específicos podem ser eficazes no tratamento da covid-19 e que, dado que não existem tratamentos alternativos adequados, aprovados ou disponíveis, os conhecidos e os potenciais benefícios do tratamento desse vírus superam os riscos conhecidos e potenciais”.
No domingo, 5, Trump voltou a incentivar o uso da hidroxicloroquina em uma entrevista coletiva. Na conversa com os jornalistas, o presidente dos EUA impediu, no entanto, que seu principal conselheiro científico com relação à covid-19 respondesse sobre a hidroxicloroquina. Anthony S. Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos EUA, enfatizou em diversas outras oportunidades que não há comprovação científica da eficácia da hidroxicloroquina contra a covid-19.
Não há provas de eficácia da cloroquina
No tweet de 21 de março em que alardeou o uso da hidroxicloroquina, Trump citou um estudo realizado em Marselha, na França, por um grupo liderado pelo médico Didier Raoult. Segundo o estudo, a combinação de hidroxicloroquina e azitromicina teria curado alguns pacientes de covid-19. Com um passado controverso, Raoult foi duramente criticado por conta do estudo, apontado como falho do ponto de vista científico e pouco transparente, uma vez que os dados brutos não foram compartilhados.
Desde então, outros estudos se debruçaram sobre essa questão. Um deles, realizado no hospital Renmin, da Universidade de Wuhan, na China, encontrou indícios de que a hidroxicloroquina ajudou a acelerar a recuperação de um pequeno número de pacientes que tinham sintomas leves da covid-19. Vale salientar que, segundo a OMS, entre os sintomas leves da doença está a pneumonia.
Outro pequeno estudo realizado na China, e publicado em um periódico da Universidade Zhejiang, não detectou benefícios com o uso de hidroxicloroquina e concluiu que mais pesquisas são necessárias.
Um quarto estudo, coordenado por Jean-Michel Molina, professor do Departamento de Doenças Infecciosas da Universidade de Paris, publicado no periódico Médecine et Maladies Infectieuses, não encontrou nenhuma evidência de redução da carga viral ou benefício clínico com a combinação de hidroxicloroquina e azitromicina em pacientes com infecção grave por covid-19.
Viralização
A postagem do canal Embaixada da Resistência registrou, até esta segunda-feira 6, 47 mil visualizações. | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Enganoso'] |
https://projetocomprova.com.br/publica%C3%A7%C3%B5es/e-falsa-a-corrente-que-diz-que-xangai-e-pequim-nao-tiveram-casos-de-coronavirus/ | COMPROVA | É falsa a corrente que diz que Xangai e Pequim não tiveram casos de coronavírus | null | 2020-04-03 | Segundo a OMS, ao contrário do que afirma uma corrente que circula nas redes sociais e aplicativos de mensagem, foram registrados 583 casos de coronavírus em Pequim e 526 em Xangai até o dia 3 de abril. Levantamento da universidade Johns Hopkins dá conta de 14 mortes nas duas cidades até a mesma data
Uma corrente que circula nas redes sociais afirmando que o novo coronavírus não chegou às grandes cidades chinesas, apresenta uma série de dados falsos para tentar comprovar que o vírus é um “atentado terrorista” produzido pela China para “criar pânico no mundo”.
O conteúdo foi publicado originalmente na página do Facebook “Jair Bolsonaro Presidente – Atibaia” em 1º de abril e depois passou a ser veiculado por outros perfis nas redes sociais.
A corrente usa dois argumentos centrais: de que a covid-19 se espalhou por todos os países, mas não atingiu Pequim, a capital chinesa, e nem Xangai, o polo econômico do país asiático; e que o vírus não teve impacto na economia e no mercado financeiro chinês.
Ambas as afirmações são falsas. No último balanço da universidade americana Johns Hopkins, até dia 03/04, às 17h, Pequim tinha 584 pacientes que testaram positivo para a doença, oito mortes e 434 pessoas recuperadas. Na mesma data, Xangai tinha 526 casos confirmados, seis mortes e 348 pacientes recuperados. De acordo com o levantamento realizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), até o dia 03/04, foram registrados 583 casos de coronavírus em Pequim e 526 em Xangai.
Já em relação aos impactos econômicos, reportagem da Agência Reuters, de 31 de março, mostra que o mercado de ações chinês teve o pior trimestre desde 2018, por conta das consequências econômicas do coronavírus. No começo de fevereiro, as bolsas chinesas chegaram a registrar a queda mais importante em cinco anos, de 8%. Os dados do impacto da covid-19 na economia chinesa podem ser lidos em texto publicado (em inglês) pela Agência Nacional de Estatísticas do país.
Há outros trechos da corrente que também são falsos, como o Comprova destrinchou na seção abaixo.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.
Como verificamos
Para verificar a veracidade das informações do texto que circula nas redes sociais, o Comprova dividiu o conteúdo em 8 perguntas.
Buscamos as informações em publicações oficiais de contaminação pela covid-19, no mapa em tempo real mantido pela Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, e no site da Organização Mundial da Saúde.
Foram utilizadas, ainda, reportagens com fontes oficiais e autoridades publicadas em veículos jornalísticos.
Você pode refazer o caminho da verificação clicando nos hiperlinks do texto verificado.
É verdade que esse vírus não atingiu a capital da China, Pequim, e a capital econômica, Xangai, e não tem efeito sobre essas cidades?
O texto começa dizendo que doença se espalhou por todos os países, mas não atingiu Pequim, a capital chinesa, nem Xangai, o polo econômico do país asiático. De acordo com autoridades locais, em 20 de janeiro a China contava com 200 casos confirmados e já tinha pacientes infectados pelo vírus em ambas as cidades.
No último balanço da universidade americana Johns Hopkins, até dia 03/04, às 17h, Pequim tinha 584 pacientes que testaram positivo para a doença, oito mortes e 434 pessoas recuperadas. Na mesma data, Xangai tinha 526 casos confirmados, seis mortes e 348 pacientes recuperados. De acordo com o levantamento realizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), até o dia 03/04, foram registrados 583 casos de coronavírus em Pequim e 526 em Xangai.
É verdade que Pequim e Xangai não foram fechadas, não entraram em quarentena nem em lockdown e também não tiveram bloqueios?
Em outro trecho, o texto diz que não houve lockdown ou bloqueios em nenhuma dessas duas cidades. De fato, os governos locais não determinaram um isolamento total de toda a população, como foi feito em Wuhan, cidade onde foram registrados os primeiros casos da doença. No entanto, autoridades restringiram deslocamentos, fecharam restaurantes, cinemas, lojas e shoppings.
Os governos locais também adotaram uma política rigorosa para a medição da temperatura da população, por meio de um sistema de reconhecimento facial implementado em estabelecimentos, como mostra esse documentário sobre a quarentena em Pequim realizado pelo canal ArteTV.
Em Pequim, lojas, cinemas, museus e restaurantes foram fechados. Em Xangai, visitas a pontos turísticos foram suspensas na última semana. No dia 15 de março, as duas cidades impuseram uma quarentena obrigatória de 14 dias para pessoas que voltassem de viagens do exterior. Em Pequim, os que se recusarem em se isolar ou obedecer regras oficiais podem ser punidos pelo governo.
Alguma autoridade de saúde informou que o vírus não chegaria a Pequim e Xangai?
Em pesquisas na internet, em jornais locais e internacionais, o Comprova também não identificou nenhuma autoridade de saúde que tenha divulgado que o vírus não atingiria as duas cidades chinesas.
Pequim e Xangai são as áreas adjacentes de Wuhan, cidade em que se originou a doença?
A corrente também afirma que as cidades são “adjacentes de Wuhan”, local onde a doença se originou. Segundo o Google Maps, Pequim está a 1.152 quilômetros de Wuhan e Xangai, a 820 quilômetros.
É verdade que novos casos não estão chegando na China e o país está aberto?
Em seguida, o texto afirma que o “mundo está assolado enquanto novos casos não estão chegando na China”. Em 12 de março, o país informou que, após registrar 80.980 casos do novo coronavírus e 3.173 mortes, o pico da doença havia passado e os novos casos diários estavam em declínio. Com isso, seria possível começar a relaxar as medidas de isolamento no país, como reabrir as salas de cinema, e voltar a abrir a economia.
Contudo, segundo a ferramenta da Johns Hopkins, nos últimos vinte dias a China registrou mais 1.529 pessoas infectadas e 153 óbitos, até as 11h30 de 03/04. A preocupação com uma segunda onda de surto da doença por pessoas que possam voltar de países que ainda registram transmissão levou as autoridades chinesas a decretarem o fechamento das salas de cinema novamente .
É verdade que não há efeito do coronavírus no mercado financeiro da China?
Depois da exposição sobre os casos, a corrente se dedica a comprovar que não houve efeitos do vírus na economia e no mercado financeiro da China. Reportagem da agência Reuters, de 31 de março, mostra que o mercado de ações chinês teve o pior trimestre desde 2018, devido a preocupações sobre as consequências econômicas do coronavírus.
No começo de fevereiro, as bolsas chinesas chegaram a registrar a queda mais importante em cinco anos, de 8%. A produção industrial na China sofreu em fevereiro a mais rápida contração da história. Os lucros industriais diminuíram 38,3% nos dois primeiros meses de 2020.
A taxa de desemprego no país aumentou mais do que durante a guerra comercial com os Estados Unidos. O aumento da taxa, mês a mês, chega a ser maior do que o desemprego que ocorreu nos 18 meses anteriores, quando havia influência do embate comercial. Os dados do impacto da covid-19 na economia chinesa podem ser lidos em texto publicado pela Agência Nacional de Estatísticas do país.
Como a China é hoje um dos maiores polos econômicos mundiais, as consequências se espalharam por todo o mundo: a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento prevê uma redução de 5% a 15% nos investimentos estrangeiros diretos no mundo em 2020. A OCDE, o clube dos países ricos, projeta que o impacto mundial do coronavírus deve derrubar de 0,5 a 1,5 ponto percentual o PIB global. Em valores, se trata de uma perda de US$ 500 bilhões a US$ 1,4 trilhão em geração de riqueza, que deixará de existir.
É verdade que o vírus chinês é uma arma biológica da China? Há indícios de que o país tem remédios que não foram compartilhados com o mundo?
O conteúdo falso também diz que o vírus é uma “arma biológica” criada pela China para destruir o mundo e sugere que o país asiático “talvez também tenha remédios que não está compartilhando”. No entanto, segundo pesquisa científica publicada na revista médica Nature Medicine, o vírus não foi criado em laboratório.
Pesquisadores dos Estados Unidos, Reino Unido e Austrália apontam evidências de que o novo coronavírus seja resultado de uma seleção natural, segundo os cientistas. Uma das possibilidades consideradas é de que o novo coronavírus tenha evoluído em alguma espécie de animal (ainda não se sabe ao certo qual seria) e, então, ter feito a transição para o organismo humano.
O Comprova também consultou o virologista Lindomar Pena, do Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães (Fiocruz Pernambuco), se havia possibilidade de o vírus ter sido criado em laboratório. Ele disse que o genoma dos coronavírus é enorme e isso dificulta sua manipulação genética.
“Nem mesmo o maior especialista em vírus do planeta teria a capacidade de construir um vírus tão exitoso em transmissibilidade. Isso é efeito de mutação e seleção natural durante a circulação do vírus em animais silvestres. A natureza é mais sábia que qualquer cientista”, disse o virologista.
O texto levanta ainda a possibilidade da China ter desenvolvido um remédio para combater o coronavírus, e não ter compartilhado com o mundo. Atualmente, não há nenhum tratamento comprovadamente eficaz para a doença. A China e outros países têm investido em pesquisas, mas nenhum deles já conseguiu comprovar a descoberta de um remédio único para tratar pacientes com a covid-19.
Na última semana, a Organização Mundial da Saúde anunciou que começará uma pesquisa global chamada de SOLIDARITY (solidariedade, em inglês), com o objetivo de testar, em milhares de pacientes, quatro terapias promissoras.
Recentemente, cientistas da Universidade Tsinghua, em Pequim, descobriram anticorpos que podem ser úteis para combater o novo coronavírus. O estudo foi divulgado pela China e pela mídia, mas não tem ainda eficácia comprovada.
O diretor-geral da OMS tem alguma relação com a China? Ele foi colocado no cargo através do esforço diplomático chinês?
Por fim, o texto classifica o novo coronavírus como “o pior atentado da história”. O conteúdo sugere que a propagação da doença contou com a participação do “presidente” da Organização Mundial da Saúde (OMS), que teria sido colocado no cargo por um esforço do governo chinês.
Na verdade, o etíope Tedros Adhanom foi indicado pelo governo da Etiópia para concorrer ao cargo, que começou com seis candidatos na disputa. De acordo com o site de notícias STAT, especializado na cobertura de saúde, foram três rodadas de votação secreta entre os estados membros da OMS até que Tedros fosse eleito.
Na última votação, que ocorreu na 70ª Assembleia Mundial de Saúde em 2017, o etíope derrotou David Nabarro, da Inglaterra, e Sania Nishtar, do Paquistão. Ele recebeu 133 votos dos 185 estados membros. O Comprova não encontrou nenhuma referência online de apoio da China à eleição de Tedros.
Quem compartilhou o conteúdo?
O texto foi publicado primeiro às 15h37 do dia 1º de abril, no perfil “Jair Bolsonaro Presidente – Atibaia” do Facebook.
Depois, o Comprova identificou outras reproduções do conteúdo, em sites de notícias conservadores do Paraguai, em páginas do Twitter e em mensagens no WhatsApp.
Viralização
O post original na página do Facebook bolsonarista teve 44 curtidas e 38 compartilhamentos. Em seguida o perfil do Twitter @zfabrogmailcom reproduziu o conteúdo, que teve 353 curtidas e 173 compartilhamentos até as 17h de 3 de abril.
Outros perfis compartilharam o conteúdo, que também circulou pelo WhatsApp.
Outras verificações
Também desmentiram a corrente o site Boatos.org, AosFatos.org e o portal G1PAGE_BREAK: PageBreak | null | null | ['Projeto Comprova'] | ['Pandemia'] | [] | 2021-07-06 | ['Falso'] |